Ela aperta os olhos como se quisesse enxergá-lo melhor. Os hormônios escapando pelos poros, a juventude corroendo qualquer bom senso. Jovens são sempre felizes, não são? Do jeito deles, de um modo que o arrastão da vida não perdoa.
Dez meses mais velha, cinco centímetros mais sóbria, vinte quilos menos perceptível. Ele com um nome que ela não entende direito. Parece estrangeiro, mas sua risada tem sotaque carioca. São muitas consoantes e nenhum sentido. Se o destino tivesse aquele som, teria de ser reescrito linha por linha.
A moça tem pressa. Já teve medo e ainda guarda poemas em gavetas. Esconde seu eu lírico lá no alto de suas expectativas, no espaço entre os seus complexos e dúvidas. Cita Bukowski esperando que ele a admire pela inusitada escolha. Nem ouve. Escuta outros sons, agudos loiros, timbres esguios e decadentes.
─ Me chamo Eva.
─ Ah, tá…
E ele sorri. Tem aparelho nos dentes e cerveja no olhar. Diz que vai embora porque a festa está chata e não tem tempo a perder. E ela pensa “será que esse garoto tá morrendo?”
Mas ele está vivo, de um jeito que até então Eva não se deu conta. Até o conhecer. Aí tudo parece fazer sentido. Diz que se chama Adamastor, mas todos o conhecem por Adam. Ela acha graça da coincidência dos nomes. Não entende porque ele começa a falar de aparições no céu, naves que cruzam órbitas, seres que brilham no escuro. Os amigos em volta riem, dizem que o rapaz não tem jeito, vai acabar sendo internado.
A festa estende-se para as areias mais próximas. Apenas para os dois. Não é o tipo de diversão que ela procura, mas sente-se atraída pela aglomeração de estrelas cadentes que vê no olhar daquele menino. O amanhecer já se insinua no horizonte, ela pensa em tirar a blusa.
Recusa o baseado que o rapaz enrola bem na sua frente. Sentam-se na areia em frente ao mar, só para fazer hora como um agrado à lua que se despede. Sente frio, ele ri dela. Diz que o seu cabelo parece pegar fogo, assim nas primeiras luzes do dia. Mas ela não tem mais certeza se é dia ou se é noite. Faz piada de si mesma e das metáforas ruins que quer dividir com ele.
Então chega o amigo que ela também conhece, aliás, mais do que deveria. Conhece antes daquele nascer do sol. Olham para o rapaz que parece alto demais, e ela se vê querendo que ele vá logo embora. Não lembra nem do nome. Que leve com ele o nome, o cabelo comprido, a tatuagem de tigre no braço direito, o sorriso que esconde segredos, como o breve passado que compartilharam semanas atrás.
Pela primeira vez, vê o rapaz de aparelho nos dentes hesitar. Mergulha o resto da maconha na areia. Será que ele sabe? Há um quê de medo em seu toque, vontade de agarrar o que ainda não existe. Ela está lá ao seu lado, mas ele nem vê por onde avança o seu olhar.
O outro se vai e ela então se lembra do nome. Alexandre, o grande… engano.
Ela quer fingir que estão em outro lugar e apreciam o último nascer do sol do planeta. Eva quase chora. Ele não a quer ali. Tem certeza de que nunca irão se ver. Também deveria preferir assim.
Seis meses depois, esbarram-se em outra festa chata e ela reconhece o estranho encantamento que a puxa para aquele olhar. Trocam cumprimentos confusos, impressões de um encontro que não havia terminado para nenhum dos dois.
─ Achei que você não tinha ido com a minha cara.
Adam ri, e ela vê que o rapaz não usa mais aparelho nos dentes. Seu sorriso sem amarras de aço parece mais feliz. Acha bonito, quer beijar aqueles lábios.
─ Eu estava com raiva.
─ De mim?
─ Do Alexandre… Por que ele e não eu?
Fica corada, tem certeza de que sim. Sorte que ele não percebe, pois baixa a cabeça e risca a areia com os dedos do pé. Se fosse verdade, ela seria a rainha má?
─ Vai ter uma festa lá em casa… Meu aniversário. Pode ir?
─ Quando é?
─ No próximo sábado…
Ela não diz nada. Fica olhando, esperando por algum sinal que justifique aceitar aquele convite. Trocam números de celulares. Ela não liga. Ele também não. Mesmo assim, ela resolve ir.
E aí tudo começa. O princípio de tudo, a criação. O Big Bang do relacionamento.
A vida desenrola-se como uma narrativa, um memorial herdado, uma tentativa de se fazer ler. Talvez porque os anos seguintes furtem qualquer memória. Debaixo do céu, do pano tingido por cores diversas, percorre-se trilhas por todas as palavras de alguém que talvez muitos chamem de Deus.
─ Tem certeza?
Ela balança a cabeça de forma afirmativa, embora queira negar.
─ Então, a gente…
Silencia antes de completar qualquer raciocínio. Não reflete de fato, só deixa os pensamentos rebaterem nas paredes do seu crânio. Gosta de surpresas, de novidades, mas tudo é novo demais para ele.
Não se ouve mais nada. A ausência de sons cobre todas as camadas de perspectivas. Têm todo o futuro pela frente, aliás é só o que têm, tempo. Cronos determina a ordem dos capítulos. Primeiro, faz-se a luz, e as trevas, que antes orbitavam em volta de um só sol, ganham um novo sentido. Inaugura-se o princípio das eras, e como não é bom que andem sós e a sós, com nova companhia contarão.
Talvez Eva não caiba nos planos de Adam, e provavelmente jamais se contente em ser um simples apêndice entre costelas. Talvez formem o primeiro casal vivendo em um universo inteiro de indagações, probabilidades de desacertos e traições, tudo fora do padrão. Ou, talvez, não.
O espaço e o tempo sopram grãos organizados em montes, um ao lado dos outro, dando a impressão de continuidade, de perpetuação de uma espécie. Não há uma singularidade, mas o grande encontro de um universo anterior, a liberdade em colapso, que se abre ao caos como um buraco negro.
Assim, o universo é parte de um multiverso constituído de inúmeros outros, que se afastam, expandem, se chocam e recomeçam. O processo criativo consiste em uma ideia primeira e pulsante, fragmentada em etapas. A luz, primeiro comando que separa tudo da crescente escuridão, traz o preto no branco do papel: positivo.
No momento indeterminado de uma noite de abril, a existência exige regalias. Aqui, os céus e a terra, o nada e o redemoinho das águas procuram alento ao caos.
─ Mas agora?
─ O que que tem? Não estou querendo nada tão esquisito assim…
─ Empadão de palmito?
Ela arregala os olhos e espera que ele se levante e vá providenciar o sustento das suas entranhas gestoras. Adam se descobre do lençol e da ilusão de ser dono do seu destino.
O ultrassom revela o caos produzido por duas células, a vida conduzida ao estado de aglomeração formando uma imagem difusa em tom sépia, algo que se insinua quase humano. Eva chora, Adam pega sua mão e a beija. Suas lágrimas escorrem por dentro, mas ele está pronto para negar.
O médico olha para o casal. Parecem jovens demais. São jovens demais. Não sabem se devem receber aquela criação com poesia ou prosa. Desconhecem seus próprios gostos e a agudeza do paladar do que virá. Apenas aguardam a surpreendente e intempestiva visita.
A gestação define-se como um substantivo feminino, substância, subjetivo ato ou efeito de criar, de retirar do nada a criação de um mundo. E navega entre as dúvidas de outros seres criados, as maravilhas da imaginação. Aquilo que produzem se tornará algum dia obra concreta. Não há mais espaço para licença poética ou rascunho de um novo invento. E a cada dia, exige-se mais do casal, solicita-se ação de formar, criar, fundar.
E acontece a formação, fundação sem narrativa.
─ E o nome?
─ Valentina se for menina, e Enzo para menino.
─ Enzo?
Ele coça a cabeça, aliviado por não ser Alexandre o nome escolhido. Preocupa-se agora mais com o preço das fraldas do que com a pouca originalidade da escolha de Eva.
Não discutem sobre nada. Nem nomes, nem crenças. Fogem de todo conceito teológico, dos tentáculos religiosos e das correntes filosóficas. Intuição, sentidos mais alertas, apontam para a inevitável questão: que universo será formado a partir da decisão que tomaram de deixar existir a criação?
O Universo continua em constante expansão.
A placenta enche-se de líquidos, protegendo a vida entre as paredes do útero, e assim ocorre a separação entre águas e carnes. Cria-se um esconderijo seguro, o novo lar, onde se pode crescer em paz. Produzem-se novos sintomas e exames se repetem, receitas voam acima da mesa, e os futuros pais procuram manter perspectivas otimistas.
O ventre só abriga a porção de terra seca quando o esqueleto se forma. Juntam-se ossos em alinhamento entre as águas que estão por todos os lados. O organismo que gesta impulsiona órgãos, sangue e fluídos a fornecerem alimento reprocessado de ervas, plantas e frutos ─ Eva é vegana convicta. Com a suplementação receitada pelo médico, o corpo produz a terra prometida, o leite que enche os seios, e alterações como pequenos soluços passam a ser bem-vindas.
Para separar a escuridão e marcar dias, meses e estações, surge o calendário na porta da geladeira. Lá contam-se as semanas, e circulado está o dia do provável nascimento. Dois grandes investimentos são criados ─ uma poupança pelos avós maternos e a aquisição do berço por uma tia esquecida, mas abonada. O pai fita as luzes no firmamento do quarto do bebê, e aguarda impaciente que se faça a separação entre os corpos.
De repente, há mais do que simples contrações de treinamento. Agora é mesmo para valer. O útero ainda retém o oceano de fluídos agitados como se um mundo se enchesse de criaturas vivas e pássaros voassem pelos céus. Eva produz sons cada vez mais audíveis que se amplificam como suas dores. O frutificado ventre multiplica espasmos e esvazia-se de mares com a ruptura da placenta.
─ Respira, amor, respira
─ Cala a boca ou juro que te mato!
Adam silencia sua ajuda e prefere apoiar a parceira de forma não verbal, evitando novas ameaças. Eva sente suas carnes se abrirem como águas do Mar Morto sob a regência do cajado de Moisés.
O médico passa a comandar o jogo da vida, instruindo a jovem no trabalho de parto. Há crescente pressão contra o assoalho pélvico da mãe. Eva em nada lembra as mulheres, também tocadas pelo pecado original, que conseguem parir quase em silêncio, como animais domésticos. Transmuta as dores, vira animal selvagem, fera sem comando algum. Cria, então, seus próprios mandos, o ser primata dentro dela reage à própria imagem e semelhança.
─ Anestesia! Agora, já!
O médico pensa em insistir no parto natural, sem o auxílio de drogas, afinal ela é tão jovem e, certamente, dará conta do recado sem problemas. Mas ao olhar para aquele rosto contorcido de dor, cala-se e solicita ao anestesista a aplicação do sedativo. Eva se vê entre peixes no mar, sob nuvens rosadas, ao lado de aves no céu, e observa o tempo arrastar-se como réptil sobre a terra.
Em poucos minutos, sem a relevância de quem ou do que seria o mais adequado, as dores diminuem, e a criação dá sinais claros de estar pronta para a estreia. A terra mãe, sujeita à turbulenta gestação e às agruras do parto, consegue lidar com corpo e alma, domando tormentos… Ah, bendita anestesia!
Um grito, um empurrão feito explosão, e a vida jorra entre as pernas.
─ Enzo?
Em lágrimas, Adam batiza o filho.
O médico, satisfeito, descreve a criação como “muito boa”. Todos concordam.
Minutos depois, a movimentação cessa. Há silêncio e paz. No leito hospitalar, a mãe descansa e abençoa o dia.
É domingo.
Olá, Costela de Eva.
Resumo do conto:
Acompanhamos um casal: Eva e Adam(astor), paqueras de uma festa, que voltam a se esbarrar e a se encantar, até que em outro encontro se alinham,e o relacionamento traz uma gravidez que é uma espécie de microcosmos de tudo ao redor.
Análise do conto:
O texto é muito maduro e bem escrito. As metáforas são ótimas, e há poesia e ciência vazando pelas linhas. Os diálogos são bons, e os personagens bem contruídos. A adesão ao tema do desafio é muito boa também.
Enfim, parabéns. Conto excelente.
Boa sorte no desafio!
Atende o tema do desafio, ao recriar a parábola de Adão e Eva transposta para os dias atuais.
O tema não é novo, mas o Conto inova na linguagem e na trama ao introduzir a percepção de mundo, das relações sociais e as inquietações individuais na trama.
O conto é muito bem escrito e faz um uso correto da linguagem:
– encadeação coerente das ideias/parágrafos; vocabulário simples, atual e apropriado para o tempo e perfil dos personagens;
– pontuação e formulação cuidadosa das frases, o que é nevrálgico nesse tipo de linguagem, muito próxima da linguagem tematizada ‘clariciana’, que abrange os problemas geracionais, de gênero e sociais via as inquietações e visão de mundo dos personagens.
A narrativa linear e com tempo/lugar definidos – costumes dos dias de hoje (consumo de drogas, festas, fralda descartável, cesárea), Rio de Janeiro e sotaque (sotaque carioca, praia) – sofre mudança abrupta na passagem da primeira fase (fase idílica, de enamoramento, de questões individuais) para a metade final (fase realista, de acasalamento e procriação, de questões a dois).
Essa divisão do tempo, que é cronológica e temática, tem sua razão de ser (mostrar as mudanças de vida e de problemáticas com o passar do tempo). Mas em termos narrativos traz perdas para o Conto, que se torna mais cansativo e pouco interessante: o texto se alonga além do necessário sobre a questão da procriação/gestação, para fazer a ponte e o tema do desafio.
Na sua segunda metade, a linguagem fica mais seca e dura, os diálogos perdem a poética da existência, mesmo quando trata do misterioso e ‘divino’ ato de procriação, predominando a visão da biológica. O idílio e os afetos que promoveram a união do casal parecem dar lugar a questões meramente práticas e de ordem material.
Intencional ou não, esse choque de realidade, presente no texto, de que na vida ‘nem tudo são flores e poesia’ pesa na leitura do desfecho do Conto. Em predominando essa leitura perderá sentido e coerência a enunciação do título – “Fiat Lux”.
Olá, Costela de Eva.
Confesso que seu conto foi bastante desafiador pra mim. Li várias vezes, deixei para comentá-lo por último, voltei, reli mais vezes… E ainda não tenho certeza do que comentar, rs.
Não que seja um conto de difícil leitura ou entendimento. Ao contrário, ele é bem escrito, você demonstra grande habilidade com as palavras, um vocabulário rico e bastante competência para uma narrativa lírica.
Mas aí que reside o problema: não sou bom com narrativas líricas. O que é um problema meu como leitor, claro. Então tentei superar essa barreira para não ser injusto com o conto. Acho que consegui. Ou ao menos espero.
O encadeamento de metáforas típico desse estilo às vezes me parece incompreensível. Tentando deixar isso de lado e focando em cada uma individualmente, eu diria que algumas são muito boas (“Tem aparelho nos dentes e cerveja no olhar”), outras que me pareceram excessivas (“mas sente-se atraída pela aglomeração de estrelas cadentes que vê no olhar daquele menino”), e ainda algumas que, bom, que eu só não entendi mesmo, rs.
Deixando a parte estética pra lá e me focando no conteúdo, esse eu consigo dizer que é muito bom. O enredo é interessante, o casal é bem construído, a história é crível. E, principalmente, a adequação ao tema foi muitíssimo bem feita. Os paralelos entre a concepção da criança e a do universo foram excelentes. Em alguns momentos me perdi com as descrições espaciais, rs, mas captei a mensagem no todo.
Alguns momentos não curti muito. A piada com Alexandre, o grande me pareceu muito deslocada no texto. As opções pros nomes da criança também me parecem algum tipo de brincadeira que não funciona bem aqui. E achei difícil engolir Adam como apelido de Adamastor, rs.
Não sei, tenho a impressão que o estilo mais carregado da narração, com muito lirismo e repleto de metáforas, não casa bem com as tiradas de humor. A narrativa é muito sóbria, até meio grandiloquente, as piadas são uma quebra muito grande.
Quando o texto acerta o tom, você entrega momentos muito bonitos, imagens fortes, poéticas. Esses momentos mostram uma técnica muito apurada na escrita.
Também gostei da construção do relacionamento. Sobretudo o início, com os jovens meio inadequados e cheios de sentimentos. É bem fácil escorregar nesse tipo de história, mas você a conta de forma segura. Acho que você correu alguns riscos ao abandonar uma forma mais tradicional de descrever algumas cenas e apostou tudo nas analogias. Creio que foi uma aposta que valeu a pena. Precisei reler algumas vezes pra perceber isso, mas só reli porque o texto tem qualidade.
A essas alturas já nem consigo mais me distanciar do conto pra avaliá-lo direito. Sei lá se gostei ou não, rs. Mas posso dizer que me chamou a atenção e fez com que eu me esforçasse pra acompanhá-lo. Isso, por si só, é um grande mérito. E eu o reconheço.
É isso, meu comentário não tinha como não ser confuso. Mas juro que foi o melhor que consegui. ¯\_(ツ)_/¯
Um abraço e boa sorte no certame.
Olá. Fiat Lux (“Faça-se luz”) narra a história de um relacionamento, desde a sua génese ao nascimento do filho. É narrado de forma elegante, feito por quem tem evidente traquejo literário. Fiquei, no entanto, à espera de algo diferente, talvez motivado pela imagem do conto. No final, fiquei algo desiludido com a normalidade da história do girl-meets-boy (desilusão essa completamente mitigada pela qualidade da narrativa). A autora soube esquivar-se aos clichés românticos que tornariam a leitura do texto um exercício desmotivante. A leitura é fluída, a ligação ao tema é feito através da criação / geração + nascimento do bebé.
Resumo: Eva conhece Adam (Adamastor) em uma festa e acabam ficando juntos. Por razões furtivas eles se separam, mas voltam a se encontrar meses depois, o que os leva a perceber que estão destinados um ao outro. Contemplando as estrelas nos olhos de Adam, Eva se entrega e, sua explosão de contentamento da luz a chegada de um novo ser. Enzo é a personificação do ciclo que permeia o reencontro e o amor existente entre Adam e Eva.
Pontos fortes: Tem uns textos neste certame que possuem uma logica de acontecimentos invejáveis. Este com certeza é um deles. Um conjunto de cenas bem descritas, narradas de forma quase poética. A gestação é tão bem detalhada que faz o autor mergulhar no texto pensando em como será o ato seguinte. Cria uma espécie de pensamento que oscila entre o medo de algo dar errado e a certeza de que tudo vai dar certo.
Pontos fracos: Não há, na minha opinião.
Comentário geral: Titulo (outro que me leva a pensar se tratar de um texto enfadonho e sem nexo algum). Para minha surpresa, o texto revela-se prazerosamente ser um dos melhores no certame. Senti falta de citar a palavra engrenagem de alguma forma, mas isso não é relevante. Talvez, por que este certame tenha nos levado a pensar que isso é quase uma obrigatoriedade. Ou, por que fica mais fácil associar com esta categoria de contos. tem engrenagens aqui, mas ocultas, estão bem casuais, mostradas a dedo em certas fases do conto.
Boa Sorte autor!
Muito lindo! Adorei as referências bíblicas e as descrições poéticas. Um conto rico e muito bem escrito, cheio de lirismo. Parabéns!
O conto é a história de Eva e Adam, um casal que namora, casa e tem um filho. Esse é o argumento e ao redor dele, são alinhavadas metáforas, sentidos figurados, etc. e tal.
“Faz piada de si mesma e das metáforas ruins que quer dividir com ele”. Não sou eu que estou dizendo, é a Eva.
Adam e Eva, uma clara analogia ao Adão e Eva Bíblicos, ao Gênese. Uma história simples ornamentada por frases elaboradas. Boa sorte.
Adoro a cadência do texto. Frases enxutas, tudo muito bem escolhido. Até os diálogos foram bem escritos.
Parabéns! Dos melhores textos dessa leva.
Eva conhece Adam e se encanta por ele. Se reencontram meses depois e iniciam um romance que resulta em uma nova criação: Enzo.
O texto é ágil, ligeiro, incomum e poético. Usa e abusa do jogo de palavras para produzir efeitos que saltam do texto. A prosa segue elétrica até o final, mas perde um pouco do brilho, quando se apoia num cotidiano raso. Parabéns e boa sorte.
Primeiramente, não serão considerados gosto pessoal e nem adequação ao tema, já que o mesmo passou a ter entendimento extremamente esparso. Para evitar injustiças por não compreender que o autor fez uso dos termos escolhidos, ainda que em sentido figurado, subjetivo, entenderei que todos os contos terão os pontos correspondentes a este quesito.
A minha avaliação é sob a ótica de um mero leitor, pois não tenho qualquer formação na área. Irei levar em questão aquilo que entendo por “qualidade” da obra como um todo, buscando entender referências, mensagens ocultas e dar algumas sugestões, se achar necessário.
Agora, meus comentários sobre o seu conto:
Tem algumas coisas que não foram muito do meu gosto pessoal. Achei o casal um tanto sem química, fora que individualmente não me passaram muito carisma. Pela qualidade da escrita, sei que isso poderia ter sido um pouco diferente se houvesse um espaço maior para o desenvolvimento. Mas eu precisaria vê-los em outras situações que não fossem apenas festinhas, bebedeiras e fuminhos de maconha na praia.
Também senti que todos esses trocadilhos com os nomes dos protagonistas e a forma como foi conduzida a gravidez tiveram como intenção justificar o tema do desafio sobre “criação”. Confesso que se fosse levar em conta o quesito “adequação ao tema”, isso perderia uns pontos. Como dito acima, não estou considerando para nota final.
De pontos positivos, o texto é bem escrito e eu gostei bastante das figuras de linguagem, como em “Dez meses mais velha, cinco centímetros mais sóbria, vinte quilos menos perceptível.”, mas o parágrafo como um todo descreveu de maneira bacana o casal protagonista.
Boa sorte.
Primeiramente, gostaria de dizer que gostei da analogia entre a criação do mundo e as questões do relacionamento e da gravidez. Achei bem interessante. Mas, tenho que reconhecer que, pessoalmente, o texto não faz o meu tipo. Mas é mais uma coisa pessoal. Me senti lendo um livro da Giselda Laporta Nicolelis, que fui forçado a ler quase todos na escola, e nunca gostei do jeito que ela aborda as temáticas da juventude, gravidez na adolescência, drogas, namoro etc. então acho que carrego esse trauma sempre que leio algo do tipo.
Outra coisa que eu notei foi uma escolha de descrições que você faz, principalmente no início do texto ex. “Dez meses mais velha, cinco centímetros mais sóbria, vinte quilos menos perceptível” e “sua risada tem sotaque carioca”. Achei um pouco diferente, por algum motivo. Me remeteu a uma escrita lírica, típica de quem escreve poesia. Não sei se é o caso.
FIAT LUX (Costela de Eva)
Comentário:
“Faça-se a luz”
O conto provoca exatamente isso no leitor. A leitura soa como uma prece interior. Cada palavra, silenciosamente, vai construindo um relato que inunda a alma de poesia. E, neste texto, não há um único parágrafo que não espalha encanto.
Afirmo que, entre as leituras e avaliações feitas até agora, este conto é o meu preferido. Além da belezura da história, do amplo atingimento do tema, a técnica da narrativa me enlaçou. Prosa poética é cachaça que não descarto, nunca. E o autor esbanjou habilidade, tem mestria nesse quesito. Esse é o texto que me traz uma certeza: gostaria de ter escrito.
Trabalho feito com extrema competência de escrita, sem qualquer deslize. A leitura voa sem qualquer barreira, um deleite.
Algumas pérolas que me enterneceram:
“mas sua risada tem sotaque carioca.”
“Se o destino tivesse aquele som, teria de ser reescrito linha por linha.”
“Nem ouve. Escuta outros sons, agudos loiros, timbres esguios e decadentes.”
“Tem aparelho nos dentes e cerveja no olhar.”
“Não entende porque ele começa a falar de aparições no céu, naves que cruzam órbitas, seres que brilham no escuro.”
“mas sente-se atraída pela aglomeração de estrelas cadentes que vê no olhar daquele menino.”
“Há um quê de medo em seu toque, vontade de agarrar o que ainda não existe.”
“Seu sorriso sem amarras de aço parece mais feliz.”
“A vida desenrola-se como uma narrativa, um memorial herdado, uma tentativa de se fazer ler. Talvez porque os anos seguintes furtem qualquer memória. Debaixo do céu, do pano tingido por cores diversas, percorre-se trilhas por todas as palavras de alguém que talvez muitos chamem de Deus.”
“O processo criativo consiste em uma ideia primeira e pulsante, fragmentada em etapas. A luz, primeiro comando que separa tudo da crescente escuridão, traz o preto no branco do papel: positivo.”
“Adam se descobre do lençol e da ilusão de ser dono do seu destino.”
“Suas lágrimas escorrem por dentro, mas ele está pronto para negar.”
“Não sabem se devem receber aquela criação com poesia ou prosa.”
“Não há mais espaço para licença poética ou rascunho de um novo invento. E a cada dia, exige-se mais do casal, solicita-se ação de formar, criar, fundar.”
Posso ficar aqui escrevendo elogios, elogios, elogios… Mas vou cansar o autor, não quero fazer isso. Quero que ele esteja sempre descansado para produzir outras belezas como este conto.
Parabéns, Costela de Eva!
Boa sorte no desafio!
Abraços…
FIAT LUX (Costela de Eva)
COMENTÁRIO
O Conto é uma construção de metáfora e intertextualidade entre as Teorias da Criação – a gênese judaico-cristã e a do jesuíta Georges-Henri Lemaitre – e o relacionamento de dois jovens. Sendo a intertextualidade quase alinhada ao Capítulo Hum do livro sagrado dos cristãos, o texto elenca de forma clara e também subjetiva partes dos elementos da gênese como estão registradas ali.
Ao abordar a história do um relacionamento entre o casal Eva e Adam, o texto trabalha o amor com seus problemas cotidianos emprestando com as metáforas sentidos e significados diferenciados.
Ao longo de sua construção textual o onisciente que apresenta a importância de ambos na constituição da realidade que escolheram. Mostra também que ambos temem que as suas singularidades possam afetar o futuro que estão construindo já que apesar de jovens, têm a capacidade de notar as suas próprias deficiências e o medo, insegurança e ciúmes são algumas delas. E podem ser considerados como o núcleo antagônico.
A linguagem usada é a poética e o campo semântico estende-se por todo o texto apontando a origem do Universo, como já referido. A essência poética surge em alguns fragmentos tais como a metáfora para promessas em: “mas sente-se atraída pela aglomeração de estrelas cadentes que vê no olhar daquele menino.” ; a personificação em : “O amanhecer já se insinua no horizonte” e em “só para fazer hora como um agrado à lua que se despede”; a comparação em “Diz que o seu cabelo parece pegar fogo, assim nas primeiras luzes do dia.” – parece que ele também tem uns poemas na alma.
Há ironia expressa no tom da lembrança do nome do ex, que usando da referência com o vulto histórico, acresce ao cognome de Alexandre a sua decepção: engano. Sacada óbvia, porém legal.
Já no primeiro instante do texto apresenta a revolta hormonal e a força de vontade dos jovens como uma explosão em potencial e a referência indireta ao Big Bang surge de pronto em :”(…) o arrastão da vida não perdoa”. A descrição física de Eva em si é um jogo de figuras de linguagens dignas de nota. O jogo entre o poético e o humor aparece em “Cinco centímetros mais sóbria” e também na percepção da estética proposto por “vinte quilos menos perceptível” é de uma elegância textual vista em poucos escritores contemporâneos.
Ainda no campo da formação do Universo o surgimento de Alexandre é uma semelhança com o choque de meteoros que abala o que “ainda não existe”.
A alusão ao padrão silábico brasileiro CV – que é observado pelos falantes do português brasileiro apenas no ambiente de uso da palavra mas, sem necessidade de conhecimento linguístico – aparece no texto na sensação de desconforto que Eva tem com o nome completo de Adam, ela percebe mais nítida a presença das consoantes. E ela quebra, ou melhor, o narrador desconstrói o desconforto com a crítica embutida no pensamento da personagem como mais poesia: “mas sua risada tem um sotaque carioca.” E volta para a impressão como o padrão silábico: “São muitas consoantes e nenhum sentido. Se o destino tivesse aquele som, teria de ser reescrito linha por linha.” Voltando à risada com sotaque é interessante que a construção sinestésica ocorre no campo oral boca-ouvido-boca de forma descompromissada e de novo o bucólico e o humor se encontram.
Já as impressões negativas que a personagem tem sobre o seu romantismo pode também ampliar a ideia de destruição que precede a criação, pois ao estar na gaveta – poesia e eu lírico -, pelo sentimento que a rodeia, são mais como poeiras de galáxias abortadas do que memórias de amor. E em todas essas o campo semântico trabalhado é de negação de si mesma e apequenamento da estima: medo; esconde o eu lírico – que reitera a ideia de que os poemas guardados são autorais; complexos, dúvidas, insegurança – que surge na busca de admiração. Entretanto, tem seus próprios limites já que recusa o baseado ofertado.
Aqui vai minha colher de pau: Busca de aceitação aceitável na personagem por sua idade, entretanto, hoje vemos isso em todos os lugares, pessoas que fazem grandes citações, mas que não possuem profundidade. E nem têm poesia nas gavetas.
A sugestão de que a união se dá mais por decisão dela do que dele surge na frase: “a moça tem pressa”, entretanto ele está ainda absorto, não a ouve, embora já esteja percebendo-a: “Escuta outros sons, agudos loiros, timbres esguios e decadentes.”. E vale lembrar que o narrador coloca mais os sentimentos e impressões de Eva do que de Adam. Assim, a tal decadência que aparece na frase é mais da visão feminina que do rapaz.
O olhar do jovem recebe uma conotação etílica para justificar seu estado de semiembriaguez, lembrou-me outro olhar, mas ali a ressaca era do mar. O tempo surge e vai se repetir adiante no Conto,aqui para justificar o motivo que o afasta da festa e para introduzir a empatia sobre seu estado de saúde: “será que esse garoto `tá morrendo?” e ela logo depois vem a frase que é uma constatação até filosófica, afinal, ao conhecê-lo ela percebe o quão vivo ele está e alguém já disse que essa percepção é pura noção de consciência – um beijo aí em seu lugar de descanso, Alan Watts. E para o texto, o inquebrável Adamastor tem consciência sobre outros planos: “ Não entende porque ele começa a falar de aparições no céu, naves que cruzam órbitas, seres que brilham no escuro” e, para corroborar minha interpretação absurda, aparece a afirmação castradora da consciência: “ Os amigos em volta riem, dizem que o rapaz não tem jeito, vai acabar sendo internado.” E vale frisar o que a voz popular repete à exaustão: “de boas intenções o inferno anda cheio”.
O conto tem algumas contribuições da Onomástica interessantes. Há as que sugerem e as óbvias. Para fazer menos óbvia o nosso Adão surge como coincidência apenas, tanto que seu nome é Adamastor, que de inquebrável tem pouco. Alexandre também aparece no contexto étimo, seja essa referência acidental ou proposital, o fato de ele surgir maior que eles, mesmo que não para proteger, já que é parte do núcleo antagônico do Conto. Núcleo esse feito no ambiente dos sentimentos negativos: insegurança e ciúmes.
O jogo de palavras mostra todo um universo rico da linguagem. O tempo, Cronos e a ordem dos capítulos, a alusão à divisão de trevas e luz que vale a pena citar: “Primeiro, faz-se a luz, e as trevas, que antes orbitavam em volta de um só sol, ganham um novo sentido.” e aparece Gêneses dois, dezoito: “não é bom que andem sós”
E lá vamos de Big Bang: “O espaço e o tempo sopram grãos organizados em montes. (…) a liberdade em colapso, que se abre ao caos como um buraco negro. E quando “ a existência exige regalias”, surge o brilho de uma metáfora; “Adam se descobre (…) da ilusão de ser dono do seu destino.”
Fiat Lux é uma explosão de uso adequado da linguagem. Há algumas aliterações, porém a que ocorre com o prefixo sub envolvendo a definição de gestação “substantivo (…) , substância, subjetivo” é muito interessante
A construção do relacionamento é ainda primata, sem arroubos intelectuais, só instintivos: “Não discutem sobre nada. (…) nomes, (…) crenças. Fogem de todo conceito teológico, (…) tentáculos religiosos e das correntes filosóficas.” Como os primórdios de tudo “O Universo continua em constante expansão.”
Gênese, o livro, capítulo hum, versos nove e dez, surge na referência sobre a separação das águas e terra: “e assim ocorre a separação entre águas e carnes.” e se repete em “O ventre só abriga a porção de terra seca” e explicado na formação dos ossos dentro âmnio: “quando o esqueleto se forma. Juntam-se ossos em alinhamento entre as águas que estão por todos os lados.” e, ainda em “aguarda impaciente que se faça a separação entre os corpos.” O verso vinte oito surge em “O frutificado ventre multiplica “.Já o verso quatorze surge em “Para separar a escuridão e marcar dias, meses e estações(,)” e o versículo dezessete em “O pai fita as luzes no firmamento do quarto do bebê(,)”.
A nova referência direta à gênese surge na figura do médico, afinal é ele que passa a comandar “o jogo da vida”. E mais um referente interessante agora a figura da cobra retoma de forma indireta o tema e ela comparada ao tempo.
Diferente das mulheres pós pecado original à nova Eva tem voz e vontades: “Eva em nada lembra as mulheres,(…) que conseguem parir quase em silêncio”, a submissão foi retificada, ela não se vê como um animal doméstico, entende que pode falar e até ser imperativa quando necessário: “ Cala a boca ou juro que te mato!”. Já o novo homem vai devagar, tem uma postura mais cooperativa e exerce a sabedoria: “ Adam silencia sua ajuda e prefere apoiar a parceira de forma não verbal, evitando novas ameaças. Na sequência há um erro sobre o evento mosaico, na Bíblia o mar aberto é o Vermelho, entretanto, a comparação é válida e inteligente.
A escolha do nome se volta de novo ao novo método de criação familiar em que nossa sociedade aceita os filhos como senhores da casa, Enzo, o nome escolhido, na narrativa surgindo como uma escolha duvidosa, não é uma nomenclatura tão insossa assim, embora comum. Do germânico Heinz, em que heim é casa e rick senhor, juntos significando “senhor do lar”. Mais algumas referências diretas ao primeiro livro do pentateuco: “O médico, satisfeito, descreve a criação como “muito boa”. “ e o descanso da mãe, que diferente da Bíblia, ocorre no domingo.
E aí está. A luz se fez!
Costela de Eva, sorte no Desafio
PS
*O primeiro astrônomo a acreditar no Big Bang foi o padre jesuíta Georges-Henri Lemaître. Sua ideia foi ampliada mais tarde.
Prezado Entrecontista:
Para este desafio, resolvi adotar uma metodologia avaliativa do material considerando três quesitos: PREMISSA (ou Ideia), ENREDO (ou Construção) e RESULTADO (ou Efeito). Espero contribuir com meu comentário para o aperfeiçoamento do seu conto, e qualquer crítica é mera sugestão ou opinião. Não estou julgando o AUTOR, mas o produto do seu esforço. É como se estivéssemos num leilão silencioso de obras de arte, só que em vez de oferta, estamos depositando comentários sem saber de quem é a autoria. Portanto, veja também estas observações como anotações de um anônimo diante da sua Obra.
DR
Comentários:
PREMISSA: rapaz-encontra-moça numa clara alegoria ao casal primordial (Adamastor e Eva), encontros e desencontros – algumas vezes resvalando no Eduardo e Mônica, da Legião – até chegar à criação de uma nova vida, o nascimento do primogênito.
ENREDO: o autor constrói as situações de encontro e desencontro do casal, a vida a dois e a paternidade/maternidade como elementos essenciais da criação. Trata de temas como a inadequação, o ciúme, a possessividade, etc.
RESULTADO: o resultado final é muito bom, o que poderia ser uma história como outra qualquer se torna emblemática e simpática ao leitor. Boa sorte no desafio!
Fiat Lux
Olá, autor.
Que belo texto. Um primor teológico e filosófico, eu diria, apesar de parecer que tentou retirar o “Teo” dessa equação a todo custo (não foi?). Compreendi que você nos apresenta uma série de paralelos entre os eventos da criação do mundo e a gestação (do relacionamento e de um filho). Sensacional. Permita-me, sabendo que o texto é composto por metáforas em sua maioria, mas, percebendo a visão da criação do mundo que você claramente revela através delas (ao substituir a ação de um agente criador pelo acaso autoformador), separei alguns trechos para analisar (além da nota 10 que darei a você):
“Primeiro, faz-se” (um fazer autopromovido? Uma ação sem agente?).
“que antes orbitavam em volta de um só sol ” (“antes”?, mas a luz e as trevas, não eram “primeiro”?).
“A luz, primeiro comando que separa tudo…” (“comando”. A luz é um agente capaz de realizar uma ação?).
“O espaço e o tempo sopram grãos…” (“sopram”, outra ação sem agente?).
“O processo criativo consiste em uma ideia primeira e pulsante” (sim, uma ideia, concepção, plano).
“O ultrassom revela o caos produzido por duas células…” (o caos que gera ordem? E se repete, sempre, milhões de vezes, o mesmo caos, gerando quase sempre a mesma ordem?).
“Para separar a escuridão e marcar dias, meses e estações, surge o calendário” (novamente “a ordem” surgindo, do caos, perfeita, repetida igual, milhões de vezes).
Perdoe-me por tanto recorte, mas é que esse é um assunto que por demais me interessa, e como o leitor apreende através das lentes que possui, bom…já foi.
Critério de avaliação CRI (Coesão, Ritmo e Impacto):
Coesão – A parte inicial me levou para outros temas, sinceramente falando. Parece, a princípio, muito descolada de tudo, vago demais, mas, logo as ideias começam a convergir para o que seria o centro da narrativa, a saber, a criação humana (que aqui você confere ao casal). Confesso que essa primeira parte não tem comparação em termos de poder de atração, sensibilidade e construção narrativa em relação à parte “do meio para frente”. A segunda é imensamente melhor, a ponto de ter achado a primeira um pouco cansativa até. Na minha avaliação, reduzir as cenas de encontros, ou até a ocorrência deles, tornaria o texto bem mais coeso e poderoso no sentido da sensação de leitura.
Ritmo – Pois é. A observação sobre a coesão aplica-se aqui. Penso que começou meio devagar e foi intensificando o ritmo e a sensação. Normal e tenho certeza de que você, pela maturidade que demonstra ter na escrita, planejou assim, contudo, mantenho minha sugestão de enxugamento no início, se assim desejar.
Impacto – Maravilhoso. Apesar de ter percebido no texto a necessidade de conferir o milagre da vida a outros (seres ou espaços ou circunstâncias, ou, à mulher) que não ao Criador (segundo creio) do toda a Palavra, maravilhoso. O milagre é o mesmo.
Destaco o trecho “A placenta enche-se de líquidos, protegendo a vida entre as paredes do útero”…Sim, a vida, ela está lá, desde o início.
A ideia de estabelecer um paralelo dos eventos da criação descritos em Gênesis com as fases da gestação, foi realmente espetacular. Sem dúvida o melhor do texto. Vou inclusive perguntar ao meu pastor se ele já pensou nisso (rsrs), pois seria mais uma das formas didáticas de descrever a genialidade Da Pessoa.
Parabéns pelo texto. Amei, de verdade.
Olá, Costela de Eva!
Seu conto tem muita poesia, é rico em metáforas inteligentes e uma pitada de clichês da gravidez e parto, tudo isso junto e misturado, cria-se um ótimo texto!
Gostei muito do paralelo entre a criação do mundo e a criação de uma vida, ficou muito bom!
A escrita em si é uma obra à parte, dá pra notar que o/a autor/a é muito experiente e entende profundamente do assunto.
Parabéns pela participação e pelo texto poético e inspirado.
Boa sorte 😘
Olá, Costela de Eva, cá estou eu às voltas com a sua narrativa. Traz-me a história da Eva, do Adamastor e do bem-vindo Enzo. Ficou legal a história que você me traz. Sim, gostei do conto da criação. E a luz se fez com a chegada do Enzo, não é? Uma narrativa bem escrita, um conto que segura a atenção, uma história que a gente fica tem horas que em dúvida se irá romper para um relacionamento, ou se terminará qual acaba a espuma das ondas ao se deitar na areia. O conto está bem escrito, você tem um domínio bem legal da nossa complexa língua portuguesa. Só um detalhe, Costela de Eva (estranho esse seu apelido, mas faz sentido no conto, risos), o cajado de Moisés fez com que se abrisse, pelo menos eu acho, o Mar Vermelho e não o Mar Morto. Fica com o meu abraço, bacana a sua história, parabéns.
Texto escrito com exímia competência. Indigno de reparos. É isso: está pronto – o texto e o escritor. Era de se esperar que, em um desafio sobre criação, a gestação fosse lembrada. Seria um lugar comum, não fosse a excelência do escritor que se debruçou sobre o tema. No texto, nota-se a qualidade daquilo que eterniza: a capacidade de abordar temas óbvios de uma maneira única. O desfecho não brilha aos brutos, mas cega os sensíveis: um domingo qualquer. Só um domingo, um nascimento, nada mais. Revisão gramatical e ortográfica perfeitas. Frases enxutas, pontuação precisa, prosa poética, analogias inteligentes, remissões perspicazes. Um texto perfeito, com bom ritmo e elegância. Criou-se aqui um verdadeiro abismo com os demais textos do desafio: a península se rompeu e a jangada foi lançada ao mar. Quem ficou no continente que lute.
É o amor, né? Ou o companheirismo fundido com as consequências de decisões impensadas? Não sei, mas, com certeza, Enzo receberá amor.
A narrativa que escolheu para o conto é pesadamente filosófica e poética, sabia? Teve partes que me perdi, uma perdição mista, entre cansaço e desejo de continuar; e teve momentos em que eu mergulhei fundo na história. As reações, os detalhes pequeninos, o silêncio esclarecedor, nossa, me encantam. E você coloca isso no conto de forma sensível. Escreve muito bem. Mesmo tendo trechos cansativos, para mim, ao menos, eu consegui apreciar a leitura. Ela foi lenta, eu procuro mais agilidade, normalmente, mas às vezes essas imposições podem ser boas.
Eu esperava encontrar um conto com essa temática, então não me surpreendi ao final do conto. Que seja feita a luz: no sentido da maternidade, com amor, dor e alívio. Eu gostei muito do início, mas ele criou uma expectativa diferente, devo admitir. Eu pensei, no final do primeiro ato, que o texto iria focar no relacionamento, nos seus ciclos, sempre descrevendo o início deles. A criação deles. O encaminhamento não ficou ruim, mas o início é tão longo, tão descritivo e imersivo, que criou uma personalidade própria. Não sei se isso é um problema, mas eu preferia um início mais rápido, talvez contando apenas o primeiro contato deles, num parágrafo ou dois, para depois focar na gestação. Eu senti que são duas partes diferentes, que não se complementam, infelizmente. Essa foi a única coisa que me deixou encucado, haha.
Gostei do conto, a leitura foi interessante e amei alguns trechos, alguns momentos. Destaco a aparição do Alexandre, como toda a cena se desenvolve sem uma palavra trocada. Eu simplesmente amei essa sutileza. Sério, vi-me no meio deles, naquela situação, vivenciando a troca de olhares, o medo, o arrependimento, a vergonha. Eu gosto muito dessas coisas. E você teve habilidade e sensibilidade para trazer alguns momentos assim. Parabéns, de verdade.
É isso, haha, você escreve muito bem e tem minha admiração. Meio denso, mas o fraco aqui sou eu! Parabéns, novamente!
Encontros de dois jovens, a gestação e o nascimento de um novo ser.
No texto, o tema foi tomado de forma literal, o ato ou efeito de conceber ou gerar um ser no útero e o nascimento. E, “a luz se fez”.
O tema é bem trabalhado, usando como recurso recortes genéricos de relacionamento entre jovens, que termina em uma gravidez inesperada. São explorados aspectos, situações típicas e questionamentos comuns a todos. Até os nomes das personagens conotam que, desde o início dos tempos, é assim que se dá a procriação.
O texto consegue prender a atenção do leitor do início ao fim, em busca de mais informações, bem escrito e, se não traz um impacto maior no epílogo, o “é domingo” ficou interessante.
Parabéns pela participação, boa sorte. Um abraço.
Criação: Aqui a criatividade está na forma e não no conteúdo. Trama simples, não há surpresas, a brilhante construção da prosa poética por si só traduz a existência.
Engrenagem: Considero o primeiro parágrafo importantíssimo. Ele pode ser um pé na porta ou um leve toque na campainha, mas tem que ser sentido pelo leitor. Aqui o (a) autor (a) usou a sutileza de uma chave mestra. Texto enxuto e estiloso. A agilidade da trama dá o tom leve sem perder a profundidade das relações humanas.
Destaque: O texto tem várias passagens legais, mas esta está um primor, coisa de quem domina as palavras com o pé nas costas: “ Eva se vê entre peixes no mar, sob nuvens rosadas, ao lado de aves no céu, e observa o tempo arrastar-se como réptil sobre a terra.”.
Não há matéria prima melhor para o escritor do que gente. Penso assim. Sempre haverá, entre duas pessoas, uma história para contar. Aqui, você nos trouxe mais uma narrativa sobre relacionamentos, vínculos afetivos e o caminhar da vida numa nova que chega ao mundo. Impressionante como, dependendo da maneira que é contada, o conto não fica enfadonho. Gostei das descrições na maneira de conduzir a gestação e, confesso, tenho um fraco sobre o tema (escrevi um livro inteiro de contos à respeito), ou seja, revivi momentos pessoais através da sua literatura.
Acho que, assim como outros contos desse desafio, você abordou ambos os temas de forma harmônica, que é nada mais do que discutir nosso papel no cosmos e como atravessamos a experiência da existência. Batizar os personagens com nomes bíblicos foi um capricho. Agora, convenhamos, Enzo é ruim demais (brincadeira).
Parabéns pelo conto.
Grande abraço!