Chegando a casa de Adelle, mamãe dizia algumas vezes ‘Urru, Adeeelle! Urru!’, e o papagaio de Adelle repetia ‘Urrrrrru, Adéééllééé! Adéééllééé! Adéééllééé!’, balançando-se no poleiro, levantando e abaixando a cabecinha, querendo mostrar as novidades que chegavam. Parecia uma folha ao vento, presa ao poleiro, descendo e subindo. Adelle chegava, dava a ele um pouco de sementes de girassol e vinha nos receber: ‘Rosalie! Samuel, querido!’. Falava isso com alegria toda semana, como se ficáramos longe dela por um longo tempo, mostrando uma surpresa tão acolhedora que nos fazia acreditar que aquela semana fora feita de muitos anos.
Ouvir o papagaio de Adelle falar tão corretamente deixava-me radiante: as aves nos entendiam, embora o papagaio de Adelle nos confundisse com tão poucas palavras. ‘Ele não fala, Samuel, só repete o que ouve…’, mamãe simplificava. Mas que desoladora verdade seria aquela? Negava-me a acreditar em algo tão absurdo: era óbvio que o papagaio de Adelle falava, e falava certinho, carregando nos erres e alongando as consoantes como um estrangeiro que não aprendera de todo a nossa língua… mas entendia tudo.
A casa de Adelle era um lugar pacificado pela ausência dos cuidados que desorientam o descanso, pois como garantir que aquele vaso, com aquela planta, naquele específico dia e lugar, não gostaria de ali permanecer, imóvel, tomando o ar, a luz, a sombra que o fazia sentir-se o mais belo vaso com a mais bela begônia do mundo? Por isso continuavam ali, quietos, vaso e begônia, até que demonstrassem alguma desordem: uma folha murcha, uma flor apequenada, um caule enfraquecido. Então, sim, seria hora de os mover em direção a outro sol, outro ar, outra sombra, uma nova umidade feita do pó fino das águas, outro conjunto de cheiros, talvez doces, talvez azedos.
Na casa de Adelle a natureza reinava tranquila, sem podas, plantios regulares, mobilidades excessivas de vasos ou ajustes estéticos; no máximo havia as habilidades de uma colher de jardineiro que afastava galhos e folhas caídas que dificultavam caminhar pelos jardins.
Adelle adorava gatos e tivera um deles, um grande gato siamês, em tudo arredio. Ela o chamava de senhor Morse, pois ele tinha o hábito de antecipar sinais quando se preparava para fazer algum malfeito, tal como roubar comida ou destruir algo de Adelle. Um gato grande que se afeiçoara aos ambientes, que foi ficando, engordando, ocupando lugares, tornando-os seus, sobre poltronas, sofás, que foram sendo derrotados por unhas longas e afiadas.
Adelle se desfez do senhor Morse quando seu papagaio chegou, vindo a cair bem diante da sua porta, ferido quase de morte e com uma asa partida. Adelle tentou por algum tempo a convivência pacífica entre ambos, que viu ser impossível quando percebeu no felino um olhar selvagem. Não soube se por ciúmes ou decorrente do seu instinto caçador.
As leis da permanência eram praticadas na casa de Adelle com extremo rigor. Tudo ali era quase intocado, livre para cumprir o destino de crescer, florescer, frutificar, lançar sementes e então morrer. Mas poucas coisas morriam sob os cuidados de Adelle: seu quintal tornara-se um grande pomar, um bosque de muitas cores e odores, todos duradouros.
As únicas coisas capazes de a incomodar eram as formigas. ‘Malditas formigas! Devo comprar um tamanduá, Rosalie?’, dizia ela à mamãe. ‘Será que posso comprar um tamanduá e deixá-lo no quintal comendo essas formigas?’.
Quando Adelle falava das formigas, tudo crescia, se avolumava, perdia a real proporção. Elas ficavam enormes, com presas que decepariam dedos, tribais e determinadas a arruinar tudo com seus longos túneis, derrubando plantas, desequilibrando árvores ao construírem pelo quintal enormes fossos e castelos de terra que cresciam assemelhados às construções de Gaudí: pontudas, terrosas e indecifráveis, que atingiam mais de metro em poucos dias.
Algumas vezes chegamos a casa de Adelle, e lá estava o homem do fole disparando golfadas de ar quente com arsênico pelos túneis das formigas.
‘Formigas infernais, Rosalie; destroem tudo…’.
‘Não faça caso, Adelle…’, dizia mamãe.
‘Elas arruínam tudo, acabam com tudo…’
O exterminador de formigas se chamava Castúnio Aparício. Homem pequeno, socado, pele morena e débil azulamento nas mãos calosas. Tinha a aparência de alguém saído de um passado profano para cumprir uma tarefa de morte. Alheio e imune, era focado na sina de exterminar, imerso em nuvens de fumaça quente saídas do seu fole.
Por algum tempo ficávamos vendo suas perícias: um pouco de arsênico, um punhado de carvões em brasa e a mais absoluta disposição para fazer a sanfona de couro do fole despejar fumaça e veneno pelos labirintos das formigas, que como gêiseres, fazia emergir longe uma fumaça branco-azulada revelando as habilidades das formigas em construir túneis intermináveis.
‘Veja, Rosalie…’
Ao chegar a casa de Adelle, íamos beirando uma cerca de sebe até atingir sua varanda, na parte de trás. Estagiávamos na cozinha e só então, depois de uma fatia de bolo com chá de flores de laranjeira, estávamos prontos para o acolhimento em seus sofás, submersos em conversas amenas e silêncios sonolentos acompanhados pelo tiquetaquear de um relógio na parede.
‘Conhece esse ponto, Rosalie?’
‘Creio que não, Adelle’, dizia mamãe com duvidoso interesse.
‘Primeira carreira e as ímpares: um ponto tricô, uma laçada em tricô, dois pontos em tricô terminando com um ponto tricô. Não é fácil?’, certificava Adelle, surpresa por mamãe desconhecer aquele ponto.
Mamãe nunca foi mulher de trabalhos manuais, dedicava-se apenas àqueles que tiravam de suas mãos a música que amava. Seus dedos não iam às plantas, aos vasos, à terra, plantios ou podas. Seus dedos haviam sido doados às teclas do seu piano, à Música de Câmara. Unhas sempre aparadas em dedos longos e fortes, que como galhos vigorosos, deixavam o tronco rosado de sua palma e corriam ao timbre das notas musicais.
De Adelle mamãe gostava da presença, das conversas amenas, dos silêncios permitidos pelo amor que tinham uma pela outra, da serenidade da vida doméstica que sentia em sua casa. Gostava de ouvir e dizer coisas despidas de orgulhos ou interesses oblíquos. Atavam-se pela sensível linha harmoniosa da convivência que sobrevivera à infância e à adolescência, e se fortificara na maturidade. O amor de mamãe por Adelle e sua casa, desfazia a ideia de que a intimidade é um caminho que leva ao tédio dos silêncios, pois era nesses silêncios que ambas teciam seus afetos.
Nunca ouvi qualquer conversa entre mamãe e Adelle em que houvesse algum desvalor, rusgas, ínfimas que fossem, intrigas que amuassem, onde o tempo cumpria apenas o destino de conceder e cobrar. Vizinhos nunca eram rivais, e nada ruim diziam do moço das entregas, da louca que gritava pelas ruas, dos sons que vinham de longe anunciando uma tempestade, da chuva pesada que chegava, dos inclementes sóis de todos os dias, de uma morte anunciada, de um inesperado nascimento, de uma alegria intempestiva, das tristezas, que nunca seriam merecidas: tudo era parte da simples e sublime urdidura do tempo: vida, fazer e espera. O Tempo.
Sentados na sala de Adelle o mundo parecia girar bem mais devagar.
Dizem que idosos são como crianças, e isto se manifestava profundamente na casa de Adelle. Gertrudes Abramov, sua mãe, estava definitivamente imune à corrosão do tempo: eu acreditava que ela havia passado dos cem, talvez duzentos anos… Mantinha-se atenta quando podia, quase sempre calada como eu. Dávamos sorrisos quando de nós diziam algo sobre os extremos de nossas idades. Eu, muito criança; Gertrudes, muito idosa; direções opostas sobre a mesma linha: o Tempo, novamente.
Gertrudes se reduzira, minguara, como se lhe evaporassem excessos do corpo, deixando nela apenas o que lhe cabia em essência: seca, encovada, com seus sapatinhos de tricô em pés que quase não tocavam o chão, avental branco, lenço escondendo o raleamento dos cabelos. Gostava de concordar e sorrir balançando a cabeça em sinal de presença entre nós. ‘Não é mesmo, mamãe?’, dizia Adelle, querendo certificar-se de que Gertrudes vivia, muitas vezes despertando-a de sonos imprescindíveis.
A casa de Adelle era o lugar onde a água, a terra, o fogo, o ar, o tempo, enfim, tinham por desejo preservar e não destruir. O tempo passava devagar, apenas arranhando a tessitura das coisas: os vasos, as plantas, as pessoas que ali moravam, sem incomodá-los em sua doce e eterna passividade.
Nunca soube se Adelle algum dia havia trabalhado, deixado a casa para uma vida de urgências, dinheiro, negócios. Cumpria uma rotina amena cuidando da mãe, do papagaio, dos jardins, atenta para que não faltassem os alimentos, as sementes de girassol, o anil em pedra e o sabão em barra.
Adelle tinha a aparência contida de uma mulher que não conhecera o sexo e manifestava uma mansa docilidade por nunca lhe haver sublevado o desejo de o conhecer. Gostava de estar com o seu avental branco protegendo a saia florida, o lenço por sobre os cabelos e os sapatos de cano alto para transitar pelos jardins distribuindo sementes ou dando diretrizes em voz suave para que as plantas cumprissem seu destino de floração, frutificação e semeadura. A vida na casa de Adelle começava pela manhã e terminava ao anoitecer quantas vezes isto lhe fosse destinado pelo acaso ou pelas necessidades do mundo.
Seus jardins chamavam aos passeios antes de nossas visitas terminarem, e as despedidas eram entre flores ou sob caramanchões, quando as conversas se estendiam a cada uma das plantas, novas e antigas, onde víamos flores transformadas pelas regas e pelo húmus abundante: uma semente que vingou quando não era esperado. Isto era surpreendente.
Ficávamos maravilhados diante de tanta beleza: uma crista-de-galo com franjas purpúreas, uma crista-plumosa que floresceu antecipadamente, gerânios, avencas, jacintos, hibiscos, prímulas azuis, um grande vaso de onze-horas, um ipê amarelo que floria colorindo o chão com suas flores caídas, as caliandras, as buganvílias, o perfume deixado por uma florida dama-da-noite.
Mamãe sempre deixava a casa de Adelle com algumas novas mudas de plantas para logo as descobrir, em nossa casa, anêmicas, carentes de muita rega ou pouca água, de extremo sol ou sombra densa; quase mortas, a despeito de seus inábeis cuidados. Então, ela as levava de volta aos jardins de Adelle para que lá renascessem sob suas urgências de indiferentes cuidados. Adelle as olhava por um curto instante e as colocava em suas câmaras de restauração: à sombra de um arbusto ou a pleno sol. Era o que bastava.
‘Rosalie, veja estes bulbos, não são perfeitos?’
‘Batatas, Adelle, são batatas…’
‘Ó, Rosalie, não os insulte… Não são lindos?, tão peludinhos… parecem bichinhos…’
Os toques de Adelle faziam as plantas despertarem à vida. Ainda que frágeis, reagiam como se amparadas em um leito, oxigenadas, mimadas, observadas as pulsações, até que seus bulbos, raízes, caules e cílios se agarrassem à terra fazendo-as despertar, criar galhos, folhas, florir e voltar a viver.
Mamãe compensava seus desacertos com as plantas levando de presente para Adelle alguns livros, sempre de Eça, Garrett ou Raul Brandão. Creio que deste último Adelle gostasse muito do rosto bonito onde havia um enorme bigode negro. Em sua sala havia uma fotografia de Raul Brandão com um texto que depois encontrei em Húmus, dizendo: O tempo era limitado, a paciência pegajosa, o gesto lento. Agora que a vida dura séculos ninguém espera um minuto.
A cozinha de Adelle era pacificada pela ausência dos excessos de zelo, e tantas frutas chegavam às fruteiras que muitas apodreciam deixando no ar cheiros difusos, às vezes frescos e doces, às vezes azedos e pungentes. O que mais me encantava eram as favas de urucum, que eram como frutos peludos que por vezes eu confundia com lagartas peludas de fogo prontas para um susto se delas eu me aproximasse.
Enquanto a visitávamos, por vezes, eu empreendia pela casa um passeio de descobertas: o fole de matar formigas de seu Castúnio parecia uma enorme perna de pau de pirata, as pencas formadas por quatro garrafas, que penduradas em cada uma das janelas e portas eram vigias contra intrusos, pareciam cachos de frutas que nasciam em árvores que davam pomos de vidro. Ao lado do papagaio havia uma estante que dizia das leituras de Adelle: Lolita, O Coração das Trevas, A Montanha Mágica e livros de Eça, Garrett e Raul Brandão.
Em seu banheiro eu sentia uma enorme alegria quando podia admirar aquele grande aquário onde tartarugas conviviam com acarás, golfinhos, anêmonas, algas, e peixes-leão, todos em harmonia flutuando perpetuamente no plástico da cortina do box do chuveiro. Olhava cada um daqueles animaizinhos flutuando no azul de um mar profundo e paralisado, sentindo o cheiro do sabonete Cashmere Bouquet. Creio que com tudo isso construía minhas memórias permanentes.
Papai havia retornado de Portugal, e a pedido de mamãe, trouxera uma coleção em três volumes das obras de Eça de Queiroz saída pela Lello. Eram livros bonitos de capa marrom que mamãe acreditava seriam um bom presente para Adelle. Ela os acomodou numa caixa de papelão, cobriu-a com papel com desenhos de hibiscos vermelhos, e, sobre tudo, pôs uma fita de cetim. Era uma forma de compensar suas frustrações com as plantas que ganhava e não sabia cuidar. Só então fomos até sua casa buscando surpreendê-la.
Naquele dia a manhã parecia tomada por estranhas urgências; ventava um ar apressado, arredio e incômodo, como se pressagiasse irreconciliáveis desordens. A casa silenciosa como sempre, agora parecia transformada em saudades, lembranças, odores adocicados, frutas apodrecidas. Cruzamos todo o trajeto com mamãe segurado afetuosamente em seus braços a caixa com os livros até chegarmos à varanda.
‘Urru!, Adeeelleee! Urru!’, mamãe disse algumas vezes.
O papagaio de Adelle manteve-se quieto. Tinha diante de si uma caixinha de sementes de girassol e um grande recipiente com água limpa, ambos novos ali. Mamãe chamava por Adelle e o silêncio se perpetuava. Na cozinha havia um nauseante cheiro azedo que beirava à morrinha de coisas apodrecidas.
Mamãe caminhou pela casa chamando por Adelle enquanto eu percorria com os olhos os cachos de pomos de vidro, a perna de pau do pirata, os armários antigos, as canecas de ágata, o fogão, o bule de café passado sobre a pia sempre arrumada.
Pude ouvir um grito quando mamãe se deu conta de que Adelle estava morta ao lado da mãe, Gertrudes Abramov, que morrera também, talvez quatro ou cinco dias antes de Adelle.
Sobre a mesinha da sala ainda estava o chá de flores de laranjeira que tomara, alguns biscoitos e balas de alcaçuz, um açucareiro, uma xícara e o frasco de arsênico usado por Castúnio Aparício para exterminar as malditas formigas com seu fole.
Como Adelle viveu os dias ao lado da mãe sabendo-a morta, com seus sapatinhos de crochê que quase não tocavam o chão? A saudade, a solidão prenunciada, a perda definitiva. Esquecer para sempre tudo aquilo? Talvez tenha compreendido que a vida não é um caminho de solidão, mas de amor e companhia. Adelle havia pesado suas chances, talvez após tocar em Gertrudes já morta e não poder transferir a ela a força que dava aos bulbos, aos caules, às raízes, fazendo com que Gertrudes brotasse e florisse como havia florido por tantos anos. Creio que foi quando Adelle soube que não seria capaz daquele simples milagre.
O conto é sobre Rosalie e Samuel que visitavam a casa de Adelle que mora com a mãe e é muito boa com as plantas. A maior parte da narrativa fala dessa relação, mas no final a mãe morre e Adelle ingere arsênico, normalmente usada na casa para matar formigas.
Gostei muito da narrativa, revelando um autor ou autora talentoso e o final trágico contrasta com o início do texto.
Desejo sucesso na narrativa e parabéns pela história muito bem contada, só me deixou triste no final.
Resumo: Samuel e sua mãe vão à casa de uma amiga chamada Adelle. O lugar é cheio de plantas e cheiros agradáveis, e parece que parou no tempo. Adelle mora com sua mãe e um papagaio, a única coisa que destoa no local é a presença de formigas que ameaçam as plantas do lugar e que são combatidas com veneno. Numa visita surpresa, Samuel e sua mãe encontram Adelle e a mãe dela mortas.
Comentários: Gostei da história no geral, é interessante e bem construída. A escrita é boa, tem uma boa linearidade e retrata bem a visão e o interior do personagem principal. A sinestesia é bem utilizada em vários pontos e podemos perceber um certo ar melancólico em toda a estória. Só achei a parte do gato desnecessária, poderia passar sem ela. Parabéns!
A Casa de Adelle – Samuel Serran
Resumo: A história de uma mulher-lar, que protegia e cuidava de tudo e de todos, mas que opta por acabar com sua vida quando vê a morte de sua mãe.
Comentário:
Conto memória traça a amizade de duas mulheres pela percepção de um garoto. Muito descritivo, desenha ambiente e sensações de forma interessante. A questão de como a personagem do título enfrenta o ciclo da vida e a certeza de que ela tem um poder restaurador é quebrada quando sua mãe morre e assim a virada se concretiza com exatidão e elegância.
Gostei. Texto rico e coerente.
O conto narra as lembranças de Samuel de quando era criança e ia passar algumas horas durante os fins de semana na cada de sua vizinha Adele. Adele cuidava da casa, dos jardins e da mãe idosa de nome Gertrudes.
O conto é absolutamente bem escrito, com um ótimo uso de figuras de linguagem. No entanto, a história não me pegou o suficiente e as repetidas descrições da casa e dos afazeres de Adele me cansaram um pouco. Talvez minha sensibilidade, ou falta dela, neste caso específico, não tenha captado algo de mais profundo que o conto quisesse passar, Para mim só ficou mesmo a enfadonha rotina de Adele. O final do conto foi bom, deu uma surpreendida. Enfim, um conto muito bem escrito mas que não me impactou. Boa sorte no desafio
Conta a história de Adelle, seus cuidados com a casa, animais e plantas, que ao final do texto, é encontrada morta na sua casa.
Técnica: 4,5
Criatividade: 2,5
Impacto: 3,5
Conto muito bem escrito, de forma bonita, gosto da beleza que o permeia, mas em muitos momentos me faz ter pouco interesse pela leitura, por não ter um desenvolvimento maior na história, eu entendo que o texto será descrevendo esta personagem, como ela trata suas coisas, que ele objetiva causar um agrado ao leitor pela personagem e me cansa tamanha descrição dela, sem novidades para o leitor (a mim não trazia).
Em certo momento do texto, eu já adivinhava o final, tinha uma certa certeza da morte, ou no mínimo algo triste destinado à que o texto nos vinha fazendo cativar, é um artifício comum usado para causar impacto ao leitor. Minha pontuação em impacto nem foi tanto pela história, pois seria menor se assim contasse como impacto pelo desfecho e história em geral, mas conto como um todo, sendo mínimo o impacto da história, mas um bom impacto pela beleza da escrita e bela descrição da morte ao final.
Resumo: o conto narra, na visão de uma criança vizinha, o estilo de vida (e morte) de duas moradoras (mãe idosa e filha) de uma casa repleta de plantas/flores/frutas (e formigas).
Impressões: um texto lindo, poético, sensível e surpreendentemente trágico. Escrita madura, consciente, despretensiosa e, por isso mesmo, livre de floreios e rebuscamentos narcisísticos. Narrativa leve e prazerosa, propiciando o mergulho na história e a gradual transformação do leitor na personagem narradora. Enredo bem planejado e muito bem executado. Uma obra estilosa e com assinatura.
Parabéns pelo ótimo trabalho, coleguinha! 😉
Resumo:
Adele tem um papagaio. Samuel, o narrador e sua mãe; Rosalie a visitam toda semana. Na casa de Adele a natureza era rainha. Adele tinha um gato siamês, mas se desfez dele quando o papagaio chegou, porque na casa de Adele tudo era pacífico e era assim que devia continuar, exceto as formigas que na visão da dona da casa eram enormes ameaças ao equilíbrio. Adele e Rosalie faziam tricô, mas o principal talento da mãe do Samuel era a música, o piano. As mulheres mantinham essa amizade pacata que escorria como a areia de uma ampulheta, lenta e harmoniosa. Havia também a centenária Gertrudes, mãe de Adele e definitivamente, tudo concorria para provar que na casa de Adele o tempo passava mais devagar. E a dona da casa também era assim, essa ilha de passividade, não parecia ter trabalhado um dia, não parecia ter conhecido o sexo e talvez todas suas energias eram despejadas em seu jardim, nas plantas que floresciam gloriosamente. Sempre foi essa a rotina até o dia em que o chamado por Adele foi respondido pelo silêncio. Encontraram-na morta ao lado da mãe também defunta.
Considerações:
Que história triste, eu penso e depois me dou conta que para a vida fazer sentido não precisa, necessariamente, ser um arriscado e vibrante passeio na montanha russa – ao som dos trovões, canhões a bombardear o céu, trazendo pirotecnias de um espetáculo espantoso. Às vezes a vida simples, o correr dos rios, as flores crescendo, o silêncio envolvendo momentos de reflexão ou o simples descanso , são também manifestações de vida. E é isso que o conto-crônica nos apresenta.
Gostei muito deste conto. É uma ode à simplicidade e à solidão, ou melhor, à necessidade que temos de companhia. Também lança no ar a incômoda (ainda que clichê) pergunta: o que importa na vida, afinal? A Casa de Adelle é, assim, uma metáfora de nossos anseios, já que nela temos um microcosmo de nossa própria existência. Adelle é alguém que evoluiu, que tem nas plantas e na mãe sua razão de viver, a fortaleza que a impele adiante. Interessante que isso nos é passado pela visão de uma criança, de alguém cuja inocência não permite entrever todos os detalhes — embora estes não se escondam do leitor mais atento — mas que ainda assim, ou talvez por causa disso, acaba nos encantando também. Quando o arsênico para as formigas apareceu no conto, já deu para imaginar como seria o desfecho. Ainda que o autor tenha seguido por esse caminho já visualizado, a trama não deixou de cativar e de emocionar. Creio que todos nós já encontramos alguém como Adelle, ou já alimentamos o desejo de ser como ela — alguém que vive da companhia alheia, alguém que tira seus sustento do fato de se sentir útil. No fim, é isso mesmo o que importa. Com clichê e tudo. Parabéns pelo texto — aliás, tecnicamente impecável — e boa sorte no desafio.
RESUMO: Nossa protagonista, ainda criança, ia à casa de Adelle, sempre acompanhando a mãe.
A casa de Adelle era um lugar harmonioso e pacífico, onde tudo as plantas se restauravam pelo cuidado da senhora virgem, e onde tudo parecia estar em perfeita ordem, exceto pelas formigas. Malditas formigas que obrigou a dona da casa contratar um matador de formigas.
Na casa tudo funcionava em perfeita harmonia, exceto pela vida da mãe de Adelle, que jazia moribunda sobre a cama. Adelle, no entanto, cuidava de sua mãe com a mesma dedicação que cuidava do jardim. Infelizmente chega o dia em que a mãe de Adelle não resiste mais e vem a falecer. Triste com a percepção de que nem tudo neste mundo era perfeito e que não podia reviver sua falecida mãezinha tal qual fazia com as plantas, Adelle resolver tirar sua própria vida.
Da última vez que a protagonista foi à casa de Adelle acompanhando sua mãe, encontrou a dona da casa morta. Ela havia se envenenado com o mesmo arsênico utilizado para acabar com as formigas.
CONSIDERAÇÕES: Trata-se de um conto epistolar, que permite uma leitura prazerosa e remetem à imagens vívidas, aguçando, inclusive, o olfato do leitor.
O(a) autor(a) consegue transportar o leitor para o ambiente, fazendo-nos sentir odores e sabores.
Conto bem escrito, demonstra que o(a) autor(a) possui domínio da gramática e faz um excelente uso das palavras, prendendo a atenção do leitor até o fim. Ouso dizer que estamos diante de um dos melhores contos desta série, talvez o melhor conto!
RESUMO: O conto narra a casa de Adelle e suas mil e uma maravilhas, dentre fauna, flora e víveres. Narra ainda a vida do narrador, que acompanhado da mãe, visita Adelle e sua mãe nesse lugar semi-mágico até o derradeiro momento da morte da anfitriã e sua genitora.
COMENTÁRIO: O conto é escrito de forma magnífica. Belas construções frasais, poesia e um verdadeiro clima mágico. Talvez, o autor tenha se inspirado na casa de algum amigo ou parente de tempos antigos, onde a visita era sempre um momento de prazer, deleite, fazendo o lugar parecer mágico, orquestrado por uma espécie de divindade benevolente, incólume e casta. Eu mesmo tive esse lugar personalizado na casa de minha avó, então de certa forma me identifiquei com este espírito.
O aspecto quase mágico e divino descrito em Adedlle e sua residência me lembraram um pouco o famoso Tom Bombadill de Tolkien; um ser de poder imensurável, mas sempre concentrado em sua casa, seus afazeres e sua esposa, vivendo num paraíso bucólico à despeito do mundo lá fora.
Entretanto, como conto em si, desenvolvimento de enredo, este não é um estilo de narrativa que me agrada, então peço ao autor minhas desculpas caso eu pareça duro ou insensível.
A não ser que alguma metáfora me tenha passado despercebida, o conto não me instiga a querer acompanhar a história, até porque não há nenhuma. O que há, a meu ver, é uma profusão de belas construções gramaticais a descrever um lugar e uma pessoa. É certo o que faz de forma excelente, mas a meu sentir, o cerne de um conto é uma história a ser contada, e aqui, não vi nenhuma. Apenas a vida e a morte de uma pessoa afeitam as amenidades da vida, dedicada ao lar e receber bem seus hóspedes.
Então, como um todo, o texto é bem escrito, mas carece de enredo, o que o torna em alguns momentos entediante. Talvez se houv(er)esse uma metáfora por trás de pessoa e lugar tão maravilhosos, o conto ficasse mais interessante, na minha opinião. Um abraço!
Olá, Samuel Serran, boa sorte no desafio. Eis minhas impressões sobre seu conto.
Resumo: O enredo é em torno de duas velhas senhoras, mãe e filha, que vivem numa casa com um simpático papagaio, e cercada por seus vasos de flores, colhidas de seu próprio jardim, e um diversificado pomar cheio de frutas e cheiros. Enquanto Adelle, a filha cuidadora de tudo isso, vive um sério problema com as formigas que devoram suas plantas, e a grande indecisão, se compra ou não compra um tamanduá para dar conta das formigas. E sempre pronta para receber e desfrutar da amizade da amiga, Rosalie, de infância e adolescência.
Gramática: Uma leitura repleta de sentidos poéticos, sem o mínimo percalço gramatical.
Comentário crítico: Um conto tecido na graça da prosa/poética, assim como a uma ode a um ser místico. Um enredo simples, apenas cuida de narrar uma vida pacata como uma poesia sobre o tempo e as pessoas, até a morte. O que se resulta num final triste e melancólico, mas, mesmo assim, mantendo toda poesia do conto. Um belíssimo conto, Parabéns autor(a).
Em meio a reminiscências acerca do relacionamento entre sua mãe e a amiga Adelle, Samuel narra certa visita feita em companhia da mãe à casa dessa amiga.
O ponto alto para mim foi a linguagem. Elegante e poética, cativa pela cadência e é muito adequada à história que narra, ao ambiente que descreve e à atmosfera que se esmera em criar.
Entretanto, apesar da linguagem cativante, a voz do narrador não me soou convincente. Não consegui construir durante a leitura a imagem de um Samuel menino real por trás das descrições detalhadas e ornamentadas, mas o autor burilando as palavras para encantar o leitor.
Outro problema da sua história para mim é que o final não combinou com o corpo do texto. Embora de certa forma esperado, o desfecho com duas mortes, uma delas já antiga, desculpe, soou-me grosseiro, no sentido de pouco refinado. Também não gostei do último parágrafo em que o narrador tece hipóteses sobre as motivações de Adelle. Soou como se o autor quisesse explicar algo que ele mesmo achou despropositado para a personagem tão ricamente delineada na história.
Finalizo dizendo que, a despeito das críticas, o texto tem muitas qualidades, a leitura foi bastante agradável e certamente darei uma boa nota ao seu trabalho.
Um abraço.
Resumo: Adelle vivia acompanhada da mãe, um papagaio e um gato que, com o tempo, acabou tendo de se desfazer.
Cuidava da casa, do seu jardim, de suas flores sempre tão cheias de vida. Recebia suas visitas demonstrando tido vigor que tinha suas plantas tão vem cuidadas. Uma vida simples, regada de pequenos momentos. A unica preocupação de Adelle era com as formigas que, vez ou outra, ameaçavam seu jardim.
Numa certa ocasião Adelle é encontrada morta, junto ao corpo de sua mãe. Com certeza tirara a própria vida.
O arsênico antes usado para dar fim a praga de formigas, lhe servirá como ferramenta para dar um fim na sua própria vida.
Ponto forte: Explorar um cenário com pequenos detalhes. Demonstrar que Adelle era uma mulher comum, solitária, vitima de suas escolhas. Explorar seus dons, seus medos.
Pontos Fracos: Quem era Adelle e porque ela escolheu esse tipo de vida?
Comentario geral: Existem mais Adelles por ai do que somos capazes de imaginar. A maioria, vitimas do medo de viver, ou, sacrificam suas vidas para ficar sempre próximos de alguém. Neste caso, perto da mãe.
Samuel narra as visitas que faz à casa de Adelle, acompanhando a sua mãe, Rosalie, pianista de profissão. Adelle é uma mulher solitária, que vive com a mãe idosa, e que tem o dom de saber cuidar de plantas, mesmo sem ter conhecimentos de botânica. É um conto com um ritmo muito próprio, extremamente bem escrito. Os pormenores são dados ao longo da narrativa, mantendo a expectativa. Um autor com menos experiência teria cedido à tentação de explicar tudo no início, quebrando o encanto do conto, onde tudo joga na perfeição: a lentidão da narrativa é quase que um paralelo com o crescimento lento das plantas. A ligação à natureza é profunda e só é quebrada quando surge em cena o desparatisador. É aqui que a ligação à natureza termina, levando ao trágico desfecho.
Resumo: O personagem Samuel conta como era o convívio dele e sua mãe, com suas vizinhas: Adelle e Gertrudes.
O que achei: Se você teve a intensão de passar ao leitor a impressão de afabilidade, conseguiu!
O conto é rico em descrições bem elaboradas. Mas confesso que eram tantas… e a monotonia da vida das personagens era tal que isso acabou me afetando.
Contudo, o final me ganhou. Ele é excelente! Impactante,contrastante; triste, porém bonito.
A Casa de Adelle
Resumo:
Eu diria que o conto A casa de Adelle não é sobre a casa, mas sobre Adelle, personagem aqui traduzida por sua casa e rotina. A narrativa é, em suma, composta de lembranças de infância de Samuel, o narrador, que juntamente com sua mãe, visitava a recatada Adelle, supostamente uma solteirona, pretensamente uma virgem, que morava com a mãe. A casa de Adelle possuía jardim e pomar que, uma vez infestados por formigas, demandaram a presença de um “exterminador” de formigas. Em suma, um dia, ao visita-las, Samuel e sua mãe, Rosalie, se deparam com ambas mortas. Gertrudes, a mãe, acidentalmente envenenada pelo arsênico dedicado às formigas e Adelle, supostamente por suicídio motivado pela falta de perspectivas ante à morte da mãe.
Comentários:
Um conto bucólico, predominantemente descritivo. Adelle, a protagonista, nos é apresentada através de sua casa e rotina, uma personagem tão palpável quanto as memórias de quem narra. De fato, esse estilo, ao priorizar, estender-se e abusar das descrições na construção do protagonista, ao quase não dar espaço para a ação, para as ponderações, menções ao passado dos personagens ou outros recursos de quebra narrativa, faz-se um tanto monótono, cansativo e flerta perigosamente com o fastio.
Quer me parecer que aqui o autor, possivelmente trazendo memórias pessoais para a ficção, se permitiu deslumbrar pela própria virtuose, esquecendo-se de submeter o resultado de seu trabalho a um filtro crítico e isento. Não que eu condene a fórmula, longe disso, apenas creio que você, autor, pecou pelo excesso de descrições apresentadas continuamente.
Em contrapartida, o conto melhora com o desfecho, quando ao adentrar a propriedade, Rosalie e Samuel presenciam os sinais que antecipam a morte das moradoras. Infelizmente, a revelação em si é demasiado curta, objetiva e direta. Penso que a morte não precisaria ser literalmente citada, mas implícita, deixada à interpretação do leitor.
Minha intuição diz que há grande potencial no escritor e, apesar do conto ser bom, poderia ser melhor. Faltou, talvez um pouco de diversificação. Outros personagens, inclusive o próprio narrador (já que a história é contada em primeira pessoa) poderiam ter sido melhor explorados, mas sobretudo, talvez tenha faltado tentar colocar-se no lugar do leitor e imaginar o que cada parágrafo incitaria em que lê.
Em números:
Título e Introdução: 7
Personagens: 7
Tempo e Espaço: 8
Enredo, Conflito e Clímax: 7
Técnica e Aplicação do Idioma: 7
Valor Agregado: 7
Adequação Temática: 10
Nota Final: 3,7
Observação:
As parciais, baseadas nos critérios, variam de 0 a 10, mas possuem pesos distintos na composição da nota final, que varia de 0 a 5.
As doces lembranças de um garoto, de quando visitava a casa de uma vizinha um tanto quanto diferente, mas que marcou profundamente a sua infância.
Técnica
Valorizo sobremaneira o uso dos sinônimos na nossa tão rica língua portuguesa. Porque usar “trama, enredo” se posso usar “urdidura”?
“Gertrudes se reduzira, minguara, como se lhe evaporassem excessos do corpo…” perfeita técnica de tornar completa a sensação da leitura.
“Naquele dia a manhã parecia tomada por estranhas urgências; ventava um ar apressado, arredio e incômodo…” essa técnica de o clima ser um apontador para os acontecimentos é muito boa, desde que não explicativa. Então, acho que “como se pressagiasse irreconciliáveis desordens.” é dispensável ao sentimento da frase.
A exacerbação dos gostos e dos cheiros da infância, quando contados por um adulto, é uma técnica não muito fácil de alcançar e você conseguiu.
Criatividade
Não é fácil tornar relatos cotidianos, situações sem adrenalina… em enredos interessantes. Mas você conseguiu isso pela riqueza da linguagem e por fazer o leitor sentir os gostos e os cheiros.
Impacto
A extraordinária sensação de calma e completude é o impacto desse conto.
Tive vontade de não ler mais nada nesse dia, só para não perder o gosto dele na boca.
Acho que a relação de Adele com a mãe e o “não suportar perdê-la” poderia ter sido inserido em momento anterior, deixando a revelação do arsênico como última frase do conto, finalizando no ápice. Desse modo o impacto teria sido muito maior e evitaria essa questão da “explicação” dos sentimentos dela.
Maravilhoso, parabéns.
Olá, Luciana, obrigado por comentários tão generosos.
Concordo com tudo que você escreveu, particularmente no que devo melhorar.
Com relação ao final, de modo geral eles se dividem em dois tipos distintos: de resumo ou cênicos.
Concordo que finais cênicos são melhores que finais de resumo, quando o autor “fecha” a trama explicando algo que possa ter ficado de fora para o leitor. Fiz essa opção, e avalio agora que talvez devesse inverter alguns parágrafos para que o final fosse cênico e não de resumo – tarde demais!.
Apostei no ânimo do público, que de modo geral faz uma leitura rápida, onde o resumo “parece” trazer um resultado mais óbvio, que não deixa dúvidas. No caso, o resultado foi apenas “maisoumenos”.
Ah sim, você tem toda razão. Alguns públicos costumam dizer “tava bom mas terminou nada com nada” para esses finais cênicos. Eu prefiro, mas tem todo tipo de público. Mas, não afetou na genialidade do conto. Um abraço.
Olá, autor(a)! A escrita é boa, clara, mas senti falta de mais desenvolvimento do enredo e dos personagens. Justamente por isso o final parece tão abrupto. Talvez uma parte das descrições dos jardins e da casa pudesse ser substituída por diálogos ou flashbacks que descortinassem um pouco mais a trajetória de Adelle, suas alegrias, medos, temores.A sequencia final também poderia ser mais descritiva, ou remeter a um esclarecimento posterior de um médico ou coisa parecida: do modo como ficou é difícil saber como chegaram à conclusão de que a mãe de Adelle estava morta há mais tempo do que ele. Enfim, a ideia é boa mas poderia ter sido mais bem desenvolvida.
Neste conto, o primor é a perspectiva. Isto é, lê-se sobre cheiro, sons e, especialmente, sobre a composição deste cenário quase onírico que é, merecidamente, o título do conto: a casa de Adelle. Narrado em primeira pessoa, o conto nos apresenta a personagem principal não por descrevê-la ou mesmo por deixá-la nos dar mais detalhes de si própria, mas por nos fazer ver como ela enxerga essa casa quase fantástica em que reside a amiga de sua mãe. As descrições esclarecem para o leitor um cenário mágico, em que a palavra “paz” e “vida” se sobressaem. Tão imerso ficamos no cenário que em certo momento resta dúvida se Adelle tem mesmo o dom da vida ou se é apenas a perspectiva infantil da protagonista encarnada pela leitura. De todo modo, a imersão contribuiu para que ficasse difícil antever o final trágico, também entregue com lirismo.
Se a escrita é acertada, não digo o mesmo do enredo, no entanto. Se fosse resumir a história, escreveria em uma ou duas linhas que se trata da visita da protagonista à casa de uma amiga de sua mãe, onde se impressiona com o lugar até o dia em que encontraram não Adelle, mas tragédia. Ainda que o desfecho surpreenda, todo o restante da leitura é um exercício de imaginação do cenário, o que, para o meu gosto não é atrativo e, mesmo que bem feito, não prende à leitura, deixando-a mais lenta que o necessário. Pode-se argumentar, é claro, que com o passar das linhas, algumas informações a mais foram sendo entregues, aprofundando nosso conhecimento de Adelle. Mesmo assim, a personagem não ficou realmente esclarecida e, mesmo que esclarecê-la não tenha sido o intento do autor, acredito que haveria uma maneira de deixa-la mais interessante ao leitor. O máximo de conflito que existe é as formigas e nem mesmo aumentadas pela perspectiva infantil elas provocaram verdadeiro impasse, servindo como mais um componente desse engenhoso cenário.
Boa sorte.
Oi, Samuel! Eu gostei muito do seu conto!! Apesar de ser bem focado na realidade, eu senti um ar surreal, como em Cem anos de solidão, não sei porque…
Esse conto parece um capítulo de um livro muito bom e gostoso de ler, que mesmo tendo tantas expressões, palavras e imagens repetidas, não tira o gosto de ler. Gostei muito mesmo, parabéns! Boa sorte!
Bastante delicado e bonito seu conto. Parabéns. Gostei bastante. Destaque para este trecho: “O amor de mamãe por Adelle e sua casa, desfazia a ideia de que a intimidade é um caminho que leva ao tédio dos silêncios, pois era nesses silêncios que ambas teciam seus afetos.”
Obs: este não é um comentário obrigatório neste desafio, por isso não há resumo nem observações gramaticais.
Bom dia/tarde/noite, amigo (a). Tudo bem por ai?
Pra começar, devo dizer que estou lendo todos os contos, em ordem, sem saber a qual série pertence. Assim, todos meus comentários vão seguir um padrão.
Também, como padrão, parabenizo pelo esforço e desafio!
Vamos lá:
Tema identificado (ou tentativa de, hehehe): uma espécie de drama, talvez. Tive dificuldades de definir o tema hehehe
Resumo: vizinhos conversam sobre uma assombração que os tem visitado. Ao final, descobrimos que a aparição tenta avisar um deles sobre algo escondido no porão do amigo, uma mulher que é mantida em cativeiro. Acredito que o menino seja filho dela.
Comentário:
Fiquei meio dividido sobre seu conto. Por um lado, tem uma inegável beleza e poesia, muito bem vindas e que causam uma sensação de bem estar e familiaridade enquanto lemos. Por outro, achei um pouco cansativo, e como a história é meio linear demais, sem conflitos e praticamente sem desenvolvimento do enredo, acabei cansando da leitura num certo ponto, e acabei meio que querendo terminar logo. Mas vamos analisar por partes.
Primeiro, vou ressaltar a qualidade da escrita. O conto tem uma beleza poética incrível, e me tirou muitos sorrisos enquanto lia. Você domina muito esse tipo de escrita, brinca com os sentidos e emoções.
Aliás, eu me senti na pele da menina, conforme ela contava. Me lembrei de quando era criança e adorava ir à casa da minha avó, e como tudo parece incrível e grande, quando somos crianças. Adoramos conhecer lugares novos, e tudo parece imenso e desconhecido, né? Rsrs.. enfim, seu conto me remeteu a essas sensações, o que é uma delícia.
Por outro lado, como falei, achei que o conto acabou ficando um pouco cansativo, senti falta de um enredo que pudesse sustentar minha atenção enquanto leitor. Pq se for pensar bem, não acontece muita coisa. Por mais que o foco da história seja o aconchego e memórias da casa da Adelle, depois de um tempo, eu já tava meio cansado de saber da casa, e esperava por alguma emoção.
Porém, devo dizer que, de uma forma interessante, ainda que não haja muito enredo ou descrição de personagens, você foi muito eficaz em construir as personagens! Aos poucos, sem saber bem como, eu meio que tinha um panorama da personalidade da Adelle na minha cabeça, como se a casa refletisse isso de forma clara. Muito bom!
Quando ao fim, por algum motivo, durante toda a leitura, fiquei esperando que ela morresse ao final. E acabou concretizando. Fiquei com a impressão de que ela não pôde aguentar a morte da mãe, e se suicidou. É isso? Um final bem triste!
Enfim, como disse, tenho opiniões meio opostas hahaha.. mas no fim, acho que foi bem positivo o balanço. Parabens e boa sorte!
Luis, creio que tenha havido alguma confusão com a sua avaliação. O texto que você postou, parece-me, pertence a outro conto, ao menos em parte. O protagonista do meu conto não é uma menina, nem tampouco há assombrações, porões ou cativeiros.
Lá pelo meio, seu texto parece retornar ao conto A Casa de Adelle e, daí, segue tecendo seus comentários sobre ele.
A CASA DE ADELLE- Resumo; história de uma mulher dedicada a cuidar de seu jardim e da mãe, idosa. Um dia a mãe morre. E por desgosto, ou com medo de ficar sozinha, Adelle acaba com apropria vida.
COMENTÁRIO – A história, o argumento não é ruim, mas achei muito radical, desnecessário até, Adelle por fim a vida por causa da morte da mãe. É possível na vida real acontecer isso se a filha tiver algum problema mental, até pode ser que Adelle tinha depressão, embora não parecesse ter. É um final que surpreende pelo gesto não ser convincente, que parece ter estragado todo o resto.
A escrita é muito boa, construção de frases, etc. espaço, tempo e ações na medida certa. O personagem/narrador, ficou em segundo plano, não se destaca no texto, tudo é focado em Adelle que praticou um ato inútil. O motivo é frágil, acho que deveria ser outro. O final deveria ser melhor trabalhado. Boa sorte no Desafio.
O narrador sempre acompanhava a mãe, em visitas semanais, à casa de uma amiga de infância. Esta, Adelle nunca se casou, morava com a mãe, idosa e cuidava, especialmente, das plantas. Na última visita, as duas mulheres são encontradas mortas. A idosa, de forma natural e Adelle havia usado o arsênico comprado para matar as formigas, que odiava.
O texto retrata o cotidiano com um toque de nostalgia. A trama é crível, trazendo certo incômodo, no desfecho dramático: o suicídio é sempre muito dolorido… Por um momento, pensei em comentar que o desfecho não foi muito impactante, mas mudei de ideia. Na verdade, acho que fecha bem o ritmo melancólico, dando uma consistência ao todo. Vida tranquila em oposição a morte violenta. Enfim, o resultado final agrada!
A caracterização de Adelle, com a oposição à personalidade da amiga, de certa forma, remetem aos versos de Francisco Otaviano: “Quem passou pela vida e não sofreu; (…) Só passou pela vida, não viveu”.
Meio conto, meio crônica, o estilo compõe a trama de forma original. Através dos elementos da ambientação, a narrativa vai construindo os personagens. O conto está emotivo, porém, parece-me que careceu de um enredo mais forte e de clímax. Acho que poderia ser ainda mais valorizado com um clímax mais trabalhado.
O texto está bem escrito, fluido e tranquilo; somente faltam algumas crases e vírgulas, além das repetições próximas e sem efeito estilístico.
Parabéns pelo trabalho. Boa sorte na Liga. Abraço.
A casa de Adelle
Conto
Mnemônico Poético
Resumo: A história da amizade de duas mulheres, Adelle e Rosalie contadas pelos olhos de Samuel, o filho da segunda.
Comentário: É um Conto sobre o Tempo focado na personagem do título, Adelle. Uma Fada Mulher que toca os seres transmitindo vida. Por ser através dos olhos de uma criança memória, sabemos apenas o que Samuel vê, mas o Tempo vaga absorto nesse Conto Poesia.
A mulher do título é apegada à ideia de pertencimento. Lar, continuidade e cuidados amenos fazem parte de sua existência. Não se desfaz de nada, reaproveita, recria, dá novos ares, nova vida.
A Poesia canta em cada parte do texto extenso e rápido, uma mostra do que é a Vida. Ou a Morte, que é o tema escondido, porém presente.
A Morte se apresenta ora na forma de Tempo, que deteriora as frutas dentro de casa, que brinca com Gertrudes e Samuel, polos diferentes do mesmo morrer-viver, ora de forma clara no formicídio no jardim. E que beleza de Poesia no morrer das formigas. O campo lexical rico, brinca com o fole e com a ideia de gêiseres, apresentando uma idéia perfeita de coexistência e finitude. Mesmo na aparente inocência da vortina plástica do box, o morrer-viver se apresenta na idéia de predadores e presas coexistirem pacificamente no aquário imaginado.
O final é aterrorizante sem realmente ser aterrador. Adelle que tudo toca com vida não consegue trazer a mãe de volta à vida, segue-a na Morte, dando fim ao seu viver-lugar.
Texto com uso adequado da Linguagem, pincelando poesia e afetos na dose necessária. Final óbvio sem obviedade – digo obvio pela coexistência da vida e morte que brincou no texto e sem obviedade porque sendo Adelle tão cuidadora da vida, sair dela através do suicídio não seria normal, mas é aceitável por sua inabilidade de existir além de seus afetos.
Texto muito bom, parabéns ao autor.
Se eu tivesse que analisar academicamente usaria aqui Heidegger e Eduardo Lourenço…
PS. Há alguns deslizes necessários de edição que não comprometeram a Leitura e compreensão.
Olá, Elisabeth,
Obrigado pela leitura atenta. Você foi precisa quando determinou que o conto, fundamentalmente, lidava com o Tempo, com a maneira como o tratamos, fazendo-o nosso amigo ou deixando que ele se se manifeste em ataques à urdidura das coisas, tornando tudo transitório além da conta.
Esse, é claro, é um conto que buscou traduzir um forte viés poético de como se pode compreender a vida, e acredito que você soube compreendê-lo.
Imagino que compreender esse conto signifique mergulhar mais profundamente na grande metáfora que é a vida que vivemos, e não compreende-la, como de modo geral acontece com muitas pessoas, significa viver uma vida menor que aquela que seria possível a cada um de nós, e aceitar que cada um compreenda a sua própria metáfora de vida, é também abrir-se à possibilidade de compreender uma mulher como Adelle, que deu um limite, circunscreveu-se em seu próprio mundo, cuidou dele, amou-o profundamente e, quando se deu conta de que a magia havia se quebrado, abdicou de continuar nele.
Abraços.