EntreContos

Detox Literário.

Deus Conosco (Gustavo Araujo)

Afastou o galho para não ferir o rosto. À sua frente, o rastro parecia claro, ainda que a mata se fechasse mais e mais a cada passo. Raízes e pedras afloravam ao redor, enquanto troncos caídos, cobertos por uma camada perene de musgo, teimavam em escamotear o arremedo de trilha outrora aberta. No alto, galhos secos e enegrecidos, despontando contra o céu em aquarelas de chumbo, lembravam braços esqueléticos em súplica. Ao plano dos olhos, porém, a vegetação se assomava, dobrando-se sobre o caminho, mal permitindo que se enxergasse à frente.

Se pelo menos seus joelhos não doessem tanto…

O suprimento de água havia se esgotado há tempos e ele dependia de riachos aqui e ali para debelar a sede. Sentia-se cansado, os olhos pesados, como que salpicados por minúsculos grãos de areia.

Por entre as copas das árvores que se inclinavam em arco, notou uma coluna de fumaça. Sentiu suas forças retornarem. Ah, a esperança… Nenhum sentimento se traduz como ela, ao mesmo encerrando entusiasmo e maldição. Abriu caminho com as mãos pelo mato alto, não se importando com os novos cortes e arranhões. Precisava chegar lá, precisava descobrir.

Logo adiante divisou uma casa de madeira, cercada de perto pela vegetação densa. Era uma construção grande, de dois andares, lembrando uma arca, construída com tábuas horizontais que o tempo havia escurecido. No primeiro plano, uma varanda protegida por um telhado baixo, de zinco. No andar logo acima, uma fileira de janelas, sete talvez, algumas delas emanando uma luz amarelada, quase laranja. Na lateral, um jardim de inverno com os vidros quebrados e totalmente escurecidos, era sustentado por escoras apodrecidas. Dali, de alguma forma, brotava uma árvore parasitária, rompendo as paredes, como se quisesse sufocá-las.

A porta principal da construção, na varanda, parecia aberta, mas era de todo modo, protegida por uma tela, dessas para evitar a entrada de mosquitos.

Controlando a ansiedade, o homem aproximou-se lentamente, os pés chapinhando no lamaçal acumulado de onde emergiam gramíneas altas e indefinidas. Bateu palmas, o peito arfando em expectativa. Olhou novamente para o céu cinzento e para a fumaça que se desprendia da chaminé, dali invisível. Uma chuva fina se insinuou pelos galhos, atingindo-o como agulhas microscópicas.

Mesmo de onde estava, ouviu os passos pesados e lentos fazendo o assoalho gemer. Em seguida a tela protetora se abriu, revelando a imagem de um homem velho e grande. Uma miríade de rugas em seu rosto crispado mal permitia encontrar-lhe os olhos. Contudo, ele sorria, a boca fina adornada por dentes amarelados e irregulares.

“Em que posso ajudar?”, perguntou, a voz grave, mas não tão firme como se poderia supor.

“Procuro meu filho”, disse o homem, a respiração curta. “Imagino se ele não passou por aqui… Os rastros…”

“Ninguém vem aqui”, interrompeu o velho, balançando a cabeça. Ele vestia uma camisa de botões, fechada até o pescoço, solta na cintura, pouco disfarçando a barriga protuberante. Suas botas e calças estavam limpas. Talvez se preparasse para sair.

“É um menino”, insistiu o homem. “Tem sete anos, mas parece mais novo. Tenho certeza de que veio por este caminho…”

“Infelizmente não vi ninguém”, disse o velho, coçando a barba e examinando o clima, como se insatisfeito com as nuvens carregadas.

“Pai?”, disse uma mulher, surgindo pela porta. “Algum problema?”

Ela era compacta, uma mulher forte, nem muito velha nem jovem demais. Tinha o nariz adunco e o queixo quadrado. As mangas de sua camisa estavam arregaçadas, como as das pessoas que trabalham arduamente. Sua cabeça era coberta por um lenço esverdeado.

“Este jovem aqui está procurando o filho, que desapareceu na floresta.”

O homem encarou a mulher por um instante, séria, inquisitiva. Havia algo de familiar em sua expressão. Tinha os olhos cinzentos como o firmamento naquele dia.

“Há quanto tempo foi isso?”, indagou ela, cruzando os braços.

Há quanto tempo foi isso?

Ele não se lembrava. Havia caminhado o dia todo, isso era certo. E também o dia anterior. E os outros e os outros antes desses. Talvez por isso estivesse tão cansado. Contemplou a si mesmo, as roupas rasgadas e imundas, os cabelos ensebados  que lhe caíam pelos ombros, a postura arqueada, as pernas doloridas.

“Quanto tempo?”, repetiu ela, a voz contaminada por uma nota de impaciência.

O homem abalançou a cabeça. Apoiou as mãos nos joelhos.

“Ele não está aqui, o meu menino?”, perguntou, mesmo sabendo a resposta.

“Por que não o convidamos para entrar, Úrsula?”, sugeriu o velho. “Talvez possa descansar um pouco, tomar alguma coisa.”

O interior da casa era amplo, ainda que imerso numa penumbra por conta das árvores circundantes e do clima que se fechava. Por um corredor estreito, o homem seguiu e velho e a mulher até a cozinha, onde outra mulher, mais jovem, descascava vegetais à mesa.

“A propósito, eu me chamo Samuel. Minha filha Úrsula você já conheceu. Esta aqui sentada é a caçula, Cecília.”

“Faz muito tempo que ninguém diferente aparece por aqui”, disse a jovem. “Como é o seu nome?”

O homem lutou com a memória por um instante.

“Eduardo…”

“Quer se sentar, Eduardo?”, disse Cecília, mostrando uma das cadeiras com a ponta da faca.

“Você não viu meu filho? Ele se chama Emanuel, tem oito anos…”, disse o homem, acomodando-se. Notou que o tampo da mesa trazia impressas manchas circulares.

Cecília, cujo rosto era magro demais, assim como os braços, balançou a cabeça, voltando sua atenção novamente para os legumes.

“Não vi ninguém.”

O homem observou o ambiente. Tudo era feito de madeira escura, os armários, a mesa onde estava, as cadeiras ao redor. Ao lado, um fogão à lenha, a única peça branca no cômodo, emitia calor. À sua frente, uma janela estreita oferecia um vislumbre da vegetação densa ao redor da casa. Sobre a pia, do outro lado, dois lampiões lutavam para vencer a penumbra.

“Logo escurece”, disse a garota, descascando as batatas que se acumulavam sobre uma bacia.

Sem aviso, a porta dos fundos da cozinha se abriu e a mulher mais velha, Úrsula, entrou com uma galinha morta nas mãos e colocou-a sobre a pia. Com habilidade, começou a esquartejá-la, separando pés e cabeça com um cutelo bem afiado, capturando a atenção do homem.

“O senhor aprecia canja?”, perguntou ela, virando-se em sua direção enquanto limpava a lâmina no avental manchado.

“O nome dele é Eduardo”, disse Cecília.

“Aprecia canja, Eduardo?”, disse Úrsula.

Depois de alguns segundos, o homem respondeu:

“Eu… Sim, sim…”

“Aqui…” disse Samuel, ressurgindo de algum lugar. “Tome um chá. Acabei de colher as ervas ali no quintal.”

A xícara fumegante exalava um aroma cítrico, inebriante até. O homem envolveu-a com os dedos, como se buscasse calor e conforto. Fechou os olhos e deixou que o odor lhe penetrasse as narinas. As pálpebras pareciam pesadas como comportas de ferro.

“Talvez seja melhor o senhor descansar por hoje”, disse o velho. “Pode continuar a procura amanhã.”

“Mas ele…”

“Dá para ver como está exausto”, disse Ursula, os olhos cinzentos e autoritários, segurando com uma das mãos o que restara da galinha. “De nada adianta continuar agora.”

“Logo vai escurecer”, repetiu Cecília, sem descuidar das batatas.

Descansar. Deus, como seria bom dormir…

Quando percebeu, estava deitado em um dos quartos. Pela visão que tinha da janela notou que a noite já caía e que a chuva ganhara intensidade. Adormeceu, enfim, enquanto era engolido pelas sombras e pelo tamborilar da água que dimanavam pelo vidro opaco.

Acordou de súbito, com a impressão de ter ouvido alguém chorando. A escuridão era completa e ele não tinha noção de quanto já havia dormido. Permaneceu imóvel, os ouvidos atentos. Não seria a primeira pessoa a confundir o chilrear da precipitação com algum tipo de lamento, com um pedido de socorro.

Acompanhando a chuva, o vento assobiava nas folhas, retorcendo galhos, enfurecendo as copas das árvores. Aguçando os ouvidos, o homem tentou traduzir o murmúrio por entre as rachaduras da madeira, fenecendo diante da exaustão. Então, mais uma vez, o som de um soluçar, quase infantil, misturou-se ao sopro sibilante.

“Emanuel?”

Um choro baixo, como que abafado, perdido no tempo, um choro doído, de súplica.

“Emanuel, onde você está?”

Tentou se levantar, mas algo o prendia à cama. Retesou braços e pernas, mas via-se imobilizado.

“Emanuel… Alguém me tire daqui…”

Jogou o corpo para os lados, mas era como impossível se levantar. Podia jurar que seus braços e pernas estavam costurados ao colchão, a pele perpassada por linhas e agulhas, repuxada e por isso incapaz de ceder.

“Alguém… Samuel? Ursula?… Moça… Onde está meu filho? O que fizeram com ele?”

Sem que percebesse, começou a chorar ele próprio, o fôlego curto, como se lutasse por ar.

“Filho…”

Um toque inadvertido no ombro o trouxe à realidade. Em seguida, a chama trêmula de uma vela rompeu a penumbra, sem que fosse possível, porém, reconhecer quem a trazia.

“Você está sonhando…”, disse a voz, que talvez fosse da jovem de rosto encovado.

“Meu filho…” murmurou o homem, tentando se levantar, incapaz de vencer a visão turva que o dominava.

“Descanse, Eduardo… Estará melhor pela manhã.”

O homem fechou os olhos e respirou profundamente, enquanto a mulher devolvia o quarto à escuridão.

Viu nitidamente quando Úrsula cortou o pescoço de um cordeiro ainda vivo. A lâmina prateada reluziu por uma fração de segundo, atingindo o animal que se debatia, as pernas esqueléticas se agitando em horror. Enquanto um balido moribundo se fazia ouvir, o sangue escuro desceu pelas mãos da mulher. No instante em que o animal deixou de se mexer, ela abriu-lhe um talho no peito, retirou de lá o pequeno coração embebido em vermelho e o devorou sofregamente.

“Carneirinhos são como as nuvens, né, papai?”, perguntou Emanuel, que estava de mãos dadas com ele, assistindo ao sacrifício. “Eles descem do céu para ficar com a gente, não é assim?”

Sacrifício.

Sem aviso, nuvens se assomaram sobre a clareira em que estavam e as árvores ao redor se dobraram em conjunto por conta do vento. Úrsula, porém, manteve-se ocupada com as vísceras do cordeiro. De alguma forma, o balido carregado de dor ainda chegava aos seus ouvidos, causando-lhe um misto de ansiedade, de agonia. Temeu por Emanuel. O menino não deveria estar ali, testemunhando aquilo tudo… Não…

Súbito, o lamento do cordeiro transformou-se em choro, um choro sentido, doído, quase infantil.

O choro.

Emanuel… Onde estava Emanuel agora?

De longe, ao prestar atenção, não via mais o cordeiro sobre a bancada, mas o garoto.

Sacrifício.

“Pai?”

Despertou de súbito, ciente do sussurro que lhe chegava aos ouvidos. Mais um sonho? Não, não poderia ser um sonho. A mulher… Úrsula. O cordeiro…

Não, não…

Estava ali, no quarto escuro, na casa de madeira. Havia dormido somente. Sim, porque estava cansado. Cansado de procurar e procurar…

“Pai, me ajude!”

Mas o sussurro, o pedido… Não, não estava sonhando. Era real. O menino estava ali. Ali, naquela casa em algum lugar.

“Filho?”, sussurrou em resposta quebrando o silêncio do quarto, ignorando o vento e a chuva que se debatiam contra a janela. “Onde está você?”

“Pai, aqui…”

Levantou-se num átimo, aliviado de certa forma por não sentir-se preso à cama. Tateou as paredes, procurando a porta na escuridão, avaliando a rugosidade da madeira com a ponta dos dedos. Por fim, encontrou uma tramela, girou-a e ganhou o corredor, atingido de imediato por uma lufada de ar quente e de odor acre. Foi quando percebeu um filete de luz alaranjada, que se esgueirava por debaixo de uma das portas adiante.

“Meu filho…”, disse baixinho, abrindo a porta.

Diante dele havia uma saleta onde se via uma poltrona e uma estante com poucos livros. No canto, uma mesa redonda, onde repousava um lampião solitário, emanando calor e conforto. Ah, poderia ficar ali para sempre. Não, não havia ninguém a vista. Nem mesmo Emanuel.

Como se guiado por uma força desconhecida, apanhou um dos livros a esmo e começou a folheá-lo, esperando encontrar páginas e páginas de uma tipologia qualquer, letras e frases impressas de forma elegante, talvez em algum idioma que conhecesse, talvez com alguma posta sobre o que procurava. Em vez disso, deparou-se com desenhos feitos à mão livre, traços feitos com giz de cera ou lápis de cor, linhas tortas, carros, casinhas, montanhas… O sol com raios múltiplos, as nuvens, um arco-íris, pessoas concebidas com rabiscos vacilantes, de mãos dadas, uma família, papai, mamãe, eu… No canto da página, as letrinhas compunham um nome. Emanuel. Com o “E” estilizado para se parecer com o “E” que também iniciava o nome do papai.

Os olhos se encheram d’água. Mas, afinal, como esse livro… o livro de atividades da escola havia parado ali? Como… Em sua visão periférica, notou algo familiar. Um triciclo azul. Como não o notara antes? E os blocos de montar? Os jogos, os bonequinhos? Estava tudo ali…

“Emanuel!”, gritou. “Filho, fale comigo!”

Apanhou o lampião, cuja luz lançava sombras alongadas na estante, nos livros e nos brinquedos.

Abriu a porta com vigor. Diante dele, a figura de Samuel o encarou com a expressão perturbada, as rugas aprofundadas pela luminosidade que vinha de baixo para cima.

“Por que não está dormindo”, perguntou o velho, um hálito azedo desprendendo-se de sua boca.

“Onde está meu filho?”, devolveu o homem, o coração disparado.

“Não está aqui.”

“Como não está? Os livros escolares dele estão aqui, os brinquedos dele estão aqui. Eu ouvi quando ele me chamou! O que vocês fizeram com ele?”

Nisso, Úrsula surgiu por trás do homem. Ela trazia um castiçal com três velas nas mãos.

“O que está havendo?”

“Ela… Essa mulher. O que você fez com o meu menino? Cortou a garganta dele? Cortou o pobrezinho em pedaços?”

“Por que não volta para cama, Eduardo?”, disse Cecília, aparecendo também, a voz tranquilizadora, quase reconfortante.

“Não… Não vou voltar para cama!”, disse o homem, sentindo as lágrimas aflorando. “Eu quero o meu menino, eu quero…”

Uma lufada de vento apagou as velas e em seguida o lampião sucumbiu ao negrume. O silêncio abateu-se sobre a casa e por um instante, o homem desejou que estivesse novamente dormindo, preso, provavelmente, à cama do quarto que lhe fora oferecido. Sim, acordaria na manhã seguinte com o sol acariciando-lhe o rosto, renovando-lhe a esperança. Agradeceria ao velho e às suas filhas e tomaria uma trilha qualquer que por ventura fornecesse indícios do menino, do local para onde ele teria seguido mata adentro. Porque era isso que fazia desde que podia se lembrar, vivia de esperança.

No momento em que quase acreditava nesse devaneio, sentiu que dedos endurecidos e frios agarravam sua mão.

“Venha comigo”, disse a mulher. Podia ser Cecília.

Mesmo no escuro, ela, quem quer que fosse, sabia para onde seguir. Os passos ligeiros e apressados o levaram para frente e para trás, como se percorresse um labirinto muito maior do que a própria casa. No entanto, tinha certeza de que não haviam abandonado a construção, pois o ranger das tábuas do assoalho continuavam a soar lamuriosos à medida que avançavam e retrocediam, entrando aqui e ali num itinerário interminável. Até que começaram a descer por uma escada, os degraus se sucedendo infinitamente em curva, desaparecendo a cada passo.

“Estamos quase lá…” avisou a mulher, no instante em que um ponto luminoso, de cor vermelha, surgia adiante.

Ela o deixou ali e desvaneceu. Sem opção, o homem caminhou até a fonte da luz, que ganhava o aspecto de uma sala à sua aproximação.

Havia algumas pessoas ali, todas de costas para ele, como se observassem algo mais à frente. Ele esgueirou-se entre eles tentando ver o que atraía sua atenção. Em uma mesa de cirurgia, havia uma mulher deitada coberta da cintura para cima por um lençol. Suas pernas estavam erguidas e apoiadas em pedestais de metal, um em cada extremidade. Diante dela, também de costas para quem assistia à cena, um homem vestindo um jaleco branco dizia-lhe algo incompreensível, mas que podia ser tomado como uma espécie de incentivo.

Ao lado esquerdo da mesa em que a mulher jazia imóvel, algumas pessoas haviam se ajoelhado. Todos vestiam-se de preto, com capuzes sobre as cabeças, entoando um cântico cadenciado e profundo, movendo-se lentamente para frente e para trás, como árvores de uma floresta açoitada por ventos indecisos. Do lado direito da mesa, um homem de sobretudo escuro observava a mulher deitada e o homem de jaleco branco, a expressão de ansiedade estampada no rosto magro e anguloso.

Depois de algum tempo que poderiam ser segundos ou dias, um choro de bebê quebrou a atmosfera de fastio que contaminava o ambiente. De onde estavam, homens e mulheres se acotovelaram para testemunhar o que se seguiria, como se cumprissem um roteiro conhecido, predeterminado. O cântico, então, ganhou força, com as pessoas encapuzadas se movendo com mais e mais intensidade, elevando o tom do lamento. Diante da mulher deitada, o homem de jaleco branco ergueu a criança no ar. O choro agora era intenso, derramando-se num misto de histeria e incompreensão, como se não aceitasse a separação da mãe, como se não admitisse ser afastado de seu calor, de seu peito, de seu aconchego.

Alheio aos protestos do bebê, o homem de jaleco branco entregou-o ao sujeito ao lado que, impassível, segurou-o por uma das pernas, brandindo-o diante do grupo entorpecido.

“A pureza é a maior das oferendas ao nosso senhor”, disse o homem de rosto anguloso, apanhando uma faca de lâmina comprida, a voz poderosa sobrepondo-se ao cântico cada vez mais convulsivo. Erguendo a faca no ar, ignorando os movimentos do bebê dependurado, o homem disse em tom solene:

“Senhor de todo o Mal, eu vos ofereço este sangue e este corpo, para toda a sua glória, porque vosso é o mundo e nós, seus fiéis seguidores.”

Em seguida, trespassou a lâmina pela garganta da criança. Os homens e as mulheres presentes  ergueram as mãos para o alto, em êxtase, repetindo a conjuração, agradecendo a sorte de estarem ali, naquele momento, insensíveis aos engasgos e aos estertores da criança.

Foi quando pôde observar o homem de jaleco branco. O médico. Um homem jovem, seguro, satisfeito consigo mesmo, contente por estar ascendendo aos níveis mais relevantes da congregação. Um homem de sorte, alguém cujo trabalho e experiência eram fundamentais para o sucesso dos ritos e do empreendimento. Em breve, isso era certo, chegaria aos postos mais altos, influenciaria decisões, ordenaria jovens, praticaria ele mesmo os atos mais significativos de qualquer celebração. O sorriso em seu rosto, um rosto incomodamente familiar, não deixava dúvidas de que seu futuro seria recompensador. A chave para o sucesso era servir à entidade correta, à mais poderosa, à que oferecia a verdadeira recompensa.

“Pai?”

Virou-se de costas para a multidão, que desapareceu num átimo, assim como qualquer fonte de luz.

“Emanuel?”

“Pai, aonde vamos?”

“Filho, onde você está?”

Um facho de luz surgiu adiante e logo a figura de Cecília, segurando o castiçal, ganhou contornos nítidos.

“Por aqui”, disse ela. “Quer encontrar o seu menino, não?”

“É o que mais quero…”

“Venha comigo.”

Caminharam em linha reta sobre as mesmas tábuas enegrecidas que compunham o assoalho da casa de madeira. Até que chegaram a uma cena similar àquela que ele havia testemunhado há pouco.

“Emanuel quer dizer ‘Deus Conosco’, não é, pai?”

Viu-se em frente a dezenas de pessoas que o miravam com atenção devota. Vestia um sobretudo negro e observava o filho único, deitado sobre uma mesa, como um cordeiro. Ao lado, um grupo de homens e mulheres encapuzados entoava cânticos de adoração, num crescendo, os olhos revirados em transe.

“Sim, significa isso mesmo”, respondeu ao menino, passando a mão em sua testa, como se ajeitasse seus cabelos.

Ladeando a mesa onde o garoto estava, duas mulheres vestindo longos casacos o observavam resolutas. Uma delas era compacta, de constituição forte, nem muito velha nem muito nova; tinha o queixo quadrado, o nariz adunco e um olhar cinzento. A outra era mais jovem, a expressão serena estampada num rosto afilado que lembrava um cadáver.

Úrsula… Cecília…

Ele observou a pequena multidão, ansiosa, pronta para saudá-lo, para celebrar sua devoção, seu ato de constrição e de abandono das convenções. Sabia o que deveria dizer a todos, sabia o que deveria fazer, como fazer.

O sacrifício supremo, a chave para a riqueza, para o poder incomensurável.

Úrsula entregou-lhe o cutelo. Na lâmina viu o próprio reflexo. Mais jovem, mais bonito. Barbeado, os cabelos bem penteados. Sentia-se forte, saudável. Poderoso. Sim, sabia o que deveria fazer. Olhou para o menino amarrado à mesa. Estava acordado, embora entorpecido, delirante.

“Pai… Os carneiros vêm mesmo do céu?”

Fechou os olhos e respirou profundamente. Grandes conquistas advêm de grandes sacrifícios, disse a si mesmo. Encarou Úrsula e Cecília por um momento. Também elas conheciam o ritual. Sabiam o que fazer, como se comportar na cerimônia.

Meu próprio filho.

Úrsula…

Úrsula? Sua esposa?

Não… Como pôde? … Como pôde concordar, como pôde incentivar?

Deus Conosco…

Não… Você sabe que isso é necessário. Não é hora de ceder…

O rosto do menino, as bochechas rosadas, o cabelo penteado de lado. Era um menino tão bonito… Uma criança linda.

Nosso filho, nosso filho…

“Podemos tomar sorvete depois, papai?”

Não, não…

“O meu eu quero de morango.”

Oh, Deus, Deus…

Num átimo, cortou as cordas que prendiam os braços do menino à mesa. Todos sabiam o que isso significava. Levantou-o e o entregou à moça de rosto encovado.

“Leve-o daqui. Ele ainda não está pronto.”

Talvez acreditassem. Talvez não. De todo modo, não seria hoje que o garoto seria oferecido. Com sorte, isso jamais aconteceria.

“Pai?”

“Quero que você vá para a casa de sua tia. Você sabe onde é, não sabe?”

O menino, ainda zonzo, fez que sim com a cabeça.

“E mamãe? E você?”

Não podia mentir. Não queria mentir. Mas sabia que a desistência teria um preço.

“Eu encontro você, meu filho. Eu encontro você.”

Quando acordou, notou a floresta que se abria logo adiante, densa, desafiadora, opressiva. Impelido por uma força desconhecida, sabia que era seu dever seguir adiante. Encontrar o filho, encontrar a si mesmo.

78 comentários em “Deus Conosco (Gustavo Araujo)

  1. Neusa Maria Fontolan
    22 de novembro de 2017

    Eu gostei do conto.
    Pelo que eu entendi, um jovem médico, ganancioso, participava de rituais satânicos, ajudando no parto de bebes que seriam sacrificados logo a seguir, para obter sucesso na vida.
    Cobiçava o lugar do executor ( sacerdote do mal) talvez fosse o posto mais elevado na seita e isso traria todo sucesso na vida terrena. Para conseguir tal lugar tinha um ritual especial, a subida foi devagar, degrau por degrau e sua esposa, também membro da seita, o incentivava.
    Chegou o grande dia, onde ele com as roupas de sacerdote do mal iria executar a prova final, aquela que selaria de vez sua união com o demo. Ele estava pronto, iria matar seu próprio filho.
    Mas…
    Mas o amor pelo filho foi mais forte e ele desistiu, libertando o filho. Este se tornou inútil para a seita, já que estava envolto com uma poderosa força, AMOR.
    Sabia que teria que pagar um alto preço por isso (pagaria com a própria vida, deu sua vida no lugar da vida do filho)
    Foi morto e por causa de seus inúmeros pecados foi para o purgatório ou limbo, só não foi direto pro inferno por conta de seu último ato.
    Vaga, sem que o tempo seja contado, a procura do tão amado filho, talvez um dia seus pecados serão perdoados e o filho venha buscá-lo. Talvez…

    • Gustavo Araujo
      22 de novembro de 2017

      Neusa, muito obrigado pelo comentário, especialmente porque feito depois do desafio. Agradeço a leitura atenta e digo que você chegou bem perto daquilo que eu pretendi dizer com o conto. É ótimo quando isso acontece. Valeu mesmo, minha amiga. Um abraço grande do sobrinho aqui 😉

  2. Renata Rothstein
    11 de novembro de 2017

    Bem escrito, envolvente, porém muito clichê. Não senti de verdade as emoções que esperava sentir qdo percebi do que tratava o seu tão bem trabalhado conto.
    O final foi impactante, olha, tenho várias interpretações sobre Deus Conosco, desejo muito boa sorte.

  3. Rafael Penha
    10 de novembro de 2017

    Olá, autor,

    A narrativa não linear é a cereja no bolo do seu conto. A forma com que passeia pelas lembranças de forma vivida, é fluida e desentravada.

    O conto as vezes parece confuso, mas narra bem e segue uma linha compreensivel.

    O terror vem mais em forma de angústia, mas funciona do mesmo modo.

    Não percebi erros gramaticais passíveis de apontamento.

    Um bom conto!

  4. Pedro Paulo
    9 de novembro de 2017

    Olá, entrecontista. Para este desafio me importa que o autor consiga escrever uma boa história enquanto em bom uso dos elementos de suspense e terror. Significa dizer que, para além de estar dentro do tema, o conto tem que ser escrito em amplo domínio da língua portuguesa e em uma boa condução da narrativa. Espero que o meu comentário sirva como uma crítica construtiva. Boa sorte!

    Parabenizo o autor por conseguir escrever um conto em que a angústia nos acompanha do início ao fim. Começamos com Eduardo exausto no meio da floresta, em que a qualidade da escrita ajuda a construir um ambiente sombrio com a floresta e, depois, com a casa. O que é mais positivo para instalar o suspense, tão necessário ao terror, é que nem o leitor e nem o personagem sabem o que está acontecendo. Ficamos embasbacados ao ver que o protagonista sabe que procura pelo próprio filho, mas tem dificuldade para lembrar do próprio nome, quando se depara com o homem e as duas filhas.

    Evidentemente há algo por detrás deles e é inevitável sentir que Eduardo está caindo em uma armadilha quando concorda em descansar em um dos quartos. Daí saem algumas sequências oníricas que misturam os presságios malditos das coisas que acontecerão com vislumbres confusos de Emanuel, cujo desaparecimento também tem o leitor ansioso e à espera da sua aparição. O autor consegue nos levar à mesma confusão que a personagem sente, nos deixando incertos sobre o que é sonho, memória e realidade.

    Contudo, temos o momento em que, embora Eduardo duvide que aquilo está acontecendo, sabemos que é tudo bem real e nos deparamos com a imagem bizarra do sacrifício do bebê (que eu tomei como real, mas agora percebo que talvez tenha sido uma memória que ele projetou no espaço escuro, o jovem médico sendo ele próprio). Aí, embora choque, não é um caminho realmente impactante, com imagens que podem ser vistas em quaisquer histórias que abordem essa trama, as pessoas cantando, vestidas com mantos pretos ou vermelhos… é tudo bem típico e acaba não compensando todo o suspense que vínhamos seguidos até então.

    O final, no entanto, é bem interessante, com ele decidindo não sacrificar o filho, desse modo sacrificando a si próprio. O trecho seguinte, que o tem de volta na floresta, consegue nos retornar à mesma agonia que vínhamos sentindo no começo, uma vez que sabemos o que vai acontecer e, pior do que isso, sabemos que talvez o desfecho vá ser diferente. Emanuel continua em perigo.

  5. Evandro Furtado
    8 de novembro de 2017

    A construção do suspense no conto é muito interessante. A história é, de certa forma, carregada por uma estética surrealista onde sonho e realidade se misturam facilmente. No começo, achei que o cara estaria morto, depois achei que os mortos eram os outros, no final não sei quem tá morto e quem não tá. Mas, de qualquer forma, a quebra da linearidade, da forma como é feita, é realmente um trabalho de arte. Lembra um pouco, inclusive, Meshes of the Afternoon. A única coisa que poderia ter contribuído ainda mais para a composição do terror seria se o autor tivesse ousado e matado a criança de fato. A tormenta do homem, que assassinou o próprio filho, seria, assim, muito mais impactante.

  6. Pedro Luna
    8 de novembro de 2017

    O conto é legal. Essa pegada psicológica de sentir culpa, reviver momentos dolorosos, meio Silent Hill é bacana. Mas bacana porque aqui o personagem não fica só rememorando esses momentos, o que seria um saco, mas eles desfilam pelo texto, como se estivessem acontecendo no exato momento. Depois descobrimos que não é bem assim. É um loop de punição que revive algo que já ocorreu.

    A ambientação na floresta é boa. Confesso que quando começou a aparecer o lance da seita e dos sacrifícios, fiquei puto, devido ao clichezão. Mas com o final, fez sentido e se tornou algo aceitável. O sujeito não quis matar o filho, compreensivo, só acho que poderiam ser cortados as falas do filho que surgem no meio do conto, como “vamos tomar sorvete, papai”, “o meu é de morango”. Entendi que busca emocionar, mas ficou meio forçado, pelo menos para mim.

    Bom conto.

  7. Daniel Reis
    7 de novembro de 2017

    Prezado autor: gostei muito e aprendi com a sua narrativa bem amarrada, ainda que lenta nos acontecimentos. Acho que é um dos contos com mais aspecto de terror desse desafio, e a ambientação tem papel fundamental nisso. Aliás, a maioria dos contos deste desafio utilizou o cenário como fator gerador do mistério para o surgimento do terror. Essa foi uma grande lição para quem, como eu, não tem muito contato com essa literatura. De qualquer forma, entendo que o loop final deu sentido conclusivo à trama. Parabéns!

  8. Fil Felix
    6 de novembro de 2017

    A narrativa está bem fluida, a leitura não cansa e possui alguns detalhes bem interessantes que nos coloca dentro da atmosfera, como a clareira, a fumaça da chaminé que não enxergamos, os delírios, o corpo preso à cama etc. Funcionaram pra colocar o leitor dentro desse universo que criou. Porém é outra história que se apoia em pontos muito batidos das histórias de terror, como o ritual diabólico, a família suspeita, o sacrifício, os cânticos, coisas que apareceram em fartura pelo desafio. O final acaba deixando o conto em looping, fazendo o leitor voltar no tempo e tentar encaixar melhor as peças, uma boa escolha, dando maior profundidade. Seria um sonho? O começo do texto? Logo em sequência de ter deixado de matar o filho?

  9. mariasantino1
    5 de novembro de 2017

    Boa noite!

    Tem umas imagens ótimas no início, cheias de melancolia >>> No alto, galhos secos e enegrecidos, despontando contra o céu em aquarelas de chumbo, lembravam braços esqueléticos em súplica. (Muito bom!) Gostei bastante da sua escrita, e do cuidado em descrever o que há ao redor para reforçar a tensão, criar clima. Porém… embora você escreva muito bem, a partir do momento em que o homem começa a rememorar os fatos o texto perde um pouco a força e torna. Se os personagens já se conheciam e o castigo do pai (Eduardo) é reviver tudo de novo e de novo, uma sinalização de que ele já havia estado ali (na floresta, com aquelas pessoas — o velho e as duas mulheres) tornaria as coisas mais claras. E acredito também que os personagens podiam rir das perguntas do homem, demostrar algum deboche para com o sofrimento dele, e assim quando houvesse a revelação de que aquilo ali era o inferno, não ficasse com ar de que está faltando algo.
    Mas reafirmo que gostei muito da escrita, das palavras escolhidas, das poucas repetições de termos.
    PARABÉNS e boa sorte.

  10. Rose Hahn
    4 de novembro de 2017

    Escrita muita boa, o 1o. parágrafo irretocável, enredo coerente com a proposta do desafio, gostei de tudo, com exceção de alguns comentários, pois nesse caso, acho que Deus não está assim tão conosco. Abçs, sorte no desafio.

  11. Iolandinha Pinheiro
    3 de novembro de 2017

    Aliás, Emanuel significa Deus Conosco. Seria Eduardo o próprio Deus em seu sofrimento por ter sacrificado seu único filho, o Cordeiro de Deus (agnus – dei) ?

  12. Iolandinha Pinheiro
    3 de novembro de 2017

    Olá, autor.

    Com grande chance de fazer uma interpretação completamente equivocada, apresento minhas impressões:

    Acredito que tudo o que o protagonista vive é a representação de seus pensamentos e emoções. A floresta, a casa, o história voltar para o começo como se aquele evento jamais acabasse, e o suplício do homem à procura do filho perdido deram para mim a ideia de EXPIAÇÃO.

    Ele chega a uma casa onde, supostamente, nunca esteve, mas parece que as pessoas que estão lá dentro saibam bem quem é ele, e que façam perguntas não para se informarem, mas para que ele retome suas lembranças.

    O filho é a chave da questão. Emanuel – que também é um dos nomes de Jesus. O que foi sacrificado pelo pai. Sete também é um número representativo (sete é o número perfeito, também representa Jesus), não sei se foi a intenção do autor, mas ter estudado apenas em escolas católicas acabou por influenciar minhas percepções. Também a dor nos joelhos me lembrou penitência

    Durante toda a jornada o homem encontra referências do filho, sua voz que o chama, objetos do menino… Coisas que apontam mais para as suas lembranças e culpas do que para fatos e objetos reais, encontrados com estranhos.

    Não entendi muito bem porque ele sonha que está amarrado. Talvez se sinta impotente para solucionar os próprios problemas. Na casa há duas mulheres e um homem, se fossem três mulheres eu arriscaria afirmar que elas fossem as greias (mitologia) porque Cecília mostra coisas para o homem, concede a visão a ele, mas acho que estou errada neste ponto.

    Durante o conto o autor repete algumas vezes a expressão “jaleco branco” e a associa a poder, talvez ele mesmo tenha sido médico ou algum médico tirou a vida a mulher e do filho na hora do parto. São tantas as possibilidades… Talvez ele tenha sido um médico ambicioso e tenha deixado o filho se perder (abandonou a esposa e o filho, ou obrigou uma namorada a abortar) para não atrapalhar a sua carreira e tendo morrido, vive neste inferno de repetição sendo confrontado pelos seus pecados em um período de tempo que se repete infinitamente.

    Para resumir, o conto, para mim, é sobre culpa, sacrifício e expiação. Desculpe se não consegui captar o que vc escreveu, mas acho que já falei demais.

    Gostei do seu conto. Tem profundidade e enigmas. Um conto que merece várias conversas num bar com os amigos do Entrecontos para tentar desvendá-lo, pois aqui cabem muitas versões.

    A ambientação veio cheia de pistas o que permitiu várias interpretações, aliás, o conto todo é um grande enigma com pequenas charadas pelo caminho.

    O autor criou quadros aterradores, mas eu não senti o terror. Acho que não li ameaça à vida do protagonista, então as cenas servirão mais para dar uma atmosfera lúgrube, decadente e misteriosa.

    Vc é um grande escritor. Minha admiração.

    Iolanda.

  13. Marco Aurélio Saraiva
    3 de novembro de 2017

    =====TRAMA=====

    Alguém aqui acabou de assistir “Mãe!” e saiu correndo pra escrever um conto ainda com a cabeça explodindo. rs rs rs!

    Esse conto, por mais assustador que seja, e por mais fortes e chocantes que as suas cenas sejam, é muito bonito. A jornada do arrependimento do pai, a vitória do amor; um final onde o bem vence o mal, desviando um pouco do clássico “mal vence o bem” dos finais de histórias de terror.

    Eu citei “Mãe!” para fins comparativos por quê, assim como o filme, seu conto começa na realidade, situando o leitor em uma situação que, apesar de incomum, ainda é factível. Um homem viajando desesperado pela floresta procurando pelo próprio filho perdido. Neste momento, o leitor faz mil perguntas na sua mente: “será que vai ser nesta casa que ele encontrará o Emanuel? Será que este velho é mal? Será que Eduardo é quem está louco?”

    Aos poucos, novamente mimetizando bastante o ritmo de “Mãe!”, a história desce em um espiral de loucura. Começa quando ele fecha os olhos (apesar do leitor já ter algumas dicas da natureza do conto quando Eduardo tem dificuldades de lembrar do próprio nome e não sabe há quantos dias procura pela criança). A partir daí, tudo parece um sonho, e a narrativa perde a referência temporal. Os acontecimentos seguem um atrás do outro, sem local ou tempo definidos. Cada cena tem um significado, e é aí que entra a criatividade do leitor.

    Eu gostei bastante do seu conto por quê você oferece uma “primeira camada”. Diferente de “Mãe!”, o seu conto tem uma linha óbvia de raciocínio principal: o homem sacrificou filhos para obter poder através de pactos profanos com entidades desconhecidas. Sua vida seria brilhante desde que derramasse o sangue correto, tudo sob a aprovação da própria esposa. Porém, ele começa a sofrer de remorso e agora tem pensamentos conflitantes sobre os sacrifícios que planejava fazer.

    Porém, a história tem N camadas de entendimento. Uma delas – uma que pude notar durante esta leitura e o pouco tempo que dei a mim mesmo para ponderar, mas que com certeza não é a única – é que Eduardo sempre foi um homem que priorizou a própria carreira e o próprio sucesso em detrimento de uma família. Provavelmente casou-se com uma mulher igualmente ambiciosa. Quando tiveram notícia da primeira gravidez da esposa, decidiram pelo aborto, afinal, um filho naquele momento atrapalharia as suas vidas. As pessoas cantando em um cântico e o homem de sobretudo que pega o bebê e o esfaqueia podem ser clientes, chefes, donos de empresas… a vida social que eles teriam que sacrificar para criar um filho. Todas estas coisas, pessoas, “stakeholders”, EXIGEM este sacrifício com os seus cânticos. Em seguida, na segunda gravidez, decidem tentar mas, conforme o tempo passa, Eduardo negligencia Emanuel e continua focando todos os seus esforços na sua carreira. Sua esposa faz o mesmo. Eles “sacrificam” o próprio filho para ter mais tempo para cumprir seus objetivos pessoais.
    Nesta interpretação, todo o conto é uma jornada mental de arrependimento. Eduardo finalmente entende o que tem feito com a sua vida, entende que tem um filho, e agora quer remediar o tempo perdido. O velho poderia ser o seu pai, talvez uma figura que o doutrinou para agir da mesma forma, e que provavelmente não prestava atenção nele (“não vi o seu filho”).

    Enfim, o conto tem um milhão de referências, pequenas nuances que surgirão apenas durante uma segunda leitura, etc. Gosto de contos assim. Eles dão o que pensar. Uma primeira leitura me deixa irritado por quê o conto mais parece uma bagunça de ideias jogadas em um texto, mas pensar nelas e montar o quebra-cabeça faz parte da experiência.

    Não é uma leitura para qualquer um… mas eu curti!

    =====TÉCNICA=====

    O clima sombrio da floresta, o ar de assombração da casa, o clima tenso dentro do lar com três pessoas desconhecidas… isso tudo foi muito bem narrado e descrito. Você é mestre em ambientações! Este foi um dos poucos contos que me fez sentir realmente aterrorizado. Eu conseguia ouvir o som da chuva lá fora, ver os galhos secos ameaçadores sobre mim, assistir ao parto macabro com tons de sacrifício… tudo muito bem escrito por você.

    Você escreve bem demais. Demonstra claro domínio da escrita, com comparações excelentes e construções frasais incríveis! Foi uma leitura deleitosa. Porém, durante a mesma, comecei a enxergar um ou outro problema. Inicialmente, quando o autor escreve tão bem quanto você, eu ignoro um ou dois probleminhas por quê, afinal, são só errinhos de revisão, isolados, etc. Mas durante a leitura acabei fazendo quatro anotações, então segue:

    “Jogou o corpo para os lados, mas era como impossível se levantar.” – acho que tem um “como” perdido aí.

    “Um choro baixo, como que abafado, perdido no tempo, um choro doído, de súplica.” – o “como” aqui também parece perdido. Seguindo seu próprio estilo, que muitas vezes troca frases extensas pela simplicidade, ficaria, para mim, muito melhor “Um choro baixo, abafado, perdido…”. Acho que esta frase também pede um ponto e vírgula, já que “um choro” é repetido. Ou então um ponto final e uma mudança de palavras… tipo: “Um choro baixo, abafado, perdido no tempo. Tinha o tom de súplica, soava doído…”

    “…causando-lhe um misto de ansiedade, de agonia.” – repetição “de-de-de”. Não seria melhor “…causando-lhe um misto de ansiedade e agonia”?

    “Ele esgueirou-se entre eles tentando ver o que atraía sua atenção.” – Ele-eles.

  14. Gustavo Araujo
    2 de novembro de 2017

    O início traz à memória o conto da Shirley Jackson, “The Man in the Woods”, em que um sujeito encontra uma cabana no meio de uma floresta, habitada por um trio de moradores bem assustadores. Lá o sujeito é compelido a assumir o posto de zelador da mata, enquanto que aqui o protagonista parece estar numa espécie de devaneio, em que não se sabe o que é real e o que não é. Dá para perceber, no fim, que a floresta é um castigo, talvez eterno, em que ele é obrigado a vagar atrás do filho que se recusou a sacrificar, revivendo sempre as mesmas descobertas: a cabana, o velho, as mulheres. Senti falta de um desenvolvimento melhor desses habitantes. O velho ainda possui certa profundidade, mas as mulheres deixaram a desejar, especialmente Cecília, que jamais disse a que veio. Como havia espaço (ou palavras) para desenvolvê-la, creio que você, caro autor, pode pensar nisso, dedicando-lhes, alguns parágrafos para torná-las mais interessantes. Creio que texto ganharia muito. Do mesmo modo, aludir melhor ao passado do protagonista poderia auxiliar na identificação do leitor com ele. Pense nisso. No mais, é um conto sem muitos erros gramaticais, como já apontado por aqui. Boa sorte no desafio!

  15. Miquéias Dell'Orti
    31 de outubro de 2017

    Oi,

    A tensão presente no conto me pegou desde as primeiras linhas, a descrição da trilha em que Eduardo caminha nos coloca em um ambiente opressor, tomado pela escuridão e medo, e dá mais peso ainda à narrativa.

    Á princípio, fiquei com aquele pensamento do óbvio: “garoto sequestrado por seita satânica para sacrifício”. Realmente, foi quase isso, mas a forma como essa premissa foi apresentada me surpreendeu. Achei muito bacana a ideia de trazer o pai como um tipo de sacerdote da seita, revelando-o como do detentor do mal.

    O final, então, foi a cereja do bolo. As revelações sobre seu passado e sua família, tudo isso para, no fim, descobrirmos que ele ficará ali, preso naquele looping infernal para sempre, como um castigo (ou como um tipo de redenção, vai saber).

    Acho que minha única crítica é sobre alguns aspectos do fio da trama em que os saltos me estranharam. Não sei se isso foi proposital, para dar a sensação da queba de fluxo de consciência (consciência?) do personagem, mas acho que senti isso por esperar um tipo de texto que não tivesse tantas camadas.

    Parabéns e boa sorte no desafio.

  16. Anorkinda Neide
    31 de outubro de 2017

    Então..
    quiser me chamar de tia, tem q ser Tia Kinda! :p
    Eu gostei imenso do conto!
    Tem frases lindas ae, tem a agonia, como num sonho do qual nao se acorda, mas entendi de primeira de q nao é sonho nao, viu? é um limbo rsrs
    Ficou em aberto: afinal, poupou a criancinha ou nao? Acredito que sim, pq o ritual era pra ser o pai matando o filho, como ele nao o fez e foi condenado à expiação de seu pecado cometido contra o demo, acredito que Emanuel conseguiu fugir para a casa da tia. #tenhoesperanças!
    Achei todo muito bom, tem algumas falhas que vc até já deve ter ajustado.
    Parabens e boa sorte!

  17. Luis Guilherme
    30 de outubro de 2017

    Olá, amgo, tudo bem?

    Como tenho dito, esperei muto por esse dessafio, já que amo o gênero. Por isso, estou lendo os contos com muita expectativa. Dito isto, vamos ao seu:

    O que mais me chamou atenção no conto foi a escrita, que conta com uma técnica muto boa. As descrições são excelentes, e, enquanto lia, os cenários e pessoas se formavam perfeitamente em minha mente. Isso é uma grande qualidade, e algo que quero desenvolver na minha própria escrta.

    Consequentemente (e obviamente), a ambientação do conto está perfeita. Gostei muito da cabana no meio da mata, um tanto sinistra. Não é algo novo no gênero, mas que você utlizou bem.

    Já o enredo, achei um pouco abaixo. Achei que não trouxe muita novidade, já que o assunto “sacrifício de criança em ritual satânico” está um pouco batido, talvez.

    O que dá um toque original à história é o final. Gostei bastante da ideia de que ele fica nesse ciclo eterno, tentando vencer as barreiras da moralidade e do bom senso que ainda o impedem de chegar aos finalmentes. Acho que isso deu o toque especial ao conto.

    Enfim, é um belo trabalho, esteticamente, mas que acaba caindo num enredo que não surpreende, mas que ganha muitos pontos pelo ótimo desfecho.

    Parabéns e boa sorte!

    • Luis Guilherme
      30 de outubro de 2017

      Ah, um errinho de revisão logo no começo: primeiro, fala que o filho tinha 7 anos, depois, 8.. Nada que atrapalhe, só achei legal apontar.

  18. José paulo
    28 de outubro de 2017

    Comecei lendo o conto como um texto linear…com ótimas descrições. Em um dado momento me perdi tal qual o protagonista, e então afundei-me vez ate o fim. Tranquilizei-me apenas quando li os comentários de alguns amigos, quando justificaram sua satisfacao com a leitura baseando-se num cabedal de informacoes bíblicas que sinceramente desconheço. E por isso não me achei apto a tecer um comentário justo. Porém, quando vc optou por explicar o seu conto fiquei entao mais tranquilo. Mesmo explicando essas indas e vindas do além, o que eh sonho, o que não eh, o que eh inferno, quem são as bruxas, ele faz o ritual, não faz, quem eh quem, quem não eh quem….perdao. Um conto em que a explicacao do conto eh tao confusa quanto o conto, não da. Sua escrita eh sublime, mas acho sinceramente que vc se enrolou no seu rolo, e eu não tenho inteligência para desenrola-lo.

  19. Pedro Teixeira
    27 de outubro de 2017

    Olá, Reinaldo!
    Gostei muito da ambientação, que me lembrou o excelente filme “A Bruxa” e da maior parte das descrições. Há um bom manejo do “mostrar” que enriquece o texto. Algumas construções, no entanto, me pareceram exageradas ou inadequadas, como:
    raízes e pedras afloravam ao redor;
    rompendo as paredes como se quisesse sufocá-las;
    causando-lhe um misto de ansiedade, de agonia;
    um filete de luz alaranjada, que se esgueirava.
    São pequenos trechos que me “tiraram” da leitura. A descrição física dos personagens também não funcionou muito bem pra mim.
    O recurso do loop foi utilizado com inteligência. Lembrou um pouco um bom filme que vi no Netflix chamado “Veronica”.
    A ideia daria um bom curta de terror daqueles mais experimentais. No final das contas, gostei, mas queria ter gostado mais. Senti falta de um um pouquinho mais de aprofundamento psicológico do personagem, de mais lembranças, de modo a tornar o leitor mais próximo. De qualquer maneira, é um bom conto.

  20. Vanessa Honorato
    26 de outubro de 2017

    Achei que o personagem era um ‘louco’ que estava sofrendo alucinações psicóticas e que ele próprio descobriria que matou o filho, tipo Ilha do Medo, mas não, ele realmente está morto e ‘vive’ um lopping sem fim. Ou não… “Leve-o daqui. Ele ainda não está pronto.” – esse AINDA pode significar que o personagem, em uma das sua voltas poderia matar o filho? Gostaria de ler mais, uma sequência, quem sabe. Gosto dessa pegada de terror psicológico que vai se revelando aos poucos.

  21. Antonio Stegues Batista
    25 de outubro de 2017

    ENREDO: Sem grandes novidades. Homem que faz ritual demoníaco com o próprio filho, não é novo.Porém, ao recusar ele entra numa espécie de castigo, numa eterna procura pelo filho.Peno também que, se o filho está seguro em algum lugar, pois foi ele quem mandou, então são alucinações, pesadelos repetidos causados pelo arrependimento e medo, por ter mexido com algo desconhecido e perigoso.

    ESCRITA: Muito boa, com frases bem construídas.

    PERSONAGENS: Bem criados. Boas descrições físicas e de personalidades.

    TERROR: Dentro do tema. A ambientação opressiva, lúgubre, ficou legal.

  22. Jorge Santos
    25 de outubro de 2017

    Olá, Reinaldo.
    Mais um conto que começa de uma forma admirável, com descrições de fazer perder o fôlego, para logo se perder a lógica do conto. Tentei reler, mas sem grande sucesso. O conto é visualmente forte. A vertente gore é intensa, a tensão existe. A única coisa que falta é a coerência da narrativa para conseguir agarrar o leitor.

  23. Luiz Henrique
    25 de outubro de 2017

    Um enredo cadenciado e eficiente que, a princípio parece simples, tornasse uma trama muito bem urdida. Com uma escrita sem rodeios segue fluindo com maestria para o desfecho, que chega a surpreender. Embora siga a risca como é a praxe dos contos de terror, a narração adotada pelo autor prevalece um tom mais brando. Entretanto, o final muito me surpreendeu, eu não contava que tudo não passasse de sonhos. Quanto a gramática não percebi grandes problemas. Um bom conto.

  24. Leo Jardim
    25 de outubro de 2017

    # Deus Conosco (Reinaldo Estevez)

    Autor(a), desculpe-me por não ter tempo para formatar o comentário melhor. Em caso de dúvida, é só perguntar.

    📜 Trama (⭐⭐⭐⭐▫):

    – um texto de muitas camadas, mistura alucinações, sonhos e flashbacks deixando a trama bastante densa
    – entendi, no fim, a cabana como uma alucinação do personagem revisitando episódios do seu passado: ele participava de uma seita, ajudou a matar crianças inocentes, e depois não o fez com seu filho. Até hoje ele procura seu filho numa floresta real ou imaginária
    – o fim aberto é bom, mas eu particularmente prefiro quando consigo encaixar toda as peças ao terminar de ler

    📝 Técnica (⭐⭐⭐⭐▫):

    – construções muito boas e cenas muito vívidas
    – soube explorar bem o uso do artifício do sonho sem tornar isso muito estranho ou confuso

    – perguntou *sem vírgula* a voz grave
    – o homem seguiu *e* (o) velho
    – nariz *adunco* (esse é um adjetivo pouco usual que se usa muito, melhor evitar)
    – divisou (também não gosto muito desse verbo)
    – mas era *como* impossível se levanta

    🎯 Tema (⭐⭐):

    – passou bem o clima de terror

    💡 Criatividade (⭐⭐▫):

    – um tema não muito novo, mas usado conto personalidade

    🎭 Impacto (⭐⭐⭐⭐▫):

    – a tensão criada me prendeu bastante
    – o fim aberto não me agradou em cheio

  25. Evelyn Postali
    24 de outubro de 2017

    Caro(a) Autor(a),
    Gostei do conto. Eu senti muita agonia ao ler. Especialmente na primeira parte, na procura. Depois, leva o leitor a não saber, assim como o personagem, se está vivendo ou sonhando. Achei isso muito bom. Para mim, está dentro do tema. E está bem muito bem escrito. Roteiro sem falhas, simples, mas muito bem construído. Boa sorte no desafio.

  26. Ricardo Gnecco Falco
    24 de outubro de 2017

    Olá! Segue abaixo o resultado da Leitura Crítica feita por mim em seu texto, com o genuíno intuito de contribuir com sua caminhada neste árduo, porém prazeroso, mundo da escrita:

    GRAMÁTICA (1,5 pts) –> Sim, escrever é a arte de cortar palavras… E sem se esquecer de cuidar das que foram poupadas! Ou seja, uma boa e atenciosa revisão é FUNDAMENTAL em um texto — e não apenas para este quesito —, ainda mais em um trabalho que estará concorrendo com os de outros escritores… Poucas coisas passaram desapercebidas pela revisão neste trabalho. Gramática boa.

    CRIATIVIDADE (2 pts) –> Este é, sem a menor sombra de dúvida, o quesito MAIS IMPORTANTE (e consequentemente possuidor do maior peso em sua nota final) de todos… Rituais de sacrifício não são lá grandes inovações neste gênero de narrativa e, portanto, mesmo bem descritos, e meio que vinculados a histórias bíblicas, não trouxeram muita novidade para este trabalho.

    ADEQUAÇÃO ao tema “Terror” (0,5 pt) –> Como estamos em um Desafio TEMÁTICO, não tem como avaliar sua obra sem levar em consideração este “pequeno” detalhe, rs! Assim sendo, mesmo eu o tendo valorizado apenas com meio ponto, ao final do somatório isso poderá representar a presença (ou não) de seu trabalho lá no pódio. Com relação a isso, não se preocupe autor/a! Seu trabalho está bem adequado ao tema proposto para este Desafio.

    EMOÇÃO (1 pt) –> Beleza! Gramática (e revisão!), criatividade (enredo), adequação ao tema… Tudo isso é importante para um bom texto. Mas, mesmo se todos os demais quesitos estiverem brilhantemente executados, e o conto não mexer de alguma forma com o leitor, ou seja, não emocioná-lo, o trabalho não estará perfeito… Aqui, devido ao pouco ou quase nulo conhecimento do histórico da personagem protagonista, o leitor não se projeta muito na busca desenfreada pelo filho sumido deste. Tudo já começa acontecendo e somos apenas levados pela maré da história que, ao chegar ao fim (ou novamente ao começo), não nos fez torcer ou vibrar nem pelo protagonista, nem por qualquer outro personagem. Em minha maneira de ver e sentir a obra, faltou um desenvolvimento psicológico do protagonista para desencadear algum grau de emoção no leitor.

    ENREDO –> Se você for bom em Matemática vai ter reparado que a soma dos valores totais dos quesitos previamente analisados (Gramática, Criatividade, Adequação ao Tema e Emoção) já atingiu o limite de pontos da nota máxima a ser atribuída aos trabalhos do presente Desafio (= 5,0), conforme as regras estipuladas pelo nosso Anfitrião… Portanto, como já levei em conta o Enredo da história ao avaliar a Criatividade da sua obra, este quesito aqui será utilizado apenas para demonstrar como eu, enquanto leitor, entendi o seu texto… Pai que sacrificou o próprio filho em um ritual, provavelmente satânico, revive eternamente uma busca pelo mesmo, talvez até como forma de expiação pelo pecado cometido.

    Parabéns e boa sorte no Desafio!

    Paz e Bem!

  27. Fheluany Nogueira
    23 de outubro de 2017

    Enredo e criatividade – Bastante complexo, pois é uma história estruturada com intercalações diversas, construída com metáforas bíblicas, apresenta riqueza de simbologia e detalhes descritivos e traz um mistério difuso, com suspense bem dosado.

    A narrativa está bem desenvolvida, funcionando como um quebra-cabeça, o final é circular, sugerindo que o pai está mesmo no inferno, consumido pelo remorso das ações que o levaram a perder o filho. Na verdade, até mesmo o sacrifício pode não ser real, ser uma outra figura que compõe a alegoria. Mas, são muitos personagens e o enredo trabalhoso.

    Terror e emoção – O clima de medo e nojo é introduzido com a morte da galinha. Um ato banal, mas descrito com técnica que já desperta o temor. Daí se seguem diversas cenas horripilantes que prendem o interesse do leitor do início ao final. Gostei muito do protagonista “costurado” no colchão.

    Escrita e revisão – Gostei da ideia e da execução, o autor aqui apresenta uma relação muito boa com as palavras. Notei apenas pequenos deslizes de linguagem, insignificantes no conjunto.

    Parabéns pelo brilhante trabalho. Abraços!

  28. Rafael Soler
    23 de outubro de 2017

    Me surpreendo cada vez mais com os textos do desafio. Esse aqui me agradou demais.
    Com uma narrativa onírica muito bem desenvolvida, somos aos poucos levados em uma jornada de remorso que fica cada vez mais pesada. O senso de desorientação inicial nos joga direto dentro da história para aos poucos nos orientar sobre o que se passa.
    Gostei muito da estruturação, da gramática, do ritmo e do estilo narrativo. Todos os elementos foram trabalhos muito bem pelo autor e funcionam perfeitamente em conjunto.
    Me senti jogado diretamente dentro de um mundo que mistura “Silent Hill” com “Mother!”.
    Ah, e não posso esquecer de falar sobre as camadas que o texto tem, trazendo um simbolismo religioso que dá um charme especial para a trama.

    Resumindo: adorei!

    😀

  29. Fernando.
    22 de outubro de 2017

    Meu caro Reinaldo, você me traz uma segunda história que bebe da fonte primordial judaico cristã, o Gênesis. A primeira, mais literal, dos primeiros e poéticos capítulos. Este segundo, um projeto mais denso, tirado já do capítulo 22, quando se relata a história do primeiro patriarca hebreu. Da mesma maneira que no Gênesis, também Eduardo não irá sacrificar seu filho. Na Bíblia esta história adquire sentido profundo na medida em que vem mostrar que o Deus de Israel não apreciava sacrifícios humanos, tais quais os deuses daqueles povos ao redor do povo judeu faziam para as suas divindades (e bem provavelmente eles mesmos, os judeus, também o fizessem até então). Quando Deus entra na história de alguém ele muda de nome e aqui me peguei pensando que nome assumiria Eduardo? Talvez Heduardo? Bem, veja o que fez, sua história me fez viajar. E isto é muito positivo. Um conto, faço esta leitura, sobre o mal que acomete a humanidade e que é gerador de um constante purgar em busca da redenção. Esse arrependimento atávico que se carrega, qual mochila de pedra, a pesar nas costas e a requerer o perdão divino. Interessante é que ele não sabia há quanto tempo caminhava em busca do filhinho, claro que desde toda a eternidade. O filho, promessa da continuidade, herança para o futuro, redime o pai, eis o ponto primordial. Bem, a história está muito bem contada e me faz imaginar. Um vocabulário rico e bem apropriado. Os nomes também estão muito bem postos. A irmã mais velha é ursa e a mais nova cega… Isto sem falar no Eduardo, o guardião do filho. Parabéns pelo seu belo e perturbador conto. Totalmente dentro do que está pedido. Amigo, receba o meu abraço de parabéns.

  30. werneck2017
    22 de outubro de 2017

    Olá,

    Trata-se, na minha humilde opinião, de um texto que se revela aos poucos, em várias nuances. As metáforas usadas são muito boas e remetem ao sacrifício de Abraão, tão sabiamente mencionado acima pelos colegas. Mas também o número de janelas (sete, não seis ou cinco), um número cabalístico que no catolicismo remete ao infinito. A luz alaranjada das janelas remete ao fogo, fogo do inferno talvez. As descrições são outro primor, já que elas são retomadas posteriormente para que a gente veja as similaridades de Úrsula com a esposa , etc.
    O verdadeiro mote do conto é o remorso, esse verdadeiro estado de inferno em vida, e acredito que o autor tenha sido feliz ao retratá-lo da forma que o fez.
    Parabéns e boa sorte!

    • Reinaldo Estevez
      22 de outubro de 2017

      Ai, Jesus… Vou dar uma resposta diametralmente oposta à que dei ao Lucas Maziero: que maravilha é quando há afinidade entre escrita e leitura. Werneck2017, você pegou todas as referências escondidas nas entrelinhas, sendo que algumas nem eu mesmo tinha percebido kkkk Perfeita a sua conclusão: é sim um conto sobre remorso, sobre busca (infrutífera) por redenção. Obrigado pela leitura e pelo comentário. Boa sorte para você também!

  31. Lucas Maziero
    20 de outubro de 2017

    Este conto é fértil em descrições, umas poucas concordes e muitas dispensáveis (que cansam e nada acrescentam), como estas, por exemplo:

    – No andar logo acima, uma fileira de janelas, sete talvez, algumas delas emanando uma luz amarelada, quase laranja. (e se fosse azul? Parece que independente da cor, não teve peso na história)
    – Dali, de alguma forma, brotava uma árvore parasitária, rompendo as paredes, como se quisesse sufocá-las.
    – A porta principal da construção, na varanda, parecia aberta, mas era de todo modo, protegida por uma tela, dessas para evitar a entrada de mosquitos. (não importa onde se localiza a porta principal, pois é a principal; a tela também…)
    – “Em que posso ajudar?”, perguntou, a voz grave, mas não tão firme como se poderia supor. (por que suporíamos uma voz firme?)

    Está certo, pode-se retrucar que passagens descritivas servem para adornar o texto, deixá-lo mais bonito, mas acredito que só as que interessam ao que se está contado. Enfim.

    O pai começa com uma certeza:

    “É um menino”, insistiu o homem. “Tem sete anos, mas parece mais novo. Tenho certeza de que veio por este caminho…”
    E um pouco mais adiante, não se lembra há quanto tempo desapareceu o filho e vacila ao lembrar o nome.

    Como eu entendi o conto: havia alguma coisa no chá que o Samuel serviu a Eduardo, pois a partir daí começam os devaneios. E a partir daí o conto já não faz muito sentido, tornou-se muito confuso para ser apreciado devidamente. Por que Ursula?! queria que Eduardo descansasse? Logo após viu a mesma moça cortando o pescoço de um cordeiro, em seguida despertou de súbito, incerto se era um sonho ou não. Mas continuava no quarto escuro… e na casa de madeira (não precisava repetir). Só se a luz alaranjada que se via por debaixo de uma das portas for o inferno. Não a luz, mas atrás da porta, por isso o calor, o odor acre… Mas não, era só uma biblioteca.

    E de novo a insistência para Eduardo dormir! Mas por que o queiram dormindo, ora bolas?

    Aí depois veio o sacrifício do bebê, que poderia ser Emanuel, e então tudo o que veio depois não passa de um tormento para Eduardo, imaginando como seria seu filho crescido, os desenhos que o menino faria… Por isso Eduardo acordou novamente em meio à floreste, era o seu castigo, e também por isso o queriam dormindo, pois cada vez que acordava o pesadelo recomeçava, o pesadelo em procurar pelo filho que nem chegou a crescer, o filho nascente que imolou. E só então, após cumprir essa terrível provação, seria capaz de encontrar a si mesmo.

    O conto possibilita várias interpretações, e por essa razão está confuso. Desculpe-me se há apenas uma interpretação. Em todo caso, não gostei dessa história. A gramática está boa, ortografia idem, apenas alguns erros de digitação.

    Parabéns!

    • Reinaldo Estevez
      20 de outubro de 2017

      Uma das maiores frustrações de qualquer autor é encontrar um leitor pouco afinado com seu modo de escrever. Por mais que se tente justificar um ou outro aspecto do texto, não há chance de mudar esse julgamento… Uma pena. Lamento por vc não ter gostado, Lucas Maziero.

      Sei que não vou alterar seu gosto literário, mas sei que outras pessoas vão ler este comentário e então, por elas, eu vou tentar fazer um contraponto às suas observações.

      Sobre as descrições:

      Num conto de terror, me parecem mais do que necessárias, a fim de inserir o leitor na história. Isso se chama ambientação. Se descrevi a casa nos mínimos detalhes, é para que o leitor se sinta enclausurado, até mesmo claustrofóbico, num contexto sufocante, degradante. Eu poderia ter dito que o cara achou uma casa velha no meio do mato e pronto. Mas não ficaria legal. Para mim, uma história, principalmente uma história de terror, precisa de boa imersão. Ser simples ou direto não me parece condizer com esse objetivo.

      Sobre as observações específicas:

      – “Não importa onde a porta principal se localiza”. Claro que importa. Eu queria que o leitor visualizasse exatamente onde ela ficava, queria fazer o leitor se sentir ao lado do cara que chagava da mata, criar empatia, identidade, saca?

      – Por que alguém suporia que a voz do velho era firme? Respondo: Porque ele era um sujeito grande, como eu havia acabado de descrever.

      Sobre o enredo:

      Como eu disse aí em cima, é uma pena que não haja empatia entre o eu-escritor e o você-leitor. Está no seu direito de achar a história confusa, assim como eu, de achar que ela está bem fácil de entender. A propósito, você poderia ter aproveitado essa coisa de comentários abertos e dado uma lida no que os outros leitores disseram.

      Vou tentar explicar mesmo assim (atenção, SPOILER ALERT!!);

      O protagonista está no inferno (a floresta é o inferno). Não sabe direito como apareceu lá. Só sabe que precisa encontrar o filho. O velho, dono da casa, é o Diabo. Na casa, que também é guardada por duas bruxas (Úrsula e Cecília), o Eduardo tem lampejos de seu passado, que lentamente o fazem perceber sua situação e porque ele está lá. Ele era um médico que participava de rituais de sacrifício satânico com bebês. Tempos depois, quando teve que sacrificar o próprio filho, desistiu, libertando a criança. Como resultado, viu-se preso nesse looping de chegar à floresta, encontrar a casa, descobrir seu passado, voltar à floresta…

      A galinha, o cordeiro, repare, são alusões aos rituais de que ele participava e por isso o deixavam tão transtornado.

      Então, veja só, Eduardo está num limbo, ele não tem consciência plena do que está acontecendo.

      Enfim, apesar de vc não ter gostado, eu agradeço o comentário e os parabéns por não ter cometido deslizes gramaticais. Boa sorte no desafio!

      • Lucas Maziero
        21 de outubro de 2017

        Agradeço pelos esclarecimentos.

        Quando vou comentar, prefiro não ler os comentários das outras pessoas, de modo a não me sentir influenciado. Depois, talvez, dependendo do meu interesse, leio alguns comentários. Mas na verdade não importa se uma pessoa entende e outra não, cada um tem a sua experiência como leitor.

        E eu concordo com o que você disse: Uma das maiores frustrações de qualquer autor é encontrar um leitor pouco afinado com seu modo de escrever.

        Mas não é preciso justificar um ou outro aspecto do texto. Se um leitor, no caso eu, não foi capaz de captar toda a sutileza que seu conto ofereceu, paciência.

        E eu discordo do que você disse: Como eu disse aí em cima, é uma pena que não haja empatia entre o eu-escritor e o você-leitor.

        A empatia se dá ou não entre o leitor e o conto, pois aqui estamos, penso eu, tecendo considerações ao conto e não ao autor.

        Ler é parecido com jogar World of Warcraft, no começo tudo fica no escuro, mas depois, conforme avançamos, o world map vai se descortinando. Alguns jogadores conseguem ir mais longe que outros.

      • Reinaldo Estevez
        22 de outubro de 2017

        Obrigado pela resposta, Lucas. Esperamos que na próxima vez a empatia apareça de alguma forma 😉

  32. Andre Brizola
    19 de outubro de 2017

    Salve, Reinaldo!

    Gosto de descrições bem feitas, em que podemos ter uma visão clara do que se passava na mente do autor quando criava a ambientação. Mas também gosto de descrições com margem para adicionarmos detalhes nossos, de nossas próprias experiências, permitindo uma aproximação ao personagem. E é incrível como você conseguiu juntar características dessas duas formas de descrever em seu conto.
    Eu sei que a comparação vai parecer meio estranha, mas o conto, para mim, remete ao enredo do primeiro Silent Hill. No jogo um pai procura sua filha em uma cidade tomada por uma neblina, encontrando personagens estranhos, entrando e saindo de uma espécie de mundo alternativo onde tudo é pior, sem saber se trata-se de sonho ou realidade. No final, um culto, um sacrifício e uma “redenção”, com final aberto à interpretação.
    É um bom conto, muito bem escrito, e com algumas cenas realmente interessantes!

    É isso! Boa sorte no desafio!

    • Reinaldo Estevez
      20 de outubro de 2017

      Obrigado pelo comentário, André. Velho, nunca joguei Silent Hill! Vou até procurar depois da sua dica. Abraço!

  33. Lolita
    19 de outubro de 2017

    A história – impossível não lembrar de Abraão e seu filho. É interessante a forma como o enredo vai se desenrolando.
    A escrita – Segura, os pequenos erros não atrapalham a leitura. A confusão do personagem quanto ao filho fica bem clara e as descrições do culto são fortes.
    A impressão – Um conto agoniante. Parabéns e boa sorte no desafio.

    • Reinaldo Estevez
      19 de outubro de 2017

      Obrigado, Lolita! Vou te contar um segredo… Eu quase dei ao filho o nome de Isaque, mas aí achei que ficaria muito na cara… Valeu pelo comentário!

      • angst447
        19 de outubro de 2017

        Ah, então, estávamos certas ao lembrar de Abraão e Isaque? Cordeiro….

      • Reinaldo Estevez
        20 de outubro de 2017

        Como diria o Jonathan Safran Foer, “Tudo se ilumina” 🙂

  34. Edinaldo Garcia
    19 de outubro de 2017

    Escrita: Profissional eu diria. Muito bem elaborada. O mistério em si foi instigante e a trama foi se desenvolvendo muito bem. Uma escrita primorosa. Faço algumas ressalvas. Achei que o título poderia ter sido melhor, ele não contribuiu em nada. Eu sou cristão e quando é revelado o nome do filho ficou claro a referência, achei até que teria algo grandioso, que o garoto fosse algum ser sobrenatural… enfim. O enredo em si é bastante simples, mas o charme está na maneira como foi contado. O personagem Eduardo é bastante carismático, tanto é que já nos primeiros parágrafos estamos totalmente envolvidos com a carga dramática que ele trás.

    Terror: Excelente. O mistério, os personagens e o ambiente foram muito bem feitos, bem trabalhados e não estão ali à toa. Tudo tem um propósito.

    Nível de interesse durante a leitura: Fiquei emergido na trama. Quando acabou senti que o texto em si não fecha, acaba que deixa aberto ao leitor interpretar tudo o que se passou. Isso não é ruim, é diferente e você soube bem conduzir isso.

    Língua Portuguesa: Muito bom. Boa poética, frases bem construídas, texto fluído, as imagens saltam aos olhos do leitor. Tudo bem feito. Só algumas observações:

    O filho tinha sete ou oito anos? Claro que eu entendo que o pai estava perturbado e isso pode ser a causa de ora ele dizer uma idade e ora outra.

    sussurrou em resposta quebrando o silêncio do quarto, ignorando o vento e a chuva que se debatiam contra a janela. – Qual silêncio, pois a chuva estava barulhenta, não estava?

    Veredito: Excelente. Primoroso.

    • Reinaldo Estevez
      19 de outubro de 2017

      Obrigado pelo comentário abrangente, Edinaldo. Não me dou muito bem com títulos mesmo… Numa dessas, posso alterá-lo quando for rever o conto. Quanto à idade do menino, eu poderia dizer que tudo é fruto da mente perturbada do pai, mas a verdade é que eu voei mesmo kkk É sempre complicado escrever sobre crianças… A gente fica pensando sobre a idade que ela deve ter para passar verossimilhança, se sentiria medo, se estaria ingenuamente confiante… Neste caso pensei primeiro que sete anos era uma boa, mas depois achei que era muito jovem, e que então deveria trocar para oito. Só que me esqueci de arrumar os trechos todos que faziam menção a isso… Vacilo, nada mais que vacilo… Já esse último trecho que vc citou, tenho que admitir que vc está coberto de razão. Não dá para ter silêncio se há chuva na janela… Questão de lógica. Valeu pela observação atenta! É algo para se reescrever com certeza! Obrigado mais uma vez!!

  35. Paulo Luís
    19 de outubro de 2017

    Um conto aparentemente simples pela sua introdução, pelos primeiros contatos com os donos da casa, a ansiedade pelo filho desaparecido, o cansaço… Mas logo no desenrolar se mostra a que veio. A começar pela degola da galinha, introdu-zindo o terror por excelência. Uma trama muito bem estruturada, costurando o argumento com segurança até o fim. A escrita fluente, nos leva com intensidade para o âmago da história. Embora não fuja do estereótipo dos contos de terror, a linguagem adotada pelo autor navega por caminhos mais suaves, limpando o grotesco típico de tais textos. É um bom trabalho, com certeza.

    • Reinaldo Estevez
      19 de outubro de 2017

      Obrigado pela leitura, Paulo Luís!

  36. Paula Giannini
    18 de outubro de 2017

    Olá, Autor(a),

    Tudo bem?

    Puxa, as coisas pegaram fogo por aqui, não foi? Por isso não costumo defender meu ponto de vista em um conto meu. Meu sangue costuma ferver também, mas respiro e penso. Se o leitor não conseguiu entender tudo o eu queria, é por que ainda preciso me aperfeiçoar. Esse negócio de desafio, por outro lado, parece mexer com os ânimos de todos. O melhor é relaxar e aprender. Mas você, claro, já sabe disso, não é?

    Bem, vamos ao conto.

    É engraçado como certas narrativas mexem conosco. Vivo repetindo que literatura é música. Algumas nos tocam a alma, outras no fazem dançar. Neste texto a coisa ficou bem mais para a ideia da alma. Uma fluência na construção do texto que me levou a lugares outros que não apenas os da história em si. Muito bom.

    Arte, na minha opinião, não e feita apenas para ser entendida. Fazer-se entender é bom, mas é fácil, algo que se aprende. Já fazer-se sentir, é um dom.

    Seu conto tem início na floresta, metáfora perfeita para o estar perdido. Na floresta os caminhos se misturam, se enevoam e os que por ali se perdem, têm, muitas vezes, a sensação de estar andando em círculos. Sensação esta, aliás, que você transmite em seu texto com grande engenhosidade. Aqui vemos o pai em busca do filho e já nos primeiros diálogos nos deparamos com a questão:

    ““Há quanto tempo foi isso?”, indagou ela, cruzando os braços. – Há quanto tempo foi isso?”, uma voz interna do personagem parece se questionar. Ele não sabe.

    O personagem não sabe se sonha, se é prisioneiro da própria memória, se é vítima de alguma maldição, se boia no limbo entre o inferno e o nosso mundo. Enfim, ele não sabe de nada, do mesmo modo que o leitor. E é aí que está a riqueza desta narrativa. Somos convidados a descobrir, junto ao protagonista. Desse modo, a empatia do leitor com esse pai em busca do filho perdido é quase que imediata. Somos conduzidos por esses caminhos, por essa busca, pelo sentimento de culpa que enlouquece o homem, pelo medo terrível de jamais voltar a ver o ser amado. Talvez ao poupar o filho o homem tenha sido condenado a vagar em busca dele para o resto de sua vida. Talvez… “Há quanto tempo foi isso?”. Talvez nenhuma daquelas pessoas esteja mais lá. Talvez o véu do esquecimento seja uma benção.

    Inúmeras explicações racionais seriam possíveis. Mais que um final aberto, a obra é toda construída desse modo, levando o leitor a pensar, a questionar, a dar voltas na floresta. Assim a partir de uma premissa simples: até onde você iria para obter o poder que deseja? O(a) autor(a), nos brinda com uma viagem onírica ou, melhor que isso, envolta em uma espécie de véu do esquecimento.

    Não sei se você já assistiu (se não o fez, recomendo) “O céu que nos protege” – filme de 1990. A história não tem relação com a sua, mas o clima sim. Na trama, uma mulher recorda uma viagem que fez com o marido à África e, lá, o marido morre. O filme gira em torno das memórias dessa mulher, que surgem aos fragmentos, confusas, fazendo-a sempre voltar ao ponto de partida. Como em seu conto.

    Parabéns.

    Desejo-lhe sorte no desafio.

    E pode me chamar de avó. 😉

    Beijos
    Paula Giannini

    • Reinaldo Estevez
      18 de outubro de 2017

      O que dizer quando alguém entendeu TUDO o que você quis passar? Obrigado, obrigado, obrigado, Paula Giannini. E obrigado ainda mais pelo bom humor. Adoro! 😀

  37. Ana Maria Monteiro
    17 de outubro de 2017

    Olá, Reinaldo. Por força de tantos comentários, saltei a ordem e li o seu conto, por sinal bastante bom, antes de outros que ainda me faltam para a ele chegar.
    Então vou pedir-lhe que não me dê nome nenhum, Ok? Nem tia, nem titia, nem seja o que for. Sou Ana Maria, pode usar, mais que isso, não.
    E também falarei muito pouco sobre o que li e, como já referi, gostei. No geral está bem escrito, bem ambientado, coerente e encaixa perfeitamente no tema.
    Um único apontamento que ainda não lhe foi feito e considero pertinente:onde você usou a palavra “constrição”, penso que queria dizer “contrição”. Outros pequenos detalhes já foram apontados e não tenho nada a dizer.
    Parabéns e boa sorte no desafio.

    • Reinaldo Estevez
      17 de outubro de 2017

      Obrigado, Ana Maria. Boa sorte para você também.

  38. Fabio Baptista
    16 de outubro de 2017

    Bom, dada a polêmica gerada nos comentários, acabei lendo o conto e pulei a sequência que vinha fazendo. Então, enquanto o conto ainda está na memória, vamos lá:

    A parte técnica é realmente muito boa, pouco tenho a acrescentar aqui. Acredito que tenha sido uma das melhores ambientações do desafio, embora algumas descrições mais demoradas tenham me soado desnecessárias – algumas funcionaram, como a da casa, por exemplo, com a fileira de janelas emitindo luzes amarelas quase alaranjadas. Outras, principalmente das pessoas e os traços físicos de seus rostos, me soaram muito genéricas (nariz adunco, rosto encovado…) e não serviram para que eu fizesse uma imagem mental única para cada personagem.

    Mas, repito, a ambientação é ótima e com isso me refiro ao clima criado pelo conto, à aura negativa e pesada que ele emana.

    – parecia aberta, mas era de todo modo, protegida por uma tela
    >>> tiraria essa última vírgula, o acrescentaria uma após “era”

    – o homem seguiu e velho e a mulher
    >>> o velho

    – Ursula
    >>> ora aparece com o agudo, ora sem

    – enquanto era engolido pelas sombras e pelo tamborilar da água que dimanavam pelo vidro opaco
    >>> dimanar = pausa para o dicionário
    >>> pelo sinônimo, entendo que diga respeito apenas à água e não às sombras. Então, se for isso mesmo, há um erro de concordância.

    – devolvia o quarto à escuridão
    – como árvores de uma floresta açoitada por ventos indecisos
    >>> construções muito boas!

    A trama é do tipo que vai revelando aos poucos e no final deixa margem razoável para interpretação do leitor. Foi impossível não lembrar do excelente “Mãe!”, tanto pela casa isolada, os eventos tétricos que começam a acontecer dentro dessa casa e, também, pelo loop eterno a que o protagonista parece estar submetido. É uma trama simples, mas bem construída, embora acredite que alguns trechos poderiam ter ficado mais claros.

    A minha compreensão foi a seguinte: o cara participava de uma seita satânica. Matou um bebê aleatório (essa parte ficou bem obscura para mim, não consegui concluir com certeza se de fato era ele) e, depois, quando foi a vez de sacrificar o próprio filho, acabou mijando pra trás. Então foi punido pelos outros integrantes da seita e acabou no inferno, onde passa todos os dias num tipo de “feitiço do tempo” diabólico.

    O inferno é a repetição.

    Abraço!

    • Reinaldo Estevez
      16 de outubro de 2017

      Eu… Não vou falar nada. Obrigado, tio Fábio!!! Aqui é São Paulo, meu!!!

  39. Fabio Baptista
    16 de outubro de 2017

    Senhores,

    Os comentários aqui não estão tomando um rumo condizente com a boa convivência que esperamos no certame.

    Antes que descambe para algo pior, peço que parem com esse bate boca que não vai levar a nada, por favor.

    Obrigado.

  40. Eduardo Selga
    16 de outubro de 2017

    Está querendo sair de fininho, fazer de conta que está tudo bem? Não é a palavra em si, é o conteúdo de sua resposta ao comentário que fiz em seu conto, e você sabe bem disso. Por que a tentativa de me ridicularizar? Se fossem apenas elogios você faria isso? Ou não se pode encontrar falhas em sua bela obra? Você postou seu texto aqui para ser analisado, e análise pode ser positiva ou negativa para o autor, ou até mesmo neutra. Não analisei a sua pessoa, mesmo porque é informação indiferente. Não foi, na análise, um ataque pessoal. Agora, com a sua atitude, a coisa muda de figura. Cresça e apareça, menino.

  41. Eduardo Selga
    16 de outubro de 2017

    Sua contra-argumentação: “Pois é… Eu podia dizer o mesmo em relação a você. Daí o cachorro, a corrida, o rabo, o cachorro… Entendeu? Não? Ah, deixa pra lá”.

    Uma bela resposta, sem dúvida. Parabéns por sua capacidade de argumentação, quase tão boa quanto criar metáforas de curto espectro.

    • Reinaldo Estevez
      16 de outubro de 2017

      Dudu… Tenha calma (passando a mão no ombro). Não precisa ficar nervoso. Estamos aqui para aprender, não é verdade? Você não gostou da metáfora. Nem daquela do costurado, e nem desta do cachorro. Tudo bem. Talvez outras pessoas gostem, sei lá… Tipo a tia Regina ou a tiazinha Cláudia, ou o Ollie… Desculpa aí se eu te ofendi de alguma maneira. Não vamos brigar por causa disso. Toca aqui o/

      • Eduardo Selga
        16 de outubro de 2017

        Estou reagindo aos seus insultos, garoto. Vá ao início da discussão e veja quem agrediu primeiro. Eu não vou ficar quieto diante disso, a menos que a moderação exclua minhas respostas. E sim, vamos brigar por causa disso, o que é bom para você, afinal já deu para ver o quanto gosta de um espetáculo. Claro: na falta de um texto que brilhe o bastante…

      • Reinaldo Estevez
        16 de outubro de 2017

        Sério que foi porque eu chamei você de “tio”? Ah, para com isso! Foi só uma brincadeira (apertão na bochecha). Você também não deixou por menos, né? Aí, indiretinha aqui, indiretinha ali… Começa de novo o cachorro, a corrida, o rabo… De novo vou dizer: desculpa se te ofendi de alguma maneira, ok? De repente acabei exagerando, né? Sorry. Vida que segue. Paz e Bem.

  42. angst447
    16 de outubro de 2017

    T (tema) – O conto está dentro do tema proposto pelo desafio.

    E (estilo) – Linguagem clara, imagens bem construídas ou bem alinhavadas (costuradas, mas não paralisadas). me fez lembrar de uma passagem bíblica – Abrahão sacrificaria o filho Izaque como um cordeiro de Deus.

    R (revisão) – Se erros passaram não percebi, a não ser a incerteza da idade do menino . Sete ou oito anos?

    R (ritmo) – Ponto alto do conto, a fluidez da narrativa. Os diálogos abundantes facilitam e muito a leitura. Ritmo de corrida pela floresta.

    O (óbvio ou não) – Não chega a ser um terror óbvio. Logo percebemos que há algo de estranho no desaparecimento do menino, mas nada já previsível. O nome do menino – Emanuel – significa “Deus (está) conosco”, que vem a ser o título do conto.

    R (restou) – Esperança de que pai e filho acabem se encontrando. Gratidão por ter poupado (ou é ilusão minha?) a criancinha. Certeza de que o autor gosta do que escreve e faz isso muito bem. Dúvida: vai me chamar de tia? Nada contra, nada contra…

    Boa sorte!

    • Reinaldo Estevez
      16 de outubro de 2017

      Como gostei do seu comentário vou chamar de Tiazinha 😉

  43. Eduardo Selga
    16 de outubro de 2017

    Reinaldo Estevez,

    Para entender o que é uma metáfora, é preciso conhecer o sentido denotativo da palavra. É óbvio que a palavra se presta a obliquidades, por isso existe a figura de linguagem. Mas a metáfora só é eficiente se o sentido denotativo estiver lá, na frase, para ser eficientemente distorcido. Entendeu? A metáfora não elimina o denotativo, apenas anula o seu efeito na frase. Seu eu digo que “os olhos de Maria são estrelas”, “estrelas” está ocultando o sentido denotativo expresso pelo significante “brilhantes” ou “luminosos”, mas eu só sei disso porque o sentido denotativo não desapareceu completamente. Tudo bem até aqui?

    Denotativamente, as palavras pertencem a campos semânticos precisos. Se eu quero dizer “pedra” e escrevo “pedregulho”, definitivamente eu não disse a mesma coisa, por mais que eu insista e tente explicar.

    Façamos uma visualização mental, dentro de uma explicação lógico-corporal..

    O seu narrador diz que o personagem “Jogou o corpo para os lados […]”. “Corpo” é o quê, no caso de uma pessoa? (outra vez a semântica) É um todo que inclui cabeça, tronco e membros, não apenas pescoço, ombros, quadril e outras partes. Se o narrador diz “corpo” ele está dizendo que o personagem moveu-se completamente para os lados. Ah, mas não era isso que você queria dizer… Então, fosse específico, fosse claro. Eu, enquanto leitor, não sou obrigado a entrar em sua cabeça e adivinhar o que você queria dizer. Palavras estão aí para isso: para dizer.

    • Reinaldo Estevez
      16 de outubro de 2017

      Tio Dudu, chegamos naquele ponto em que o cachorro corre atrás do próprio rabo. De um lado, o “você me diz que seus pais não entendem, mas você não entende seus pais”; do outro o “eu quis dizer, você não quis escutar”. Metáforas são assim mesmo. Às vezes funcionam para uns e não para outros. Como diz um amigo nosso aí: Paz e Bem.

      • Eduardo Selga
        16 de outubro de 2017

        Dizer que chegamos no ponto em que o cachorro corre atrás do próprio rabo mostra que você não entendeu absolutamente nada. Ou não quis. Mas é assim mesmo. Às vezes funciona com uns e não com outros.

      • Reinaldo Estevez
        16 de outubro de 2017

        Pois é… Eu podia dizer o mesmo em relação a você. Daí o cachorro, a corrida, o rabo, o cachorro… Entendeu? Não? Ah, deixa pra lá.

  44. Eduardo Selga
    15 de outubro de 2017

    Sacrifício ao Demônio e sonho: dois lugares-comuns que foram usados sem maiores fugas ao clichê. Se tivesse ocorrido um tratamento de algum modo inovador teria sido importante, pois se destacaria num universo de iguais. E quando digo “inovar” não se trata de fazer piruetas que tornem o texto inverossímil dentro do gênero ao qual pretende estar incluso, e sim manipular o conhecido de maneira inusual, a exemplo do conto “Nós”, concorrente neste Desafio.

    Há algumas cenas fortes, que mereciam ser melhor trabalhadas, como a representada por este trecho: “Em seguida, trespassou a lâmina pela garganta da criança. Os homens e as mulheres presentes ergueram as mãos para o alto, em êxtase, repetindo a conjuração, agradecendo a sorte de estarem ali, naquele momento, insensíveis aos engasgos e aos estertores da criança”. A crueza narrativa funciona bem, e seria bom explorar mais essa vertente.

    Por outro lado, há cenas frágeis, como esta: “Jogou o corpo para os lados, mas era como impossível se levantar. Podia jurar que seus braços e pernas estavam costurados ao colchão, a pele perpassada por linhas e agulhas, repuxada e por isso incapaz de ceder”. Se o personagem se sente costurado à cama, como ele se move para o lado? Ele não consegue se levantar, ok, mas a comparação com sentir-se costurado é estranha, pois ele se mexe.

    A criança tem sete ou oito anos? Primeiro, o personagem diz: “Tem sete anos, mas parece mais novo”; depois, “Ele se chama Emanuel, tem oito anos…”.

    Logo no início temos “Em Sentia-se cansADO, os olhos pesADOs, como que salpicADO por minúsculos grãos de areia”, um excesso de ADO que incomoda a leitura.

    Em “‘Por que não está dormindo’, perguntou o velho […]” faltou um PONTO DE INTERROGAÇÃO após a palavra DORMINDO.

    • Reinaldo Estevez
      15 de outubro de 2017

      Sonho? Meu Deus… Mais um que acha que é sonho? Acho que vou ter que escrever esse conto de novo… Não, melhor: leia o comentário do Olisomar, aí em baixo. Numa dessas as coisas ficam mais claras. Que bom que gostou da cena do bebê; mas que droga que não entendeu que alguém pode estar amarrado e ainda assim se mexer… Amarrado, costurado… não é paralisado! Faz um teste aí, tio!

      • Eduardo Selga
        15 de outubro de 2017

        Calma, sobrinho.

        Cuidado com as palavras, você está escrevendo um texto de ficção que pretende passar certas informações ao leitor. Por isso, a escolha das palavas adequadas é muito importante, porque existe uma coisa chamada campo semântico. Cada palavra remete a um sentido exato. Então, é preciso cuidado para não pensar uma coisa e escrever outra. Por que será que mais de um interpretou como sonho? Palavras mal escolhidas. Você mira no que vê e acerta no que não vê.

        É possível alguém mover-se amarrado, é lógico. Mas o narrador criado por você, faz comparação com estar costurado, o que sugere, sim, imobilidade.

        Não foi isso o que você quis dizer? Então eu lamento, pois foi isso o que você disse.

        Se refizer o texto, opte por outra metáfora ou mesmo a elimine. Escreva uma, duas, quantas vezes forem necessária para a informação sair de sua cabeça e entrar no texto. Faz um teste aí, sobrinho…

      • Reinaldo Estevez
        16 de outubro de 2017

        Vamos repetir. Vamos lá, juntinhos:

        “Jogou o corpo para os lados, mas era como impossível se levantar. Podia jurar que seus braços e pernas estavam costurados ao colchão, a pele perpassada por linhas e agulhas, repuxada e por isso incapaz de ceder.”

        Façamos um experimento mental:

        Imagine que você está deitado de barriga para cima, os braços paralelos ao corpo. Imagine que linhas perpassam sua pele, costurando seus braços e pernas ao colchão.

        Pergunto: você consegue mover, digamos, o pescoço, a cabeça, os ombros, o quadril? Me parece que sim, né, já que só (vamos repetir) braços e pernas parecem costurados. Se só (de novo) braços e pernas estão costurados, é meio óbvio que o resto do seu corpo pode se mover, permitindo o balanço para os lados. Então…

        Depois dessa explicação lógico-corporal, vou discordar de outra coisa que você disse: que cada palavra remete a um sentido exato. Não. Cada palavra pode remeter a diversos sentidos. O nome disso é metáfora. Às vezes o leitor entende, às vezes não. Às vezes tem bagagem suficiente para captar o sentido diverso do usual; às vezes tem preguiça de buscá-lo. Fazer o quê? É um risco…

        Por fim, o lance dos sonhos. A interpretação é possível, mas só para quem leu o conto no estilo Usain Bolt. Alguém já disse que depois que a gente escreve a história, deixa de ser dono dela, já que o leitor pode ler e interpretar da maneira que quiser. Pode até ser verdade, mas todo autor escreve com a esperança de que pelo menos o basicão vai ser entendido, especialmente se a leitura for minimamente atenta, né? Pena que nem sempre acontece 😦

        Mas entre tios e sobrinhos a vida segue. Experimentando novas realidades ou não.

      • Olisomar Pires
        16 de outubro de 2017

        Apenas para contribuir sem o desejo de polemizar:

        O personagem jogou o “corpo” na intenção de se libertar daquilo que o prendia como se deduz do trecho anterior a este em debate: ” Tentou se levantar, mas algo o prendia à cama. Retesou braços e pernas, mas via-se imobilizado.”

        OU seja, a tentativa é de sair das amarras, reais ou imaginárias, logo, joga-se o corpo para rompê-las. É óbvio que as partes do corpo que estejam bem fixas em uma superfície bastante imóvel não se mexerão, mas houve a intenção do corpo todo e é claro que outras partes não aprisionadas terão movimento, mesmo que inúteis.

        Numa outra visão é possível entender que o “jogar o corpo para os lados” não significa propriamente um movimento exitoso, mas a simples vontade consciente do ato para se ver livre. Podemos aceitar, enquanto leitores, o termo em discussão como “debateu-se” e nesse “debater-se” o corpo é jogado para os lados, pra cima, pra baixo em frenesi.

        Só isso mesmo.

      • Reinaldo Estevez
        16 de outubro de 2017

        Tô falando… Ollie! Foi vc quem escreveu este conto!

  45. Regina Ruth Rincon Caires
    15 de outubro de 2017

    Conto muito bem escrito, fluente, mistura perfeita de sonhos e realidade. Contado ao inverso, como outros contos do desafio que foram feitos com a mesma técnica. Gosto muito.

    Confesso que desviei de galhos (devo ter arranhões pelo corpo), que sorvi o chá fumegante, que meu corpo cansado deitou naquela cama, que ouvi a chuva, que a vi escorrer pela vidraça. E, menino, como desconfiei das filhas do homem grande!!! Estou até com dor no corpo de tanto que sofri com o pai na busca do filho. E como torci!

    História envolvente, o leitor fica preso, “costurado” pelas palavras. Enredo muito bem construído, tramado, fundamentado. Não vi deslizes de linguagem, apenas de digitação. Traz um terror incomodativo, traz muito sofrimento, agonia. A leitura não é prazerosa, é sofrida, mas é valiosa.

    Parabéns, Reinaldo Estevez!

    Boa sorte no desafio!

    • Reinaldo Estevez
      15 de outubro de 2017

      Obrigado, dona Regina! Boa sorte para a senhora também!

  46. Olisomar Pires
    15 de outubro de 2017

    Impacto sobre o eu-leitor: alto.

    Narrativa/enredo: pai envolvido em seita matou ou intentou matar o próprio filho em sacrifício satânico ou algo que o valha e depois enlouqueceu ou foi punido.

    Escrita: boa, alguns pequenos errinhos que podem ser corrigidos numa revisão, poucos.

    Construção: o texto é bem estruturado no sentido de dar angústia à procura do pai. O autor adotou a atmosfera onírica, sendo que esta possui vantagens e desvantagens. Ela cria as névoas necessárias para o Terror, entretanto tornam opacos os personagens que interagem, não sendo possível atribuir-lhes papéis precisos.

    No final o pai acorda e está numa floresta, talvez no início de sua busca, logo após ter se recusado a matar seu filho, talvez esteja morto e já no inferno, quem sabe.

    Um texto com alta carga de tensão e angústia.

    A técnica de criar empatia com a suposta vítima-criança ilustrando desejos infantis como sorvete ou apego ao pai é bastante eficiente e, salvo engano, é bastante corriqueira nos desafios. A inocência do amor filial traduzida em gestos corriqueiros fazendo um contraponto à maldade que cerca o ambiente foi bem conduzida.

    Um bom conto, bastante aberto, mas de todo modo, causador de apreensão.

    • Reinaldo Estevez
      15 de outubro de 2017

      Ollie, amigo! Você captou TUDO o que eu quis dizer. Obrigado, obrigado! Ei, se alguém tem dúvidas sobre o que é o conto, é só ler esse comentário do Olisomar! Ele entendeu tanto, mas tanto, que talvez seja ele mesmo o autor! Obrigado pela luz!

  47. Angelo Rodrigues
    14 de outubro de 2017

    Caro, Reinaldo Estevez,

    seu conto passa pela saga de um pai que procura um filho, envolve-se com diversas pessoas, um culto, e se descobre, possivelmente, algoz de seu próprio filho. Ao final, descobre-se em um sonho.
    Nada houve de fato, salvo o sonho. A busca deve continuar, onde busca seu filho/ele próprio?
    Não percebi nenhum grande desacordo gramatical ou de construção frasal que atrapalhasse a leitura. Alguns ajustes deveriam ser feitos. Um deles, o filho que tem sete anos, logo em seguida tem oito.
    Infelizmente, depois da leitura de mais de trinta contos. Percebo que é difícil sair de alguns clichês na construção de personagens. Isso não é legal e a alternativa é a leitura seguida de mais leitura, arejamento. Seu texto, embora escape das gargalhadas, humanas ou fantasmais, tropeça nos narizes aduncos, nos rostos encovados, na miríade de rugas no rosto. Esses adereços parecem colar ao conto alguma verossimilhança ao arquétipo do segmento terror, mas não, acabam só povoando o texto.

    A ideia do pai que procura não é nova. É explorada até hoje com grande sucesso (Liam Neeson que o diga, com seu Taken 1, 2 e 3). Acho que voltar ao conto seria legal, ajustando, amarrando.

    Boa sorte e obrigado por nos deixar conhecer seu conto.

    • Reinaldo Estevez
      14 de outubro de 2017

      Olá, Angelo Rodrigues,

      Interessante essa sua interpretação. Sonho? Não tinha pensado nisso, mas de repente, pode ser né? Ou será que o personagem principal teve uma visão do passado? Ou será que você leu contos demais num mesmo dia e estava um pouco cansado para captar os detalhes? Não importa… Legal ver o seu comentário aqui, ainda que se resuma a falar de clichês…O gênero é terror, então acho meio difícil ambientar a história na cabeça do Bob Esponja com aqueles arco-íris, solzinho, nuvens e unicórnios pulando, enquanto ele e o Patrick se empanturram de algodão doce huhauhauah (ops, desculpe a risada – mais um clichê – é que incorporei o personagem). Boa sorte para você também!

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Informação

Publicado às 13 de outubro de 2017 por em Terror e marcado .