Nuvens cinzentas e mal encaradas escondiam o sol do meio dia e anunciavam que vinha muita chuva por aí, mas Téo não se apressou no caminho feito entre a escola e sua casa. A barriga ainda estava doendo onde haviam lhe acertado, e por isso andar depressa era doloroso. Não se importaria em tomar um banho de chuva. Talvez aquilo lhe esfriasse as ideias e os pensamentos ruins.
Andava lentamente, passo a passo, pensando em como abordar o assunto com o pai. Nos últimos dias, o velho estava um pouco nervoso devido a uma briga com a namorada. Ela havia saído de casa e o deixado furioso, esmurrando paredes e quebrando copos. Sobrou para Téo segurar a barra, mas como sempre, o pai não lhe encostou a mão. Apenas o usou como confidente de xingamentos e ameaças.
‘’ Mas não importa’’, pensou, Téo. ‘’ Vou falar com o pai hoje. Não estou mais aguentando.’’
E apenas pôde torcer para que o velho estivesse de bom humor.
Quando finalmente chegou em casa, Téo encontrou o pai na cozinha, debruçado em cima da pia.
– Pai? – perguntou. – O que o senhor está fazendo?
Sempre que Téo fazia algum tipo de pergunta, o pai demorava pelo menos três segundos para responder. Era como se pesasse em sua balança mental se a pergunta em questão era digna ou não de uma resposta sua. Daquela vez, levou quatro segundos e meio.
– Consertando essa torneira – resmungou, finalmente respondendo. – Mas já acabei.
O pai se virou e Téo notou a camisa molhada na linha da sua cintura e um alicate na mão esquerda. Logo em seguida, olhou para o seu rosto e procurou tentar adivinhar como estaria se sentindo. O pai não era tão velho, mas já tinha alguns cabelos brancos e diversas linhas de expressão marcando o rosto. A posição dessas linhas mudava para um formato característico, formando um V bem no centro da testa, quando ele estava com raiva. Naquele momento, as linhas não formavam a letra e por isso tudo parecia estar bem. Mesmo assim, Téo estava nervoso. Ansioso para falar, mas ao mesmo tempo apreensivo. Uma terrível sensação e o velho percebeu logo.
– O que você quer me pedir? – Perguntou. – Vamos. Conheço essa sua cara. Fale logo.
Téo abriu a boca mas não conseguiu falar. No fundo, sabia que além do medo, estava mesmo era com vergonha.
Pedir ajuda não era tão fácil.
O pai jogou o alicate na pia e se agachou ao seu lado, começando a franzir o cenho.
– Você ouviu a minha pergunta? – ele apertou o ombro de Téo com um pouco de força. – Eu sei que ouviu. Desembucha, moleque. Rápido.
– Eu queria que o senhor me ajudasse – disse Téo, com um ridículo fiapo de voz fina.
O pai ficou curioso.
– Ajudar com o que? Do que você está falando?
Bom, não havia mais volta. O garoto então começou a falar, atirando palavras feito uma metralhadora, muito por causa do nervosismo.
– É que tem esse menino lá na escola, pai. E ele fica me chamando de coisas na hora da aula, e no recreio também. E eu já pedi pra ele parar, mas ele não me escuta e continua me xingando. Eu já pedi mais de mil vezes. Mas ele…
O velho apertou o seu ombro, e Téo se calou abruptamente.
– Do que ele te chama? – perguntou, o pai.
Téo mordeu os lábios. Não queria falar. Não queria ter que se humilhar daquela forma. Mas outro aperto do pai em seu ombro, dessa vez com mais força, o encorajou.
– Ele me chama de viadinho, de bunda suja, de outras coisas também – o garoto confessou e ficou aflito quando viu o pai sorrir. Não um sorriso normal, mas um sorriso de dar medo. Um sorriso perigoso.
– De viadinho? – O pai gargalhou. – Mas que filhinho da puta, heim? E você, moleque? O que você fez? Bateu nele, não é?
Automaticamente, e sem saber porque, Téo fez que sim com a cabeça, mas os seus olhos fugiram para o chão, entregando a verdade. O pai fechou novamente a cara.
– Não, você não bateu nele. Eu sei disso. Você está mentindo para mim. Mentindo pro seu pai, não é? Escroto. Mentirosinho de merda.
Téo virou-se e quase saiu correndo, fugindo daquela situação, quando o pai lhe pegou pelo pulso e apertou tanto que o garoto caiu sentado no chão.
– Porque você não bateu nele? – o pai já começava a gritar. – Porque não bateu?
– Porque ele é maior, pai – Téo choramingava. – E ele me bate também. Mas eu não consigo bater nele porque ele é maior do que eu.
Então, de repente, o pai o largou, foi até a parede e deu alguns socos fortíssimos nela.
– PORRA! – gritou, enquanto espancava o cimento. – PORRA! PORRA! PORRA E PORRA!
E depois encarou Téo, que a essa altura já estava chorando. O pai foi até ele e se agachou novamente ao seu lado.
– Escuta aqui – ele cuspia enquanto falava, e apontava para o rosto de Téo. – Quando eu tinha a sua idade. E quantos anos você tem mesmo? Dez, onze? Ah, é doze. Lembrei. Pois então. Quando eu quase a sua idade, tinha um moleque que gostava de me bater na hora do intervalo, igualzinho ao seu amigo aí. Ele me xingava e chutava minha bunda na frente das meninas. Pois é, era uma merda. E adivinha só, Téo? Ele era bem maior e mais forte do que eu. Mas ao invés de ficar chorando e pedindo ajuda para o meu pai, sabe o que eu fiz?
Téo chorava, não seria nunca capaz de perguntar. O pai não esperou que o fizesse.
– Eu levei um martelo escondido para o colégio – continuou. – E quando o imbecil estava distraído, acertei uma martelada na sua cabeça e ele caiu na hora, gritando de dor. E você pensa que nessa hora eu saí correndo? Não, não mesmo. Quando ele estava no chão, eu continuei a bater. E bati muito. Nas pernas, nos braços, no corpo. Ele ficou todo quebrado. Toda a valentia daquele saco de bosta havia sumido. No fundo, ela não era tão grande assim.
O pai então apontou para a pia. Gritava agora ainda mais do que antes.
– Tá vendo aquela porra de pia? Ela quebrou hoje pela manhã, começou a jorrar água pra tudo quanto era lado. E sabe o que eu fiz? Eu fui lá e a consertei. Não precisei perder tempo chamando alguém e nem pedindo ajuda, ou mesmo pensando no que iria fazer. Simplesmente fui lá e consertei. É assim que as coisas funcionam. Quando algo dá errado, a gente conserta depressa, na hora. Ou depois o problema cresce e fode totalmente com a gente.
O velho então pegou o queixo de Téo com a mão e sussurrou, como se o estivesse ninando. Na testa, o imenso V sinalizava o perigo.
– E é por isso, meu filho, que amanhã você vai bater nesse garoto e mostrar para ele quem você é. Vai mostrar para ele que você tem coragem e que não vai aceitar ser espancado ou xingado. Amanhã você vai virar um homem.
E Téo, que nesse momento parou de chorar, assentiu novamente de forma automática com a cabeça, pois sabia que se não o fizesse, estaria perdido. Mas dentro do seu peito, o coração estava apertado pois sabia que não teria coragem. Sabia que de um jeito ou de outro decepcionaria o seu pai.
No outro dia, Téo chegou em casa com um galo em cima do olho. Na verdade, pensou muito em nem voltar. Mesmo sozinho, achava que conseguiria atravessar metade da cidade e chegar até a casa da irmã da mãe, onde ela costumava ficar quando os pais brigavam. Mas quando lembrou que a mãe havia ido embora da cidade, fugindo sem nem mesmo se despedir, preparou-se para o pior pois sabia que teria de voltar para o pai.
E o velho estava deitado no sofá da minúscula sala, dormindo. Magro, sujo e descuidado. Téo ficou observando e pensou em ir procurar a namorada do pai. Eles estavam brigados há dias e talvez ela ajudasse a acalmá-lo. Foi até a caderneta de telefones e procurou o número dela, mas desistiu quando encontrou. Ela também não era nada legal com ele. Na verdade, era o seu pai usando saias. Para Téo, bastava um daquele tipo.
Téo foi ao banheiro e viu que o galo estava enorme. O apertou com a ponta do dedo indicador e gemeu de dor. Depois, abaixou a tampa do vaso sanitário e ficou sentado ali, pensando, os dedos dançando de nervosismo. O que o pai faria quando visse que ele não conseguiu bater no valentão da escola?
– Ei, Téo…
O garoto quase teve um infarto, levantou a cabeça e escancarou a boca quando viu o pai parado na porta do banheiro. Automaticamente, sua mão subiu a testa e tentou esconder o galo. Os dois ficaram ali, parados, um encarando o outro. E então o pai finalmente suspirou e disse:
– Vai ficar aí sentado ou vai deixar eu entrar e dar uma cagada?
Téo aproveitou e saiu depressa.
‘’ Ufa, ainda bem que ele não viu’’, pensou. Mas quando passou ao lado do pai, este o segurou pelo ombro.
– Ei, moleque. – Sua voz era fria, implacável. – Não pense que eu não vi esse machucado aí.
– Pai, desculpa… – Téo suplicou. – Eu tentei. Eu juro que tentei.
– Não, não… cala a boca – o pai se agachou ao seu lado e sorriu. Dessa vez não era um sorriso perigoso, mas tampouco fez Téo ficar tranquilo. – Escuta. Deixa que o seu velho vai resolver isso pra você, está bem?
Téo não respondeu. Pôs a mão em cima do galo e quis chorar. O pai o abraçou.
– Não chora. Você tentou, eu sei. Amanhã eu vou resolver essa situação.
– Tá bom, pai.
– Certo, agora some daqui. Tenho uma parada pra resolver.
O pai lhe deu três tapinhas nas costas e entrou no banheiro, deixando Téo parado ali, com um pequeno sorriso crescendo no canto esquerdo da boca.
Nenhum dos dois tocou mais no assunto no decorrer daquele dia. Téo passou o dia no seu apertado quarto, lendo um livro de mistério, e o pai assistiu um pouco de televisão e depois foi consertar algumas telhas quebradas no quintal. Era sempre assim. Quando ele estava desempregado, vivia procurando o que fazer dentro de casa. Estava sempre consertando algo. Téo achava que o ajudava também a esquecer sua mãe, que o abandonara, e agora a sua namorada, que não dava mais notícias. De vez em quando, Téo escutava o seu pai praguejando no quintal. A noite, eles comeram macarrão instantâneo em silêncio e assistiram TV juntos, também em silêncio. Téo foi dormir às nove e meia da noite, pela primeira vez em algumas semanas, tranquilo pelo dia que viria. Afinal, o seu pai resolveria tudo.
No dia seguinte, o pai não estava em casa pela manhã cedo. Téo estranhou, mas fez o que já estava acostumado a fazer sozinho. Era um garoto ainda, mas desde cedo já sabia preparar café e se arrumar. Comeu e foi andando para a escola. Não era longe. E logo no portão de entrada, foi abordado pelo valentão.
– Ei, mocinha – disse o garoto. Era mais alto que Téo e um pouco gordo pra idade. – Tomou seu mingauzinho hoje antes de vir?
Téo o ignorou e entrou apressando o passo. No resto do dia, para o seu alívio, não o viu mais. Nem mesmo dentro da sala de aula. No mínimo, o valentão estava matando aula no banheiro ou fazendo coisa pior.
Por isso, Téo teve um dia diferente. Podia-se dizer até que foi um dia feliz. Sem se preocupar com xingamentos e pancadas. No intervalo, sentado em um banco no pátio, ele se perguntava se o pai já teria agido. Se tudo já estaria resolvido.
No fim da manhã, o sinal tocou e Téo saiu depressa. Seria excelente não encontrar o valentão na saída. Seria a cereja do bolo de uma perfeita manhã. E, realmente, o garoto não se encontrava lá. Téo, satisfeito, saiu e andou apressado. Quando dobrou a esquina, assustou-se ao ver o pai encostado em um carro. O velho usava trapos de roupas amassadas e estava bastante suado com o sol que fazia. O pai sorriu e sinalizou para que viesse até ele.
– Pai? O senhor veio me buscar?
O pai cuspiu no chão e abriu os braços.
– Ora, não lembra que eu disse que ia resolver o seu problema hoje?
Téo ficou sem saber o que dizer. Só sabia que vendo o pai ali, sentia que algo estava errado. Ficou preocupado.
– Mas já acabou a aula, pai. Ele não veio. Vamos embor…
– Ei mocinha…
A voz atrás de Téo o congelou imediatamente. Aquele xingamento? Sem dúvidas era o valentão. E ali também estava o seu pai. O que iria acontecer?
O pai ficou apenas observando. O garoto que vinha chegando não deu atenção ao adulto que estava ali. Foi direto até Téo e apontou o dedo em sua cara.
– Eu não tenho dinheiro para o ônibus. Então me dá o seu.
– Mas eu não tenho. Vou embora a pé.
– Mentiroso – e o valentão levou a mão como se fosse dar um soco, mas se conteve quando viu o adulto se mexer.
– Opa, espera aí, garotão – disse o pai de Téo. – Eu quero falar com você.
– O que foi?
O velho foi até o seu lado e pôs a mão no seu ombro. O garoto pareceu murchar um pouco, mas continuou olhando para ele.
– Eu sou o pai do Téo – disse o velho, sorrindo. O V não estava presente em sua testa. – Esse moleque aí.
E apontou para Téo, que já estava pensando em sair correndo. Não sentia que as coisas estavam indo bem. Na verdade, estava com tanto medo que mordia forte os lábios.
– Então – o pai continuou. – Como é seu nome?
– Victor.
– Victor. Victor. Sei. Então, Victor. Eu sou o pai do Téo, mas ultimamente ele não anda me ouvindo. E eu nem mesmo sei mais como criar esse garoto. Você quer me ajudar?
Victor gargalhou, confuso.
– Não estou entendendo nada – disse.
O velho deu de ombros.
– Só o que eu quero saber é se você vai me ajudar a educá-lo. E aí? Vai me ajudar?
– Vou.
Téo começou a sentir falta de ar.
– P… pai? O que o senhor…
– Cala a boca – gritou o pai. Em sua testa, um formato de V começava a se formar. Mas depois o velho voltou a lhe ignorar e falou novamente para Victor.
– Escuta aqui, Victor. O que você vai precisar fazer é bem simples. Está prestando atenção?
– Estou sim.
– Certo. Você só precisa bater no meu filho. Todo dia você vai bater um pouco nele. E vai xingá-lo também. Tudo certo?
Téo estava paralisado. Porque o pai estava fazendo aquilo? Não conseguia entender.
– Mas preste atenção – o velho ainda passava instruções para Victor. – Tente não bater na cara dele. Pois se ficar muito machucado, as pessoas vão perguntar. Bata nas costelas, ou no estômago. Lhe chute as pernas. Algo assim.
– PAI! – Finalmente Téo gritou. – PARA COM ISSO!
– CALA A BOCA SEU SACO DE BOSTA! – O pai gritou, enfurecido. E então Victor deu três passos até Téo, que não teve tempo nem de se encolher, e acertou um soco em seu ombro. O garoto caiu de bunda no chão e começou a chorar.
– É assim? – Victor, claramente se divertindo, perguntou para o velho.
O pai observava Téo caído no chão, chorando. Não demonstrava nenhuma intenção de ajudá-lo, mas sim mantinha uma expressão de nojo, de asco.
– É assim, Victor. É desse jeito mesmo.
Téo passou o dia dentro do quarto, chorando. O pai só foi vê-lo uma vez, quando entrou e deixou um sanduiche e um suco em cima de uma mesinha.
Bom, ainda bem. Téo não queria mesmo falar com ele. Estava furioso com o pai. Chorava de raiva, e não mais de medo.
Decidiu que não iria nunca mais para a escola. Nunca mais.
E faltou no outro dia. O pai também não estava em casa pela manhã. Téo acordou e quando viu que não havia ninguém em casa, decidiu voltar a dormir. Tinha pesadelos com Victor. E também com o pai. Às vezes tinha pesadelos com os dois juntos. Batendo e xingando.
No terceiro dia em que faltou aula, o pai veio lhe falar. Entrou no quarto com outro sanduiche com suco e disse:
– Escuta. Amanhã você vai para a aula. E é melhor não tentar nada, ou então eu te levo amarrado. E coma essa porra de sanduiche.
Téo levantou-se, pegou o sanduiche do prato e o jogou na parede.
– Saí daqui – gritava e chorava. – Eu odeio você. Eu odeio você. Eu queria ter ido embora com a mamãe.
O pai apenas o observou com um olhar triste e em seguida saiu em silêncio. Téo bateu a porta e continuou sozinho.
No dia seguinte, levantou cedo, vestiu a farda e saiu sem tomar café. Estava decidido a falar com Victor e acabar com aquela palhaçada. Se fosse necessário, engoliria a vergonha e falaria com a professora. O acusaria para ela. Usaria isso para ameaçá-lo.
Victor estava, como sempre, parado no portão de entrada. Téo não fingiu não vê-lo dessa vez e foi direto até ele.
– Victor – disse. – Eu quero falar com você.
Mas Victor já se virou desferindo um chute nas suas pernas. Téo sentiu uma pontada de dor lancinante no joelho direito e caiu para o lado, batendo as costas na parede.
– Ops, desculpa mocinha – ele sorria. – Somente cumprindo as ordens do seu pai.
E entrou no colégio, gargalhando como uma hiena.
Dessa vez, Téo não chorou. Ficou apenas sentado ali. Pensando.
No dia seguinte, Téo decidiu ir logo até a professora. Quando o sinal do meio dia tocou, ele foi discretamente até a sua mesa e explicou a situação, omitindo apenas a participação do pai. A professora, uma senhora bem mais velha, na faixa dos seus cinquenta anos, ouviu atentamente, de vez em quando ajeitando os óculos, e quando Téo parou de falar, ela apenas deu de ombros.
– Téozinho. Os meus filhos já foram pequenos. Nessa fase as crianças querem bater nas outras. É normal.
Téo ficou incrédulo. Não conseguia falar nada ao ver a calma com que a professora estava tratando do seu problema.
– Eu vou conversar com o Victor – ela disse. – Mas fique tranquilo. É só uma brincadeira. Coisa da idade. Logo, logo ele vai amadurecer e deixar você em paz.
‘’ Ou me deixar morto’’, pensou, Téo.
– Agora deixa eu ir, pois tenho um horário marcado no médico – finalizou a professora, pegando suas coisas e saindo rápido como um raio. Téo ainda ficou ali um pouco, apenas parado, sem pensar em nada. Sentia-se cansado. Desgastado. Não queria ir embora, mas ao mesmo tempo queria muito a sua cama.
Vinte minutos depois, um funcionário da limpeza passou pela sala e o avisou que os portões já iriam fechar. Téo o escutou e reagiu mecanicamente. Pegou sua mochila e foi embora. Saiu da escola e caminhou devagar, nem percebendo quando Victor chegou ao seu lado.
– Ei, Téo – ele o chamou pelo nome, e aquilo foi suficiente para chamar sua atenção.
– O que foi?
– Cara – Victor gargalhou. – O seu pai é maluco, não é? Ele é sempre assim?
– É sim.
– Caramba – Victor enxugou a testa molhada de suor. – Eu achava o meu pai estranho, mas o seu é bem mais.
Téo não respondeu. Apenas ficou observando Victor. O valentão estava agindo diferente de todas as outras vezes. Estava descontraído, arfante, parecia até um pouco nervoso.
– Deixa eu falar – disse, Victor, ficando um pouco mais sério. – Eu paro de bater em você se você fizer um negócio pra mim.
– Fazer o que?
– Pega no meu pau.
Téo ficou nervoso.
– Como é?
– Pega no meu pau, agora. Rápido. Não tem ninguém vendo. Se você pegar eu paro de te bater.
Téo sentiu as forças lhe faltarem. Por um pequeno momento, pensou mesmo em pegar aonde Victor queria, apenas para que pudesse sair logo dali. Mas ficou parado. Imóvel. Apenas balançou a cabeça, negando o pedido.
– Não vai pegar?
– Não.
E então Victor mudou completamente em uma fração de segundo. Fechou a cara e acertou um soco bem no nariz de Téo, que caiu de costas no chão. Victor continuou a lhe bater, chutando-o nas pernas e lhe acertando um bico na barriga.
– Mocinha – Victor gritou. – Seu bicha de merda. Não fale isso pra ninguém ou eu te mato, entendeu? Não fale pra ninguém.
E saiu correndo dali. Deixando Téo caído na calçada, tentando respirar após a surra.
Mas novamente… ele não chorou.
Téo chegou em casa e foi direto para a cama. Acordou algumas horas depois, e viu o pai parado na porta, o observando.
– O seu nariz está sangrando – disse, o pai.
Téo não respondeu. Sentia muita dor, mas não queria falar nada. Apenas fechou os olhos, querendo cair novamente no sono. Mas antes de apagar, ouviu o pai falar.
– Deixa que eu limpo pra você.
Dois dias depois, Téo acordou melhor, e se sentia cansado de ficar deitado. Havia passado aqueles dois dias praticamente dentro do quarto, saindo apenas para ir no banheiro. O pai vinha lhe trazer comida e água e até mesmo apareceu com algumas revistas em quadrinhos. Porém, os dois não se falavam. Não até aquela manhã.
O velho o abordou por volta de onze horas e disse.
– Téo? Veste uma roupa. Vamos sair.
– Não quero sair.
– Mas você vai. Veste uma roupa logo e me espera.
Téo ficou nervoso, mas não se sentia com forças para discutir. Vestiu uma roupa e ficou vendo televisão até o pai sair do banheiro, de banho tomado, e sinalizar para que ele o seguisse.
– Vamos resolver o seu problema – disse para o filho.
– Como é?
– Não faça perguntas. Estou com dor de cabeça.
Pai e filho deixaram a casinha de três cômodos que moravam, nos fundos de uma vila e andaram lado a lado, sem conversar, pelas ruas sujas e debaixo de um sol massacrante. Marcharam em direção ao que Téo logo percebeu ser, o caminho da escola. E quando estavam a uma esquina do lugar, o pai mandou que parassem e esperassem.
E dali, Téo ouviu o sinal do meio dia anunciar o fim as aulas.
– Pai – ele sussurrou, choramingando. – Por favor, não. Eu não aguentou mais apanhar.
O pai o olhou e Téo nunca viu tanta tristeza em seus olhos. O V não estava lá, e dessa vez nenhuma linha de expressão. Era como se pela primeira vez o pai estivesse nu, despido de qualquer intenção.
– Eu sei, meu filho – ele disse. – Eu sei.
E então os alunos começaram a dobrar a esquina, e não tardou para Victor aparecer. Quando viu o pai e o filho, o valentão abriu um sorriso e caminhou até lá.
– Pai? – gemeu, Téo.
– Não se preocupe – o pai abriu um sorriso. – Não se preocupe.
– E aí, meu velho – disse, Victor, chegando animado. – Eu fiz o que você me pediu…
Mas foi interrompido por um soco que o atingiu em cheio o queixo. Enquanto Victor caía, o pai já pulava em cima dele e continuou a bater quando o garoto estava no chão. Acertando socos e tapas na cara do valentão, que logo ficou vermelha com o sangue que saía de ferimentos no nariz, na boca e nos supercílios.
– Eu disse para não bater no rosto, seu porra – o pai gritava. – Eu disse para não bater no rosto.
Téo olhava para tudo sem acreditar, tremendo de medo e incapaz de dizer algo. Mas quando notou que Victor já estava desmaiado, pulou nas costas do pai, chorando, e pedindo para ele parar.
O velho então saiu de cima de Victor e olhou para as mãos inchadas e vermelhas.
– Nossa, bati pra valer – ele gargalhou. – Mas agora esse filho da puta nunca mais vai bater em você, Téo.
E foi quando um grito estridente rasgou o suspense do momento. Era uma aluna, que havia visto o corpo ensanguentado de Victor e saiu correndo aos berros. Vários outros alunos olhavam e corriam, alguns filmavam com os seus celulares, outros choravam. Havia muita gritaria. Só então Téo percebeu a gravidade de tudo aquilo. Chorando, ele virou-se para o pai.
– O senhor matou ele?
O pai se agachou ao seu lado.
– Não. Não matei – ele sorria, mas novamente era aquele sorriso perigoso. – Eu não o matei, Téo. Mas você pode fazer isso um dia se você quiser. Eu achei que você era forte, mas ainda é um moleque fraco. Mas não tem problema. Um dia você vai ser forte. Eu vou te ajudar.
Téo assentiu automaticamente e viu quando grupos de adultos chegaram para ver a cena. Ele reconheceu funcionários do colégio, professores e professoras.
– P.. pai? – ele gaguejava. – O que…. o que vai acontecer agora?
– Eu não sei filho – o pai sorriu amargamente, como se na verdade soubesse, e o que soubesse não fosse nada bom. – Só sei que eu amo você, moleque. Você é um merda mas é a única coisa que restou de sua mãe. A única. Você me ama? Você me ama também?
Mas Téo não conseguiu responder, pois nesse momento alguém chegou atrás de seu pai e lhe puxou pelo ombro. E enquanto dois homens que ele nunca vira espancavam o seu pai, Téo sentiu por ele um amor enorme, tão grande como nunca sentira antes.
– Te amo… – sussurrou, enquanto chorava. – Te amo.
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Este texto foi baseado no tema “Bullying”, sujeito ao limite máximo de 5000 palavras.
Nossa. Que conto forte. Téo sempre me lembra o personagem de dias perfeitos, do Raphael Montes. Mas sei lá, não consegui entender direito o que o tal pai queria. Primeiro manda bater no filho, depois quase mata o menino. Mas gostei do enredo e da construção do conto. Muito bom. E essa cena final eu só tenho como descrever como perturbadora.
Antes de começar a ler, dei uma olhada no tema. Bullying. Achei um tema bastante sem graça, mas resolvi não tirar conclusões precipitadas, e dei inicio à leitura. A escrita me prendeu bastante, o que demonstra bastante habilidade do autor(a), essa parte foi bastante prazerosa.
Quanto à história… bom… não posso dizer que achei extremamente empolgante, mas superou as minhas expectativas. Acho que, boa parte devido à ótima escrita, os personagens ficaram bem marcantes, com bons diálogos, e o resultado final até que me agradou. Parabéns.
O conto é muito bom. Muito bom mesmo.
Adorei o final. Achei o meio com uma leitura um pouco pesada, monótona, mas a medida que o texto foi chegando ao fim, foi evoluindo também.
Gostei da solução que você deu para o tema “Bullying”.
Faltou um pouco mais de drama, ao meu ver. Algo que emocionasse mais, tocasse mais as pessoas… Mas no fim das contas o conto é muito bom!
Parabéns!
Não pensei que fosse gostar tanto, mas gostei, do começo ao fim. São personagens bem críveis, senti empatia pelo menino, uma indignação com o jeito de ser do pai, só achei meio estranha a atitude da professora, talvez porque eu não conheça nenhum professor que reagiria dessa forma, mas é provável que exista, tem cada uma nesse mundo, rs. Gostei, poderia ter exagerado a dose, mas manteve o ritmo e o enredo coerente do começo ao fim. Poucos erros, acho que mais por culpa da pressa, deve ter corrido contra o tempo, assim como eu, rs. Parabéns!
Emoção: 2/2
Enredo: 2/2
Criatividade: 2/2
Adequação ao tema proposto: 2/2
Gramática: 1/1
Utilização do limite: 1/1
Total: 10
Esse tema, “bullying”, é complicado para mim. Geralmente me afeta bastante. “Meu Querido Pai” é triste e demasiado humano, deixou-me com olhos cheios de lágrimas. Téo lembra a criança que fui. O final do Ensino Fundamental e o Ensino Médio me deixaram marcas que até hoje me fazem pensar e pensar. Unborn fez uma bela narrativa, com cenas tocantes e reais.
Olá! Que paizão doente haha. Conseguiu construir um personagem que será odiado por quase qualquer um que ler o conto. Por mais que sua conduta possa ser considerada loucura, não diminui a covardia de que se trata. Sendo assim, parabéns por abordar seu tema de maneira inigualável.
Um conto forte.
Bem escrito, trama interessante que mostra lamentavelmente o dia a dia de muitas crianças. Gostei também da conclusão, apesar de não ser surpreendente.
Boa sorte e parabéns.
Caraca! Achei bárbaro esse conto. Pequenos pecados de revisão, mas a história me prendeu do início ao fim e me emocionou de verdade. Tem tensão e se resolve bem. As personagens são muito convincentes. Todas elas.
Muito bom. Fui lendo sem parar até o final, conto bem escrito e com personagens bem cativantes. Notei algo que costuma ser comuns em histórias assim, a presença do ódio, um sentimento que não parece ter fim e vai atingindo todos os personagens, menos Téo, que foi bem caracterizado. Gostei da trama, esse pai é um personagem muito forte e os diálogos foram muito bons também.
Conto que prende a atenção do leitor do começo ao fim, pra saber o que vai acontecer. Bem narrado, com clímax muito bom. A temática não é do meu agrado, mas o conto se saiu muito bem. Apesar do tamanho, foi uma leitura bem rápida e tranquila. O convívio entre pai e filho, a história por detrás e tudo mais, foi bem ambientado e ficou bastante crível.
quanto sofrimento!! sofri o tempo todo da leitura… isso não se faz…rsrsrs
o final foi bonito.
parabens por trazer um texto forte mas que ao mesmo tempo que choca, enternece pois as personalidades dos personagens foi muito bem desenvolvida.
Boa sorte ae! 🙂
O pessoal comentou por aqui que a reação da professora é estranha…não acho não… já vi (na pele) várias professoras e professores agindo exatamente assim.
Caralho, que coisa! Ao longo do conto pude experimentar vários sentimentos e ter diversas opiniões acerca do pai do guri. Cheguei à conclusão que o cara tinha algum problema mental pela maneira que ele lidou com a situação, mas compreendi que ele queria que o guri aprendesse a enfrentar seus problemas, mesmo que os meios fossem a violência. Acredito que ele amava sim seu filho. Foi uma estória um tanto tocante e me lembrou o filme Bullying (muito tenso, aliás). Escrita simples, narrativa e descrição que ambientam bem a estória. Parabéns e boa sorte.
história bem contada, com uma atmosfera negra – pai que pede para baterem no filho – e que tem sempre algo surpreendente. parabéns
♒ Trama: (4/5) muito legal, com bom início, desenvolvimento muito interessante e um final que fecha muito bem a história. É tão verossímil, que parece que realmente aconteceu. Só faltou mesmo dar mais pistas de quem eram os caras que espancaram o pai.
✍ Técnica: (4/5) muito boa. Narra bem e o texto, mesmo sendo relativamente grande, flui com muita naturalidade. Bons diálogos e cenas muito bem narradas. Gostei bastante.
➵ Tema: (2/2) bullying (✔).
☀ Criatividade: (2/3) para um conto que narra o cotidiano, achei criativo.
☯ Emoção/Impacto: (4/5) vivi internamente o texto e gostei muito do final. Senti mais pena que raiva desse “querido pai”, como o próprio Téo. Parabéns!
Problemas de revisão que encontrei:
● Quando eu *tinha* quase a sua idade
● Eu não *aguento* mais apanhar
Ainda digerindo essa história de bullying. Uma relação muito estranha entre Téo e seu pai, porém mais comum do que imaginamos. No início do conto, temos a impressão de que o pai de Téo seja um homem ponderado, mas logo que o filho se abriu sobre o problema na escola, ele se mostrou bem controverso, incapaz de lidar com a educação do filho. Talvez descontando nele uma raiva que possui da ex mulher. Um detalhe na narrativa me pareceu estranho, sobre a quantidade exata de tempo que o pai levava para responder o filho enquanto media a relevância da questão. Não está errada, evidentemente, mas imagino que fazer notar que ele aguardava um instante ou um momento não cairia no clichê.
Ao longo da história vemos Téo cada vez mais confuso, traumatizado e perdido nesse dilema e seu pai tornando as coisas piores. O texto volta a simular uma mudança no comportamento do velho, até que ele o faz, mas de maneira tão errada quanto do outro lado. Victor e Téo, no final das contas, acabaram por sofrer as consequências de uma indiferença da escola e a ignorância do velho. Conclusão: tragédia.
Eu gostei do texto. O final em que Téo se vê mais apegado ao pai quando o vê apanhando por conta da agressão em Victor me pareceu um tanto confusa, mas se tratando de um menino de 12 anos, absolutamente refém daquela situação, parece verossímil.
Parabéns pelo trabalho e boa sorte no desafio.
Nossa, caro Unborn, que texto carregado de emoção e de drama… Que história! Gostei muito da forma como você tratou do tema bullying, principalmente na relação de medo da vítima com o agressor, e de toda a reviravolta quando o pai psicótico entra na história, o que faz com que o leitor fique ansioso pelo final. Ah, o final… Uma ótima finalização do texto, com o filho, mesmo tendo tudo para odiar o pai, acaba cedendo à pressão do momento e se vê amando o pai. Medo ou não, fica a dúvida… Parabéns!
Um texto muito forte que traz reflexão.
Triste porque se alimenta do real.
Gostei, especialmente por não ter escolhido o caminho óbvio das lições, da crítica panfletária.
Vai muito na linha dos Homens Difíceis, dos personagens que oscilam e, por isso, se aproximam da realidade. Os vícios e as virtudes se anulando. Aquela coisa do beleza americana, do próprio Walter White. Um protagonista que intriga, assim como o seu pai, o antagonista misterioso, com uma carga dramática pesada. Inevitavelmente tentamos buscar respostas, entender a motivação, mas a vida não é esse toddynho gelado, moleque, rs!
Penso que alguns diálogos poderiam ser mais diretos, tem um “lhe chute as pernas” que não combinou muito.
Outro fator a ser observado e a repetição em demasia do nome do protagonista, em certo momento cansa um pouco o leitor.
Acho que houve um pequeno equívoco no uso de alguns “porquês”.
Bem, o conto é muito interessante! Parabéns e boa sorte no desafio.
A única coisa que me veio na cabeça com esse conto foi “ê cacete!”.
Muito bom. O texto é bem interessante e consegue nos prender a cada linha.
E é muito assustador. Lá pelo meio já sabia que não tinha como esse moleque se dar bem, e realmente a vida é assim, não?
Alguns erros que passaram na sua revisão, mas que não prejudica no todo. Sensacional!
Está no caminho certo, autor(a). Em breve a prática lixará as arestas e suas histórias soarão em uníssono com a folha. Imaginativa, visual… Tudo isto está presente em sua narrativa. Ou seja, agora é só continuar escrevendo e escrevendo… Como uma banda que, depois de muitos ensaios, fica entrosada, a simbiose entre o que você imagina/visualiza e o que seus dedos traçam irá em breve acontecer. Aprenda a cuidar com um pouco mais de esmero a questão da revisão (e o melhor para isso é se afastar do conto depois de finalizá-lo; deixando esfriar até conseguir enxergar o que escreveu, e não mais o que pensou na hora que escreveu) e pronto. Mais um bom escritor (a) na praça!
Parabéns! Boa sorte!
Paz e Bem!
🙂
PS: Já pensou em reescrever esta história sob a visão do pai…? Seria um bom exercício! 😉
Abrax!
Muito bem desenvolvido! E que bom que te deram bastante espaço! Sofri como esse menino na idade dele, quando ainda tinha 35kg e era baixinho! Agora continuo baixinho, mas com 60kg e quem quiser me tirar do lugar, vai suar um pouco! Mas enquanto qualquer vento me derrubava, eu sofria com a baixa auto estima dos donos do mundo: qualquer um maior que eu. E você abordou coisas fundamentais: a família em frangalhos, a escola que não protege quem precisa ser protegido e, é claro, o “bulim” qualificado. Tem um estagiário que trabalha comigo que todos invejam sua auto estima inabalável, porque ele sofre bullying do pessoal e continua firme e forte como é: simpático e engraçado. Parabéns pela abordagem que cobriu tantos pontos importantes e agradeço à quem sugeriu esse tema e te deu tanto espaço para trabalhar.
Não gostei do conto. Estranha demais essa maneira de tratar o tema bullyng. Os personagens não me cativaram e o pai doido não ficou bem caracterizado. O final não faz muito sentido. O pai foi espancado por quê? Quem era Vitor, para que os dois estranhos espancassem o pai daquele jeito. O normal seria chamar a polícia. Estranho. Não me agradou.
Notas:
Gramática: 7
Criatividade: 5
adequação ao tema: 10
utilização do limite: 10
emoção: 4
enredo: 3
Achei a abordagem do tema bastante criativa! O pai conseguiu fazer o filho sofrer mais do que o próprio agressor. A história ficou convincente, bem realista, muito interessante, e a escrita é impecável. Parabéns !
Uma história triste. Nenhuma história com bullying é feliz, mesmo as que acabam “bem”. A forma como o tema foi abordado foi bem interessante, o final ficou razoavelmente previsível. Fora isso, um conto muito bom.
Um conto cheio de emoções, muito doloroso são os sentimentos de alguém que passa por este tipo de humilhação. A história foi muito bem trabalhada e com reviravoltas que ninguém poderia esperar.
Olá!
O fato do pai ponderar se a resposta do filho merece ou não resposta me lembrou a relação do Kafka com seu pai (mas naquela relação o lance de desmerecer o filho está num nível astronômico. Meu Deus!).
O duplo bullying sobre alguém tão jovem, atrelado aos diálogos simples, deram ar inocência para sua trama, uma suavidade inocente que acaba cativando. Não tem construções intricadas, nem plumas e paetês, mas também não destoa (o que acho importantíssimo também). Senti que se alongou um pouquinho, e nesse intervalo não houve mais descrições para aprofundar a relação. Também senti que a conversa com a professora não foi boa, crível, cabível, mas a proposta de se mostrar tudo pelos olhos do menino é bem interessante e funcionou bem comigo.
Média — A nota para esse conto será: 8 (oito)
ótimo conto. Tenso e denso. Uma condução marcada pelo suspense e pela angustia de Téo. Personagens muito bem trabalhados. Adequação perfeita ao tema. Boa sorte.
Um texto bem pesado e triste, mas até possível, vide os casos dos noticiários, feito o do pai que matou o filho de pancada pq ele gostava de arrumar a casa…
A escrita, contudo, não está muito boa. O nome Téo, por exemplo, está imensamente repetido (91x). Algumas atitudes, como a da professora indiferente a um aluno espancado, não me soaram muito verossímeis.
Enfim, o tema foi bem abordado, mas achei o conto mediano…
O conto apresenta pelo menos duas fortes inverossimilhanças: as atitudes do pai e da professora. Não que seja impossível um comportamento destrutivo do pai em relação ao filho ao ponto em que é mostrado, ou a extrema indiferença da professora, mas ambos são pouco plausíveis, da maneira como foram narrados.
É comum o(s) pai(s) incentivar(em) o filho a reagir com violência à violência recebida e para isso usar(em) termos bem explícitos, mas patrocinar o espancamento do filho para que este “vire homem” é um pouco demais, do ponto de vista de construção de enredo, por soar artificial.
No entanto, se o pai estivesse percebendo no comportamento tímido do menino evidências da homoafetividade latente do filho e/ou a enrustida dele, pai, ou ainda se o seu comportamento fosse uma vingança indireta contra a esposa (mãe do menino) que o abandonara, esse problema inexistiria, e daria ao enredo uma dimensão interessante. Mas no caso dessa segunda hipótese, o final teria de ser outro, pois ele demonstra afeto pela esposa.
De qualquer modo, o fim precisaria ser refeito, ele não faz muito sentido. Primeiro ele estimula o espancamento do filho e depois quase mata de porrada o agressor desse mesmo filho? Por quê? Se ele fosse bipolar…
Há outra questão em pauta: o discurso predominante do conto. Como já disse em outro desafio certa vez, e tive algum dessabor por causa disso, não há discurso literário que seja inocente, que seja apenas expressão estética. Isso é uma das quimeras que costumam acompanhar alguns realizadores de texto literário.
A narrativa costuma ter, em diferentes níveis de relevância, a camada filosófica, política, psicológica, histórica, social e outras, mas não necessariamente todas elas num mesmo texto. Assim, muito mais do que diversão ou exercício de “arte pura”, existe uma (ou mais de uma) ideia sendo transmitida via enredo e personagens. Ainda que o(a) autor(a) não se dê conta disso. Ainda que ele não conheça conceitos de filosofia, política, psicologia ou história.
Digo isso porque o texto o enredo enaltece a violência gratuita. A “conspiração” do pai contra o filho, a criminosa omissão da professora, o show de porrada do personagem Victor, a sessão de pancadaria do fim. Claro, o tema é “bullying”, que é essencialmente violento, seja na modalidade física ou moral. No entanto, não há no conto contrapeso à violência. Ela é rainha. Se houvesse, o discurso dominante de que falei poderia ser outro, oposto: seria o discurso da antiviolência.
Quando digo da falta de contrapeso, é que a força oposta à violência explícita contra o menino é também violência explícita. Ou seja, agressão do início ao fim. Ou seja, exaltação. E ainda há a declaração de amor filial do menino na última frase, equivalendo a uma salva de palmas à brutalidade, um apagamento da barbárie praticada pelo pai.
Claro, pode-se afirmar que a ideia do conto é exatamente o contrário, na medida em que mostrar a violência é mostrar e barbaridade e, assim, causar um choque no leitor que o leve a negar a violência. Será mesmo? As imagens que nos chegam via TV de todo o tipo de agressão nos faz ficar verdadeiramente indignados ou aos poucos nos anestesia? Quantas vezes nos irritamos de fato quando a imagem midiatizada nos mostra tiros e brigas num bairro no qual não moramos, numa cidade em que conhecemos talvez de nome?
O discurso socialmente dominante que enaltece a violência em todas as suas modalidades não está aí à toa, ele função bem específica no seio da sociedade. Portanto, quando o autor produz uma peça de arte em que a violência não encontra rédeas ele está, sim, pactuando com esse discurso dominante.
GRAMATICALIDADES
Em “Consertando essa torneira[…]” o correto é ESTA porque o personagem ao dizer a frase está próximo do objeto a que ele se refere.
Em “Conheço essa sua cara. Fale logo.” o correto é FALA LOGO, pois o verbo precisa estar no modo imperativo, não subjuntivo.
Em “Lhe chute as pernas.” o correto é CHUTE-LHE, porque PRONOME OBLÍQUO não pode iniciar oração.
Em “A professora, uma senhora bem mais velha […]” o trecho UMA SENHORA BEM MAIS VELHA é redundante, porque pelo contexto só pode ser BEM MAIS VELHA DO QUE O MENINO, o que é uma informação desnecessária porque evidentemente a professora de um menino será bem mais velha do que ele, ainda que ele tenha 12 anos e a professora, digamos, “apenas” o dobro.
Em “[…] pensou mesmo em pegar aonde Victor queria […] o correto é ONDE.
Certamente um comentário que irá me fazer refletir.
Olá, autor (a)! Tudo bem? Conto bom esse seu, hein.
Sobre a técnica.
Muito boa. Narrativa limpa, certeira. Contou o que tinha que ser contado e prendeu minha atenção até o fim. Comecei a ler e quando percebi, já estava acabando. Muito boa mesmo. Consegui criar um clima real, com diálogos reais e uma emoção palpável.
Sobre o enredo.
Muito bom também. Conseguiu trabalhar bem o tema, e ainda criou personagens críveis, quase reais. Os eventos descritos também fizeram jus à realidade. Gostei bastante.
Sobre o tema.
Um tema bem atual e que figura na mídia hoje em dia. Bastante material para se trabalhar, e um limite mais do que generoso.
Nota.
Técnica: 8,0
Enredo: 8,0
Tema: 8,0
Parabéns pelo ótimo texto! Boa sorte!
Olá, autor(a). Depreendo do seu texto que um forte elo entre pai e filho, ainda que grotesco, inconsequente e violentamente protetor, não deixa de ser amor. Amor torto, se bem que articulado pela violência pretérita e presente do bullying. Não posso deixar de sentir pesar por essa relação truculenta, por esse amor fraco-pulsante e sempre se negando a lapidar. O garoto revela amor pelo pai — mas nós sabemos que é um sentimento desesperado não porque real, mas porque feudal: ele ama o pai por este ser o último muro de contenção para sua segurança; se o muro desaba, não há outro. Se bem que o pai é de uma austeridade, um sangue-frio, um calculismo surreal (elementos bem comuns do passado, dos tempos de “valentias”): o sentimento que nutre por Téo exige que este se defenda a tal ponto que incentiva o agressor a novas investidas (sempre rememorando da sua atitude quando sofrera bullying na adolescência).
Um bom conto, caro(a) autor(a). Se pudesse resumi-lo numa imagem, esta seria: o viajante noturno que vai se afogando num rio e, já soçobrando, olha para a luz da lua focando num cipó distante, inalcançável. Naquele momento, autor(a), a réstia da lua é toda a esperança do viajante.
Abraços e boa sorte neste desafio.
É um bom conto, envolve do início ao fim. Conseguiu me fazer sentir raiva do Victor, pena do Téo, raiva do pai do Téo, torcer pelo Téo e pelo pai dele. Você mostrou uma forma diferente de amor, e acabou conseguindo criar um texto tocante.
Gostei!
Boa sorte!
Aff… com um pai doido desses, nem precisava sofrer bullying. Pelo o que entendi, o pai é linchado no final. É isso?
Achei o conto meio baseado no conceito machista – homem não chora. Não entendi muito bem a psicologia do pai, mas acho que não era mesmo para entender, já que o sujeito não estava bem mentalmente.
Encontrei um “à noite” sem crase e uma frase que ficou estranha:”o pai mandou que parassem e esperassem.” Como assim? O pai mandou no filho e em si mesmo?
Bom conto, embora eu esperasse um final diferente. Boa sorte!
Outro texto muito bom. Muito bom mesmo.
Gostei da abordagem do tema… não fugiu do cliché, mas conseguiu colocar elementos (esse pai bipolar) que tornaram o conto único.
A narrativa é envolvente, depois que começa fica difícil largar.
Só achei que pecou um pouco na ambientação… sei lá, esse final cheio de gente filmando com celulares deu uma quebrada no clima.
Teria tentado deixar os diálogos um pouco mais naturais também.
ótimo conto.
NOTA : 8
Sem noção esse pai. Isso lá é jeito de tratar uma criança? E o exemplo então?
Interessante. O autor conseguiu usar um tema que está em alta atualmente e criou uma história muito criativa em torno dele. Achei que o final poderia ter sido melhor, mas não ofuscou o cativante e bem escrito texto.
Abraço e boa sorte!
E: Um texto bem denso. Nota 8.
G: Não gosto muito deste estilo, mas o enredo prende até o final. Estava curioso para saber o desfecho. Ainda mais por ser um assunto tão comum nesses dias. O final, bem diferente do esperado, foi muito bem pontuado, fugindo dos clichês de soluções rápidas. Cria-se uma empatia direta pela criança, desde as primeiras linhas. E por aproximar-se da realidade, exalta o tom melancólico. Nota 8.
U: Certas partes precisavam de uma pequena revisão. Notei falta de conectivos em alguns diálogos. Nota 6.
A: Um texto triste e quase poético sobre o assunto. Nota 8.
Média: 7.
Conto tenso que retrata bem uma família problemática. Foi interessante também a parte em que o valentão demonstra uma tendência homossexual. As pessoas preferem evitar o tema, mas ao trabalhar próximo de escolas públicas percebi que é bem mais comum do que as pessoas gostariam de admitir.