– Vai-se lá, mano! Que história é essa de dar educação aos pretos?
Ouviu a tal pergunta atentamente, mas já estava decidido. Ajuntou a sua mala e partiu. Subiu ao trem pouco antes das três. O moço a vir lhe checar o bilhete tinha mal hálito e cheirava a crisântemos, o que lhe causou um incomodo desnecessário.
Durante os três dias de viagem, admirou as paragens, com seus longos verdes. Vez ou outra, deparava-se com rebanhos enormes, brancos ou pretos, mas nunca misturados. Ao longe divisava o que imaginava ser um vaqueiro, que imaginava gritar ao gado. No entanto, àquela distância, sua voz desaparecia por debaixo do soprar do vento e mesmo do mugir das vacas.
Ao final do terceiro dia, já chegando ao seu destino, choveu às troças. A máquina teve de parar, com o moço a entrar no vagão explicando-lhe o medo de dilúvio.
– Pois não há forma de prosseguir no atual estado. – disse o moço, com o chapéu à mão. Fitava-lhe com certa tristeza, a tal ponto que quase lhe perdoou os odores, mas bastou virar-se para que a ojeriza voltasse a toda potência, e ele praguejou contra o pobre por ofender-lhe o olfato.
Chegando ao destino, desceu à plataforma agarrado às malas. Uma velha se aproximou pedindo esmolas e ele atirou-lhe uma moeda. A senhora, feito um cão, lançou-se ao pedaço de metal, mordendo-lhe para checar a consistência.
Esperava-lhe por ali um tipinho magro, de dentes poucos, que prometia levar-lhe ao endereço que procurava. Saltou então ao lombo de uma mula cadavérica e prosseguiu embaixo de Sol. O sujeito ao lado mascava algo que não pôde distinguir. Vez ou outra, cuspia por sobre o ombro um misto disforme preto-avermelhado que fê-lo perguntar se não achava melhor ir procurar o doutor. O sujeito sorriu de volta mostrando uma gengiva branca e repleta de vermes.
Chegaram a uma vila já beirando o crepúsculo. Via-se por ali uns projetos de casa pairando sobre um areal estéril. Os olhos que fitavam-lhe dos outros lados das janelas eram de dar dó. Pareciam lhe pedir por algo. Só não sabia o quê.
Aquietou-se por uma construção que parecia um pouco menos suscetível a desabar do que as outras. Dormiu um sono intranquilo no qual foi visitado por uma garota, metade preta, metade branca. Quando perguntou-lhe quem era, ela disse com voz de choro e de riso: “Sou tua filha natimorta”.
Levantou-se antes do sol, das galinhas e do leiteiro. Conversou com a noite por alguns instantes e depois partiu ao meio da quadra onde falou ao pároco local. O homem santo lhe perguntou sobre suas intenções, e ele disse por entre dentes:
– Não é justo que esse povo possa, ao menos, ler? – mas logo abaixou a cabeça, ciente dos absurdos que dizia.
Pouco após o nascer do Sol, já estava sentado à praça, cercado de crianças pretas, livro à mão, falando sobre aritmética. Uma menina mirrada, com uma dúzia de anos e de quilos, perguntou-lhe se com aqueles números poderia contar os golpes que mataram o seu pai.
Ao final da lição, o padre chegou para aproveitar a reunião e falar um pouco sobre seu deus. Ele percebeu como os olhinhos atentavam-se às palavras do religioso em busca de algum significado que sua ciência era incapaz de conferir.
Caminhou até um comércio e pediu duas doses de álcool e uma de esperança. O homem do outro lado do balcão colocou três copos na mesa, dois cheios, o outro vazio.
Outra noite sonhou com a menina. Perguntou-lhe se havia algo que pudesse fazer por aquele povo e ela respondeu: “Chorar o sangue que não tem coragem de derramar”.
Três dias mais, e seus ineficientes esforços cansavam-lhe. Os copos no balcão aumentavam à medida que as crianças na praça diminuíam. O padre disse-lhe das inutilidades de seus atos e aconselhou-o a partir. Deu-lhe um terço para que rezasse, e uma garrafa de vinho para que bebesse.
Em sua última noite na vila, sonhou com a menina pela última vez. Apesar de não lhe perguntar nada, ela lhe disse: “E se Deus existir e ele não gostar da gente?”.
Encontraram-lhe no quarto por volta da hora do almoço. As roupas encharcadas de vinho, o terço enrolado no pescoço, asfixiando-o.
Para além do vale da esperança
Elias
Resumo:
Um professor resolve ensinar os pretos a ler e em sua busca acaba por encontrar desesperança e morte.
Comentário:
O texto está cercado de elementos de pobreza, destruição e morte: crisântemo – flor que amo – mas que enfeita caixões, vermes em vivos, referência ao dilúvio que aqui é só símbolo de destruição, esmolas, casas condenadas, distância da cidade, desesperança, angústia.
Texto curto e afiado. Não há registro de quem de fato é a menina do sonho, mas a morte do professor ao final mostra que ele buscava expiação de algo pessoal e intransferível. A marcação de preto e branco até nas reses no pasto mostra o cenário real que está além do texto e que combina com as frases sobre educar preto.
Texto ferino.
Um conto curtíssimo sobre um homem que decide ensinar os pretos e como não consegue alcançar seu objetivo, aparentemente se enforca com o terço presentado por um padre. A história curta não precisa ser sem pé nem cabeça e esta pareceu-me assim. Poderia ter sido melhor se houvesse uma definição de época ou local ou de o porquê os pretos não terem acesso à educação.
Resumo: professor resolve partir para um povoado distante e pobre, onde tenta sem sucesso ensinar crianças carentes e desnutridas, que podem somente contar com o conforto da esperança em dias melhores, mesmo que somente na outra vida.
Impressões: um conto pesado, triste, trágico e curto como uma vida sem fé. Narrativa direta, enredo e história pouco desenvolvidos; personagens pouco aproveitados, como o potencial do tema apresentado. O corpo morre sem comida; a mente atrofia sem conhecimento; mas é a alma que perece sem a crença, mesmo em tempos de fartura.
Resumo: Homem embarca num trem e ao chegar ao destino é recebido por um tipinho magro. De lá chegam à vila com casas sobre um areal e com pessoas com um olhar de dar dó. O homem tenta ensinar os moradores da cidade a ler, depois de um tempo sem sucesso, o padre da cidade o aconselha a ir embora, mas o homem não obedece e conhece seu fim.
Comentários: Gostei da estória, no geral, é bem interessante e bem construída. A escrita é boa, retrata bem o ambiente desolado e a crueldade que é fruto da diferença de classes na sociedade. Tem algumas metáforas bem legais e frases de efeito que dão uma certa potência à estória tirando-a do lugar comum. O final ficou bem legal, tem um bom impacto. Porém, não tem um desenrolar muito diferente de outras estórias do gênero. Não vi erros de revisão.
O conto narra a história de um homem que embarca em um trem decidido a dar aulas ao mais necessitados. chegando em seu destino e vendo a realidade de como as pessoas do lugar viviam e atormentado por sonhos ruins, o homem acaba se matando.
Achei o conto mediano. A história começou e terminou tão rapidamente que não deu tempo de se apegar ou conhecer o protagonista da história. No início ele me pareceu um tanto antipático, por cismar com o cheiro do empregado do trem. Depois comecei a simpatizar com ele, pela preocupação com os habitantes do lugar onde foi viver. No entanto, foi tudo muito rápido, como disse anteriormente. Ficou só um gostinho do que poderia ter sido se por acaso o conto fosse mais trabalhado e mais extenso. Nós também ficamos sem saber quem é a garota que ele sonha e acabei ficando bem frustrado com o suicídio dele. Boa sorte no desafio.
Homem chega em uma vila distante com intuito de dar educação às crianças, mas logo é morto.
Técnica: 5,0
Criatividade: 4,0
Impacto: 4,0
Mas que coisa linda de leitura. Lindas imagens no texto. Cada frase deve ser lida com extrema atenção, pois tudo é muito bem construído. Gosto também de textos curtos, que nos levam logo ao ponto, que constroem um universo inteiro em poucas palavras. E este conto é transmitido isso com muita maestria.
Nem tenho muito o que comentar do texto, sem palavras mesmo após a leitura.
Obrigado!
Um homem sem nome assumiu uma missão: educar os pretos. Pegou um trem, encontrou um funcionário da ferrovia de hálito podre, enfrentou um tempestade e enfim chegou ao seu destino em lugar nenhum, em qualquer lugar, qualquer bolsão de miséria e iniciou a as aulas. Logo percebeu-se inútil, incapaz de atingir seu objetivo e rendeu-se ao álcool e deu um fim a sua vida.
Considerações: É curto. É universal; poderia ser na África, no nordeste brasileiro, no Haiti… É sem esperança e repleto de frases de feitos filosóficos. É bom!
RESUMO: Um homem viaja para uma região paupérrima, esperando levar alguma esperança para os habitantes, esperança esta que o falta. Lá, ele percebe o quanto é vã sua tentativa, enquanto fantasmas de seu passado o atormentam.
COMENTÁRIO: O texto é de sutilidade sofisticada e tão profundo quanto a mente do leitor pode ir. Sua narrativa, lírica deixa muitas coisas no ar e entrega poucas de mão beijada.
A narrativa me pareceu interessante, mas por demais lírica, dando mais importância à beleza das construções frasais do que a história em si.
De história, há pouco: um homem com um passado misterioso, contra todos os argumentos resolve tentar levar educação e esperança a pessoas desprovidas de ambos e de muito mais, ao fracassar, atormentado, dá fim a própria vida. A meu ver, há muito mais sobre este personagem que poderia ser explorado, e o final trágico me pareceu uma forma fácil de terminar sua história, contrariando o clichê do final feliz fácil. Aqui vejo um exemplo do final triste fácil.
Sobre a gramática, excelente. Algumas construções me incomodaram como: “Ajuntou a sua mala e partiu” e “admirou as paragens, com seus longos verdes”. Por outro lado, outras me comoveram e impressionaram, como: “Caminhou até um comércio e pediu duas doses de álcool e uma de esperança. O homem do outro lado do balcão colocou três copos na mesa, dois cheios, o outro vazio”.
Com o final abrupto da história, que conta com apenas setecentas e poucas palavras, minha impressão se torna mais convicção; não há história. Apenas um amontoado de frases bem construídas. O que é uma pensa, pois o potencial do autor demonstra que ele poderia escrever um conto memorável, simplesmente adicionando mais profundidade ao protagonista, talvez explorando seu passado, ou adicionar vitórias e derrotas em sua missão, se forma a seu final ser ainda mais lamentável e por conseguinte, mais poderoso.
Um texto bom, mas que tem potencial para ser muito melhor.
Um abraço!
RESUMO: Um professor saiu de sua terra, uma cidade grande, com o intuito de alfabetizar crianças negras em um vilarejo distante. Talvez crianças quilombolas. Com o passar do tempo, e com a impossibilidade de colocar seu plano em prática, o professor ficou desiludido ao ponto de perder o interesse em viver. Quando o encontraram, ele estava morto em seu quarto. Havia se enforcado.
CONSIDERAÇÕES: Gramática ok, leitura dinâmica, sem floreios. É um bom conto, provavelmente escrito por alguém que conhece a dificuldade levar a educação a alguns setores da sociedade. Vale a pena desenvolver um pouco mais a história, porque estamos diante de um assunto interessante e atual.
Bom dia/tarde/noite, amigo (a). Tudo bem por ai?
Pra começar, devo dizer que estou lendo todos os contos, em ordem, sem saber a qual série pertence. Assim, todos meus comentários vão seguir um padrão.
Também, como padrão, parabenizo pelo esforço e desafio!
Vamos lá:
Tema identificado: drama
Resumo: professor vai à Africa na esperança de salvar as crianças pela educação, mas ve as esperanças morrerem (e morre junto)
Comentário: caraca, FANTASTICO! Parabéns! Vamos por partes.
A liguangem que você empregou combina muito com o enredo: crua e direta, com uma certa frieza característica da morte da esperança. Acertou em cheio no tipo de escrita. Desde o começo, a leitura me colocou num ambiente desolador, e eu só podia sentir que algo de terrível se passaria.
O conto todo é triste e desolador, recheado de metáforas sobre morte, desesperança e incapacidade de entender coisas (como a incapacidade de ouvir o vaqueiro). Além disso, existem várias distinções entre preto e branco, servindo de pano de fundo para a crítica social do conto. Um trabalho que me lembrou de certa forma (em proporçoes e situações diferentes) Almodovar, usando bem o contraste de cores como artifício de enredo.
Ainda sobre a escrita, a princípio estava achando que tinha infos sobrando, sem muita utilidade, como o trecho da viagem do trem. Por algum motivo, tudo acaba se encaixando no final, e parece ser indispensável para a trama.
Alguns trechos me marcaram muito, especialmente os sonhos, que são a metáfora perfeita de como a esperança dele foi morrendo aos poucos. Além disso, o clima do sonho é assustador e me causou um pouco de repulsa ou medo, não sei dizer.
Outro ponto altíssimo do conto é a metáfora dos 3 copos, 2 cheios (de alcool) e um vazio (de esperança).
Tudo isso pra mostrar que seu conto possui metáforas memoráveis, trabalho de mestre. O conto é forte, denso , curto e direto.
Senti inúmeras emoçoes lendo o conto, especialmente o ultimo paragrafo, que me arrepiou.
Sensacional. Sem dúvida um dos meus preferidos de todas as divisões, até agora ( e só falta ler uns 5). Parabéns e boa sorte!
Olá, autor!
Nossa… Conto muito interessante no modo que foi narrado… Eu estranhei muito mas achei genial… Não sei bem explicar direito… Uma narrativa bem original e incomum! O conto ser curto, rápido e certeiro foi muito acertado, a linguagem poética e diferente poderia cansar em um conto maior. Olha eu gostei muito! Bem forte, como um coice de mula! Parabéns e boa sorte!!
Resumo
Alguém que decide ensinar crianças (possivelmente africanas) a ler. O fim trágico e inesperado diante da impossibilidade e da impotência.
Técnica
Uma narrativa muito interessante, muito bem escrita, nada ingênua, sem sensacionalismos ou panfletagens e que simplesmente termina…
A garota dos sonhos foi uma incógnita e que não contribuiu para a compreensão do drama e principalmente do final.
Criatividade
Um drama já por muitos relatado, mas com uma pitada de sobriedade narrativa bastante peculiar.
Impacto
Confesso que a o final (mais parecido com a falta de final) me impactou bastante. Fiquei sem entender muito quem era a garota e qual a sua influência real no final trágico. Tive a impressão que você se cansou do texto e resolveu dar um fim logo.
Perdoe-me se perdi muita coisa do seu conto, mas parabéns pela linguagem e pelo estilo da escrita.
Olá, Elias, boa sorte no desafio. Eis minhas impressões sobre seu conto.
Resumo: Numa viagem de trem homem vislumbra a paisagem, ao fim da viagem, em um vilarejo, após passar por estranhas situações e esquisitos personagens, ao dormir sonha com uma estranha garota, metade preta, metade branca. No dia seguinte vai até a praça, quando se encontra com várias crianças, também bem esquisitas, por fim morre asfixiado em um terço.
Gramática: A escrita na linguagem lusitana, embora a nós brasileiros nos cause certa estranheza, corretíssima. Mesmo se tiver algum deslize, não há como detectar.
Comentário crítico: Uma narrativa cheia de significados e metáforas, mas não conclusivas. Apesar da pequena extensão do enredo, o autor despeja diversas hipóteses sem, entretanto, dar um significado para suas pretensões, como mensagem. Ficando o dito pelo dito? E como desfecho finaliza com mais uma incógnita.
Homem parte de trem em uma viagem de três dias para ensinar em aos pretos de uma comunidade distante. Inicia as lições em uma praça mas logo se frustra por achar inúteis seus esforços.
Uma história enigmática. No enredo, o número três se repete: três dias de viagem, três dias para desistir de ensinar, três copos na mesa, o terço a asfixiar o personagem. Talvez uma referência à trindade cristã, sei lá, Na minha leitura, elementos que reforçaram o efeito enigmático doo conto. A dualidade preto-branco que também se repete no texto (o gado, a filha natimorta), idem.
A linguagem combina com a atmosfera de estranhamento que acompanha o desenrolar do conto, o que me agradou. A precariedade dos ambientes e dos personagens que surgem nas cenas, além das repetições enigmáticas, reforçam essa atmosfera de estranhamento.
Notei duas coisinhas que passaram na revisão. Um “mal” hálito e a palavra “imaginava” repetida em um único período não soou bem,
Finalizo dizendo que não é uma história que tenha me agradado, talvez por ter me escapado alguma intenção do autor. Mas o conto me impactou de alguma maneira pela combinação dos elementos de enredo-linguagem-imagens evocadas. Enfim, uma experiência de leitura interessante.
Desejo sucesso no desafio e em tudo mais. Um abraço.
Para Alem do Vale da Esperança
Resumo: Um homem segue viagem de trem. Aproveitando do cenário, ele vislumbra paisagens e personagens que parecem não lhe agradar. Chegando ao seu destino ele busca por alguma coisa(não consegui definir o que seja), ele parece não encontrar. Entre os fatos vivenciados e algumas doses do que, o texto chama de esperança, ele acaba tirando sua própria vida com um terço dado por um dos padres da cidade onde estava.
Pontos Fortes: A fragilidade do personagem revela algo que parece comum com a realidade (Gostei dessa similaridade).Tem pessoas que parecem seguir assim, sem rumo, sem um destino certo. A viajem de trem sempre me foi convidativa.
Ponto fraco: Alguns trechos no texto não parecem ter uma conexão. Me pergunto se o personagem viveu atordoado pela sua mente, ou, se estava disposto a tirar a própria vida desde o inicio. isso não ficou muito claro.
Resumo:
Para além do vale da esperança nos traz a história de um protagonista sobre o qual pouco se diz diretamente. A história parece passar-se na primeira metade do século passado e o personagem decide afastar-se da sua vida cotidiana mudando-se para um vilarejo habitado por afrodescendentes a fim de alfabetizá-los. Sem incentivo e sem sucesso, é incomodado por pesadelos recorrentes, sucumbe ao alcoolismo e acaba por suicidar-se.
Comentários:
A história abre com um dos poucos diálogos presentes no conto. O substantivo “mano”, precedido pela expressão “vai-se lá” (bem como adiante a citação do chapéu usado por funcionário do trem), remete à formalidade da primeira metade do século passado. Então, “mano”, longe de enquadrar-se na gíria contemporânea, indicaria mesmo um laço sanguíneo. Neste caso, seria adequado confirma-lo logo a seguir usando, por exemplo, ao invés de “Ouviu a tal pergunta”, algo como “Ouviu a pergunta do irmão(a)…
É uma boa introdução, do tipo em que o autor “arregaça as mangas” e mostra imediatamente a que veio, sem muitos preâmbulos. A seguir, no entanto, nota-se muitas descrições e imagens pertinentes aos cenários e “figurantes” e estas acabam por resultar excessivas em contraponto ao quase nada que é informado sobre o protagonista.
De fato, todo o conhecimento sobre o protagonista se dá de forma muito indireta, exigindo bastante atenção e relativa perspicácia do leitor. Ponto positivo. Em contrapartida, a escassez de diálogos talvez se dê por uma possível inaptidão do autor em relação aos mesmos. Em “– Não é justo que esse povo possa, ao menos, ler?” O que se segue “mas logo abaixou a cabeça, ciente dos absurdos que dizia.” Não é apenas desnecessário e supérfluo, mas nocivo à narrativa. Bastaria informar que o personagem disse-o de cabeça baixa, ou que abaixou os olhos imediatamente após dizê-lo, e a pretensa censura da contraparte (ou de si mesmo) ficaria implícita. De forma análoga, em “Uma menina mirrada, com uma dúzia de anos e de quilos, perguntou-lhe se com aqueles números poderia contar os golpes que mataram o seu pai.”, o discurso é indireto, no entanto a dramaticidade associada à informação é extremamente direta, tornando-se assim barata, evidenciando o apelo emocional (talvez nem mesmo deliberado), a tentativa de comoção do leitor.
Essa “dramaticidade barata” prossegue em “Caminhou até um comércio e pediu duas doses de álcool e uma de esperança” Nota-se a tentativa positiva de adição de poesia à prosa, porém o autor, ao meu ver, falha miseravelmente quando, na sequência, ratifica o caráter literal da imagem com “. O homem do outro lado do balcão colocou três copos na mesa, dois cheios, o outro vazio.”
De forma geral, a missão que o protagonista impõe a si mesmo como um autoflagelo, bem como a recorrência dos sonhos perturbadores e a inclinação ao alcoolismo, remetem a um sentimento de culpa (dedução fortalecida pelo suicídio no arremate), porém os indicativos da origem dessa culpa também precisariam ser apresentados e distribuídos ao longo da narrativa.
Naturalmente, um miniconto apenas não nos permite compor o perfil de um autor, porém se tal missão me fosse imposta, eu sugeriria que se trata de um escritor(a) talentoso, com potencial e que, apesar da técnica e estilo ainda bastante crus, tem visão concreta do que caracteriza a literatura enquanto arte e de como se deve escrever um texto de forma a valorizar a inteligência e percepções do leitor. E se ainda me fosse pedido um conselho, recomendaria-lhe que trabalhasse mais, que trabalhasse à exaustão, não apenas em seus textos, mas nos dos autores que eventualmente tome por referência.
Em números:
Título e Introdução: 7
Personagens: 6
Templo e Espaço: 6
Enredo, Conflito e Clímax: 7
Técnica e Aplicação do Idioma: 7
Valor Agregado: 7
Adequação Temática: 10
Nota Final: 3,5
Observação:
As parciais, baseadas nos critérios, variam de 0 a 10, mas possuem pesos distintos na composição da nota final, que varia de 0 a 5.
Homem vai ensinar comunidade negra, contra todas as opiniões. Acaba por se suicidar.
Achei este conto muito confuso. Percebo o tema do racismo como sendo a base do mesmo, tal como a religião, mas o desenvolvimento é feito de uma forma confusa. Não encontrei motivação para o desfecho, por exemplo. A dualidade entre a igreja e o ensino é estranho: na maior parte das comunidades remotas é a própria igreja que tem um papel na educação. Neste conto parece haver um conflito que resulta da mente transtornada do homem. Esse transtorno nunca é explicada. Talvez faltasse desenvolvimento para resolver a trama, dado que o limite de palavras não foi atingido.
Texto forte, boa técnica, bons personagens.
Não sei se compreendi direito a história, mas parece-me que o homem está tentando livra-se de alguma culpa, redimir-se, ajudando as crianças negras. Ele teve uma filha? Isso não é um problema, pois gosto de textos abertos, que nos deixam pensando no que exatamente o escritor quis dizer. Parabéns pelo conto.
Destaque para este trecho, muito bom: “Caminhou até um comércio e pediu duas doses de álcool e uma de esperança. O homem do outro lado do balcão colocou três copos na mesa, dois cheios, o outro vazio.”
Obs: esta não é uma leitura obrigatória para mim neste desafio, por isso não há resumo. É apenas a minha breve impressão sobre o texto.
Resumo: Homem com boas intenções vai a um lugar rústico e carente do mínimo para tentar levar um pouco de instrução para as pessoas que ali vivem. Só que ele falha e acaba se matando pelo desgosto.
O que vi: Infelizmente preciso concordar com a ideia de que é inviável tentar levar erudição a um povo que sequer tem o mínimo de comida e dignidade. Sendo estas preocupações primeiras de todo ser humano, penso eu.
A mim pareceu que o protagonista viu sim que era isso que estava estampado nos olhos das pessoas na vila: falta de dignidade. Mas preferiu não admitir.
Era uma gente sabotada, sem acesso ao mínimo. E como não havia sinais de Governo Municipal, talvez, pelo menos o próprio padre, que gozava de mais credibilidade no local pudesse ter tomado a dianteira nesse projeto de alfabetização. Mas ele mesmo também já não via como.
Parabéns pelo conto. Foi fluido, reflexivo e impactante.
PARA ALÉM DO VALE DA ESPERANÇA- Resumo=. Um professor vai lecionar numa vila distante da civilização. Ele começa a dar aulas para crianças e adultos, mas devido ao desinteresse da população, aos poucos o abandonam. Sentindo-se inútil, o homem comete suicídio.
COMENTÁRIO = O argumento até que é bom, porem a narração está malformada, com frases mal construídas e uma série de erros. 1- A palavra “mal hálito” está errada. O certo é “mau hálito”. É comum as pessoas confundirem mal com mau, bem com bom. Mal é contrário de Bem. Mau hálito – bom hálito. Homem mau-homem bom. Ele está mal (doente), ele está bem, com saúde. 2- A palavra “imaginava” escrita duas vezes na mesma frase. Deve-se evitar a repetição de palavras numa mesma frase e num mesmo parágrafo. 3- “Gengiva branca cheia de vermes”. Vermes ou germes? A diferença é muito grande, vermes só se o homem era um zumbi, estava meio-morto. 4- “garota metade preta, metade branca”. Fiquei imaginando uma garota preta da cintura para cima e branca da cintura pra baixo. O mais certo é dizer “ garota parda, ou mulata”, naturalmente filha de mãe negra e pai branco, ou vice-versa. Esses problemas, a meu ver, prejudicaram o texto e me impediram de dar uma boa nota. Mas o autor tem boas ideias, só precisa aperfeiçoa-las até cansar.
Homem faz viagem de trem com objetivo de ensinar negros. Em poucos dias, mesmo com certa ajuda do pároco, ele fracassou em sua missão e comete suicídio.
Conto curto e simples, com elementos que indicam a época da escravidão ou, logo depois da abolição, no Brasil.
É uma trama válido que, se não é nova, está apresentada de forma interessante; um protagonista envolvente e crível, personagens planas, mas que funcionam. Podemos notar um certo viés ideológico.
Bem escrito, suave, flui, apesar de faltar mais conflito, aventuras, ação, uma trama mais dinâmica e rápida, que é o que atrai o leitor. Talvez se alguns acontecimentos fossem mais aprofundados, a história teria um ritmo mais envolvente.
Parabéns pelo trabalho. Sorte na Rodada. Abraço.