EntreContos

Detox Literário.

No Limiar do Grande Vazio (Fabio D’Oliveira)

Branco, tudo branco.

“Atenção, o universo AYB-7842 está em processo de extinção. O fungo espacial, catalogado no Almanaque das Dimensões como Morte Invernal, já consumiu 87% das formas de vida deste universo. Não recomendamos viagens para este setor no momento. Repetimos…”

Logan encerrou a transmissão e encarou o companheiro.

— Tá maluco? — assustou-se Ingmar. — O nível de perigo deste troço é universal.

— Eu sei, Ing, mas não temos muito tempo. As opções estão acabando.

Ingmar não respondeu. Pegou o rádio pra si, ajustou a frequência e recomeçou a transmissão.

“Atenção, o universo ENA-4953 está em processo de extinção. A entidade maligna Un’rel…”

Tentou uma nova frequência.

“Atenção, o universo VIC-9112 está extinto. Caso “salte” para essa dimensão, não garantimos sua segurança.”

— Ing…

— Cala a boca — cortou ele, num berro.

Teimoso. Como sempre.

Logan não se ofendeu. Sabia o que Ingmar sentia naquele momento.

Afastou-se um pouco, perambulando pela vastidão branca. O Grande Vazio era uma espécie de corredor entre as dimensões. Ambiente não-temporal. Nenhuma ordem, nenhum caos. Nada acontecia. E era finito. Concepção confusa, complexa, tanto que o jovem nunca tentou entender aquele lugar.

As coisas eram o que eram, simples assim.

— Desgraça!

Igmar jogou o rádio para longe, que, depois de quicar duas vezes no chão, parou no meio do ar, semidestruído.

— Não é possível… — lamentou. — Todos os universos estão em colapso.

— Talvez seja o fim de tudo — sugeriu Logan, aproximando-se.

— Não faz sentido, Lô. Como a Confederação Dimensional não previu algo do tipo.

— Pode ter previsto. Só não contou pra todos…

Momento de silêncio. Grande. Triste. E desesperador. Ingmar e Lohan, lado a lado, observaram a brancura do Grande Vazio.

— Vamos morrer aqui? Era pra ser um recomeço.

— Não sei, Ing. Mas aqui ainda é melhor do que lá.

Decidiram não falar sobre o passado. E não falariam.

— Por que não cruzamos o limiar?

Ingmar ficou quieto.

— Por que não? — insistiu Logan.

— É uma grande aposta. Não sabemos o que existe além do limiar.

— Pode ser o fim. Ou pode ser o recomeço.

Decidiram caminhar até a borda do Grande Vazio. Não sentiam fome ou sede. Sequer cansaço. Mas sabiam que permanecer muito tempo naquele ambiente resultaria num sumiço expontâneo. Fenômeno misterioso.

O limiar era bem sutil. Uma pequena película, quase imperceptível. Acidentes eram comuns, principalmente entre os alunos da Academia.

— Tem certeza disso? — Ingmar estava nervoso.

— Não. Mas nunca tive certeza de nada.

Ingmar hesitava.

— Desculpe por mais cedo — pediu ele, cabisbaixo.

— Pelo quê?

— Gritei contigo.

— Você gritou? Não lembro — sorriu Logan.

Antes que Ingmar pudesse falar algo, agarrou a mão dele, e, num salto, atravessaram o limiar do Grande Vazio.

Foi uma sensação única.

Era como se o corpo tivesse sido esticado, de uma hora pra outra, achatado por completo. Não tinha mais profundidade. Escuro. Ainda sentia a mão de Ingmar. Era estranho. Sentia coisas novas, também. Uma força centrífuga começou a agir sobre eles. Girando, girando, girando. Cada vez mais forte. Parecia que algo queria separá-los.

Então, num lapso de segundos, tudo pareceu congelar.

Logan estava na Academia. Normal, como antes. Era um observador. Viu-se na frente da sala de aula, calmo, disciplinado e focado nos estudos. No fundo, Ingmar ria no meio de outros aspirantes a viajantes interdimensionais. Opostos.

Piscou.

Foi ali, nas arquibancadas vazias do estádio da Academia, que falou com Ingmar pela primeira vez. Sentiu algo estranho quando trocaram algumas risadas. Nunca havia sentido aquilo na vida. Era só reprimir, pensou na época.

Suspirou.

Depois do primeiro beijo, espontâneo, foi impossível evitar. Entre os encontros secretos, foram notados. Boatos. Sua família era tradicional. Não aceitou. Prometeu esquecer.

Chorou.

Subitamente, o caos matou a ordem. E o universo deles começou a ruir. Foi rápido. Mas deu tempo de se encontrarem e fugirem juntos. Roubaram o saltador de dimensões. Livres, pela primeira vez. Seria um recomeço.

Sorriu.

Um vasto céu adiante. Nuvens e mais nuvens. E Ingmar ao seu lado. Uma nova forma de existência era possível. Diferente e semelhante.

— Até que não é ruim.

— Não mesmo.

Não soltou a mão dele, como no passado. E não soltaria mais.

Sobre Fabio Baptista

15 comentários em “No Limiar do Grande Vazio (Fabio D’Oliveira)

  1. Alexandre
    9 de março de 2024

    Não curti. Tantas referências en passant sobre pessoas, eventos e instituições dá aí conto uma impressão de superficialidade que incomoda. A pontuação picota a história e, tantas paradas a torna mais longa do que é. E o autor, ainda podia ter revisado melhor. Há redundância no texto e o protagonista tem o nome escrito de duas formas diferentes.

    .Nada disso quer dizer que a história é ruim ou que o autor escreve mal. O autor deixa claro que domina o tema e a premissa da história é atemporal e sempre instigante. Enfim, o autor é bom, a história também, mas foi mal executada. Parabéns ao autor. Nota 6

  2. Thales Soares
    9 de março de 2024

    No início, este conto estava me empolgando bastante. Eu pensei “Poxa, alguém escreveu um conto de ficção científica, que maneiro!”. Porém, achei ele muito simples e pouco desenvolvido. Apesar de ter uma ideia bacana, ele foca no relacionamento amoroso entre os dois personagens principais, o que para mim foi um pouco desinteressante.

    O uso do tema foi muito bem aplicativo, tendo vários significados. Não só o reinicio de todo o universo, mas também na vida dos personagens, com um novo começo para o amor deles. E os flashes de memória que Logan experimenta durante a travessia sugerem que o recomeço não implica esquecer o passado, mas sim integrá-lo à nova existência de uma forma que traga paz e aceitação.

    O conto é bastante breve, e a leitura foi bem fluida, então consegui lê-lo bem rápido. Foi até que bacana, porém, ao ver esse clima inicial meio Star Trek, eu esperava algo mais complexo. Tem um momento aí do conto que o Logan deixou de ser o Wolverine, e virou um tal de Lohan… mas creio que isso tenha sido erro de revisão.

    Foi um conto curto, direto ao ponto e razoavelmente divertido. Apesar de não mostrar muita coisa interessante, a escrita dele e toda a sua construção foram muito boas!

  3. Karina Dantas Nou Hayes
    7 de março de 2024

    A ordem, o caos e um recomeço depois do fim de um universo convencional . Dois personagens que se amam, se aventuram na busca por uma nova dimensão e atravessam o chamado “Limiar do Grande Vazio”. O grande vazio da falta de coragem de serem quem realmente são, de sentirem o que realmente sentem. E ao atravessarem este limiar, finalmente encontram, de mãos dadas, uma dimensão onde não precisavam mais se reprimir. Conto meio “viajandão ” mas que narra de uma maneira sutil e poética a aceitação de um casal homossexual num mundo cheio de preconceitos.

  4. Priscila Pereira
    2 de março de 2024

    Olá, Viajante! Tudo bem?

    Seu conto não está na minha lista de obrigatórios então não poderei avaliá-lo, mas mesmo assim quero deixar meu comentário.

    Olha, esse foi o começo mais legal que li no desafio até agora(e até já sei quem é o autor 😏), mas acabou tão abruptamente… Quando as coisas começaram a engrenar você terminou o conto, como assim?

    Eu não gosto muito de romances adolescentes na literatura (salvo excessões), prefiro nos filmes… Acho difícil escrever de uma forma que pareça natural sobre o que é de verdade um romance adolescente. Tudo que leio parece forçado e raso, e como seu conto só pincelou tudo isso de forma tão rápida, não consegui fugir dessa sensação.

    De qualquer forma a ideia dos mundos sendo extintos e o grande vazio unindo todos eles é muito legal mesmo. Espero poder ler mais sobre esse universo!

    Boa sorte no desafio!

    Até mais!

  5. Regina Ruth Rincon Caires - Caires
    28 de fevereiro de 2024

    No Limiar do Grande Vazio (Viajante)

    Lendo este texto confesso que, aos poucos, fui envolvida por uma sensação muito boa. O amor dá sentido a tudo. De início imaginei que seria apenas um texto futurista, daqueles que descrevem as engenhocas dos próximos séculos, viagens espaciais, viagem no tempo, vida extraterrestre, universos paralelos. Depois, a cada parágrafo, através de revelações que o autor foi espalhando (gota a gota), percebi a emoção trazida pelo sentimento que unia os dois personagens.  Tudo muito suave, bem contado. Poético. O recomeço estava ali.

    A linguagem simples dos diálogos, coloquial, traz o leitor para perto.  O texto está bem escrito, fluente.

    Parabéns pelo trabalho, Viajante!    

    Boa sorte no desafio!

    Abraço.

  6. mariainezsantos
    26 de fevereiro de 2024

    Uma alusão ao caos que é viver entre o espaço e o nada. Sem socorro, sem ter a quem recorrer. Um vazio imenso entre saber que se está por um fio de vida e uma infinitude de novo viver em outro lugar, com calmaria, sem perceber a destruição ocorrendo ao lado, sem visão alguma do mal… Apenas deixando as coisas acontecerem

  7. Antonio Stegues Batista
    26 de fevereiro de 2024

    Pelo início do conto, achei que seria uma aventura espacial com astronaves combatendo um fungo que destrói mundos, previa combates em planetas  e cidades sendo arrasadas, combates em terra, lançador de chamas queimando o tal fungo que se retorcia como um polvo gigante, mas nada disso aconteceu, na verdade, o tal fungo é um sentido figurado, uma metáfora que posso identificar como a sociedade conservadora, as convenções sociais, o drama familiar e pessoal na relação amorosa de dois jovens do mesmo sexo. Os dois criaram um mundo só deles. O texto está bem escrito, apesar dos pequenos erros. A ideia é válida, embora tenha me enganado de início.

  8. Givago Thimoti
    25 de fevereiro de 2024

    No limiar do Grande Vazio (Viajante) 

    Primeiramente, gostaria de parabenizar o autor (ou a autora) por ter participado do Desafio Recomeço – 2024! É sempre necessária muita coragem e disposição expor nosso trabalho ao crivo de outras pessoas, em especial, de outros autores, que tem a tendência de serem bem mais rigorosos do que leitores “comuns”. Dito isso, peço desculpas antecipadamente caso minha crítica não lhe pareça construtiva. Creio que o objetivo seja sempre contribuir com o desenvolvimento dos participantes enquanto escritores e é pensando nisso que escrevo meu comentário.

             Como eu já avaliei todos os 12 contos mínimos, chegou o momento de comentar “no amor”. Não terá nota, tampouco vou comentar sobre questões gramaticais. Irei escrever apenas sobre minhas impressões e o que tocou ou não o leitor nesse conto.

    Impressões:

    + Minha pequena Eva… E V A! Se você não pensou nessa música lendo esse conto, não tem algo certo contigo

    + O final me lembrou um pouco aquele filme “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”. Imaginei o final do conto com o casal junto, igual duas pedras no início do Universo seguinte. 

    – Achei que teve pouca relação com o tema recomeço. Foi muito mais sobre o fim

    Alma – o que tocou ou não o leitor: 

    Particularmente, contos de ficção científica dentro desse contexto de desafio, com 2.500 palavras, sofrem bastante com o espaço reduzido e a necessidade de encaixar sua história. Acho que isso aconteceu um pouco com o conto; teve que passar por uma premissa básica (colapso de múltiplos universos [que eu li muito mais como colapso de múltiplas galáxias]) para contar uma história de recomeço. Contudo, como comentaram no meu conto uma vez, ao escrever uma história, uma regra de ouro deve ser aplicada: “Don’t tell us, show us” (Não conte, mostre). 

    Claro que, considerando a dificuldade do desafio, é preciso relativizar essa questão. Mas, gostaria que esse colapso fosse mais bem demonstrado, ao invés de simplesmente jogado.

    Enquanto isso, gostei bastante da revelação da relação entre os colegas de turma Logan e Ingram, especialmente quando consideramos que a relação deles ocorre dentro do contexto do militarismo e machismo de uma Academia de Pilotos Intergaláticos. O segredo e o amor do casal são tão ínfimos diante do colapso do universo, que chega a dar pena. Gostei bastante de colocar essa relação no conto. Pena que foi pouco demonstrada, ao meu ver.

    Enfim, um conto simples, com potencial que não foi tão bem explorado.

  9. Fernanda Caleffi Barbetta
    22 de fevereiro de 2024

    Oi, Viajante.

    Como qualquer texto de ficção científica, precisei ler mais de uma vez para entender, sempre me parece tudo muito confuso. Sei que parte, grande parte, disso é uma dificuldade minha, mas, na maioria dos contos de FC, sinto que faltam informações. Não que todos os universos e instrumentos criados tenham que ser explicados em detalhes, ficaria chato, desnecessário; FC é interessante também por essas lacunas. Mas, na minha opinião, tudo precisa fazer sentido; coisas muito importantes que foram colocadas ali precisam ser justificadas.

    No caso do seu texto, ele inicia com uma transmissão avisando sobre os universos estarem se extinguindo, cita a porcentagem de formas de vida consumidas, fala de um fungo, nomeia este fungo. E nada disso é explicado. Como eles têm todas estas informações se tudo foi muito rápido e eles só conseguiram pegar o saltador de dimensões? Esse saltador é também um transmissor? Seria interessante situar melhor o leitor. O texto depois se volta para a questão pessoal dos dois personagens e acaba.

     expontâneo – espontâneo (em uma das vezes que essa palavra aparece, está com grafia errada)

    “Antes que Ingmar pudesse falar algo, agarrou a mão dele” – entendi, mas está um pouco confuso, quem faz o quê.

    “Foi uma sensação única”— desnecessário.

    “de uma hora pra outra” – não sei se foi a melhor escolha. Aconteceu no instante em que cruzaram, não foi de uma hora para outra. De qualquer forma, acho desnecessário.

    “Opostos” – não sei se entendi.

    Você usou “estranho” em duas ocasiões, talvez usar um adjetivo mais específico. “Sentiu algo estranho” – sentiu o quê?, estranho é muito vago.

    “Depois do primeiro beijo, espontâneo, foi impossível evitar” – parece que falta alguma coisa. Evitar o quê?

  10. Vladimir Ferrari
    19 de fevereiro de 2024

    Um título bastante promissor. Como minhas análises, sempre focam o texto em primeiro lugar, achei estranho a fala de “Ing” logo no início. Devo dar o devido desconto ao “Lohan” e ao “expontâneo”, além de uma repetição da palavra “limiar”. Ainda mais que o primeiro beijo foi “espontâneo”. Toda a narrativa é decorativa e no momento de se perceber o que o autor veio dizer ao seu leitor, deve ser posta de lado. Mas, disse pouco. Não vi um conflito muito antagônico à condição dos dois amantes. Foi algo zás-trás, “foram notados. Boatos. Sua família era tradicional.” Um título sugestivo poderia “brincar” com esse vazio de julgamentos, por exemplo. Ou o vazio das preocupações: “o que os outros irão dizer? Danem-se os outros”. Sucesso.

  11. danielreis1973
    16 de fevereiro de 2024

    Comentário:

    Começo dizendo que tenho pouca conexão com o gênero ficção científica. Acho, inclusive, que mereceria um espaço só dela, já que é muito difícil comparar histórias com tal grau de inventividade (inegável) com outras, que lidam mais com aspectos cotidianos e “pés no chão”. É até desleal com o escritor de FC ter que comparar (como maçãs e laranjas), ainda mais porque o desafio é justamente comparativo, e me faltam critérios objetivos para colocar lado a lado esses dois tipos de narrativas. Mas vou tentar:

    No caso do “Limiar do Grande Vazio”, dois colegas/amigos estão buscando alertar possíveis viajantes sobre o colapso de grande parte dos universos, quase uma reação desesperada e mortal sobre o fim dos tempos. O que dificulta o meu entendimento é a quantidade de conceitos que tem que ser determinados ao leitor (ou simplesmente aceitos por ele, sem maiores explicações) para que ele “embarque” nesse universo, tal como “corredor entre dimensões” e “Confederação Dimensional”.

    O conto só engrena no meu gosto quanto traz uma decisão (embarcar ou não no Grande Vazio) e essa decisão explica, em suas consequências, a relação estabelecida entre os dois, há tempos. Nesse ponto, creio que o mundo normal (como o conhecemos) toca levemente o universo FC, e nisso está o seu valor: de uma situação imaginada, reflete-se a realidade do ser humano e das relações entre eles.

    Critérios de avaliação:

    1. Premissa: construída sobre uma base de FC, mas que atingiu um ponto de intersecção interessante com o mundo comum. O “salto” no vazio como o recomeço de uma história, como deveria ser.
    2. Construção: nesse ponto, da construção, é que me pareceram os diálogos um pouco ríspidos, quase uma “versão dublada” da história original.
    3. Efeito: o efeito geral foi médio, mais pela dificuldade em relacionar o universo proposto com o drama existencial, o que diminui um pouco na última parte do conto, em que o drama humano sobressai frente à realidade ficcional.
  12. Gustavo Castro Araujo
    15 de fevereiro de 2024

    O conto possui dois atos. O primeiro se inicia com uma ambientação futurística, em que dois astronautas(?), Logan e Ingmar, veem-se de frente com o apocalipse e a única chance que lhes resta é o mergulho no grande vazio, com consequências inimagináveis. De fato, é o que acontece. Nesse mergulho, é difícil que se mantenham juntos.

    Na segunda parte, ambos estão de volta à academia. Ali sabemos que ambos eram amantes, que essa relação foi contestada, que seu mundo, ao menos metaforicamente, ruiu, qual o universo espacial do primeiro ato. Diferente do destino por que passaram antes, agora não se soltarão mais.

    O lado positivo do conto é sua criatividade latente. Por meio de um paralelismo, vemos que em ambos os casos Logan e Ingmar estão diante do fim dos tempos; na primeira parte, não conseguem ficar juntos; na segunda, com a lição aprendida, mantêm-se firmes como casal, como dupla.

    Há mais não-escrito do que escrito, ou melhor, há muito subtexto no conto. Sabemos por entrelinhas, que ambos vivem um romance proibido e que essa relação é colocada à prova de forma cabal: é tudo ou nada; não há como prever o que irá acontecer. Dessa maneira, tanto faz a ordem com que lemos os dois atos, afinal um é espelho do outro.

    As frases curtas utilizadas pelo(a) autor(a) conferem à história um ar de abreviação, quase de fábula, entregando ao leitor a tarefa de completar as lacunas. É uma estratégia arriscada, já que muitos podem considerar essa estratégia como falta de desenvolvimento; já outros podem gostar do clima onírico a ser complementado. De qualquer forma, é uma escolha corajosa. Pessoalmente, me coloco ao lado de quem quer mais informação, quer mais dados, até para que, de alguma maneira, eu consiga compreender e me importar de verdade com o drama existencial dos personagens. Creio que foi isso que faltou para mim.

    Também senti um pouco de desleixo com a revisão. Logan pode ser Lohan, Ingmar pode ser Igmar, espontâneo vira expontâneo… Não sou de reclamar disso, mas quando há repetição meu TOC fala mais alto.

    De todo modo, é uma história interessante. Uma maneira criativa e original para falar de recomeço. Parabéns e boa sorte no desafio.

  13. Kelly Hatanaka
    15 de fevereiro de 2024

    Estou avaliando os contos de acordo com os seguintes quesitos: adequação ao tema, valendo 1 ponto, escrita, valendo 2, enredo, valendo 3 e impacto valendo 4.

    Adequação ao tema
    Atende ao tema. Ingmar e Logan saltam no grande Vazio e têm seu recomeço.

    Escrita
    Escrita correta e fluida, sem erros. Os diálogos são bem feitos e ajudam a definir os personagens. Muito bom.

    Enredo
    Um universo entra em colapso e dois amantes fogem para um limiar entre as dimensões, onde descobrem que todos os universos ruíram. Saltam, então para o vazio.
    Uma boa história, mas que poderia ser mais desenvolvida. Acredito que havia espaço para mostrar melhor os personagens, as situações, a fuga, sua nova vida no vazio.

    Impacto
    Gostei desta história que fala de amor e de liberdade. Mas, gostaria de ter visto mais. Isto é uma questão de gosto pessoal, afinal, a história foi contada e com muita competência. Mas eu sinto que tinha espaço para mais. Para mostrar mais quem era Ingmar e quem era Logan. Como era o mundo de onde vieram, como viviam, como era a academia. Ficou a sensação de que a narrativa correu.

    De toda forma, é um ótimo texto. Parabéns pela participação.

    Kelly

  14. Simone
    13 de fevereiro de 2024

    Muito bem escrito e interessante o conto Branco, tudo branco. No início pensamos em ficção científica, em fantasia, distopia, mas no fundo o romance, a aposta nessa mistura com final feliz. Sei que existem mais camadas do que pude perceber no texto. Entendi um subtexto mencionado em poucas palavras que abrem para toda uma história de amor. O conflito medo x coragem. Estar sempre procurando saídas para os desafios, quando não se percebe caminhos, quando arriscar é a única opção. Então o mais importante é não desistir um do outro, não soltar a mão. Vida nova para além da coragem, creio que seja uma das mensagens do texto. Gostei da objetividade do texto, frases curtas, na medida do necessário. Ao mesmo tempo provoca curiosidade sobre o desfecho, sobre a escolha do escritor. Muito bom!

  15. Marco Aurélio Saraiva
    12 de fevereiro de 2024

    Conto bem escrito e sucinto, vai direto ao ponto. Começa com um tom de ficção científica, mas depois fica claro (ao menos para mim) que a alusão dos “multiversos” era apenas um paralelo com o descobrimento da sexualidade de Logan e Ingmar. Como o conto não chega nem a mil palavras, ficou difícil criar qualquer tipo de “primeiro plano” de entendimento do texto: é, realmente, um paralelo direto com a descoberta da sexualidade. A ruína do seu universo é ver familiares e amigos tradicionais negando sua homossexualidade. O Grande Vazio é o momento de confusão, quando o casal não sabe para onde ir, não decide se volta ao mundo anterior ou pula para o próximo. Ficar neste limbo, sem entender a si mesmo por muito tempo, é perigoso, como descrito no texto. Atravessar o limiar é abraçar a aceitação do que é e tornar-se outro, renovado, em uma vida reiniciada, com novos amigos e família… efetivamente em outro universo.

    A escrita é muito bem feita. Destaque às pausas, que às vezes têm papel fundamental:

    “Momento de silêncio. Grande. Triste. E desesperador.”

    Neste trecho acima, por exemplo, as pausas em excesso têm o papel de forçar a pausa na leitura e extender o tempo fictício, que se passa entre uma fala e outra. Acho que muita gente não gostaria deste tipo de pontuação, mas eu gostei! Mostra que o autor prestou atenção ao detalhe.

    O que não gostei: para um conto assim, tão breve, ter algum impacto, ele deve ser estrondoso. Mas o conto é simples e um pouco raso, então não deixou nenhuma marca. Também achei que o tema é meio clichê, e a forma como foi abordado não é muito criativa.

E Então? O que achou?

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Informação

Publicado às 10 de fevereiro de 2024 por em Recomeço e marcado .