“Não pense que foi por acaso que vim parar aqui, não. A doutora aí é a única proctologista mulher em toda Santo Antônio. Não condeno as outras médicas por escolherem especializações diferentes. Procurar caroço em rabo de homem é um negócio que não desejo nem pra minha ex mais ingrata, apesar de achar que ela talvez fosse gostar, porque foder com os outros era com ela mesmo, com todo o respeito. E olha que trabalho em hospital, já vi mais coisa nojenta que muito socorrista de trânsito. Só que também precisava pensar no meu lado, o lado da minha reputação. Depois que comecei a sentir essas dores quando ia mijar, me aconselharam a fazer o exame, falaram que já tinha passado da idade, aquela merda toda pra convencer a gente. Mas eu não podia deixar outro macho me arrombar desse jeito, e ainda pagando por isso, como se o diploma dele me eximisse da humilhação. Falei pro meu irmão assim, ou tu me arruma uma mulher pra fazer essa porra, ou prefiro morrer do que quer que ‘teja causando essa dor. Aí ele procurou, procurou, e encontrou esta clínica…”
Dentro do consultório, Lúcia redobrou a atenção na conversa entre o homem e a secretária, na antessala. Não pela natureza caricata do que ele dizia (o discurso se mantinha na média do que costumava ouvir, às vezes apenas de modo implícito, dos pacientes que a procuravam como uma opção menos afrontosa à sua honra, durante a realização de exames invasivos), mas pela fusão do timbre com uma informação aleatória de seu dono — informação que Lúcia ainda não tinha bem certeza de qual fosse –, esbarrando quase sem querer nalguma peça mal posicionada no sótão da memória. Um objeto de cuja existência havia esquecido e cuja silhueta difusa ela sentiu uma urgência meio aflita em divisar. Com o banheiro interno em reforma, tinha uma desculpa para usar o dos pacientes, ao lado da recepção. A porta do consultório dava para as costas da cadeira em frente à bancada da secretária, de modo que Lúcia não pôde ver o rosto do homem que agendava a consulta. Apesar disso, reconheceu-o imediatamente. E numa reação fisiológica que escapava a seu controle, o sangue pareceu afluir em retirada para longe da superfície, aninhando-se no centro do corpo, e tornando o tom da pele da médica sinistramente similar ao do albino sentado na cadeira diante dela.
— Tá tudo bem, doutora? A senhora está pálida…
O formalismo de Camila ao lhe fazer a pergunta (o tom que em geral adotavam diante dos pacientes) não contribuiu para amenizar seu mal-estar. Em face daquela aparição, queria familiaridade, queria o conforto de uma mãe ou amiga ou irmã mais velha a tratá-la com condescendência, a refutar racional e ternamente o terror infundido pela pareidolia de formas abstratas que a penumbra do quarto tornara apavorantes. O profissionalismo só ampliava sua pequenez e solidão diante do que a presença daquele homem representava. Fez um gesto vago com a mão, querendo dizer que era normal sentir o chão ondulando mesmo quando não se está em um barco, e caminhou para o banheiro apoiando-se de leve na parede, embora seu desejo fosse abraçá-la, fundir-se a ela, desaparecer contra o fundo, aproveitando a brancura da pele, do jaleco, da alma.
“Vish. Espero que não seja pelo que ela acabou de ver ali dentro…”
Trancou a porta. O vômito veio sem esforço, e não conseguiu evitar sujar o chão. A tontura convulsionava os desenhos nos azulejos, as ranhuras no piso, os nós no forro de madeira; o caráter estático sumira do mundo. Um suor repentino, persistente, entorpecia o alto da testa. Retalhos de memórias derrubando-se uns sobre os outros num efeito dominó cujo impulso inicial remontava a nove anos, dos quais só os três últimos conseguira viver com relativa paz. Relativa, sim, porque a resiliência, ela sabia, jamais ia se completar. Sua reação ao vê-lo comprovava este fato, amplificando-o. Não era mais a mão que se retrai por instinto no contato com uma superfície tórrida: era a pele que cauteriza sem sequer precisar tocá-la. Não, ele não devia se lembrar dela… Apesar de ter feito aquilo com tantas pessoas, nunca se interessara por decorar fisionomias, provavelmente julgando uma mudança de estado medida suficiente para evitar o reencontro acidental, quando se cansasse. Se se cansasse.
Agora, no entanto… bem ali, na outra ala.
Quais as chances? Qual o significado?
Lúcia não saberia dizer quanto tempo ficou no banheiro, ou por que Camila não demonstrou maior interesse em entender o que acontecera. Quando saiu, uma nesga de resolução orbitando a consciência, a secretária, já despida do tom formal, se preparava para fechar a clínica.
— O seu Augusto desmarcou a manometria de amanhã, Lu. E eu transferi a consulta da dona Regina, a Regina Sales, pro dia 17. Ela viajou pra BH, parece que o cunhado morreu.
— Obrigada.
— Também chegaram os retosigmoidoscópios reusáveis de 20 e 25cm, mas o Cléber disse que o de 15 tá em falta, então fiquei com uma caixa dos descartáveis, mesmo. O afastador de 60×30…
— Camila.
— Oi?
— Aquele cara… o albino. Pra quando você marcou o TR dele?
— Eu não marquei. Ele queria fazer com anestesia geral. Anestesia geral, em TR, Lu! Disse que é porque tem sensibilidade aflorada, e que a anestesia local não dá conta, mas tava na cara que era orgulho, ou medo de gostar. Machinho típico. Falei que nosso anestesista tá de férias e ele desencanou.
— Pegou o número dele?
— Ahn… sim, sim, tá aí na ficha que eu comecei a fazer, ainda não excluí.
— Ligue e diga que a gente faz. Próxima terça, no horário da Regina. Com anestesia geral.
— Mas o Fernando…
— Eu aplico. A inalatória. Não tem problema.
— Certeza, Lu?
— Pode ligar.
II
— Se não quer ver gente, fica em casa, caralho!
A moça a quem a frase se dirigia olhou para Lúcia como se algum limite muito sagrado tivesse sido irremediavelmente transgredido. Na luz intermitente da boate, contudo, sua recomposição pareceu vir rápida demais, num corte malfeito de edição. “Faz o que você quiser”, disse, e foi embora. Mesmo sob o vago efeito da vodka, Lúcia logo perdeu ânimo para continuar dançando e se dirigiu para o bar, abrindo caminho entre os universitários que entravam e saíam de vista segundo o ritmo da música eletrônica, sincronizada com o jogo de luzes. O homem se aproximou minutos depois. Devia ser pouco mais velho que ela. Sua pele parecia feita do mesmo material luminescente das pulseiras que quase todos ali usavam, inclusive ele, e Lúcia teve que disfarçar o pequeno susto que levou com seu aspecto inesperado fingindo apoiar melhor as pernas do banco.
— Triste em pleno final de semestre, moça?
— Pra você ver…
— Não, não. Tristeza nessas horas é que nem DST, a gente tem mais é que passar pra frente.
Ela não achou que fosse querer levar a conversa adiante, com um começo desses. Mas o aborrecimento pela intransigência de Mônica, sua insistência reincidente em voltar para casa no meio de uma festa, na semana em que tinham combinado ser decisão dela, Lúcia, o programa do sábado a predispôs a agarrar-se a qualquer arremedo de balsa que a levasse (e à sua consciência) para longe da ilha do quarto que as duas dividiam numa quitinete a cinco quadras da faculdade. Deu-lhe as aberturas mínimas para o estabelecimento do diálogo, e fez o possível para se concentrar no que o desconhecido dizia. Quando soube que Lúcia cursava o quarto ano de medicina, por exemplo, ele falou de seu próprio emprego na ala dos comatosos de um hospital público, embora não tivesse terminado o curso de enfermagem.
— Rondas das 22 às 7 com intervalos de 15 minutos a cada 2 horas. Checo aparelhos, mudo posições de braços e pernas, troco as sondas… O pessoal brincava que praquilo ser um cemitério só faltava uma assombração, e que depois que eu cheguei não faltava mais nada. Nem comentei que já me chamavam de fantasma na escola. As pessoas gostam de achar que estão sendo criativas ao pensar em apelidos óbvios. Não ligo. O emprego tem diversões suficientes pra compensar isso. Sem falar no que eu consigo tirar por fora…
A conversa continuou com os pés bem firmes no monólogo. Em determinado momento, o homem pediu licença e saiu para uma parte mais afastada do balcão, voltando com o que pareceram a Lúcia duas taças de piña colada. Oferecendo uma a ela, sondou o motivo de seu abatimento anterior, e Lúcia teve a impressão de que a bebida era o jeito dele de pagar por sua história. Como estivesse disposta a contá-la mesmo de graça, só pra observar a esperança se esvaindo do rosto do desconhecido da mesma forma que a cor, viu a oferta como um bônus e desandou a falar, entre um gole e outro do coquetel adocicado. Tinha uma namorada desde o primeiro ano do curso. Amava-a. Mas a noção de diversão das duas divergia. Sentia-se sufocada quando cedia aos programas caseiros dela, e sufocando-a quando ela cedia aos seus, muito mais interacionais e agitados. Como naquela noite. Falou da discussão. A frase final dela. “Faz o que você quiser.” Quando terminou, o albino olhava para o balcão.
— Você é sapata?
— Foi tudo o que você registrou, do que eu disse?
— Que desperdício…
— Que original…
— Sabe… Isso é falta de experimentar… Eu tenho certeza que se você…
— Não, nem começa. Você não me conhece, posso entender de pau até melhor do que você, que tem um.
— Se entende, o cara não fez direito. Você não sabe o que é a vida até ter uma foda hétero digna.
— Ha-ha-ha! Se o mensageiro fálico dessa revelação for alguém como você, meu amigo, eu prefiro continuar sem saber.
Só depois de soltar a frase percebeu a ambiguidade subjacente. Não tinha querido dizer que o achara pouco atraente no sentido físico, mas no ético. Quis esclarecer a questão, um medo irracional de ferir a autoestima do estranho, como se a deformidade estética fosse algo mais grave que a moral, mas voltou atrás. Ele não parecera ter se ofendido, de todo modo. Lúcia sentiu-se grata por não precisar continuar o diálogo, e quis voltar para a pista. Uma sonolência incomum, contudo, começara a enredá-la, membro por membro, como se alguém tivesse adicionado gesso à mistura outrora fluida do ar. A sensação de relaxamento quase instantâneo, que só voltaria a experimentar quatro anos depois, durante a sedação para a realização de uma endoscopia, borrou as luzes da boate numa pintura impressionista, e estendeu as ondas sonoras da música até o ponto da ruptura. Até o silêncio.
Que coincidiu com o endurecimento do gesso.
III
— Qual o tipo dele?
— Organometálico. O mesmo do dimetil mercúrio, mas com toxicidade bem menor.
— Menor?
— Continua sendo letal. Só não te exporia a risco. Por inalação, por exemplo.
— Esse aqui não atravessa látex, atravessa?
— Não. Nem neoprene. Até o contato com a pele não causaria absorção.
— Então… a aplicação teria que ser…
— Em alguma mucosa. Ou intravenosa.
— Entendi. Qual a posolog… a dosagem?
— Depende do porte. Acha que mais de setenta?
— Bem mais.
— 0,1ml é suficiente. Dá uma gota.
— Eu sei. Quanto tempo?
— Dois meses. Três, no máximo. Os sintomas seriam os mesmos de uma pneumonia ou gripe comum.
— E quanto aos resíduos?
— Eliminados com a ureia. No último estágio, não há nada para contar história.
— Nada?
— Nada.
Sopesou o minúsculo vidro, similar ao das amostras de perfume. O líquido incolor mal chegava à metade do tubo, e ainda assim excedia em muito sua necessidade. Abriu a bolsa com cuidado, tirou o envelope e o entregou ao homem. Ele não conferiu o conteúdo.
Já na porta, se virou. Como se tivesse sido solicitada a justificar-se.
— Ele… Ele merece.
Apoiado na moldura, o outro apertava os olhos para protegê-los do sol, já a pino, a despeito da hora.
— Eu não me importo.
Lúcia apertou o lado da bolsa em que havia guardado o vidro.
— Obrigada, professor.
E entrou no carro e foi embora.
IV
Dor. Quarto de hotel. Nudez. Lençóis encardidos. Um bilhete com um apelido ridículo. Gosto azedo na boca. Ardência. Sangue seco. Sêmen seco. Cãibra. Mesa de cabeceira. Celular. 18 mensagens recebidas. Mônica. 3 mensagens enviadas. Fotos. Legenda: “Segui seu conselho.” Fotos. O albino por cima. Membro. Dedos. Mão. Sexo-consensual-aparente. “Cadela.” “Sua puta”. “Sempre soube que você não valia porra nenhuma.” “Foi até bom.” “Deixei de te amar tem quatro meses.” “Mas tô trepando com a Vanessa desde ano passado.” “Ela sim sabe chupar uma boceta com gosto, chupar um cu com gosto.” “Não faz essa sua cara de merda, como se a tua própria boceta e cu não fossem podres, como você inteira.” “Mas até que faz sentido.” “Tu sempre gostou de pau, afinal.” “Puta” “Mentirosa do caralho.” “Some com as tuas merdas daqui.” “Quer saber? Não precisa.” “Eu caio fora.” “Você infectou este quarto.” “Espero que morra de AIDS.” “Que esse infeliz te empale”.
Dor.
V
A posição não era a ideal.
O decúbito ventral comprometia o relaxamento da musculatura glútea, já prejudicado pelo fato de não se poder pedir ao paciente anestesiado o habitual esforço de evacuação para a realização do toque. Anestesia geral para um exame cuja duração média não passava de 20 segundos era um procedimento administrado somente em caso de extrema sensibilidade anorretal. O que, pelo aspecto externo da região, não parecia ser o caso daquele paciente.
“É quase como se ele quisesse me dar essa chance… As mesmas condições…”
Curiosamente, tremia menos do que nos dias anteriores, ou no carro a caminho da clínica, mais cedo. Nenhuma das implicações morais do ato que estava prestes a cometer fora suficientemente forte para demovê-la da intenção – pelo contrário: sob qualquer ângulo que analisasse a situação, era impelida a ir adiante. Os eventos encadeados pelo acaso vinham eivados de inegável intencionalidade, devolvendo à existência certo sentido de justiça, de não-aleatoriedade. Lúcia fora vítima de um criminoso hediondo, que se aproveitava do emprego (exercido até hoje, segundo fazia crer a conversa com Camila na semana anterior) na ala de comatosos de um hospital público para estuprar pessoas inconscientes e, ao que tudo indicava, receber para deixar que outras pessoas fizessem o mesmo. Tivera dois terços da vida arruinados na reação em cadeia que se seguiu ao despertar naquele horrível quarto de hotel. A ação discreta da substância garantiria que não fosse (que ninguém fosse) associada ao assassinato, que sequer seria tomado como tal. Tinha, portanto, álibis de sobra para a consciência e para o temor da captura. E o presumido apoio silencioso de várias outras vítimas. A única manifestação em contrário era involuntária, um tremor que, em sua intensidade a princípio crescente, assemelhava-se ao general que redobra os esforços quando já esqueceu os objetivos. Mas mesmo ele, agora, no consultório, começava a hesitar, perdendo força.
Sim. Não havia reação possível a um fantasma que se erguia do passado num contexto tão minuciosamente oportuno, além da de mandá-lo para o inferno.
Lúcia pegou um par de luvas na caixa e a vaselina na terceira gaveta. Se deteve. Aquele desgraçado sem dúvida não ia direto ao ato com suas vítimas. Por que deveria dar-lhe tratamento diferente?
Tirou as luvas. Cuspiu na ponta do indicador, sentindo uma miríade de professores espiando-a com reprovação por cima do ombro. Assepsia, em certos casos, não fazia sentido. Lembrou-se, então, de uma dúvida da adolescência, e, mais tarde, do primeiro semestre da faculdade, sobre a necessidade de esterilização das agulhas usadas em injeções letais.
A ação contrativa do óxido nitroso combinado ao oxigênio não se aplicara às paredes do ânus, que estavam relaxadas. Lúcia introduziu a primeira falange do dedo, fazendo movimentos circulares. Uma preliminar do estupro. A anatomia interna despertou em sua memória tátil, absurdamente, a lembrança da primeira namorada. Essa associação — corroborada talvez pelo tom alvo-róseo da pele do homem – persistiu, e ela não se esforçou para repeli-la. A menina vetara as possibilidades de um novo contato, depois daquela primeira vez, que julgara incômoda. Isso havia aumentado a excitação de Lúcia, e, por extensão, sua frustração. Terminaram antes que pudesse fazê-la mudar de ideia. Agora, era como se voltasse aos treze, na penúltima cabine do banheiro da escola. Dentro do sutiã, sob blusa e jaleco, os mamilos enrijeceram. Introduziu a segunda falange, sem interromper os movimentos circulares. A sensação prazerosa cresceu. Com a mão livre, pressionou o próprio púbis, que tinha se enchido de umidade. A vulnerabilidade física e, de certa forma, moral do homem que a estuprara se juntavam a uma lembrança ainda mais remota para compor um quadro de inexplicável desejo sexual.
Pela primeira vez no exercício da profissão, estava excitada durante o exame de um paciente.
Aumentou a profundidade da penetração, bem como a pressão sobre o púbis. Assustou-se. Refez o movimento mais calmamente, enfiando outro dedo e tateando com a ponta dos dois. Estremeceu.
Um nódulo bloqueava a passagem.
Um nódulo cuja disposição, textura e diâmetro só podiam indicar um tumor em estágio avançado na próstata.
Lúcia olhou para o vidro de amostra de perfume em cima da escrivaninha.
A excitação não desaparecera de todo.
***
O homem não quis esperar a sensação grogue pós-anestésica passar. “O que é uma tonturazinha pra quem acabou de ser desvirginado, né não?” Camila repetiu três vezes as recomendações para a retoscopia com biópsia do dia seguinte, até desistir e anotá-las no verso de um folheto. Enquanto se despedia, risonho, da secretária, Lúcia cruzou a recepção em direção ao bebedouro. Ele lhe disse alguma coisa, logo depois da palavra adeus. Algo que ela não pôde entender, porque no mesmo instante o escapamento ruidoso de uma moto na rua defronte encobriu qualquer outro som.
Nunca poderia confirmar a suspeita de que a palavra não escutada era o apelido que ele escrevera no bilhete no quarto do hotel, nove anos antes. Que havia se lembrado dela desde o princípio. Que o “adeus” significava que jamais se veriam de novo. Que já sabia a respeito do próprio câncer, tendo, provavelmente, o tempo restante de vida cronometrado. Que seu real objetivo ao procurá-la era dar-lhe a oportunidade de entendê-lo, de irmanar-se a ele na capacidade de sentir excitação sexual violando um corpo inconsciente, fosse por vingança, fosse por uma absurda associação da memória. Que sua missão, ali, era a mesma que se impunha em relação à tristeza e às DST’s: passar sua doença adiante.
— Ok. Ok, peraí, só um segundo. Lu, o Cléber tá perguntando se a gente vai querer o mesmo tanto de luvas que no mês passado.
A médica ainda olhava para o lugar em que o fantasma desaparecera para sempre.
— Não. Pede só a metade.
Como pesquisador os termos médicos agradam bastante e a originalidade é a coisa que mais aprecio numa história. Enfim, ótimo!
A temática do conto foi muito original, nunca havia visto o tema abordado por esse lado. Mas não me fisgou. Achei uma leitura cansativas, talvez pelas explicações médicas e afins, não sei.
Mas parabéns pelo texto.
Um contaço! Confesso que não tenho competência para julgar o aspecto técnico (médico) que envolve o conto — para falar a verdade, em nem sabia que proctologistas também diagnosticam câncer de próstata; achava que só urologistas faziam isso ;-P — mas tudo se encaixa tão perfeitamente, quer dizer, de uma maneira tão verossímil, que não me restou outra opção senão embarcar de cabeça na história de vingança da Dra. Lúcia.
Em suma, é testemunhar o nascimento de uma psicopata. Existe um livro muito, muito bom – infelizmente sem tradução para o português – de uma autora croata chamada Slavenka Drakulik, intitulado “They would never hurt a fly”, algo como “Eles não fariam mal a uma mosca”, em que ela relata o julgamento de diversas pessoas envolvidas nas guerras da Iugoslávia. Não somente os chefões, como Slobodan Milosevic ou Ratko Mladic, mas gente comum, O interessante nessa obra é que, graças à prosa fantástica da autora, podemos ver como essas pessoas normais (um garçom, um motorista de táxi, um faxineiro), enfim, gente igual a quem conhecemos e encontramos nas ruas todos os dias, se transformam em assassinos sem qualquer tipo de remorso. Em muitas das vezes, a culpa é das circunstâncias da própria guerra. Em outras, de uma personalidade sociopata latente, esperando um gatilho para se libertar.
Digo isso porque me parece ser este o caso do conto aqui comentado. Talvez Lúcia tivesse sempre sido doente. O fato de ter-se visto com seu antigo algoz à merce, ao que parece, fez despertar nela não só uma sede de vingança, mas um desejo, quase um prazer, em vê-lo sofrer. A perícia na narrativa permite entrever essa metamorfose, cujo gatilho é, obviamente, o fantasma do trauma passado.
Percebe-se, em resumo, que o conto cumpre seu papel em demonstrar essa transformação. Não obstante, creio que sem a limitação de palavras imposta pelo regulamento do desafio, os motivos e a própria percepção da médica de que se tornou igual ao seu algoz poderiam ser melhor trabalhados.
De todo modo, um conto magnífico. Like imediato.
A estrutura do conto (esse vai-e-vem) funciona muito bem, a narração está ótima e o “fantasma” foi aproveitado de forma muito interessante na história, que é bastante insólita. Um conto bem bom. Meu pé atrás com a narrativa diz respeito ao que parece ser o núcleo dessa história: a transmissão daquela perversão, a vítima que vira algoz. Tive a impressão de que o desenrolar do conto não sustenta inteiramente a “comunhão” entre malfeitor e vítima (que no fim trocam de papel), algo soa forçado. É curioso como o final contrasta com o início: tive a impressão de que a narrativa ia se encaminhar pra uma repulsa total daquele tipo de machismo, daquele tipo de situação, mas acaba tentando uma aproximação…
Olá. Um enredo originalíssimo, a escrita deixou fácil de eu me encontrar no que estava acontecendo, achei tudo bem claro. Muito bem planejado, eu acho, acima de tudo. Achei marcante num sentido intelectual, não acho que eu vá esquecer o final e o jeito como você fez o texto por um bom tempo, mas emocionalmente não me apeguei. Eu penso no desenvolvimento da personagem e eu sei que tem muito no conto mostrado ou contado, mas ainda parece que eu ouvi falar de uma mulher de vida complicada em vez de parecer que a conheci. Digo isso só porque fiquei mesmo com uma sensação meio vazia ao terminar, embora tudo tenha sido bem-feito. Mas as qualidades superam esse um defeito, com certeza. Abraços
O uso de detalhes técnicos e conceituais na narrativa para garantir verossimilhança a uma personagem médica é o ponto forte do conto e, certamente, o(a) autor(a) merece ser parabenizado. Também gostei do elemento “fantasmas” tal como foi inserido. Alguns contos do desafio usaram os “fantasmas do passado”, mas até agora, só esse me comprou. Não achei o texto cansativo, mas algumas decisões do(a) autor(a) no quesito distribuição do enredo não funcionaram para mim. Sem mais, é isso. Parabéns!
Gostei da escrita,mas achei um pouco cansativa. Boa Sorte!!
Sem muito o que falar. Muito bom. Até entendo que não agrade a alguns, mas me agradou muito. Tem que ser lido com atenção ou o leitor pode marear um pouco…e os termos médicos mostram que aparentemente o autor saca bem as manhas, ou pesquisou legal. Parabénzzzzz 🙂
Puxa, excelente conto! Fiquei apreensiva e um tanto incomodada durante toda a leitura do texto, e posso apostar que foi exatamente essa a intenção do autor. Aliás, leitura não, leituras, pois li duas vezes para absorvê-lo em detalhes. O enredo é surpreendente, a escrita é impecável, os detalhes beiram à perfeição. Adorei a aparição do “fantasma diferenciado”, como um fantasma do passado. Excelente e não convencional. Com certeza estará na minha listinha dos favoritos! Meus sinceros parabéns ao autor!
Só achei um errinho no conto. No lugar de: “remontava a nove anos”, o certo é “remontava há nove anos”, pois indica o tempo decorrido. No mais, a revisão também é impecável, assim como tudo no texto…
Boa sorte e mais uma vez, parabéns!!!
** PODE CONTER SPOILER **
Apesar de uma abordagem “séria”, o texto possuí umas passagens muito bonitas. Particularmente, fiquei encantada com essa: “(…) e caminhou para o banheiro apoiando-se de leve na parede, embora seu desejo fosse abraçá-la, fundir-se a ela, desaparecer contra o fundo, aproveitando a brancura da pele, do jaleco, da alma. “.
Existem umas palavrinhas difíceis sim, mas elas estão tão presentes no meu cotidiano que não me assustei. Talvez isso foi o que tornou o conto cansativo para algumas pessoas, já que eu não senti isso e fluiu muito bem.
Quanto aos termos técnicos, eu achei um máximo! Não sei NADA de medicina, mas consegui compreender tudo que foi dito. Os diálogos da secretária passaram uma realidade extraordinária!
A quarta parte me causou aflição. Mas ficou a pergunta: ela aplicou ou não o veneno? Esse é o tipo de final aberto que eu gosto!
Boa Sorte!!
Acho que ela não aplicou, mas a “dst” dele foi passada adiante.
Parabéns ao autor: muito bem escrito e surpreendente. Boa sorte.
Bem escrito e executado. Ideia bem “transmitida” e que vai vencendo as barreiras do leitor não pelo cansaço, mas sim pela contaminação que a trama infunde.
Parabéns!
Parece-me que houve um certo subterfúgio ao tema, ficando exactamente sobre a corda bamba. Não posso dizer ter gostado disso, mas gostei sim do conto. O uso das analepses resultou muito bem aqui, o enredo encontra-se bem estruturado, conseguindo fugir do óbvio no final, e as personagens estão bem construídas. Com pouco, o leitor consegue conhece-las e compreende-las.
O texto é muito bem escrito, embora o tipo de linguagem não seja muito o meu estilo. A aparição do “fantasma” só vem no finalzinho e eu já estava me perguntando quando ele iria aparecer. Achei a história com muitas minúcias, o leitor chega a se perder no excesso de detalhes. Mas ele é muito bem escrito e mostra uma criatividade excelente! Parabéns!
Gostei da sua solução “out of the box” para o tema, interessante mesmo. Não é do tipo de conto que gosto, mas não posso deixar de aplaudir seus méritos. Tem densidade e você soube criar uma tensão ao longo da história. O desenvolvimento não ficou legal, precisa ser melhorado, para a leitura ser mais fluida. O desenrolar da trama está muito aos trancos.
Ponto positivo por ter abordado o tema do desafio de forma “out of the box”. O conto tem algum suspense, mas precisa ser trabalhado para poder ser lido de forma mais agradável. Muitos termos técnicos, apresentação da trama aos aos solavancos. Boa ideia, mas a execução precisa ser trabalhada.
Comecei a ler sem muita empolgação, mas aí a narrativa foi me prendendo e a leitura ficou fácil. Conto muito bem escrito com detalhes técnicos e tudo mais. Apesar de longo, o texto abordou o tema de forma incomum. Gostei! Boa sorte.
Gostei bastante do texto. Sou completamente leigo no que diz respeito a medicina, mas o(a) autor(a) consegui me convencer de tudo o que estava acontecendo na história.
Não achei o ritmo da narrativa cansativo, fui carregado com muita facilidade. Achei ótimo como o final retomou a ideia já apresentada do ‘fantasma’ sobre passar a DST adiante. Além disso, a relação entre Lúcia e Mônica também me convenceu.
Não tenho nenhuma grande crítica aqui. Talvez tenha considerado que o modo como foram reveladas as intenções do albino um tanto abrupto. Aliás, ele não deveria ter morrido há um tempão, vítima dos planos de Lúcia?
Isso me lembra, achei a passagem com o ‘professor’ sensacional. A cena dele dizendo “Não me importo.” me conquistou.
A princípio fiquei um pouco dividido quanto à fuga do teor sobrenatural de fantasma (o que não era necessário. Se o albino não revelasse que sabia que estava para morrer se criaria a possibilidade dele ser, de fato, um espírito), mas até que ela ficou bem agradável aqui. Um fantasma, afinal, é algo que não deveria mais existir, mas volta para nos assombrar. No fim, curti a mudança.
Enfim, gostei bastante do texto. Parabéns ao autor(a).
Ótimo conto. Achei um pouco cansativo até a metade, mas depois fluiu bem.
O estranho “vish.” (vixe maria!!), foi um minúsculo detalhe.
Eu me chateei pensando já saber o final, com Lúcia envenenando-o e tornando-o uma vítima, mas a reviravolta me surpreendeu, principalmente pelo fato de ver o estuprador atingindo seu objetivo de criar outro monstro, explicitamente contido na frase “– Não. Pede só a metade.” Foi fantástico isso! Não gostei dos paragráfos enormes com palavras difíceis. Parabéns ao autor.
Texto bem escrito, não me cativou, mas mesmo assim um bom texto.
Bom conto, apesar de que não me cativou muito, talvez por ser o último que li, esperava mais. De qualquer forma, isso é pessoal, o texto é bom. Parabenizo o autor pelo texto.
Achei que foi bem escrito, com certeza, mas não me envolvi com a história em si, em alguns momentos achei cansativo, talvez em uma segunda leitura… Mas parabéns pela ideia!
Um conto muito bem escrito, nos mínimos detalhes!
Mas achei muito cansativo,a história não me agradou.
Espero que outros gostem.
Parabéns e boa sorte!
Excelente conto! Mais um que passou longe da obviedade, além da escrita primorosa. Parabéns ao autor!
Wow!!! Fantástico!!
Gostei bastante, apesar de esperar mais da personagem principal.
Partes quatro e cinco particularmente bem executadas.
Parabéns!