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Palestina – Joe Sacco – Resenha (Gustavo Araujo)

A guerra entre Israel e Hamas desnuda, como poucos assuntos, o tamanho de nossa ignorância. Por trás de nossos computadores e celulares, nos arvoramos de especialistas, entendedores supremos de um conflito que se arrasta há séculos, repetindo frases feitas sem qualquer ponderação.

Mais do que a ignorância, o tema revela nossa falta de coragem. Isso porque jamais teríamos a iniciativa de ir à Faixa de Gaza ou à Cisjordânia, para vermos tudo por nós mesmos. Poderíamos ir às ruas limpas e policiadas de Tel Aviv ou à Cidade Velha de Jerusalém, constantemente vigiada. Mas não aos locais onde os palestinos são confinados como animais, despidos de direitos, sem acesso a água, infraestrutura, saneamento básico ou educação, sujeitos a uma realidade opressiva que tem nos colonos e nas Forças de Defesa (!) os arautos da desgraça.

Sim, somos acomodados e donos de uma retórica simplista e covarde. Ao contrário de Joe Sacco, o jornalista americano que entre 1991 e 1992 passou dois meses nos territórios ocupados entrevistando aquela gente esmagada dia e noite pelos soldados, cercados pelo medo, pelas ruínas e pela lama. Sacco foi muito além do que qualquer turista mais curioso jamais fora.

O resultado foi uma obra fantástica, publicada em nove fascículos e depois reunidas em volume de 300 páginas. “Palestina”, construída como HQ, revela não só a demolição dos palestinos por um governo covarde, mas o tamanho da nossa própria falta de empatia, traduzida pelo raciocínio raso com que tratamos essa questão.

Os traços não encantam pela perícia. Antes, dão forma ao desespero dessas pessoas que foram presas, jogadas em campos de refugiados, que perderam filhos e maridos, que não têm qualquer perspectiva de melhora e cujo único propósito de vida é vingar-se do inimigo que o oprime.

Há algo de Will Eisner na maneira como Joe Sacco nos apresenta esse cenário. Ironia e uma boa dose de sarcasmo pontuam seus caminhos entre Nabulus, Khan Younis, Gaza e Ramallah, numa atmosfera amarga e sem prazo para se dissipar.

Mulheres e crianças perguntam a ele: “de que adianta contar ao mundo sobre o nosso sofrimento?”. Passados trinta anos, alguém os culpa pela desesperança?

E Então? O que achou?

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Publicado às 14 de janeiro de 2024 por em Resenhas e marcado , , .