EntreContos

Detox Literário.

Estantes (Thiago Barba)

 

Há seis outonos venho aqui. Folheio o máximo de Hemingways, Balzacs e quantos outros cânones literatos mais sejam possíveis. Compro aqueles que o tempo afastou de meus dedos.

Sou péssimo leitor, confesso. Livros são para folhear. Meus olhos, vez ou outra, até são atraídos por algum trecho. Leio apesar, mas em geral folheio. Mentira!… Quase mentira. Leio epígrafes. Copiosamente, sou ótimo leitor de epígrafes, isso eu atesto. Sou fã de algumas dúzias e parte delas até me traduzem. Drummond, por exemplo, “Há livros escritos para evitar espaços vazios na estante”.

Preciso de mais estantes. Ao menos para eu tirar os livros da porta do meu quarto, às vezes sinto a necessidade de dormir com a porta fechada. Dia desses, encontrei a solução para os livros sobre a pia. Quebrou uma cadeira. Ela tinha os pés de alumínio. Fica a dica, nunca compre cadeiras com pés de alumínio, uma porcaria, vai esgaçando e esgaçando, até… Juntei os livros, quatro pilhas, bem juntinhas. Eram cerca de trinta e cinco livros cada monte. Coloquei uma almofadinha em cima deles, e!… Ótima cadeira nova. Consegui até lavar a louça estacionada na pia há semanas. Ainda tenho paredes vazias, estantes seriam ótimas.

Ela conheceu minha casa há seis anos. Os livros ainda não dormiam lá, por certo. Eu ainda não havia adquirido o hábito da leitur… o hábito de folhear os livros. Esse, digamos, hobbie, começou na semana sequente de ela ir embora. Os livros começaram aparecer por conta dela. Ela adorava George Orwell e foi a partir dela que descobri, não foram os Engenheiros do Hawaii responsáveis pela criação da frase, mas sim parafrasearam “Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que outros”. Ainda bem! Foi grande alívio saber, nunca achei muita graça no Humberto Gessinger. É inútil folhear encartes de CDs.

Odeio CDs, se procurar bem, talvez eu tenha uns cinco lá em casa. Esmagados por algum livro, certeza. Um deles, único que sei, é do John Lennon. Ele está no centro de uma pilha com aproximadamente cinquenta e oito livros. Pequena. Reside ao lado do botão desliga da tevê. Nunca mais ouvi. Não gosto de Lennon, prefiro McCartney. Escutei uma vez só. Lá. Há seis… Eu ganhei dela. Ouvimos juntos e cantamos Nobody Told Me. Fingíamos um estetoscópio. Na sala. No corpo do outro. Nos divertimos. Dançamos. Jogamos almofadas e ela espirrou um bocado. Olhamos um para o outro. Nos olhos. Odeio John Lennon.

Aqui na feira tem livros demais! Isso me endoidece um tanto. Tendas demais também, para endoidecer outro tanto. No ano um foi fácil, entrei de curioso, mais pela circulação de pessoas. Nunca fui um frequentador de eventos culturais, para me esconder um pouco daquele ambiente inóspito a mim, escolhi uma tenda qualquer, peguei um livro, olhei a capa, mais outro, ousei abrir, folheei e, puf! Lá estava. Numa epígrafe. Nunca tive sorte, compro rifas aos montes e nunca fui sorteado. E olha que se alguém me oferece já vou comprando. Nunca ganhei nada. Bingo, roda da fortuna, mas daquela vez fui sorteado.

Nos anos dois e três, eu ficava escolhendo a tenda. Parava na frente, olhava. Nunca conseguia decidir onde entraria, apontava, “mi-nha-mãe-man-dou-eu-es-co-lher…”, até perceber a perda de tempo com a indecisão e larguei mão dessa mania. Coisa odiosa é ter manias. Perda de tempo danada. Épocas atrás, tinha a mania de nunca pisar nas fugas do piso. TOC dizem, né?! Por sorte deixei disso, lá em casa mal consigo pisar no chão, quem dera encontrar espaços sem fuga.

Anos quatro, cinco e hoje, chego na feira e entro logo na primeira tenda. Folheio o máximo de livros quanto minhas habilidades combinadas de mãos e olhos tornam possíveis, e, parto à banca ao lado feito uma tacada de golfe do Woods. Ao final do expediente, volto tenda a tenda e compro o que não consegui folhear. Assim fico o dia inteiro, nos dois domingos do evento, os dias que eu não trabalho.

Tenho um emprego numa livraria. Completa seis anos no próximo inverno. Nunca tiro férias, sempre pego em dinheiro. Ela me disse que escolhia os livros em algumas livrarias também, não só em feiras. Nunca folheei sequer um livro de lá. Seria perda de tempo. Odeio perder tempo. Sou segurança. Olho quem entra e quem sai. A profissão é perfeita. Estou sempre de olhos atentos aos entrantes da loja, ninguém escapa ao meu olhar. Se entrar eu vejo. Qualquer um. Até mesmo ela.

Gosto muito de uma das vendedoras, senhorinha adorável. Sempre me incentiva conhecer os livros da loja. Conversamos antes do expediente, momento onde a senhorinha me influencia contando histórias, pensando, desta forma, me interessar à leitura. Sempre agradeço suas histórias hilárias, mas respondo amigavelmente que não tenho o hábito da leitura, ela ri balançando a cabeça, tem que começar lendo algo pequeno, sempre ouço. Serve epígrafes? Semana outra ela chegou com mais um livro e me entregou na mão, leia esse, aposto que vai gostar, presente meu. Eu peguei o livro, agradeci e disse para ela não gastar mais o dinheirinho dela me dando livros, pois se existe alguma coisa que eu não gosto, são os livros, odeio livros, tenho uma espécie de alergia deles. E fui me coçando inteiro ela só deu risada. Nunca tive coragem de dizer que a livraria é uma ninharia diante minha casa. Um harém de livros, todos folheados, do início ao fim, todos os livros que não consegui encontrar o que procurava, todos ali armazenados, no meu castelo de paredes semivazias e chão abarrotado. Amanhã compro estantes.

A senhorinha já me deu cinco livros. Todos de fantasia e aventura. Ela percebeu que das histórias que me conta, são as que mais me interessam. Do Jules Verne ela me deu “Volta Ao Mundo em 80 Dias” e “20.000 Léguas Submarinas”, “As Viagens de Gulliver” do Jonathan Swift, “Moby Dick” do Hermann Melville e esse último que ganhei é aquele livro que tem os personagens Dr. Jekyll e Mr. Hyde, o escritor esqueci o nome, é um carinha doido que acordou tendo um sonho e começou a escrever freneticamente o livro, o nome, creio ser “O Médico e o Monstro” ou algo do gênero, nem olhei direito. Nunca folheei nenhum deles. Seria inútil. Perda de tempo. Coisodiosa perdê temp…

Percorri quase todas as tendas e ainda nada. Folheei cerca de mil oitocentos e quinze livros, ou mais, sei lá quantos, nunca conto. Orwell, folheei todos que encontrei, claro! Nesta tenda parece não ter nada, acho que vou pular. Aliás, só falta um par de horas e zaz! Encerram as atividades. A feira termina hoje e me aparenta da busca continuar no próximo ano. E na minha casa. Folhearei mais alguns alfarrábios nesse sebo e depois abraçar minha incessante compra de livros do ano, o tanto que eu possa, para me ocupar pelas semanas vindouras.

Pensando agora na minha cama feita de livros. Vai dar trabalho fazer prateleiras novas no quarto. Acho que não vou me preocupar com estantes, vou sim construir um rancho atrás de casa, depois coloco as estantes. Estantes em casa e no rancho.

Pensando n’outra cois’aqui, será que tiro férias esse ano? Tenho os olhos cansado de procurar por mulheres-ela. Quem sabe com sintomas de repouso visito feiras de livros em outras cidades, mais livrarias de cidades outras. Chego acreditar que aqui, na minha livraria, ela não vai aparecer. Creio até que ela deve ter uma porcentagem mínima de chance voltar a essa cidade. O mesmo percentual de eu ser sorteado na rifa. Preciso tirar férias. Embora, maquinando mais aqui. E se ela aparecesse na minha loja durante minhas férias? Odeio férias. E se nestes seis anos ela conheceu alguém mais legal do que eu? Um novo Lennon. Alguém que como eu, num domingo qualquer, por divina sorte, pegou o livro onde ela deixou seu recadinho? Algo que nunca quero ter é manias. Odeio manias. Tenho medo delas. Odeio a mania boba de ela anotar seu número em livros de maneira aleatória. Mania besta de passar vinte e quatro horas se divertindo com a pessoa que encontra o recado. Assim ela disse. Conhecer novas pessoas que gostam de literatura. Só gosta da maldita literatura quem não compra rifas. Nas crianças que vendem ninguém pensa.

Há seis anos tenho a odiosa mania de folhear livros. Eu que reprovei três vezes. Três vezes. Trê-ê-ês vezes por causa da mal-di-ta literatura. Nunca peguei sequer um livro. Um. Antes daquele bendito domingo nessa bendita feira de livros. Odeio os livros, odeio folhear livros e não aguento mais essa mania de folhear, folhear e folhear livros. Não aguento mais esses seis anos, eu não aguento mais pensar nela. Nem querer ela.

E se quer saber eu não preciso mais dela, não preciso mais do meu emprego de segurança numa livraria, não preciso mais ficar vindo aqui todos os meus outonos nos dois fucking domingos de feira, procurando por um recadinho que nunca vai existir. Nunca vai. Não preciso de mais porra nenhuma disso. Não preciso dela, não preciso do emprego, nem das feiras. Tudo o que preciso é um rancho. Um rancho e estantes. Muitas. Muitas estantes.

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19 comentários em “Estantes (Thiago Barba)

  1. Cirineu Pereira
    14 de dezembro de 2019

    Eu diria que o ponto forte de Estantes é sua total ausência de linearidade. As informações são disponibilizadas para o leitor de forma aparentemente aleatória e sem necessária conexão com a ordem dos eventos. Em suma, o conto é narrado pelo segurança de uma livraria que, há seis anos da narrativa, adentrou uma feira literária por mera distração e, distraindo-se a folhear livros, encontrou num deles um bilhete que o teria levado a conhecer uma mulher, uma apreciadora de livros, com a qual teria se relacionado amorosamente por apenas vinte e quatro horas.
    Desde então, o narrador busca obsessivamente reviver aquele dia, seja reencontrando a mesma mulher, seja com outra(s) que, eventualmente, tenham em comum o hábito de deixar bilhetes entre as páginas de livros. Para tal, o personagem volta anualmente à feira, observa as clientes da livraria em que trabalha e sempre folheia tantos livros quanto lhe seja possível, inclusive comprando e colecionado muitos em seu lar, ainda que não possua estantes e os tenha espalhados por toda a casa.

    Essa obsessão, por si só, delinearia o personagem-narrador, no entanto algumas informações adicionais são disponibilizadas ao leitor, por vezes indiretamente e, inclusive, através do próprio discurso e estilo, já que narrado em primeira pessoa. Ele é homem, trabalha como segurança, não gosta de literatura, mora sozinho, não costuma tirar férias e é, pretensamente, um solitário. Um tipo, eu apostaria, bastante comum nos grandes centros. Note-se que outras experiências amorosas não são mencionadas pelo narrador.

    O enredo é simples e fazer dele uma história interessante é de competência do autor, coisa que o próprio parece ter em mente e até inicia bem ao optar pela ausência de linearidade que, para o leitor qualificado, se reverte num agradável exercício intelectual. Não obstante, a verve narrativa é fraca, ou seja, é incapaz de reverter o personagem-narrador num protagonista devidamente interessante. Aliás, por vezes, o discurso levou-me a questionar as competências intelectuais do personagem-narrador (jamais do autor). Mas enfim, como o discurso de um homem culturalmente limitado e que confessa ele mesmo não apreciar a leitura, poderia reverter-se em algo interessante de se ler? E note-se que além da pergunta ser retórica, aqui minha contestação limita-se às divagações e discurso do personagem, tão somente. Talvez um narrador neutro – com oportuno uso do discurso livre indireto – pudesse tornar tais aspectos mais interessantes.

    A preocupação com as “estantes” não soa razoável. Afinal, por que alguém cujo interesse pelos livros acaba tão logo os folheie, colecionaria os mesmos livros? Não bastaria livrar-se deles? A resposta óbvia é que isso faz parte da personalidade transtornada do personagem, claro. Porém o pecado não é esse, mas o que resulta disso tudo. Não obstante, a insistência com as estantes, há diversas outras menções fúteis e que nada agregam, senão a superficialidade do próprio personagem. CDs, pilhas de livros, louça suja, cadeira quebrada, John Lennon e autores sobre os quais nada interessante é realmente dito. O personagem parece incapaz de reflexões mais profundas e instigantes.

    Por vezes, além de usar onomatopeias gastas, o autor faz investidas de vocabulário e estilo: “Coisodiosa perdê temp… “,“Pensando n’outra cois’aqui…”, “nos dois fucking (?) domingos de feira…”, mas mesmo essas tentativas soam deslocadas se nos atentamos ao personagem, a sua formação cultural e seu discurso que, à revelia, acaba por marcar o estilo. A essa altura, cabe por fim citar as construções ruins e alguns (não muitos) erros de ortografia e gramática (vide as notas gerais).
    Em suma, escrever sobre nada (sobre quase nada), ou ainda, a partir de um enredo cotidiano e ordinário, exige mais a nível de estilo, de poesia, de sensibilidade e de perspicácia se se pretende maravilhar o leitor. Não obstante esses apontamentos, eu incentivo e parabenizo o autor, antes arriscar-se com o extraordinário a se acovardar assumindo o usual e previsível.

    Notas Gerais:

    1. “Esse, digamos, hobbie (a palavra correta seria “hobby”, plural “hobbies”), começou na semana…”

    2. “Os livros começaram (a?) aparecer por conta dela…”

    3. “Nunca fui um frequentador de eventos culturais, para me esconder um pouco daquele ambiente inóspito a mim, escolhi uma tenda qualquer…(construção ruim)”

    4. “Folheio o máximo de livros quanto minhas habilidades combinadas de mãos e olhos tornam possíveis, e, parto à (para a) banca ao lado feito uma tacada de golfe do Woods (analogia ruim).”

    5. “Conversamos antes do expediente, momento onde a senhorinha me influencia contando histórias, pensando, desta forma, me interessar à (pela) leitura.”

    6. “A feira termina hoje e me aparenta da busca continuar no próximo ano (construção ruim, confusa).”

    7. “E na minha casa. Folhearei mais alguns alfarrábios nesse sebo e depois abraçar minha incessante compra de livros do ano (construção ruim, confusa), o tanto que eu possa, para me ocupar pelas semanas vindouras”

    8. “Tenho os olhos cansado (cansados) de procurar por mulheres-ela…”

    9. “Quem sabe com sintomas de repouso (construção ruim, confusa) visito feiras de livros em outras cidades, mais livrarias de cidades outras…”

    10. “Chego (a) acreditar que aqui, na minha livraria, ela não vai aparecer. Creio até que ela deve ter uma porcentagem mínima (construção ruim, confusa) de chance voltar a essa cidade.”

    11. “Só gosta da maldita literatura quem não compra rifas. Nas crianças que vendem ninguém pensa. (? Difícil atinar com o sentido e pertinência, mal expresso).

    12. “Nem querer ela (Querê-la).”

  2. Leo Jardim
    14 de dezembro de 2019

    🗒 Resumo: homem com sério problemas de manias conhece uma mulher por quem se apaixona. Ela tinha o hábito de colocar o número de telefone no prefácio de livros e, quando ele ganhou um na rifa, encontrou o número e viveram um curto período mágico. Ela se foi e ele criou a mania de comprar livros e folheá-los sem parar em busca de um novo recadinho dela.

    📜 Trama (⭐⭐⭐⭐▫): é interessante a forma como o autor conta a história. Conhecemos o personagem, seu vício por livros e, aos poucos, os motivos que o levou a essa obsessão de folhear livros. É um fluxo de pensamentos numa mente atormentada e doente, mas ainda assim há uma trama e ela é bastante interessante e triste: querendo novamente dar a sorte de ser “sorteado” pela mulher por quem ele se apaixonou.

    📝 Técnica (⭐⭐⭐⭐▫): o autor é claramente alguém com experiência na escrita. O domínio da narrativa, as brincadeiras da mente caótica do narrador: tudo é prova de um autor que sabe bem como contar uma história.

    ▪ Nunca fui um frequentador de eventos culturais *ponto* Para me esconder um pouco daquele ambiente inóspito a mim, escolhi uma tenda qualquer (o ponto deixa o parágrafo mais fluído; é mais uma sugestão que correção)

    ▪ E *vírgula* se quer saber *vírgula* eu não preciso mais dela

    🎯 Tema (🆓️): obsessão 😫📖

    💡 Criatividade (⭐⭐⭐): a criatividade aqui está na forma de contar a história.

    🎭 Impacto (⭐⭐⭐▫▫): já dado os devidos elogios à forma e a à técnica do conto, permito-me aqui deixar minha opinião interferir um pouquinho. Gostei do conto, mas não é daqueles que impactam ou causam alguma forte emoção.

  3. Fabio Baptista
    14 de dezembro de 2019

    RESUMO:
    Homem abandonado pela mulher tem o vício de folhear livros e acumulá-los em estantes e mais estantes. Ele nunca os lê, apenas os folheia.
    No final, descobrimos que está na verdade à procura de um recado da mulher, que deixava bilhetes aleatórios em livros, para conhecer outros amantes da literatura.

    COMENTÁRIO:
    É um bom conto, bem escrito, empregando bem o tal “narrador não confiável”.
    Fica um pouco repetitivo ali no meio, mas a revelação final, do porquê da obsessão crescente, compensa.

    Gostei!

    NOTA: 4

  4. Daniel Reis
    14 de dezembro de 2019

    Resumo: narrado em primeira pessoa, a história se passa com o autor numa biblioteca, vivendo entre livros e estantes. O colecionismo fica claro pela quantidade de livros, na pia, utilizados para ajustar as cadeiras. Conta sua história com uma moça, que o conheceu e a sua casa há seis anos, e da qual, por gostar de Orwell, o atraiu a si e à leitura. Não gosta de música, prefere com certeza os livros e a companhia dela, que não tem mais. Está doido pelos livros, mas não para ler, para os ter. Folhear no máximo. Comprava livros na feira, após folheá-los. E tem emprego numa livraria, na qual vende as férias para comprar livros, e para ver se reencontra a mulher que o deixou. De uma senhorinha, ganha livros de aventura, mas não os lê. Procura, nos livros de Orwell nos sebos, a dedicatória e a presença da ex-companheira. Ter livros é um vício. E ele está viciado.

    Método de avaliação: “Análise Jacquiana”
    Receita: uma história confessional, com um hábito que se torna ritual – ter livros, como forma de preencher os vazios, da estante e da vida.

    Ingredientes: um homem abandonado, um elo de ligação com o amor perdido (os livros), a esperança quase doentia de reencontrá-la numa compra na livraria ou numa anotação de livro.

    Preparo: a história é sobriamente escrita, apesar do evidente desequilíbrio do narrador. É o tipo de coisa que dá medo, falar com um louco aparentemente normal, talvez até por refletir a nossa loucura.

    Sabor: uma história triste, quase um recorte ou fatia de pizza fria. Triste, mas confortador no meio da noite.

    Frases motivacionais (quase aleatórias) do Eric Jacquin (ou coisas ele possivelmente diria) : “NON DESLIGA O FREEZER!”

  5. rsollberg
    13 de dezembro de 2019

    Estantes (Eduardo Novena)

    Resumo: Um transtorno, a perseguição de um amor, a escravidão pelo hábito.
    Gostei do texto! Essa pegada de crônica casou muito bem com o mote da história.

    O gostoso do texto é que ao mesmo tempo em que ele é direto também tem algo de hermético, tipo isso “Fingíamos um estetoscópio. Na sala. No corpo do outro. Nos divertimos. Dançamos. Jogamos almofadas e ela espirrou um bocado. Olhamos um para o outro. Nos olhos. Odeio John Lennon.”

    Muito curiosa a relação de amor e ódio do protagonista com os livros, porém, em outra escala, até que não é tão difícil de imaginar esse fascínio pelo material e não pelo conteúdo. Conheço algumas pessoas, que guardadas as devidas proporções, também possuem um símile desse distúrbio. Ocorre que no texto, a mania tem uma explicação. Ah o amor, sempre o amor. No desfecho entendemos a motivação por trás do comportamento sistemático e compulsivo do protagonista. Enfim, compreendemos o motivo da coleção apesar de não gostar de ler, do seu desinteresse pelos livros novos da livraria onde trabalha. Aos poucos, também realizamos a ligação do fato dele sempre comprar rifas apesar de nunca ganhar, assim percebemos que ele é um homem de esperança e não por outra razão continua sua jornada nas páginas que folheia sem nunca ler. Adiante, tudo vai fazendo sentido, compra nas tendas exatamente aquilo que não verificou. E, por mais insólito que possa parecer, o comportamento aparentemente bizarro começa a nos fazer sentido, método e esperança nos seis anos de jornada.

    Enfim, achei o conto muito criativo, uma ótima sacada com belíssimo desenvolvimento e com um desfecho surpreendente (e esclarecedor). Parabéns pela ousadia e pela insanidade projetada,

  6. Fernando Amâncio (@fernandoamancio)
    12 de dezembro de 2019

    Homem, obcecado por uma mulher, está há seis anos folheando livros em busca do telefone da jovem. É uma mania dela deixar o número anotado em livros aleatórios. Ela se diverte com quem encontra o número por um dia e depois troca o número. O novo será anotado em outro livro. O narrador, porém, entrou no jogo e está em busca do contato da jovem. Vai há seis anos na mesma feira onde encontrou o número, folheia os livros e adquire os que não conseguiu folhear. Também arrumou emprego em uma livraria, na esperança de esbarrar na jovem novamente. Ele não gosta de ler, tem a casa abarrotada de livros, mas deseja mesmo é encontrar o telefone da mulher.

    Eduardo Novena, seu conto é bem elaborado, com uma escrita apurada. A ideia é bastante interessante e desenvolvida de forma satisfatória. Não encontrei nenhum problema quanto ao texto, gramaticalmente falando.

    Histórias com narrativa em primeira pessoa, nas quais um panorama vai se desvelando na medida em que o relato se desenvolve, dependem muito do carisma do personagem principal. Então, sim, o ritmo pode ser um problema, já que é a curiosidade em entender o cenário mais amplo no qual o narrador está imerso que é o motor do texto.

    A ação é lenta e alguns leitores podem se sentir incomodados com isso. Azar o deles, literatura não é corrida de obstáculos. Eu gostei bastante de seu conto, do personagem pitoresco e achei criativa a história de amor. Boa sorte no desafio!

  7. fabiodoliveirato
    12 de dezembro de 2019

    Uma agoniante história de amor. Ou seria obsessão?

    Resumo: Ele trabalha como segurança de uma livraria. Ele possui o hábito de folhear os livros procurando por um número. Ele tem montes e montes de livros em casa. Ele odeia livros e vive procurando por uma pessoa. E odeia CDs também.

    Querido autor, seu conto é de uma sensibilidade singular. Parabéns! Ele é literalmente perfeito, no meu ponto de vista, não precisa retirar nem adicionar. Claro, isso é um erro levado pelo entusiasmo pós-leitura, tudo pode melhorar, e piorar, mas que se dane.

    O protagonista é a alma do conto, mas são suas palavras que lhe dão impacto. Se a narrativa fosse em terceira pessoa, não teria a mesma força. Conhecemos suas manias enquanto vemos sua defesa natural agir, negando-as volta e meia. Porém, no fundo, ele reconhece suas obsessões, odiando-as da forma como pode. Ele odeia tudo relacionado à ela, entretanto, ama a ideia de reencontrar a pessoa com que passou um dia mágico. É provável que a tenha idealizado. E não conseguiu superar essa ilusão, procurando-a em páginas na mesma feira que a encontrou inicialmente, na livraria que trabalha, nos livros que foi incapaz de folhear nas tendas.

    É um conto triste, na realidade. Sua beleza está nessa tristeza, tão humana, tão próxima da realidade. É possível sentir a dor dele, de como foge da realidade e fica apegado às suas ilusões.

    Foi um trabalho impecável!

  8. Carolina Pires
    11 de dezembro de 2019

    Resumo: Um homem tem a mania de folhear livros, colecionando vários livros, que preenchem toda a sua casa. Enquanto pensa em comprar estantes, questiona a si mesmo sobre essa mania adquirida, já que não lê apenas epígrafes. Ele folheia livros desde o dia que encontrou o telefone de uma mulher em um livro, a qual passa vinte e quatro horas com a pessoa que o encontrou. Ele vive na expectativa de reencontrá-la.

    Eduardo, seu texto é uma prova de que contos curtos funcionam, e como funcionam! Estou encantada com a sua forma de encaminhar as divagações do personagem-narrador, o qual questiona a si mesmo sobre a sua busca curiosa e sua mania de folhear livros. Aos poucos o motivo é revelado ao leitor, fechando as linhas no final, ao descrever a mania da mulher por quem ele procura. São muitos pontos que achei interessantes, tentarei colocar aqui os que eu mais gostei. Gostei da escolha do anonimato, não sabemos o nome de nenhum personagem: da senhorinha que vende livros na livraria; da amante da literatura que deixa sua marca em algum livro; do homem que odeia livros, mas os tem abarrotados em sua casa. Isso me levou a pensar que um “nome” não determina a identidade de um personagem, seus personagens têm história, singularidade e vida! E isso é simplesmente incrível! A única observação que faço é que achei a escrita dele muito elevada para quem não lê livros, apenas epígrafes. Tipo, como que o personagem escreve tão bem se não tinha a mania de livros antes e ainda se nega a lê-los? (sim, esse “escrever tão bem” pode entender como um baita elogio ao contista). Mas depois fiquei pensando: seis anos de incansável leitura de epígrafes é muita coisa, né? (rsrsrs) Eu me diverti muito com a dica da cadeira com pés de alumínio (rsrsrs – são uma droga mesmo, lá em casa tinha). Também dei boas risadas com a referência aos Engenheiros do Hawaii (não gosto da voltinha que o Gessinger faz quando vai descer de uma nota alta para uma baixa). As contradições internas do personagem foram descritas de uma forma tão bem alinhada com a narrativa e com as emoções dele que me deixaram de boca aberta (aplausos). Também gostei da forma como apareceram algumas frases de reflexão: não notei que foi forçado. Eu já percebi que em muitos contos, os autores as colocam para dar algum ar de importância para a narrativa, mas, muitas vezes, acabam existindo apenas para si, sem uma conexão “útil” com o enredo ou personagem, ou apenas para dizer: “sou escritor e filósofo, que-ri-do”. Mas com você não, não foi isso o que eu vi. Você conseguiu provar que uma escrita redonda, bem trabalhada, não precisa de frases de efeito mirabolantes tiradas do nada como um ilusionista tira um coelho da cartola. Bem, talvez você seja um ilusionista, mas um BOM ilusionista. Aquele que tira o brilho dos olhos do espectador e convence que magia, sim, existe. Vou parar de escrever porque estou com os olhos brilhando até agora. Parabéns! 😀

  9. Catarina Cunha
    10 de dezembro de 2019

    O que entendi: Um segurança de livraria odeia livros, mas sua casa é cheia deles. Não os lê, folheia compulsivamente a procura de um bilhete da ex-namorada.

    Técnica: Fluxo intenso de pensamento, ora repetitivo, não sei se por falta de enxugamento do texto ou para pontuar o TOC do personagem.

    Criatividade: A premissa é muito boa e inédita, pelo menos para mim.

    Impacto: Positivo. A razão para tantos livros me surpreendeu. Ri muito. Embora tenha me distraído na leitura por não prender minha atenção.

    Destaque: “Ao menos para eu tirar os livros da porta do meu quarto, às vezes sinto a necessidade de dormir com a porta fechada.” Consigo visualizar o caos.
    Sugestão: Enxugar o texto.

  10. Gustavo Araujo
    5 de dezembro de 2019

    Resumo: homem quer reencontrar a mulher que marcou sua vida; sabe que ela deixa recados a esmo em livros e por isso os adquire em profusão, lotando sua casa; talvez, um dia, ele se depare com um bilhete ou algo assim.

    Impressões: uma história de amor que arrebata quem lê muito mais pelo que não está escrito do que pelo que efetivamente está, o que revela uma habilidade invejável do autor. Nosso protagonista é um homem torturado, ou melhor, que se tortura ao alimentar uma esperança vã: reencontrar, por meio de um bilhete ou nota deixada num livro qualquer, o paradeiro da mulher que laçou seu ímpeto de existência. Para tanto, ele coleciona livros e mais livros, folheando-os compulsivamente, o que é refletido na narração caótica que bem transparece sua loucura. Frequenta feiras onde folheia todo tipo de obra; compra os livros que não conseguiu folhear; emprega-se como segurança em uma livraria, afinal, quem sabe, um dia a garota não fará uma visita…

    A desesperança de quem se afoga numa obsessão mas que ainda assim, em espasmos, luta por manter a sanidade, negando-se, ora aqui, ora acolá, a sucumbir à depressão — tudo isso aflora dos parágrafos concebidos com sensibilidade e sem cair na pieguice, uma armadilha sempre à espreita e que é neutralizada com perícia. Não há, é verdade, algo impactante na história. O que temos é um fluxo de consciência que revela uma história subjacente, fatos que deixaram cicatrizes profundas no narrador. Acho que é por isso que o texto mostra-se tão instigante.

    De todo modo, não é dificil sentir empatia pelo narrador-protagonista, perceber-lhe as dores e torcer por ele. O conto se encerra assim, num estilo a-vida-como-ela-é, sem reviravoltas mirabolantes ou com um final feliz pasteurizado. Ao contrário, o que se vê é a antecipação de um mergulho ainda mais intenso nessa espiral de loucura. Um ótimo arremate.

    Parabéns ao autor e boa sorte no desafio.

  11. Priscila Pereira
    5 de dezembro de 2019

    Resumo: Um homem vasculha feiras literárias e sebos só folheando livros a procura do numero de uma moça que ele encontrou anos antes.

    Olá, autor!
    Seu conto tem uma pegada nostálgica e desesperançada que eu achei bem legal… um acumulador de livros… que folheia mas nunca lê. Tão triste… quanto desperdício de vida, ele poderia se livrar dessa obsessão pela moça se lesse todas as história que acumulava…
    Então, gostei do conto. Bem escrito, sensível, com um ótimo aprofundamento de personagem, sua loucura quase sã narrada de uma formas poética.
    Parabéns e boa sorte!

  12. Fil Felix
    4 de dezembro de 2019

    Resumo: um homem está há 6 anos alimentando o vício de folhear livros no objetivo de encontrar algum bilhete perdido de uma antiga paixão.

    Um conto que traz ótimas figuras de linguagem e metáforas, utilizando do absurdo e do fantástico pra fazer o leitor entrar na magia. O protagonista, como é dito no texto, está há 6 anos folheando livro após livro, milhares deles. Lendo não, apenas folheando. E criando pilhas e mais pilhas de títulos. O leitor é apresentando à essa estranha obsessão, tentando encaixar as peças para descobrir onde tudo isso vai dar. Apesar das referências a autores ou livros como Revolução dos Bichos, descobrimos que o protagonista não é tão fã assim de ler, deixando ainda mais curiosa sua mania de folhear livros. Sua adoração por epígrafes também é interessante e poderia até ter sido utilizada algumas durante o conto, já que é uma história que aborda também a própria questão da literatura, seria legal ver os dois mundos se cruzando mais.

    O final não chegou a ser surpreendente pra mim, já estava recolhendo as provas e imaginando algo parecido, principalmente envolvendo a sua antiga paixão. Mas foi satisfatório, gostei de como apresentou um personagem que chega a ser caricato, que criou e alimentou uma obsessão por anos, chegando a não ter férias para não perder uma única chance de poder vê-la. As sentenças curtas torna a leitura mais rápida e a ideia geral é muito boa, acho até que funcionaria melhor num conto mais curto, pro impacto e surpresa final serem mais rápidos.

  13. Leila carmelita
    27 de novembro de 2019

    Sinopse
    O conto narrado em primeira pessoa mostra interessantes questionamentos da psique humana, tendo como base, sua compulsão em adquirir livros. O objetivo não é lê-los, mas sim folheá-los. O que estaria procurando este anti-leitor nas epigrafes de livros?

    Comentário
    O protagonista parece sofrer com determinados problemas psicológicos. Como o conto vai na linha de narrativa psicológica, focando nos conflitos da mente, vou seguir essa linha de raciocínio. O “colecionador” de livros parece ser um acumulador. Alguém que apenas acumula objetos, seja por apego sentimental aos mesmos ou por não perceber quais as suas atuais condições de vida. A acumulação é inconsciente, o indivíduo está alienado do meio em que vive. Mesmo produzindo riscos a sua saúde e a comunidade em que vive. Segundo, o personagem é um workholic, um viciado em trabalho, pois, prefere trabalhar nas férias e cumpre seu horário rigorosamente. Provavelmente deve estar sofrendo com síndrome de Bournout devido acúmulo de trabalho. A falta de energia para realizar tarefas simples como lavar a louça é um perigoso indicativo. O personagem também parece sofrer da síndrome do pensamento acelerado, segundo Augusto Cury, a incapacidade de o indivíduo controlar o seu fluxo de pensamentos, o que provoca a abertura de janelas Killer, memórias traumáticas que provocam reações biopsíquicas. O motivo, embora isso não seja muito bem explorado, deva ser a separação com sua antiga companheira. Uma separação pode ser um evento tão traumático para o indivíduo quanto uma batida de carro ou um assalto. Casais separados podem apresentar quadros depressivos e até síndrome do pânico. A busca pelo livro com um recado de sua amada parece se rum busca de redenção, ou perdão, provavelmente, ele deve ter sido o responsável pela separação. O personagem também demonstra ser um homem amargo, que não gosta de música e de ler. Apresenta postura obsessiva. Parabenizo o entrecontista, seu conto merece ótima nota.

    Notas de Leila Carmelita
    – A Gata de Luvas – 4,0
    – A Hora da Louca – 4,5
    – A Onça do Sertão – 3,6
    – A Pecadora – 5,0
    – App Driver – 1,0
    – Estantes – 5,0
    – Famaliá – 3,5
    – Festa de Santa Luzia: Crônica de uma Tragédia Anunciada – 5,0
    – Lágrimas e Arroz – 1,0
    – Muito Mais que Palavras – 1,5
    – Na casa da mamãe – 3,5
    – O Legado da Medusa – 4,5
    – O que o Tempo Leva – 1,8
    – O Regresso de Aquiles – 4,0
    – O Vírus – 2,5
    – Suplica do Sertão – 5,0
    – Trilátero Ourífero – 4,5
    – Uma História de Amor Caipira – 1,0

    Contos favoritos:
    Melhor técnica – Estantes
    Mais criativo – Festa de Santa Luzia: Crônica de uma Tragédia Anunciada
    Mais impactante – A Pecadora
    Melhor conto – Suplica do Sertão

  14. Fernanda Caleffi Barbetta
    26 de novembro de 2019

    Resumo
    Rapaz encontra o número do telefone de uma mulher que tem o propósito de passar 24 horas com a pessoa que encontra seu recado. Quando ela vai embora, ele adquire a mania de procurar em todos os livros pelo novo recado na ânsia de poder encontrá-la novamente. Isso faz com que ele colecione uma quantidade tremenda de livros mesmo não gostando de ler, faz com que trabalhe como segurança em uma livraria, sem férias, além de visitar feiras de livro, folheando o maior número de livros que consegue.

    Comentário
    Adorei seu conto. Sensacional. A história é ótima e foi ‘contada’ de uma maneira muito gostosa de ler, fluida, bem escrita, contagiante mesmo. Parabéns.
    Só faltou explicar se ela mudou de telefone ou se ele perdeu o livro que tinha o número dela antes de anotar em nenhum lugar. Mas eu amei esse conto.

    Peguei poucos equívocos:
    Os livros começaram (a) aparecer por conta dela.
    todos os livros (em) que não consegui encontrar o que procurava
    Tenho os olhos cansado (cansados)
    Chego (a) acreditar que aqui
    de chance (de) voltar

  15. Luis Guilherme Banzi Florido
    22 de novembro de 2019

    Bom dia/tarde/noite, amigo (a). Tudo bem por ai?
    Pra começar, devo dizer que estou lendo todos os contos, em ordem, sem saber a qual série pertence. Assim, todos meus comentários vão seguir um padrão.
    Também, como padrão, parabenizo pelo esforço e desafio!
    Vamos lá:

    Tema identificado: drama? não tenho ctza…

    Resumo: homem obcecado por ex-mulher, continua incansavelmente folheando livros, esperando encontrar novamente o número dela marcado numa página, enquanto vive afundado em manias que nega ter.

    Comentário:

    Cara, que angustiante ler esse conto. Dá pra entrar de cabeça na mente atrapalhada e perturbada do cara, e dá uma certa angústia/tristeza compreender aos poucos o que aconteceu. É um tanto desolador.

    A leitura acaba sendo muito boa pela sua capacidade de nos fazer criar empatia pelo cara, nos fazer mergulhar no sofrimento dele. Isso acaba compensando a meio que falta de um enredo mais complexo, algo que poderia facilmente tornar a leitura cansativa e chata.

    Pela sua habilidade com as palavras (e uma técnica muito apurada, usando repetição de palavras, inversão, descontrução das palavras, etc, que auxilia muito a criar o ambiente bagunçado da mente dele), você conseguiu me prender na leitura.

    À partir de determinado ponto, comecei a me questionar: o que diabos ele tá procurando nesses livros? Isso cria um certo suspense/mistério, que reacendeu, no momento certo, o interesse na leitura. Resumindo: sua técnica é muito apurada, e isso é essencial nesse tipo de conto, que utiliza muito mais da estética como ferramenta que o normal.

    É algo tipo o filme da Amélie Poulain (guardadas proporções e com enredos totalmente diferentes): o filme tbm tem um enredo bem simples, mas ganha muito pela estética e técnica impecáveis.

    Ainda sobre a história, o cara meio que adquire uma obsessão/transtornos de personalidade após a perda da amada, e canaliza isso como várias manias e TOCs. O mais interessante é o quanto ele nega essas manias, como quando diz “coisa odiosa é ter manias”.

    A vida do cara vira uma série de manias e acumulações, advindas da incapacidade de lidar com a perda. O transtorno vai num crescendo, e no sexto ano (até que aguentou demais), o cara meio que surta de vez (no final do conto).

    Sobre a escrita, notei alguns erros de revisão e de pontuação. Nada que atrapalhe a leitura, mas acredito que uma revisãozinha mais atenta cairia bem.

    Parabéns, gostei. Boa sorte!

  16. Evandro Furtado
    16 de novembro de 2019

    Car(x) autor(x)

    Estou aproveitando esse desafio para desenvolver um sistema de avaliação um pouco mais técnico (mas não menos subjetivo). No geral, ele constitui nas três categorias propostas no tópico de avaliação: técnica, criatividade e impacto. A primeira refere-se à forma, à maneira com a qual x autor(x) escreve, desde o uso de pontuação, passando por ortografia e mesmo escolhas de estruturação. A segunda refere-se ao conteúdo, ou seja, a que o conto remete e quais as reflexões que podem ser levantadas a partir disso. Por fim, a terceira refere-se ao estilo, quais as imagens construídas e as emoções que elas evocam. Gostaria de pontuar, também, que, muitas vezes, esses critérios têm pontos de intercessão entre si, sendo que uma simples palavra pode afetar dois ou mesmo três deles. A pontuação final é dada, portanto, pela média dos três critérios, sendo que uma nota elevada em um deles pode elevar a nota final. Dito isso, prossigamos à avaliação.

    Resumos: Um sujeito que coleciona livros, folheia livros, trabalha em uma livraria e odeia livros. No fim, ele só está tentando encontrar neles a mulher que o deixou.

    Técnica: Gosto da forma como x autor(x) deixou o fluxo de consciência fluir (não consegui encontrar verbo molhar, então perdão pelo pleonasmo). A maneira como a narrativa evolui é perfeita para representar o estado de espírito do protagonista, caótico mas, ainda assim, linear.

    Criatividade: O paralelo traçado entre os livros e a ausência da mulher amada é muito bem feita. A ideia do mero folheamento dos livros (e, consequentemente, da não leitura) faz uma boa ponte com relacionamentos superficiais. Ao mesmo tempo, tudo isso ilustra a mentalidade obsessiva do personagem principal. O quarto é uma alegoria à mente. Os livros espalhados mostram os pensamentos bagunçados. A necessidade de estantes representa uma necessidade de organização mental.

    Impacto: O texto varia em relação às suas construções imagéticas. Algumas são muito bem feitas (vide o quarto), mas outras ficam um pouquinho superficiais. Apesar disso, o drama apresentado é relacionável o suficiente para que se crie empatia para com o protagonista.

  17. angst447
    10 de novembro de 2019

    RESUMO:
    Um rapaz, segurança em uma livraria, conta que há seis outonos frequenta uma feira de livros. Folheia todos os livros que consegue, buscando um recadinho da amada que se foi. Não gosta de ler, só de epígrafes. Odeia manias, mas tem agora a mania de folhear livros. Falta espaço em sua casa para tantos livros. Ele pensa em colocar estantes nas paredes. Depois, diz que não precisa de mais nada, nem da moça, nem de nada, só de um rancho e de muitas estantes.

    AVALIAÇÃO:
    Conto relativamente curto, narrado em primeira pessoa. Apresenta ritmo lento, sem diálogos ou muita ação. É mais um desabafo, uma reflexão sobre hábitos que se tornaram manias, ausência de um amor e a necessidade de arrumar estantes. A premissa é interessante, e o autor soube desenvolver a narrativa intimista.
    Há pequenas falhas de revisão, mas algumas acredito que tenham sido propositais… falhas na linha de pensamento do narrador.
    O leitor logo imagina a casa do narrador apinhada de livros, que ocupam lugares inusitados. Daí surge a necessidade, obsessão por estantes… que no fim, parecem mais urgentes do que rever a pessoa amada.
    Bom texto, que revela criatividade e familiaridade com o quê? Livros!

    Parabéns por participar deste último certame de 2019. Que o seu Natal seja pleno de paz e alegria, e que 2020 lhe ofereça maravilhosas oportunidades. 🙂

  18. Regina Ruth Rincon Caires
    7 de novembro de 2019

    Estantes (Eduardo Novena)

    Resumo:

    História de “ele” e “ela”, contada por “ele” (Eduardo Novena??????). A narrativa é uma busca que perdura por seis anos, desde que ele a conheceu através de um contato anotado em um livro.

    Comentário:

    Um texto que traduz busca obsessiva. O leitor é levado a uma narrativa desenfreada, daquelas de perder o fôlego. A mania de folhear livro, em sua descrição, dá celeridade aos movimentos da escrita e leva o leitor, feito carona. Confesso que, em certas passagens, precisei respirar fundo. Depois que encontrou a amada através de uma dica anotada em um livro, e depois que ela se foi, “ele” desenvolveu a mania de buscar “anotações”, sempre em “epígrafes”. Ele entrava em bancas de livros, e, aqueles livros que não conseguia folhear, por falta de tempo, comprava-os, todos. Com isso, sua casa foi ficando abarrotada e ele estava sempre atormentado pela ideia de colocar mais e mais estantes. Há vários deslizes de escrita e cacofonia que truncam a leitura, mas isso pode ser solucionado com uma boa revisão. Interessante foi conhecer o significado de “fugas do piso”, confesso que não conhecia. O texto me fisgou pela “maluquice” que mostra do entendimento humano. Realmente somos assim. Um turbilhão de pensamentos e atos. Gosto disso. Gosto de perceber que não sou a única tresloucada neste mundão de meu Deus. No desfecho, “ele” tenta passar que a busca chegava ao fim, que não precisaria mais da amada, que não a queria mais, que não precisava mais do emprego na livraria, que não iria mais às feiras de livro… Mas, contraditoriamente, precisará de mais estantes. Texto criativo, inovador, bem estruturado e que prende o leitor, de cabo a rabo.

    Parabéns, Eduardo Novena!

    Boa sorte no desafio!

    Abraços…

  19. Angelo Rodrigues
    6 de novembro de 2019

    Estantes
    Resumo:
    Homem relata suas experiências folheando livros. Os tem aos montes, espalhados pela casa. Deseja ter um rancho onde possa encher de estantes e colocar ainda mais livros. Embora goste de livros, mas não de os ler. Embora acabe não gostando de livros, pois os odeia, assim como odeia a tudo e a todos, dado que não precisa de nada para viver, só de um rancho e estantes.

    Comentários:
    Caro Eduardo Novena,
    O conto inicia passando a ideia de que o protagonista tem paixão por livros, que é um leitor, embora, não. Ele só gosta de os ter, de os folhar e ler seus epígrafes. Sua paixão – ou mania – passa pela coisificação dos livros, dado que os vê como objeto para os quais caiba uma paixão, não se importando com o conteúdo que eles têm.
    Imaginei – erroneamente – que o conto se desmanchasse pela paixão efetiva pelos livros, pelas descobertas que eles proporcionam, só que não.
    O protagonista oscila, como um pêndulo, entre suas manias, suas paixões, seus desapaixonamentos.
    Fiquei em dúvida quanto ao propósito objetivado pelo conto, que acabou funcionando para mim como uma introdução de uma ideia que se perdeu, não havendo a efetiva centralização do desejo do autor em passar uma ideia que substanciasse o discurso em torno dos livros, focando a narrativa nas volições do personagem acerca do que ele gosta ou não gosta. O que não é mal, embora a personalidade assumida pelo personagem não se traduza em algo que salte aos olhos. Preferiria os livros a ele.
    Achei curiosa a vontade que teve o autor de, ao final, construir a destruição de tudo que foi ressaltado durante a narrativa.
    “E se quer saber eu não preciso mais dela, não preciso mais do meu emprego de segurança numa livraria, não preciso mais ficar vindo aqui todos os meus outonos nos dois fucking domingos de feira, procurando por um recadinho que nunca vai existir. Nunca vai. Não preciso de mais porra nenhuma disso. Não preciso dela, não preciso do emprego, nem das feiras. Tudo o que preciso é um rancho. Um rancho e estantes. Muitas. Muitas estantes.”
    Deixou-me curioso tal opção narrativa, particularmente a presença do rancho na narrativa. Que símbolo?

    Há alguns pontos que queria ressaltar. Há a ausência constante de conectivos nas frases, tais como:
    “…chance [de] voltar…”
    “…chego [a] acreditar…”, onde o verbo chegar, funcionando como intransitivo, pediria a partícula [a], que ficou de fora.
    Em outro momento, há uma frase que se permite solta:
    “Nas crianças que vendem ninguém pensa.”. O que vendem as crianças? Creio que a frase deveria ser: “Nas crianças que [as] vendem ninguém pensa.”, dado que as crianças vendem rifas, elas, [as] rifas.
    Logo no início o autor adota o plural para nomes de família, Hemingways e Balsacs. Bem, os nomes próprios assemelham-se aos nomes comuns, podendo ir ao plural, tal como em Josés e Marias, mas os nomes de família Hemingway e Balsac, preferentemente não devem ser levados ao plural, permanecendo como são, Hemingway e Balsac.
    Há também que fazer a revisão em “…olho cansados”, para “olhos cansados”.
    Boa sorte no desafio.

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Publicado às 1 de novembro de 2019 por em Liga 2019 - Rodada 4, R4 - Série B e marcado .
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