EntreContos

Detox Literário.

Chocolate Branco (Thales Soares)

Acabou-se o Que Era Doce

Valentina estava caída sobre o piso gelado da cozinha, com os pensamentos agitados e descontrolados. Seu corpo era pequeno e bastante magro, os cabelos negros e lisos iam até a altura do ombro, com uma franja reta cortada rente à testa. Parecia uma criança, sendo difícil de acreditar que era uma adolescente de 16 anos de idade e que já havia cometido tantas decisões equivocadas ao longo de sua curta vida.

Já era tarde da noite. Sua mãe estava dormindo no quarto do andar de cima e não havia nenhuma outra pessoa na casa. Suas únicas companhias eram as várias embalagens de chocolate branco espalhadas pelo chão ao seu redor, cada uma lembrando um momento de prazer fugaz que a garota buscava de forma tão desenfreada.

No auge dos efeitos do chocolate branco, que distorcia sua realidade e a mantinha em um estado catártico, Valentina não se alarmou quando a figura da Morte se materializou em sua cozinha. A criatura possuía uma presença serena e se vestia com elegância, apesar de não ser possível enxergar direito o que estava escondido por trás do capuz preto.

– Vício em chocolate branco? – perguntou a Morte, com uma voz rouca e metálica.

– Vício é para os fracos! – retrucou Valentina, sorrindo na tentativa de desafiar o fim que se aproximava. – Eu posso parar quando eu quiser.

– Mas você não quer, não é mesmo?

– Por que eu iria querer? Eu estou no comando! Eu controlo o quanto eu quero, o quanto eu preciso.

A Morte assentiu, de forma quase imperceptível, como se tivesse encontrado a resposta para uma pergunta não formulada.

– E se você tivesse uma segunda chance?

– Uma segunda chance? – repetiu a garota. Sua voz estava embargada pela paranoia que começava a se infiltrar em sua euforia.

– Exato. Quero verificar se você realmente consegue parar… se realmente pode controlar seu destino.

Antes de Valentina poder dizer qualquer coisa, a Morte tocou seu rosto, e o mundo girou em um turbilhão de cores e sombras. Quando a vertigem cessou, Valentina se viu em seu quarto. Tudo estava igual, mas estranhamente diferente. Sua mente, pela primeira vez em muito tempo, estava clara e com pensamentos organizados e harmônicos. Ao olhar para o espelho, notou que sua aparência estava mais jovem. Ela havia voltado aos seus 14 anos.

Respirou fundo, sabendo que essa seria sua chance de fazer tudo diferente, pois nessa época o chocolate branco ainda não possuía poder sobre ela.

***

Um Novo Dia

O amanhecer infiltrou-se no quarto desarrumado de Valentina, lançando um julgamento silencioso sobre a desordem de sua vida. O despertador já tinha desistido dela, mas sua mãe não. A porta se abriu de forma grosseira, e a mãe surgiu gritando:

– VALENTINA! Você perdeu o horário da escola de novo. Você quer que a coordenação chame o conselho tutelar outra vez, é isso? Você é uma inútil, e fica tentando fazer com que eu leve a culpa pela sua irresponsabilidade!

Valentina se encolheu, sentindo cada grito como um soco.

– Eu… err, eu me arrumo rapidinho…

– Se arrumar? Você tem ideia de que horas são? Agora já era! Você é uma decepção, assim como aquele fracassado do seu pai!

– Não fale assim do papai! – Valentina revidou com raiva. – Ele é melhor que você!

– Melhor? Ele abandonou a gente! E você… você é só uma lembrança do erro que ele cometeu!

Sem mais nada a dizer, a mãe saiu do quarto, batendo a porta com força, e a garota foi deixada sozinha, com o eco da briga e o peso da rejeição.

Seu celular tocou logo em seguida. Quando viu que era o pai, atendeu na hora.

– Pai? Alô?!

– Oi, filha – disse ele, com a voz distante. – Tudo certo com o dinheiro que te mandei?

– Sim, mas… eu queria te ver, pai.

– Hm, sei. Talvez no Natal. Ando muito ocupado ultimamente.

– Mas eu quero agora! Pelo menos fica mais um pouquinho no telefone comigo?

– Desculpa, tenho um compromisso importante agora. Se cuida, tá? – e com essas palavras, ele desligou, deixando-a com a linha muda e o coração mais vazio do que antes.

Para se distrair um pouco, Valentina tentou ler um livro, mas seu déficit de atenção impedia que as frases formassem algum sentido lógico em sua mente. Então tentou assistir televisão, mas os programas zumbiam como uma conversa em uma língua estrangeira. A ansiedade estava começando a atacar, dando palpitações em seu coração e deixando sua mente agitada.

Assim, decidiu sair para dar uma volta em seu bairro, em busca de ar fresco. O que encontrou, porém, foi algo que prometia ser um pouco mais doce. Um garoto que morava na rua de baixo se aproximou com um sorriso travesso, escondendo algo atrás das costas.

– Tenho algo especial aqui, Val. Algo que vai te deixar pirada!

– O que é? – perguntou a garota, curiosa.

Com um movimento teatral, ele revelou uma barra de chocolate branco. A embalagem reluzia ao sol como um tesouro.

– Isso vai te levar às nuvens, morô?

Valentina hesitou. Sua mente ainda estava clara e funcionando bem, e ela sabia que consequências aquilo lhe traria.

– Eu não… eu não sei se…

– Ah, qual é, Val? Experimente só uma barra. Só pra sentir o gostinho – ele a incitava, com tentação brilhando em seus olhos. – Vai arregar?

Valentina queria recusar. Queria se afastar daquilo e evitar que sua vida fosse consumida novamente. Mas por algum motivo, disse:

– Tá, só uma barrinha, vai.

Ela mordeu o chocolate, e foi como se o céu se abrisse. O sabor rico e cremoso se esparramou por sua boca e uma onda de prazer se espalhou por sua papila gustativa. Então comeu uma segunda barra, e uma terceira, e uma quarta. O prazer de cada mordida era uma mentira que ela contava para si mesma, uma mentira que a consumia.

Por fim, a garota se viu sentada no meio-fio, com o sol se pondo e o brilho dourado das embalagens vazias ao seu redor. O êxtase do sabor havia se dissipado, deixando apenas o vazio e a crescente percepção de que ela havia caído novamente em sua antiga perdição.

***

O Sussurro da Derrota

O relógio marcava meia-noite quando Valentina caiu no chão gelado da cozinha. A lua lançava uma luz fria através da janela, iluminando as embalagens de chocolate branco que cercavam seu corpo. Eram as relíquias de sua derrota, espalhadas como testemunhas silenciosas do seu fracasso.

Ela ainda segurava uma barra pela metade, sua última tentativa de encontrar conforto no doce que tanto a consumia. Seus lábios estavam manchados com traços do prazer que havia se tornado sua maldição, e seu peito subia e descia em um ritmo irregular e fraco.

Foi então que a Morte se aproximou, tão silenciosamente quanto a própria sombra. Fazia dois anos desde seu último encontro com Valentina. Ela observava a garota como se achasse graça naquela situação trágica.

Valentina, em um lampejo de consciência, percebeu sua presença e franziu a testa.

– Do que você tá rindo?

A Morte inclinou a cabeça em uma falsa reverência.

– Não é todo dia que vejo alguém tão jovem se entregar completamente ao seu… hobby.

– Hobby? – Valentina cuspiu a palavra como se fosse veneno. –  Isso é mais do que um hobby. É… era a minha vida!

– E que vida, não? Você teve uma oportunidade para mudar, para fazer escolhas diferentes. E cá estamos novamente.

– Eu preciso de outra chance. Uma terceira chance. Por favor!

A Morte observou-a com olhos antigos, olhos aqueles que já haviam visto muitas súplicas e muitas promessas vazias.

– E o que seria diferente desta vez? O que faria se eu lhe desse mais uma oportunidade?

Valentina olhou para as próprias mãos, a realidade de sua situação finalmente a havia alcançando.

– Eu… eu faria tudo diferente. Tudo! Eu vou largar essa porcaria e vou ter uma vida feliz. Eu prometo! Só mais uma vez… por favor! Me ajuda!

A Morte, intrigada, analisou a garota à sua frente, notando que sua arrogância e negação estavam dando lugar a desespero e compreensão.

– Muito bem, você terá uma última chance. Mas lembre-se, mantenha sua promessa, senão eu voltarei para te buscar e a levarei para a escuridão eterna.

Com um aceno de mão, a escuridão começou a se dissipar, e Valentina sentiu o peso da morte se afastando. Ela sabia que essa seria sua última oportunidade, sua última chance de provar que podia ser mais do que seus desejos, mais do que seu vício. Desta vez, ela estava determinada a mudar seu destino.

***

A Promessa

Valentina despertou com um sobressalto. Seu quarto era aquele de dois anos arás. Estava com 14 anos novamente. A manhã começou como sempre, com a entrada agressiva da mãe, cujas palavras cortantes rasgavam a quietude do amanhecer.

– PREGUIÇOSA, INÚTIL! – gritava.

Quando o pai telefonou, sua voz estava novamente distante, tão fria como o de costume.

– Pai, eu preciso de você – Valentina suplicava –, não do seu dinheiro. De você.

Mas as palavras dele eram sempre as mesmas, promessas vazias camufladas por um depósito bancário que caia na conta da garota, mas que não podia comprar o que ela realmente precisava.

As horas se arrastavam, cada uma mais lenta e pesada que a anterior. Sua mãe a repreendeu novamente à noite, uma discussão banal que se transformou em uma guerra. Valentina deitou na cama, abraçada com seu ursinho, sentindo-se solitária.

Os dias passaram, e a monotonia da vida pesava mais que qualquer tentação. Valentina decidiu dar uma volta pelo bairro, e novamente encontrou aquele garoto. A barra de chocolate branco em sua mão parecia brilhar.

– Não – ela disse firmemente –, eu fiz uma promessa…

Naquela noite, a sensação de vitória a embalou em um sono sem sonhos. Mas sua vitória era tão instável quanto tudo em sua vida.

Outra briga, outra humilhação. A dor de ser diminuída por sua mãe, de ser ignorada por seu pai, de não ser amada por ninguém, formou uma tempestade perfeita que convergiu para um único ponto de fraqueza. Ela resistiu o quanto pôde, mas a solidão e a falta de propósito corroeram sua convicção. O chocolate branco, com seu potencial de gerar prazer fugaz e esquecimento, chamava com uma voz que ficava cada vez mais difícil de ignorar.

Até que um dia, ela disse:

– Tá bom. Só um pouquinho…

O doce gosto do chocolate branco preencheu sua boca, afogando seu coração partido em uma onda de falsa alegria.

A noite caiu, e Valentina ficou sozinha com a traição de sua própria promessa. As embalagens douradas se acumulavam ao seu redor mais uma vez. Ela havia retornado à sua sina e, com isso, selado o seu destino pelo sabor que havia jurado nunca mais provar.

***

Vida e Morte

Valentina encontrou novamente a Morte, nas mesmas condições das outras vezes. O chão gelado da cozinha, as embalagens de chocolate branco, a luz do luar – todos elementos de um quadro trágico que ela pintou com suas próprias escolhas. Então se pôs a chorar.

– Eu sou uma decepção, não sou? Eu decepcionei você! Eu decepciono todo mundo!

– Eu já esperava por isso – respondeu a Morte, imperturbável em sua eternidade.

– Por favor – implorou Valentina –, me dê mais uma chance. Eu posso mudar. Por favor, me ajuda!

A Morte olhou para ela com um semblante inexpressivo.

– Já me cansei de assistir ao seu fracasso.

Valentina não suportava ouvir aquilo. Em sua mente, ela era grandiosa, capaz de alcançar qualquer objetivo. Sempre teve um ar de superioridade e um ego inflado, e fracassar era uma palavra que ela costumava evitar. Mas a verdade é que ela era frágil, e não sabia lidar com frustrações. Em um rompante de vulnerabilidade, confessou:

– Eu só queria receber carinho… A vida não é justa! Todo mundo recebe amor em algum momento, seja da família, dos amigos, ou de um namoradinho. Mas eu… eu nunca tive isso! Eu só queria que… eu só queria que alguém me abraçasse!

– Pena que seu tempo acabou. Não haverá mais chance alguma para você.

– Não seja tola! Me leve de volta para o passado! – exigiu Valentina, agora com arrogância em sua voz. – Mas me leve para uma família diferente, onde meu pai não me abandone e minha mãe me trate com carinho!

– Por que eu faria isso?

– FAÇA LOGO! – gritou Valentina, com fúria e desespero.

– Eu sou a Morte, não o gênio da lâmpada.

E então a realidade de Valentina começou a se desfazer. A cozinha, as embalagens de chocolate, o luar – tudo começou a se dissolver em sombras. Ela estendeu a mão, tentando agarrar o que restava, mas só encontrou o vazio. A Morte, imóvel e implacável, observava enquanto a garota pouco a pouco desaparecia na escuridão.

Foi nesse momento que um brilho surgiu, iluminando o ambiente com uma luz acolhedora. Aquela presença resplandecente desafiava a escuridão e trazia consigo um sentimento reconfortante. Era a irmã mais velha da Morte, conhecida como Vida.

– Essa pobre garota não é seu brinquedo, Morte – a voz da Vida era como uma melodia doce e poderosa. – Pare de atormentá-la!

– Eu estava apenas… fazendo um experimento.

– Experimento?! E que experimento seria esse?

– Não lhe interessa!

– Não tente me fazer de boba! Eu sei que você sente prazer em esmagar os sonhos das pessoas.

– Essa menina é apenas uma viciada, por que você se importa tanto com ela?

– O vício é só a superfície, uma resposta à dor que não foi ouvida. Importar-se com ela é reconhecer sua luta, sua vontade de viver que persiste apesar do desespero. Você jamais compreenderia, pois isso se encontra no âmbito da vida.

Com um movimento gracioso, a Vida afastou a Morte, empurrando-a contra a parede. Então virou-se para Valentina, cujos olhos estavam fixos na figura luminosa à sua frente.

– Valentina. Sua jornada foi difícil, cheia de dor e desilusão. Mas ainda há uma chance para o amor e a felicidade reinarem em você.

– Mas eu sou uma fracassada – disse, com lágrimas escorrendo em seu rosto, olhando para a Vida com uma mistura de medo e admiração. – Eu falhei tantas vezes…

– A falha é parte da jornada. É como aprendemos, como crescemos. Você ainda tem muito a viver, muitas alegrias para encontrar e muitas dores para superar.

A Vida estava oferecendo algo que Valentina sempre desejou, mas nunca pensou merecer: uma segunda chance, uma verdadeira segunda chance. Para firmar o acordo, a Vida lhe deu um abraço longo e caloroso. Uma onda de energia benevolente inundou seu coração, preenchendo-o com uma luz que parecia acender cada canto escuro de sua alma.

– Vá, Valentina. Aproveite essa oportunidade que eu, a Vida, estou lhe dando.

– Vida… – disse a garota, com a voz trêmula.

– Pois não?

– Você poderia… me abraçar só mais um pouquinho?

– Sim, meu amor.

Em seu abraço, uma luz envolveu a garota, levando-a para longe da sombria cozinha e da presença da Morte. Quando a luz se dissipou, Valentina se viu em seu próprio quarto. O sol da manhã entrava pela janela, anunciando um novo dia.

Ela sabia que a jornada à sua frente não seria fácil, mas agora ela tinha algo que nunca teve antes: esperança.

Sobre Fabio Baptista

26 comentários em “Chocolate Branco (Thales Soares)

  1. iolandinhapinheiro
    12 de março de 2024

    Olá, querido Thales, primeiro quero parabenizá-lo por participar do concurso ENTRECONTOS trazendo seu trabalho diferente, original e dirigido para um público mais jovem, ainda que o tema vício seja pesado. Não vou entrar no teor da história porque os nossos colegas já o fizeram com muita propriedade, mas vou aproveitar esta oportunidade para te dar uma dicas que eu gostaria de saber quando eu comecei a escrever.

    A-Um conto é uma história rápida, uma imagem em uma fotografia que nos faz imaginar a história por trás do que se vê, no máximo, um conto é um clipe curto. Ele usa um fato fora do comum (ou um sentimento, ou um sonho…) é importante que não seja algo banal, e o autor transforma isso em uma história curta que prenda a atenção do leitor. Se você pretendia escrever uma história mais longa que contasse o problema da menina, os dilemas, toda esta trama que vc trouxe seria desenvolvida com mais suavidade se, ao invés de ser um conto, tivesse sido uma novela, ou um romance;

    B- Escrever menos é escrever mais. Cuidado com os detalhes, descrições e diálogos que não seja realmente necessário para a perfeita compreensão da história, lembre-se que são muito contos para ler e as pessoas querem uma trama mais ligeira e empolgante. Corte tudo o que for excessivo e que deixe a história mais lenta;

    C- O recomeço no seus conto foi se repetindo e eu me lembrei de algumas obras cinematográficas tais como Corra, Lola, Corra, o que é legal como proposta mas fica melhor em uma obra com mais espaço.

    Dito isto, gostei do seu conto, apreciei a pegada juvenil e o fato da sua heroína gostar de chocolate branco. Não me importa se é chocolate ou não, eu também adoro.

    Grande abraço e sorte na vida.

  2. Andre Brizola
    11 de março de 2024

    E aí, Thales!

    Uma pena que seu conto não estava na minha lista de avaliação, pois eu gostei bastante da forma como você tratou o lance do vício, com a alegoria do chocolate branco, e a personagem da Morte. Você conseguiu pegar um tema que enveredaria fácil no drama puro e simples e conseguiu dar uma aura mística, mitológica, que tirou ele do lugar comum. É o tipo de coisa que eu sempre espero do pessoal do EC.

    O enredo é algo simples, mas permeado de metáforas e figuras fantásticas, deixando-o com uma máscara poética bastante interessante. Vejo muito esse recurso na mão de alguns autores ingleses e, em especial, do Neil Gaiman. O tema recomeço é abordado de forma criativa, com Valentina ganhando da Morte a oportunidade de recomeçar. O ritmo do conto foi bem escolhido, com diversos diálogos “agilizando” a leitura, não deixando que as descrições, ou as repetições dos recomeços, deixassem a leitura cansativa. Mérito do autor, que soube utilizar esse argumento de maneira benéfica.

    Com relação às escolhas frasais, acho que tem alguns momentos bastante bonitos intercalados com outros que poderiam ser editados de maneiras diferentes. Dou como o exemplo o parágrafo “Antes de Valentina poder dizer qualquer coisa, a Morte tocou seu rosto, e o mundo girou em um turbilhão de cores e sombras. Quando a vertigem cessou, Valentina se viu em seu quarto. Tudo estava igual, mas estranhamente diferente. Sua mente, pela primeira vez em muito tempo, estava clara e com pensamentos organizados e harmônicos. Ao olhar para o espelho, notou que sua aparência estava mais jovem. Ela havia voltado aos seus 14 anos”. Tem coisa bonita como “girou em um turbilhão de cores e sombras”, ao mesmo tempo que cita “Valentina” duas vezes, além de uma quantidade enorme de pronomes possessivos. Não querendo me meter demais no conto, mas alguns trechos podem ser escritos de várias maneiras e darei como exemplo apenas um, “ao olhar para o espelho, notou que sua aparência estava mais jovem. Ela havia voltado aos seus 14 anos”, que eu reescreveria assim: No espelho se viu mais jovem. Havia voltado aos 14 anos. E esse aspecto do excesso de pronomes é uma questão que poderia ser revista no texto todo. Há uma frase no começo do conto, inclusive, em que Valentina repete “eu” umas cinco vezes (o que talvez reflita a locução de uma garota de dezesseis anos, de fato, mas aqui estamos tratando de literatura, então o texto sempre vai prevalecer).

    Da parte gramatical, eu realmente não costumo verificar muito. Acho que isso é mais parte de revisor do que comentarista. Sobretudo porque a maioria dos erros costumam ser falhas de digitação. Mas gosto de apontar uma ou outra coisa, mais no espírito de avisar o autor, pois são erros que podem gerar duplo entendimento (em situações mais específicas, não é o seu caso). Aqui achei por bem apenas apontar o “assistir televisão”, onde assistir aí é verbo transitivo indireto e pede a preposição, e sem a preposição fica no sentido de ajudar, auxiliar.

    No geral, eu gostei bastante do enredo e acho que o conto é muito bom. Mas ele pode ficar melhor se for feito um tratamento mais cuidadoso nos detalhes. Se fosse da minha lista, teria levado 8,5!

  3. Felipe Lomar
    9 de março de 2024

    olá

    O conto não é sobre chocolate branco. Foi criativa a metáfora sobre drogas. Talvez um pouco clichê demais no desenvolvimento, porém. Resolver o problema no final com um Deus ex machina também não foi muito interessante. Apesar disso, a escrita e as descrições tem uma certa qualidade, e o texto tem um ritmo bom de se ler.

    boa sorte.

  4. Marco Aurélio Saraiva
    8 de março de 2024

    Gostei que, enquanto ela aceitava a segunda chance da Morte, mantinha-se no ciclo do vício. Ela abraçava a morte como se pudesse tirar algo de bom dela. Foi só quando escolheu a vida, que conseguiu quebrar o ciclo. Este é um conto bem metafórico, com enormes eufemismos a fim de exemplificar algumas ideias (o amadurecimento, o trauma, o vício). É uma fábula moderna. Os personagens não têm muita personalidade, eles mais são instrumentos para levar a narrativa a frente. É um estilo que costumo não gostar muito, e apesar de eu ter achado a leitura deste conto um pouco cansativa e repetitiva, vi aqui muita atenção e muito carinho na escrita.

    O que não gostei: da repetitividade da história. Mais da metade do conto foi ver a personagem principal repetir os mesmos atos e cair nos mesmos erros. Ela se redime no final, mas ao custo de uma leitura cansativa.

  5. Jorge Santos
    7 de março de 2024

    Olá. Este é o último dos contos que sou obrigado a comentar neste desafio. Fala de três coisas de que gosto: em primeiro lugar, é um conto, em segundo lugar, fala de chocolate, em terceiro lugar, usa surrealismo. Faltou apenas algum ritmo, um final menos expectável. Nem todos os contos precisam de um final feliz. Gostei da forma como usou o chocolate como alusão à droga. Lembro-me de quando iniciei o meu estágio em Lisboa. Saí do comboio à meia-noite e cruzei uma das praças principais da baixa lisboeta, sendo abordado por um homem que me perguntou se queria “chocolate”, gíria para canábis. Na Alemanha, é moda os jovens snifarem cacau em vez de cocaína, dando os efeitos que refere no seu conto. Não acredito que o simples chocolate branco faça o mesmo efeito, porque a quantidade de cacau é manifestamente insuficiente.

    Quanto à linguagem, não achei problemas de maior. A adequação ao tema está bem vincada nos sucessivos recomeços, nos quais a personagem cai consecutivamente no vício, algo que é bastante real, não importa o tipo.

  6. Fernanda Caleffi Barbetta
    6 de março de 2024

    Chocolate Branco (Nikaido)

    Que vontade de comer chocolate branco!!! Gostei da ideia de usar o chocolate como o vício, como a recompensa que ela buscava para suas frustrações e ansiedades. É um texto muito bonito e sensível. O final, com o surgimento da vida foi inesperado.

    Algumas construções que destaco positivamente: “conforto no doce que tanto a consumia” / “Valentina cuspiu a palavra como se fosse veneno” /

    Algumas sugestões. Use o que julgar que vale:

    No primeiro parágrafo, quando você coloca a personagem caída no chão, eu a vejo caída no chão. Aí, quando você, no mesmo parágrafo, a descreve, eu fico vendo essa descrição enquanto ela está caída no chão… ou seja, o cabelo na altura do ombro, está esparramado no chão, a franja reta cortada rente à testa não está reta rente à testa…. entende? Sugestão, quando colocar a personagem em uma cena, use esta cena.. não interrompa no meio do parágrafo para descrevê-la.

    “Sua mãe estava dormindo no quarto do andar de cima e não havia nenhuma outra pessoa na casa. Suas únicas companhias” – aqui, fica confuso sobre a quem se refere “suas companhias”… na primeira leitura, parece que é a mãe.

    “por trás do capuz preto” – por trás?

    “Valentina tentou ler um livro” – ela não tinha que se arrumar para ir para a escola?

    “Então comeu uma segunda barra, e uma terceira, e uma quarta” – deixar claro se foi o vizinho que lhe deu todos esse chocolate e por que

    “tão fria como o de costume.” – tirar o “o”

    “Sempre teve um ar de superioridade e um ego inflado” – essa informação apareceu somente no final. E eu não percebi estas características nela.

  7. claudiaangst
    4 de março de 2024

    Oi, Nikaido, tudo bem?

    Sim, o seu conto aborda o tema proposto pelo desafio. Aliás a protagonista abusou do direito de recomeçar. Vício em chocolate branco? Ou seria algo como pó branco? Se substituir uma barrinha por uma carreirinha …

    Como alguém pode ser viciado em chocolate branco? Ele costuma ser mais gorduroso e mais doce, dizem os entendidos que chocolate branco nem chocolate é, de fato. Manteiga de cacau adoçada. Gosto? Gosto, mas não posso.

    Enfim, a narrativa discorre sobre a renovação da chance de um novo começo, sobreviver ao vício e fugir das garras da Morte.

    O conto parece ter sido elaborado visando à leitura de um público mais jovem, suscetível a fábulas com um “quê” de lição de moral no final. A esperança vence todos os vícios?

    “A Vida estava oferecendo algo que Valentina sempre desejou, mas nunca pensou merecer: uma segunda chance” > apelou um tantinho aí no pieguismo… Enfim, duelo entre Vida e Morte favoreceu a sobrevivida da protagonista.

    No geral, o conto está bem escrito. Você leu A Biblioteca Meia Noite, né? Sei que sim, não negue. Só achei estranha a escolha de “cometer decisões”. Eu tomo decisões (às vezes antes do café da manhã), mas cometo muitos erros.

    Parabéns pela participação no desafio. Boa sorte para aproveitar a nova chance longe do pó branco, digo, do chocolate branco.

  8. Vladimir Ferrari
    4 de março de 2024

    Entendo que há um excesso de pronomes em alguns momentos do texto. “O sussurro da derrota” é um baita título. Dá para pensar em grandes histórias a partir dele. A premissa do desafio foi atendida e usar o “chocolate branco” como o antagonista (se bem que antagonista e protagonista são o mesmo na narrativa), foi interessante. Texto bem escrito. Sucesso.

  9. Priscila Pereira
    2 de março de 2024

    Olá, Nikaido! Tudo bem?

    Seu conto não está na minha lista de obrigatórios então não poderei avaliá-lo, mas mesmo assim quero deixar um comentário.

    Achei muito interessante como trocou qualquer tipo de droga por chocolate branco, muito bem sacado mesmo! A cena toda dela no chão da cozinha rodeada por embalagens vazias é bem sugestiva.

    Uma história que poderia ser bem mais pesada e clichê, ficou mais lúdica e original. Muito bom!

    Porém (sempre tem, né), toda a luta entre a morte e a vida, e o final com “ela só precisava ser amada” deu uma cara de “moral da história” que eu particularmente não acho legal. Pra mim toda moral tem que ficar muito subentendida na história, na ação dos personagens e não tão escancarada assim… Mas isso é coisa minha, com certeza muitas pessoas vão gostar!

    No geral, eu gostei bastante do conto, achei muito criativo, muito bem escrito, bem revisado, um conto muito bom!

    Boa sorte no desafio!

    Até mais!

  10. Emanuel Maurin
    29 de fevereiro de 2024

    Oi autor, tudo bem?

    Uma adolescente viciada em chocolate, que a leva pra morte. Mas a morte da uma segunda chance de mudar seu destino e a menina fracassa. A morte da mais chances, mas menina também não resisti ao vício. Quando a morte tá quase a leva-la, a vida aparece e a salva, dando uma nova oportunidade de ser feliz. A menina aceita a vida e recomeça sua jornada com esperança.

    Achei o conto bem escrito e criativo, gostei dos temas que abordou: vício, família, amor e esperança, mas os personagens não me cativaram, faltou descrição. Gostei dos elementos fantásticos: morte e vida, isso deu qualidade na sua história. Vc tbm terminou o conto com uma mensagem positiva. Parabéns.

  11. Gustavo Castro Araujo
    28 de fevereiro de 2024

    Gostei do conto, com exceção da parte final. É um texto concebido para adolescentes da faixa de 12-13 anos, e que visa fazê-los pensar no problema das drogas e em tudo que delas decorre. Nesse aspecto, o conto acerta por trazer a ideia de vício em chocolate branco, e não necessariamente em alguma substância ilegal. É o tipo de estratégia que funciona com o público a que se destina, que evita que eles se afastem logo de cara. Ponto para o(a) autor(a).

    A trama, nesse sentido, foi bem construída, com a Morte oferecendo a Valentina duas chances para que ela se redimisse, tendo a garota falhado em ambas.

    Esse elemento sobrenatural, aliás, foi muito bem utilizado para tornar a leitura atrativa, evitando o didatismo e a chatice de uma história mais adulta. As razões que levaram a menina a sucumbir ao vício também funcionaram igualmente bem, já que não são raros os casos desse tipo.

    Só não curti o fim – açucarado demais. Essa ideia de a Vida surgir para suplantar a morte e libertar Valentina de seu destino contumaz me pareceu um tanto forçada, criada talvez para arrematar o conto com um final feliz. Penso que drogas dificilmente têm um final feliz – e nas que têm, essa façanha é conseguida com muita disciplina, a muito custo.

    Em termos puramente egoísticos, creio que o final do conto ficaria melhor se, mesmo com a derrota da Morte, Valentina vislumbrasse uma barra de chocolate em um canto qualquer, como uma tentação onipresente, afinal, esse seria seu desafio pelo resto de sua existência.

    De todo modo, é um conto que impele a leitura, bem elaborado e com ótima escrita. É dinâmico, tem uma protagonista cativante e cumpre bem o papel de dizer ao público a que se destina tudo aquilo que “Eu, Christiane F.” se propôs, sem a necessidade de parecer chocante demais.

    Parabéns e boa sorte no desafio.

  12. mariainezsantos
    26 de fevereiro de 2024

    Uma escrita reveladora de momentos de lucidez mesclada ao sonho fazendo com que realidade e virtual se misturem confundindo o que pode e o que não pode ser real. O inusitado momento em que vida e morte se confrontam num paralelo indecifrável quando o luz ilumina os caminhos dissipando a escuridão permitindo que o olhar seja diferenciado e novo.

  13. Simone
    25 de fevereiro de 2024

    Quem dera tivéssemos outras chances. Às oportunidades dadas pela morte, ela não aproveitou e fez igual, voltou ao chocolate branco, que como uma droga, um prazer efêmero. Cercada pela indiferença do pai, pela raiva da mãe, ela não consegue resistir e tomar o caminho da sua vida. Mas a própria vida concede a ela nova chance, e dá o aconchego de força e fé, num abraço. Agora pensamos que ela aproveitará a chance de mudança. O conto deixa para o leitor a construção do final com a vitória de Valentina. Uma história de fantasia, uma lição nas entrelinhas. O chocolate branco como qualquer droga. A falta do carinho dos pais, que trava a vida dos jovens. Ficamos felizes com o empenho da vida, quando a morte já considera o jogo ganho. Como sugestão de melhoria, penso que poderíamos saber um pouco mais sobre o drama familiar que levou essas três personagens (pai, mãe e filha) à intolerância, indiferença, rancor, etc.

  14. Pedro Paulo
    24 de fevereiro de 2024

    RESUMO: Valentina enfrenta a Morte por três vezes, na arena do vício, até a Vida ser a primeira a mostrar acolhimento.

    COMENTÁRIO: É um conto singelo, com uma mensagem positiva acerca de perspectiva e superação, de se ver para além das próprias cicatrizes e do fatalismo. É metafórico no uso do “chocolate branco” como uma forma de abordar outros vícios que consumem vidas, mas consolida o conflito da narrativa e o desafio à protagonista, cativando quem lê a torcer por Valentina para vencer sua aposta contra a morte. Entretanto, em algumas linhas de diálogo e na maneira como alguns parágrafos se dedicam e explicar o porquê dos sentimentos da personagem, achei que a autoria se perdeu um pouco, tornando-se artificial demais ou expositiva demais, de modo a distrair a leitura de um texto que, em outros pontos, mostrou-se bem escrito, poético. Então poderia ter enxugado um pouco e reescrito os diálogos para soarem mais orgânicos. Ainda assim, uma boa abordagem do tema!

  15. Kelly Hatanaka
    24 de fevereiro de 2024

    Estou avaliando os contos de acordo com os seguintes quesitos: adequação ao tema, valendo 1 ponto, escrita, valendo 2, enredo, valendo 3 e impacto valendo 4.

    Adequação ao tema
    Atende ao tema. Valentina tem múltiplas oportunidades de recomeçar e sucumbe sempre ao vício em… chocolate branco?

    Escrita
    Correta, não encontrei erros. Algumas coisas, porém, causaram estranheza. Logo no começo, Valentina é descrita como parecendo uma criança, nem parecia ter 16 anos. Achei graça, mas imagino que o autor seja jovem. Para mim, leitora não-jovem (eufemismo pra véia), qualquer idade com menos de 18 anos é criança.

    Enredo
    Simples. Valentina é viciada em chocolate branco e morre por consumo excessivo. Quando a morte vem busca-la, pede uma nova chance, ganha e a desperdiça, até que a vida lhe dá um abraço e ele ganha uma nova chance, desta vez com esperança.

    Impacto
    Um conto singelo, com cara de fábula infantil. Esquisita essa escolha por chocolate branco. Minha mente adulta e semivelha traduziu internamente para cocaína e daí fez um pouco mais de sentido. Aliás, acho que o conto teria ganhado força e dramaticidade se fosse cocaína mesmo no lugar desse recurso eufemístico de chocolate branco.
    No fim, tudo o que Valentina queria era carinho e sua volta, após o abraço da vida, se dá cheio de esperança. Sei lá… não senti firmeza nessa Vida aí, não. Discursinho motivacional padrão, abracinho e vá ser feliz? Até levar um fora da mãe e aparecer o traficante de chocolate de volta, né. E talvez aí esteja um ponto que poderia ser trabalhado. O leitor pode ser cínico, como eu, e não acreditar facilmente em redenções. E assim, a gente tende a largar mão da personagem. Acho que a redenção deveria ser difícil, porém, crível.

    Kelly

  16. Leda Spenassatto
    24 de fevereiro de 2024

    Chocolate Branco (Nikaido)

    Eita! texto bem escrito.

    Que inveja da sua gramática.🫣

    Eu que, quase, nunca sei onde colocar a pontuação, pude verificar a facilidade da sonorização em sua narrativa.

    Betina com sua dependência buscou afogar suas carências no doce sabor que têm o chocolate branco.
    Do seu pai só tinha o dinheiro, para sua mãe ela era uma decepção, um peso inútil.
    Travou, consigo mesma, uma guerra interna e crucial, onde a Morte a desafiava até o dia em que a Vida apareceu lhe devolvendo a esperança.

    Que conto lindo, que clareza de relato e magnitude.
    Que inveja dessa pessoinha, que relata uma história triste com tanta leveza e harmonia.

    Um palpite: não foi um menino que escreveu essa belezura de conto.

    Nem é preciso te desejar sucesso.

    Abraços!

  17. Sílvio Vinhal
    23 de fevereiro de 2024

    A história é bem redigida, porém, há a impressão de que há um “excesso desnecessário de palavras”. Um bom exercício para isso é tentar contar/recontar a história como um resumo de 300 caracteres, por exemplo, como se fosse um microconto.  Recurso que, na revisão, pode ser aplicado a cada parágrafo.  “O que eu posso retirar desse parágrafo para torná-lo mais conciso, sem perder a ideia que quero transmitir?”

    O tom de “certo/errado” – vida e morte, dá uma certa previsibilidade um tanto piegas, panfletária, conhecida, que o autor precisa evitar.  Confesso que eu também trazia isso na minha escrita, e tive que entender que não coaduna com a boa literatura, justo porque a boa obra de arte deve ser aberta, ou seja, ela permite que o leitor tire suas próprias conclusões.

    Um conselho: investir um pouco mais no sentimento do protagonista – a descrição, simples, não consegue criar empatia com o leitor, é como se fosse uma história “fora dele”, porém, quando o personagem “fala” por meio de uma vivência interior, mental, em primeira pessoa, consegue criar mais empatia, como se leitor e personagem se fundissem. Ou seja, “mostrar mais do que descrever”. Por exemplo:

    _ Valentina desceu a escada atordoada. (descreve)

    _ Chegou ao andar térreo sem perceber os degraus, aos tropeços. A cabeça zunia e os olhos mal conseguiam se fixar num único ponto. A respiração entrecortada, uma palpitação tomando conta do seu corpo. (mostra)

    É interessante tratar a escrita com várias camadas – cada uma mais profunda que a outra. Os personagens podem ganhar mais densidade, serem menos “caricatos”. Por exemplo, por que a Morte tem que ser essa figura convencional? E se ela aparecesse no celular da garota, numa videochamada, ou, no delírio, ela conversasse com o próprio chocolate? Para inovar é preciso pirar um pouco.

    Quanto à mãe, que problemas a levaram a ser/agir daquela forma? Quem é, de fato, Valentina? Que profundidade tem esse personagem?  Lembrando que em todo personagem há o “bem e o mal” – o que equivale dizer que ninguém é totalmente bom ou totalmente mau. Uma pergunta que não quer calar. A nova vida boa e cheia de esperanças de Valentina, também “salva” seus pais?

    O desfecho peca por não ter uma guinada ou um “elemento surpresa”, uma quebra de paradigma, que poderia tornar o conto mais atual e mais interessante. Do jeito que está, não traz empolgação.

  18. Antonio Stegues Batista
    23 de fevereiro de 2024

    Não entendi muito bem o mote do conto, o significado do chocolate como uma droga viciante, ou simplesmente Valentina é viciada em chocolate branco, um doce que provoca dependência e alucinações. No mundo da Fantasia, é bem possível, tudo pode acontecer. Uma vez assisti um filme sobre um alienígena que ficava embriagado tomando leite de vaca.

    Valentina é uma garota insegura e influenciável. O vício é realmente desse jeito, para algumas pessoas é impossível evitar.

    Deixando as metáforas e fantasias de lado, achei o texto bem escrito, as frases elaboradas. É interessante a Morte e a Vida como personagens disputando o destino de Valentina. Achei o enredo simples, mas que trás uma mensagem positiva. Sempre há uma luz no fim do túnel.

  19. Fabio Baptista
    22 de fevereiro de 2024

    O vício em chocolate branco leva Valentina a óbito. A Morte dá uma segunda e depois uma terceira chance, mas a menina sempre cai no vício novamente, devido ao abandono paterno e ao tratamento recebido da mãe. Quando iria em definitivo para as cucuias, a Vida intervém e dá uma segunda chance real à Valentina, onde havia presença da esperança.

    Um conto com pegada juvenil, com linguagem mais leve e metáforas para disfarçar o tema pesado das drogas. A leitura está fluída como se espera desse tipo de conto destinado a um público mais jovem. Dá até uma estranheza (no bom sentido) ler esse tipo de história no EC, onde geralmente recorremos a abordagens mais “adultas” e um estilo de escrita mais rebuscado (desnecessariamente muitas vezes).

    Sobre a trama, eu achei a mãe uma personagem fraca, caricata demais, mesmo para a proposta. Talvez fosse melhor tirar a terceira chance (ficou meio repetitivo de todo modo) e aproveitar o espaço para dar um pouco mais de “alma” para essa personagem, ou talvez mostrar mais algum aspecto sofrido da vida da Valentina.

    O final do conto me deixou na dúvida. Ela voltou no tempo para uma nova chance e dessa vez haveria esperança de um verdadeiro recomeço. OK, mas está na mesma casa? Mesma mãe? Mesma mãe em uma realidade alternativa onde talvez o pai estivesse junto? Às vezes a dúvida é a cereja do bolo. Aqui não senti isso, apesar de não ter comprometido.

    Algumas anotações que fiz durante a leitura:

    • reta cortada rente
    • possuía poder
    • Vá, Valentina
      Eu tento evitar a proximidade dessas palavras que têm uma “sonoridade” semelhante. Na minha opinião evita alguns “soluços” que podem distrair o leitor.
    • ela tinha
      O mesmo vale para cacofonias
    • Eu posso parar quando eu quiser.
    • Por que eu iria querer? Eu estou no comando! Eu controlo o quanto eu quero, o quanto eu preciso.
      Poderia limar alguns “eu”s
    • O despertador já tinha desistido dela, mas sua mãe não.
      Essa frase ficou bem legal
    • Isso vai te levar às nuvens, morô?
      Mano, essa parte do traficante oferecendo chocolate branco me fez rachar o bico por lembrar disso aqui:
      https://www.youtube.com/watch?v=l73-0r5zB94
    • por sua papila gustativa
      melhor o plural aqui
    • olhos aqueles que já haviam visto muitas súplicas e muitas promessas vazias
      Um “testemunhado” cairia melhor do que o “visto” (teoria da sonoridade das palavras). Eu também arrancaria esse “aqueles”.
    • Já me cansei de assistir ao seu fracasso.
    • Não lhe interessa!
      Meu, a Morte entrou na competição de toxidade com a mãe da Val, hein kkkk

    Bom conto!

    NOTA: 8,5

  20. rsollberg
    16 de fevereiro de 2024

    Chocolate Branco

    Fala, Nikaido

    Antes de tudo gostaria de deixar claro sou apenas um leitor entusiasmado e meus comentários dizem mais sobre gosto do que qualquer outra coisa.

    Destaco preliminarmente que o conto atendeu plenamente o tema do desafio. São vários pequenos, ou falsos, recomeços e um definitivo. Verdadeiro.

    A morte enquanto personagem é algo recorrente na literatura, desde Saramago em “as intermitências da morte (em minha opinião, a melhor representação literária) até “A menina que roubava livros”. Presente na comédia, como no “um trabalho sujo” do Chrsitopher Moore, ou no drama, como no presente conto. Fato é que se trata de um arquétipo fantástico nas mãos de um bom autor. E aqui, penso que funcionou novamente.

    O texto é muito bem escrito. A alegoria dos “chocolates brancos” foi também muito bem pensada, principalmente se pensarmos em diferentes públicos a serem atendidos. O eufemismo como ferramenta. A protagonista razoavelmente desenvolvida dentro dos limites do desafio. Uma história que comove. O maniqueísmo não me parece ser um obstáculo, tendo em vista ao que se propõe, ou seja um formato infanto-juvenil. A vida certamente poderia ter cantado para A morte “try a little tenderness”, mas a Morte é uma danada sem coração.

    Abraços grátis, diria a Vida.

    Parabéns e boa sorte no desafio.

    • Thales Soares
      11 de março de 2024

      Vlw Rafael, por ter lido meu conto!

      Aliás, você que é o barbudo viciado em Ouro Branco, né? Fico feliz que devido a esse vício em comum com minha protagonista, você tenha conseguindo criar uma conexão especial com meu conto!

      E realmente, eu queria ter mostrado mais da Valentina. Eu tinha tudo dela em minha mente, toda a sua complexidade e contradições internas… mas o limite de palavras sufocou esse desenvolvimento. Quem sabe um dia, quando eu adaptar esse conto para uma história maior e mais ambiciosa, eu não consiga apresentar melhor essa personagem insana que habita os meus sonhos.

      Obrigado pelos elogios Rafael!!

  21. Givago Thimoti
    12 de fevereiro de 2024

    Chocolate Branco – Nikaido 

    Impressões iniciais: 

    + Texto organizado

    + Pertinente com o tema

    – Faltou um pouco mais de maturidade nesse conto

    – Como amante de chocolate (especialmente o branco), entendi muito bem a relação entre chocolate, vício e drogas rs.

    Resumo: 

    “Chocolate Branco” conta a história de Valentina, uma adolescente de 16 anos que se encontra em situação de drogadição e recebe chances da Morte para mudar o seu passado e refazer o seu presente e futuro. Em todas elas, Valentina falha em fugir de seu vício e do ciclo vicioso que a leva ao vício. Isso muda somente quando a Vida resolve intervir na situação em favor de Valentina.

    Corpo (gramática/estilo de escrita):

    A escrita é simples, sem grandes floreios literários. Acho que a autora (ou o autor) poderia ter ousado mais nesse sentido, se arriscado mais. O conto tem muito potencial literário, em termos de sentimentalismo. Contudo, faltou esse esmero de embelezar o conto, para arrebatar o leitor. 

    Dito isso, também não achei um conto feio. Simples, apenas.

    Não observei também erros gramaticais gritantes (acho que só a falta de uma vírgula em alguma frase).

    Aqui, vou aproveitar para fazer um elogio à organização do texto, que tornou o conto claro e sucinto.

    Alma (o que tocou ou não o leitor. Pontos fortes e/ou fracos)

    O que me tocou negativamente nesse conto foi a imaturidade e a contradição ao escrever o conto. Valentina tem o aspecto físico de uma criança e é uma adolescente de 16 anos com problemas familiares; a mãe desconta na filha o fracasso do matrimônio (e porque não de sua própria vida), punindo-a pelo divórcio com o ex-marido como se Valentina e o ex fossem a mesma pessoa. Enquanto isso, o pai de Valentina a abandona, priorizando o trabalho, limitando a sua relação com a filha ao nível econômico e a encontros nos feriados. 

    Essa relação familiar demonstra a profundidade do conto. Agora, o jeito que ele é conduzido vai numa direção diametralmente oposta. O conto tem uma pegada infantil, como uma história-lição, o que não combina com essa profundidade. Ou, melhor dizendo, falar sobre adolescentes em situação de drogadição, relações familiares e as nuances problemáticas desse contexto não funcionam com um texto infantil (embora, eu não classificaria esse texto como infantil, já que faltou o aspecto lúdico).

    O chocolate branco me incomodou um pouco, confesso. Não há o aspecto lúdico ou imaginativo de uma analogia. A sensação que tive é que o chocolate branco é só um sinônimo para droga. Autora/autor, por que não falar cocaína, crack, maconha…? Não acho que tratar sobre drogas é suavizar a questão. 

    Outro ponto, que aí é mais uma chatice minha do que qualquer coisa. Acho que seria melhor abordar as duas entidades Vida e Morte com outro nome e com outras características. Por quê isso? A Vida não é uma mãe acolhedora e afetuosa, assim como a Morte não é uma carrasca sádica, que gosta de ver os humanos sofrerem. Acho que esse maniqueísmo, especialmente nesse conto, não combina com a profundidade da história. Substituir a morte por uma figura tipo Deus do Furdunço do rapper BK (A entidade que fazia tu falsificar a identidade/ Pra entrar em boates, poder comprar em bares / Você sempre me ouve, sempre faço tu acreditar que essa vai ser a melhor noite (…) Vem, eu não sou ninguém/ eu não sou nada
    / Eu sou a desculpa que a sua mente dá/
    Pra realizar suas vontades, seus desejos

    Comparo esse conto com um iceberg; você vê a ponta, enquanto o restante do bloco de gelo fica submerso na água, oculto a quem vê de longe. Quem quiser ver mais do bloco, precisa mergulhar para contemplar o bloco de gelo. Alguns contos são assim propositalmente, o que não me parecer ser o caso.

    Enfim, minha conclusão é que eu gostaria de ter visto mais maturidade, coragem e até mesmo ludismo para tratar sobre esse assunto.

    E, embora pareça que odiei o conto rs (o que não é o caso), eu enxerguei muito potencial nesse conto. Agora é lapidar. Acho que a autora/ o autor tem o potencial de trazer o lirismo e a profundidade para esse conto e outros que irá escrever. 

    Nota: 6 (mas poderia ter sido muito mais)

  22. Angelo Rodrigues
    12 de fevereiro de 2024

    Chocolate Branco

    Por Nikaido

    O conto assume a estrutura de fábula, com a presença clássica da Morte que se aproxima dos que caíram em desgraça por conta dos vícios que assumiram.

    Tem um tom ingênuo, de construção ingênua, algo como ensinar às crianças que os filhos chegam às mulheres por meio das cegonhas, que as trazem em seus bicos enrolados numa fralda. Digo isso porque não achei justificativa plausível para o autor haver trocado a cocaína pelo chocolate branco, criando uma longa metáfora para o vício da protagonista Valentina. Ela não engorda, não se torna obesa, não tem fastio da gordura da manteiga de cacau, ela apenas se vicia e fica caída sem sentidos tendo alucinações com a morte. Curiosa escolha.

    No conto, o autor se utiliza de uma série de arquétipos sociofamiliares que – talvez – justifiquem o ritmo de vida ao qual se entregou a protagonista: uma mãe grosseira que não a compreende, e, segundo o mesmo arquétipo, tão sem afeto quanto a protagonista; um pai ausente, que talvez tenha constituído uma nova família; amigos insidiosos que circunstanciam o seu vício com ofertas equivocadas de… chocolate branco.

    O tom fabular do conto, inclui, inclusive o sabido ‘pela terceira vez’, o valor mágico que, superado – ou não superado –, justifica a punição pela queda ou o prêmio pela conquista sempre esperada.

    Isto posto, eis que surge a irmã mais velha da Morte, a Vida – nunca soube que a Morte tivesse uma irmã, e menos ainda que essa irmã fosse a Vida. Trata-se, aqui, neste ponto, de uma trapaça do autor, que subverte a sequência lógica dos fatos apontados até então pelo conto, uma espécie de Deus ex machina rolando novamente os dados, agora viciados em benefício da protagonista Valentina.

    O conto/fábula, embora bem escrito, constrói seus pecados pela escolha substitutiva feita pelo autor, rebaixando o problema abordado, como se não desejasse transmitir ao leitor o drama real do vício em cocaína de Valentina, que aos 14/16 anos já fazia parte da sua vida.

    Sob o quesito Recomeço, curiosamente a nossa protagonista recomeça por quatro vezes, embora em nenhum momento ela recomece de fato, dado que suas atitudes não mudam.

    Sob tais circunstâncias, realmente não vi qualquer abordagem de Recomeço, dado que não há atitude decisiva da protagonista, mas uma esperança descrita pelo narrador, subjetivada por ele – o narrador – de que ela assim procederia. De novo, com a esperança, o autor retorna à fábula por meio da Esperança, a última que morre, emprestada aqui da Fábula da Caixa de Pandora.

    Parabéns pelo conto e boa sorte no desafio.

    • Thales Soares
      11 de março de 2024

      Vlw Angelo, por ter lido meu conto!

      O motivo do Chocolate branco ao invés de cocaína é porque drogas são chatas, não? Prefiro chocolate, bem mais gostoso! E a magia das fábulas é justamente essa… podemos comer chocolate infinito, sem nos preocuparmos em ganhar peso e nem mesmo com diabete… que bom que o campo literário permite esse tipo de coisa, porque eu não gostaria de engordar!

      Sobre os laços familiares da Morte… não conte nada ao Neil Gaiman, senão ele vai lhe dizer que o irmão mais novo da Morte é o Sonho! Mas tudo bem.

      E sobre o tema… será que realmente houve um Recomeço? Eu tenho esperanças de que, desta vez, Valentina mude suas atitudes. Sério, estou torcendo muito para que nesse quarta tentativa ela siga por um caminho mais iluminado.

      Obrigado pela crítica Angelo!

  23. Mauro Dillmannn
    11 de fevereiro de 2024

    A personagem Valentina tem autocompaixão. O final aponta para a possibilidade de redenção, de conquista da felicidade. Assim, o texto ganha essa dimensão de entendimento e de ajustes de vida que vão do erro ao acerto. O pretexto para essa dimensão é o vício em chocolate, que esconde, por sua vez, a complexa relação entre filha e pai/mãe. Acontece que mesmo essa dimensão supostamente mais profunda (a carência de afeto familiar) parece também trazer suas fragilidades. O tom do texto fica no sentimentalismo e na tentativa de demonstração da fraqueza da personagem diante dos desafios externos (a culpa é dos pais, a culpa é do chocolate). Assim sendo, o narrador também traz a marca de compaixão pela personagem.

    O conto é dividido. Na segunda parte, quando a ênfase está nos conflitos familiares, o texto ganha em dinamismo e a leitura flui bem.

    A trama em si, envolvendo o vício em chocolate, a visão da morte, parece pouco crível. Algo comum no universo artístico (filmes, livros), a visita da morte e as novas chances para se concretizar uma ‘vida feliz’. E ainda uma promessa de destino cristão ameaçador, do tipo juízo final: “a levarei para a escuridão eterna”. No final, tudo termina bem. Tem-se um recomeço com esperança. Mas o conto fica linear, pautado numa relação afetiva do narrador com a personagem (não está errado, apenas minha opinião crítica enquanto leitor).

    Outros detalhes que merecem atenção:

    “os cabelos negros e lisos”. Eu diria “os cabelos pretos” porque está fazendo referência à cor do cabelo. O nome da cor é ‘preto’. “Negro”, na língua portuguesa do Brasil hoje significa ‘etnia’, recorte étnico-racial.

    “e a mantinha em um estado catártico”. Essa ideia de ‘catarse’ virou lugar comum, chavão. Seria bom evitar.

    Errinho de digitação/revisão: “de dois anos arás”.

    Parabéns pela escrita!

    • Thales Soares
      11 de março de 2024

      Vlw Mauro, por ler meu conto!

      Acho que você tem razão quando disse que eu tive compaixão da minha personagem… acabei me envolvendo demais com ela, e não consegui dar outro final que não fosse um feliz hahaha. Você me pegou, viu… eu realmente sinto afeto pela Valentina. Falha minha.

      Escuridão eterna seria promessa de destino cristão? Não seria uma promessa de ateu?

      Sobre os cabelos negros… sinto muito, mas meu português não é tão contemporâneo, e não consigo atualizá-lo. Estou preso nos cabelos negros de Iracema até hoje, então espero que não se incomode nos próximos desafios, quando ver que eu continuei a cometer esse mesmo equívoco ideológico.

      Opa! Li 50 vezes esse conto, e revisei ele sem parar durante muitos e muitos dias. Mas esse errinho aí que você citou, do “arás”, eu realmente não havia percebido. Obrigado por avisar!

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Informação

Publicado às 10 de fevereiro de 2024 por em Recomeço e marcado .