Ao abrir os olhos, acordado da soneca por um tranco inesperado no até então suave balanço do ônibus de linha, já havíamos passado há uns bons cinco minutos de Bento Ribeiro. Olhei ao redor, surpreso, pois desde a Candelária, em mais ou menos uma hora de viagem, o ônibus permanecia praticamente vazio e ninguém ocupava o lugar ao meu lado. Como há muitos anos não voltava a aquelas paragens, muito antes que inventassem os assentos preferenciais para idosos, não me pareceu normal tão pouca gente viajando no meio da tarde. Para minha vista cansada, não era só aquele transporte e a paisagem suburbana que estavam muito diferentes dos meus tempos de criança. Era o mundo inteiro que havia mudado.
Depois de rodar o país e o estrangeiro, em meus muitos momentos de aventuras, tristezas e vitórias, finalmente estava voltando para casa: aquela era minha última visita a Bangu. Cabeça já branca, cabelos finos encostados no vidro da janela, balançando ao vento vespertino. Do lado de fora, a arrabalde revelava, em um ou outro ponto, os acidentes geográficos que eu não mais reconhecia – morros ocupados, ruas loteadas por letreiros de comércios, prédios de todos os tamanhos – e os pequenos acidentes do trânsito caótico de carros e caminhões, em busca de uma saída em direção à Avenida Brasil. Ou, como me ensinou Totoca, a Rio-São Paulo. Isso, no tempo em que tudo ali era mato, e só havia aquele caminho até a escola.
Totoca era meu irmão mais velho. Ele me mostrou como atravessar a rodovia, sapatos na mão para não sujar no barro, em direção à aula. Só depois da travessia segura, olhando para os dois lados, podíamos colocar os calçados nos pés. Comecei a estudar aos cinco anos de idade. Por que tão cedo? Porque eu aprendi a ler sozinho. Nunca soube explicar como, nem porquê dessa proeza, palavra usada por tio Edmundo, o mesmo que me deu um cavalinho de madeira de presente pelo feito. Já os de casa aproveitaram para se livrarem de mim e de minhas peraltices, pelo menos no período da manhã, me colocando sentado numa carteira escolar o quanto antes.
No reflexo do meu rosto na janela, mesmo com as rugas profundamente cavadas, eu podia vislumbrar as lembranças e traços da fisionomia de Totoca e de cada um dos meus outros irmãos: Glória, Godóia, minha protetora; Jandira, namoradeira; a outra, que foi dada pra ser gente aos parentes do nordeste; os dois anjinhos que morreram, ainda pequenos; e meu irmão menor, Luís. De cada um deles, um sinal, uma ponta de queixo, uma sobrancelha; ou apenas a mesma tristeza no olhar.
Tudo era motivo e razão para aquele meu desejo de retorno. Meus irmãos, meus pais. Manual Valadares. E Minguinho.
O ônibus parou no ponto sem que fosse preciso puxar a cordinha para alertar ao motorista. Desci os degraus, cuidadoso. Era quase meio da tarde e nada ali parecia com o quintal da minha infância. Onde era mato, agora havia gente circulando, buzinas, gritaria. Praticamente uma fotografia antiga, colorizada, que se desvanecia aos poucos à minha frente, numa cena de transição entre o progresso e confusão.
Vagamente desorientado, passei em frente a um bar de esquina que me lembrou muito o Miséria e Fome, antigo armazém e banca do bicho onde gastei meus tostões contados para comprar seda de balão e pipas. Agora, não havia mais secos e molhados, nem apostas. Apenas uma fachada para mais uma das muitas boca de fumo, naquela área dominada pelo tráfico e a milícia local.
Na Barão de Capanema, surgiram um enorme viaduto e várias passarelas, contornando o caminho até o outro lado da linha do trem. Isolada por muros altos e pichados, a via férrea não era mais a trilha reta e aberta pela qual caminhávamos antigamente. Foi então que ouvi o apito estridente e profundo.
Era ele.
O Mangaratiba. O Assassino. O Trem da Morte.
Espalhando fumaça de carvão e terror, rodas de ferro a esmerilhar as moedas que os outros meninos deixavam em cima dos trilhos.
(Nunca fiz isso com eles. Cada tostão conquistado com minha caixa de engraxate devia ser muito bem guardado. Ou aplicado em bolas de gude.)
Mangaratiba era o monstro que um dia levou meu amigo Manuel Valadares.
Ironia do destino eu ter dito a ele, dias antes, cansado das surras e tristezas da minha então curta existência: “Portuga, hoje de noite eu vou me atirar embaixo do Mangaratiba”. Mas ele não deixou. E mesmo com meu juramento em contrário, em nome da nossa amizade, e a promessa de ir direto para casa, permaneceu em seu carro até tarde da noite, no cruzamento, aguardando a última passagem do trem só para ter certeza de que eu havia mesmo desistido.
Não morri, ali, naquele dia.
Mas um pouco, depois, quando ele se foi.
Aliás, todos eles já se foram.
Até o apito do trem de ferro, perdido no passado.
Subi vagarosamente a rua, agora pavimentada com o asfalto barato das eleições e ladeada de calçadas sujas, estreitas, onde as cadeiras não mais descansavam, com os vizinhos em conversas fiadas dos fins de semana. Casas simples, construídas pela Fábrica de Tecidos Bangu, antigamente com seus muros baixos e roseiras nos quintais, agora escondia-se covardemente atrás de muros altos, todos adornados no topo com cacos de vidro, arames farpados ou cercas elétricas. Triste vizinhança, onde brincávamos felizes e tantas aprontei…
“ Zezé, você me ensina a ganhar bola de gude no jogo?”
Dois meninos pequenos brincavam ao lado da calçada. Deviam ter três e cinco anos. Um, loirinho e miúdo. O menorzinho, de grandes olhos castanhos, curiosos, brilhando ao ver o mais velho com os bolsos cheios.
“Ah, Reizinho, seus dedos ainda são muito pequenininhos para tacar do jeito certo. Presta atenção e olha só como eu faço”.
Mirou por um instante, fechando um dos olhos para caprichar na pontaria, a bolinha transparente esperando no centro do círculo traçado na areia. Com o impulso certeiro do seu polegar, a bolinha azul acertou a outra em cheio, arremessando-a para fora da área de jogo.
O pequenino aplaudiu a manobra bem sucedida, com orgulho e inocência, enquanto o mais velho recolhia ambas as bolinhas.
“Taqui, pega essas coloridas pra você brincar. Essas duas são as mais bonitas que eu tenho. Quando você crescer um pouco, vou te ensinar a jogar não só o círculo, mas o búlico, meia-lua e a estrela. Daí, ninguém vai ganhar do meu Rei Luís”.
“Ah, Zezé, vou treinar lá no Jardim Zoológico !!”
Era o galinheiro do fundo do quintal.
“Não faz maldade com a Pantera nem com a Leoa, hein? E não joga as bolinhas na janela da casa dos vizinhos, tá bom?”
Falava por experiência própria.
“Tá, eu prometo.”
O pequenino se foi. Eu me aproximei do mais velho.
– Menino, sabe onde é a casa do seu Paulo Vasconcellos?
“Papai não está em casa, foi procurar emprego.
Me olhou, intrigado.
“Você é amigo dele?”
– Acho que sim. Mas tem alguém em casa?
“Glória e Jandira, eu acho. Mamãe deve estar fazendo serão no Moinho Inglês, lá no centro, e só volta tarde da noite.”
– Vou falar com elas, então. É longe? Não me lembro mais…
“Pertinho, ali na quadra de cima, à direita. Casa branca com janelas azuis. Você não é cobrador, é?”
– Não! – disse, contendo o riso. Obrigado por tudo, Zezé!
O menino franziu a testa, bem como eu fazia.
“Você sabe meu nome?”
– Ouvi você e seu irmãozinho conversando, agora há pouco. E, para dizer a verdade, gostaria de te dar um conselho.
Ele me olhou, atento.
– Antes de jogar assim, esfregue um pouco de terra na dobra do dedo indicador, que a bolinha de gude fica mais firme e não escapa com o suor.
O menino experimentou na hora o truque e viu que eu entendia do que estava falando.
“É verdade, senhor. Muito obrigado.”
Passei a mão naqueles cabelos finos que Jandira dizia ser de “gato ruço de mau pêlo”…
– Eu é que agradeço… Não deixe escapar…
Ele se afastou, contente, concentrado em aprimorar a técnica recém-aprendida com outras bolas de gude. Eu continuei a subir a rua com esforço. Quando já estava mais ou menos longe, ouvi ele me chamando:
“Moço, quer ouviu uma música que seu Ariovaldo me ensinou ontem?”
E começou a cantar, com uma voz inesquecível:
“A lua vem surgindo cor de prata
No alto da montanha verdejante
A lira do cantor em serenata
Reclama na janela a sua amante
Ao som da melodia apaixonada
Das cordas do sonoro violão
Confessa o seresteiro à sua amada
O que dentro lhe dita o coração…”
Anoitecia.
Cheguei ao endereço da antiga casa em que morávamos. Já não havia mais nada para onde eu pudesse voltar. Nem paredes, brancas, nem janelas azuis, nem portas, nem muro, nem sequer portão. Só um terreno baldio, onde restavam ruínas e cacos de azulejo barato da cozinha e o piso cru, de cimento, onde um dia foi o banheiro. Nem restou nem mesmo a cerca de madeira na divisa, protegendo a goiabeira da Nega Eugênia e o valão ao fundo do quintal de minhas traquinagens.
“Tantas são as velhas árvores…”
Eram. Não são mais.
Não existia mais a mangueira de Godóia, nem o pé de tamarindo de Totoca.
Ao fundo, no limite do terreno, a rua agora alargada também ocupava o espaço onde esteve um dia Minguinho. Meu Xururuca. A árvore da minha infância.
Caminhei vagarosamente, entre os restos de telha e tijolos, até apanhar uma pequena flor branca. Tão linda quanto a flor imaginária que eu dava para a minha primeira professora, a da pinta branca no olho – Dona Cecília Paim.
Igualzinha à primeira florada do meu pé de laranja lima.
“Adeus, Zezé!”
Foi então que, muitos anos depois de tudo aquilo, meu passarinho despertou de novo no peito e voltou a cantar. Não as canções que seu Ariovaldo me ensinava pelas ruas, vendendo os folhetos de Vicente Celestino ou Chico Viola. Mas uma melodia, parecida com um assobio, há muito também esquecida no silêncio dos anos e no sopro das saudades. Enquanto murmurava a canção, pensei bastante em todos eles: mamãe, meu pai e meus irmãos e irmãs que se foram – uns pelo mundo, outros para sempre. Portuga, sua cara bondosa, redonda como a lua a brilhar no céu, naquele momento. Minguinho, meu confidente, a vida interrompida ainda em sua primeira florada. Luís, meu reizinho, que também não aguentou esperar. Todos com raízes espalhadas pelo subterrâneo da minha vida inteira. Eles estavam ali, naquele chão, refletindo um brilho tão exuberante quanto o chapéu de caubói do Tom Mix e o corcel de Buck Jones, “ajaezado”, cintilando na tela prateada do Cine Bangu; tudo ainda vivo, logo abaixo da superfície da minha infância perdida.
O morcego Luciano passou voando acima de nós, pelo céu. Era a hora. Abri vagarosamente os botões da camisa até embaixo e deixei o passarinho do meu peito ir embora, para sempre, solto do peso da velhice. Minha alma agora cantava e voava com ele, alegre, até pousar em uma nuvem enluarada. Tão comprida, alva e brilhante, que parecia mesmo ser o dedo de Deus.
Pequena homenagem aos 100 anos de José Mauro de Vasconcellos.
O conto traz a história de um personagem que já com certa idade retorna ao seu bairro natal e experimenta a memória de momentos no qual viveu ali, junto com o contraste do passar do tempo e as transformações da vizinhança.
Gostei do conto, achei bem escrito. Consegue passar bem a melancolia e a nostalgia que o personagem está vivendo no momento. Uma bela homenagem a locação e ao Personagem em si.
Pontos negativos são alguns erros de português no texto.
O conto narra as lembranças de um idoso que vai visitar o bairro onde viveu quando criança.
O conto é muito bom. tem um ar nostálgico e melancólico que eu pessoalmente gosto muito. É muito bem escrito e tem passagens muito bonitas. Não li o livro e nem assisti a novela em questão, por isso não conhecia os personagens, no entanto, a história conseguiu me envolver bastante. A parte dos meninos ogando bolinha de gude me fez lembrar dos meus tempos de infância também. Boa sorte no desafio.
🗒 Resumo: Um senhor idoso retorna à casa de sua infância, depois de muitos anos. Nada mais era como antes, a área rural de outrora agora é um bairro do subúrbio à beira da Avenida Brasil, cheia dos problemas atuais. Era Zezé, o menino de Meu Pé de Laranja-Lima.
📜 Trama (⭐⭐▫▫▫): não há exatamente uma trama sendo contada, mas apenas Zezé retornando ao local de sua infância e relembrando os momentos vividos ali. Este conto em especial acaba se sustentando somente sobre a nostalgia. Acredito que daria para contar uma outra história além disso.
📝 Técnica (⭐⭐⭐⭐▫): é um texto muito bem contado, daqueles que dá gosto de ler. Tão bem contada era a história, que acabei mergulhando completamente na história contada. Não é, porém, daquelas técnicas que se destacam por si só, o que não é um desmérito, apenas um registro da minha avaliação (são aquelas que reservo as cinco estrelas neste quesito).
🎯 Tema (⭐⭐): fanfic de Meu Pé de Laranja-Lima.
💡 Criatividade (⭐⭐▫): dentro do previsto para o tema.
🎭 Impacto (⭐⭐⭐▫▫): aqui eu preciso confessar que não li Meu Pé de Laranja-Lima, apesar de conhecer a história por alto. Percebi do que se tratava no meio do texto e dei um Google pra não ficar totalmente sem as referências. Enfim, apesar de tudo, é um texto bom de se ler, mesmo não me trazendo a nostalgia de alguém que leu o texto há tantos anos.
Idoso retorna ao bairro de sua infância. No trajeto, em meio à desorientação que as transformações lhe causam, ele vai rememorando seu passado, os personagens que fizeram parte da sua vida e se foram. Ele encontra crianças, interage com elas, mas aparentemente é um reencontro com memórias do passado. Ao fim, percebemos que se trata de uma despedida: da infância e da vida.
O conto é muito bem escrito. Não li “Meu pé de laranja lima”, mas creio que a narrativa reproduza a poética do livro original. Achei uma boa transposição do conceito de FanFic, tão comum para obras populares da contemporaneidade, a um clássico da literatura. Fez muito sentido, fazer uma FanFic de um capítulo final de um personagem que é criança no livro.
Apesar de ser uma temática monótona (“homem rememora o passado perto do fim da vida”), quiçá clichê, creio que a elaboração da narrativa seja o elemento central do conto. Parabéns, Minguinho, e boa sorte no desafio!
Começo pelo desenho que fez (imagino que você mesmo, Minguinho). Ficou perfeito em relação ao conto. Você me traz um passeio de saudades aos subúrbios cariocas nos quais a história do Meu Pé de Laranja Lima aconteceu. Um conto que se fez triste, melancólico, como o é a história que a tantos encantou. A ida de ônibus, rememorando os tempos de penúria vividos na história base da narrativa. As visitas, as ausências (todos já se foram, inclusive o próprio grande personagem, o pé de laranja lima). História que pega pela emoção aqueles que também viveram, com grande paixão, o livro. O final com a libertação do passarinho preso no peito funcionou bem dentro da narrativa. Minguinho, receba o meu abraço,
Zezé regressa à casa da sua infância, já velho. Nesta viagem, ele recorda momentos e pessoas que fizeram parte do seu passado e também Minguinho, o seu pé de laranja-lima. O olhar melancólico e profundo é próprio do autor, ele mesmo, e também da maturidade oferecida pelos anos e pelas vivências dolorosas. Lentamente, ele nota como o novo mundo se sobrepôs a um outro que ele conheceu, é a roda da vida sempre girando. Zezé chega até a sua casa antiga da qual também nada resta. Mas os subterrâneos da sua vida estão ali, os que lhe foram queridos, tudo pulsa a sua vida inteira e o pássaro em seu peito pede liberdade. Abriu a camisa e partiu, feliz.
Olá, Minguinho. Não tem como ficar indiferente a José Mauro de Vasconcellos, nem a quem expressa a sua voz em homenagem. Quando eu era criança, ele esteve em Portugal e deu uma maravilhosa entrevista para a TV e você nem imagina o que fez: ele disse “O Meu Pé de Laranja Lima” palavra por palavra, sem ler – ele tinha o livro inteiro na memória e no coração. Foi numa tarde de domingo que o ouvi, maravilhada. Depois li esse e outros livros dele. Você conseguiu “vestir” José Mauro, este belo conto poderia ter sido escrito por ele. Gostei muito. Obrigada por participar e boa sorte no desafio.
Zezé volta à sua vizinhança após uma vida inteira – após todos que amava terem partido na morte – e mergulha em uma viagem nostálgica pelas ruas que já não reconhecia, até finalmente despedir-se da vida entre os escombros do que um dia foi seu lar.
Nunca li “Meu pé de laranja lima”, então acredito que uma parte significativa do sentimento neste conto passou a mim desapercebido, o que é uma pena. O conto é extremamente bem escrito, com muito sentimento, quase uma prosa poética. A forma das palavras é tal que eu mesmo me senti preso em uma nostalgia, pensando em anos que se foram, como zezé no conto. Você escreve bem pra caramba.
O conto depende muito do leitor já ter lido “Meu pé de laranja lima”, o que não é problema nenhum já que o desafio é de fanfics. Mesmo assim o conto não é exatamente uma “história”. A palavra mais apropriada seria mesmo a que você usou no final: uma homenagem.
Fiquei realmente impressionado com a forma que a leitura deste conto me pegou, transportando-me para a minha infância, fazendo-me pensar no passado. Seu conto me fez querer ler o livro; acho que vou comprá-lo agora hehehe.
Resumo de Mangaratiba – é a história de um homem idoso que retorna a sua terra natal e vai observando as mudanças na cidade enquanto relembra os anos que ali morou.
Comentário – Achei um conto com um toque bem sentimental, que me fez lembrar os meus tempos de criança na roça. É um bom conto, bem escrito e pensado. Uma bela homenagem a Mauro de Vasconcelos. Se não tivesse escrito isso no final, nunca saberia qual era a referência, pois há muitos contos de autores brasileiros que tem as mesmas características em relação a memórias de infância. Boa sorte.
Resumo: homem velho retorna ao lugar em que cresceu e tem que lidar com as memórias em contraposição à modernidade.
Impressões: seria fácil identificar essa fanfic como uma homenagem direta ao Meu Pé de Laranja Lima, mas acredito que há mais nisso do que uma mera alusão à obra que lhe serve de inspiração. Na verdade, essa “literatura de retorno” é algo bastante difundido. São inúmeros os contos e até romances que aludem a essa confrontação entre o ontem e o hoje, à maneira como o protagonista precisa digerir os fantasmas do passado ou, enfim, à passagem do tempo e à consciência do fim próximo.
Um dos contos que mais gosto é exatamente nessa toada, o pouco conhecido “O Menino Perdido”, do Thomas Wolfe, que trata desse regresso sem cair na armadilha da nostalgia pura e simples. Isso porque há naquela narrativa um fio condutor, um motivo real para o retorno, o que parece faltar aqui. Apesar da escrita virtuosa e das referências bem pontuadas, não parece existir uma razão verdadeira para o regresso. A poesia que permeia as linhas, apesar de conferir à narrativa um tom melancólico e lírico, não sobrepuja a ausência de algo fundamental nesse tipo de história, que é a verossimilhança a respeito do retorno em si.
Outro aspecto que não me agradou muito foi o excesso de nomes e de alusões que parecem fazer sentido apenas ao protagonista. Entendi a intenção, mas do modo como exposto, me pareceu um tanto raso. Em vez de me levar — enquanto leitor — a um sentimento de empatia, o que senti foi uma certa confusão. Ou seja, não consegui me sentir cativado por esse retorno, ainda que a habilidade no trato com as palavras seja evidente.
Não dá para negar que é um bom conto, mas talvez a experiência larga que tenho com narrativas desse tipo tenha me tornado um tanto exigente com qualquer proposta nesse jaez.
De todo modo, parabenizo o autor e desejo boa sorte no desafio.
Nota: 3,0
RESUMO: Um senhor retorna ao seu lar de infância, lembrando de coisas que não estão mais lá.
COMENTÁRIO: O conto tem uma cadência muito boa. Resume-se a uma caminhada, mas o recurso aqui é justamente o vai-e-volta das memórias, o que o lirismo da narrativa investe de uma beleza melancólica que acompanha o protagonista durante todo o conto. Enquanto a escrita envolve e emociona, falta ao conto uma estória para além do mero retorno. Com a chegada do personagem ao seu ponto do destino, senti como se faltasse algo mais do que a conclusão, nesse ponto já previsível, de que, com o seu retorno, ele acaba sendo a única sobra dos tempos de que recordava. A nota no final avisando da homenagem foi uma boa decisão, pois eu pelo menos “conheço” o autor pelo “Pé de laranja lima” que, aliás, não li. Essa árvore chega a ser citada nesse conto e acho que é bem plausível assumir que outras referências permeiem o texto, mas, por não conhecer o autor, não as achei. Assim fica sendo que, numa escrita primorosa, não achei um desfecho substancial, já que o último sentimento que o conto evoca é o mesmo que acompanha toda a leitura e, no que tange a homenagem, minha ignorância do autor me impede de sentir o conto em toda a sua glória. No que tange a pontuação do certame, não afeta muito, pois quando não reconheço a homenagem a pontuação fica toda na conta da narrativa e da língua portuguesa.
Mangaratiba era o trem da morte. Este lindo conto saudosista nos faz relembrar a infancia antiga de um personagem que volta às origens e sente novamente as lembranças de infância, agora com um olhar de felicidade. A pitoresca vida da comunidade que vivia em liberdade e amizade , hoje cercada de cercas, muros altos e com cacos de vidro. O personagem relembra o amigo que morrera em acidente , em que o trem levou o carro.. Nota 5
O conto é uma homenagem e singela lembrança à obra Meu Pé de Laranja Lima.
O protagonista zezé retorna ao local de sua infância e se depara com as mudanças no local, bem como nele mesmo, já que se encontra agora na velhice.
É o encontro do eu mais velho com o eu das lembranças.
É melancólico e lindo, delicado. A escrita é uma poesia em prosa, algo para tocar o coração. Me lembro vagamente da obra de referência – li na minha infância. Não me recordo dos detalhes, mas da emoção, do choro no meu coração, esses sentimentos estão vivos.
Linda homenagem à obra. Lindo conto-poema.
Homem retorna, na velhice, à casa de sua infância, e recorda-se de fatos e pessoas.
Um conto belíssimo, delicado. O autor consegue desenhar lindamente a nostalgia e a melancolia do personagem central. Só sugeriria que não fossem mencionados tantos nomes, porque nada acrescentam ao leitor; acredito que o conto deveria se sustentar por si só, sem depender de profundo conhecimento da obra de referência – no caso aqui, “Meu Pé de Laranja Lima”. Mas é um texto lindo, maravilhosamente bem escrito. Parabéns!
Resumo:
Homem retorna à casa de sua infância e revive memórias.
Avaliação:
Autor, não leia o presente comentário como crítica literária, pois se trata apenas de uma justificativa para a nota que irei atribuir ao texto.
Autor, você possui pleno domínio da língua e das técnicas de narração; é um escritor “pronto”. Fiquei muito impressionado! Parabéns!
O enredo é enternecedor!
Não identifiquei erros graves de revisão, ou melhor, seu texto está muito bem revisado!
Receberá nota alta!
Não conheço nem a obra, nem o escritor a que você fez referência (conheço só de já ter ouvido dizer, talvez mais por causa do filme do que do livro), mas isso não prejudicou a compreensão do seu conto. E o mérito é todo seu! Seu texto é tão bom, que me senti motivado a conhecer a obra e o escritor!
Parabéns pelo conto e boa sorte no desafio!