EntreContos

Detox Literário.

A Praia (Kelly Hatanaka, Silvio Vinhal e Claudia Roberta Angst)

Tic.

A praia é legal. Eu gosto da praia. Na praia tem sorvete. Papai e mamãe gostam da praia. Todos os anos nós vamos à praia. Eu me perdi na praia. Quando encontrei o nosso guarda-sol, mamãe estava chorando. Eu nunca fui encontrada.

Tac.

As ondas seguem seu padrão hipnótico e eu perco noção das horas. As pessoas passam, seguindo também um padrão, mas que só eu pareço notar. Elas são todas iguais, as pessoas. Você conhece uma e sabe de todas.

Tic

A mulher gorda de maiô preto que teoricamente emagrece persegue para lá e para cá um menininho ranhento. Ela é igualzinha ao homem barrigudo com tatuagem tribal no bíceps flácido que está olhando para a mocinha tonta que joga frescobol com outra mocinha tonta. E eu, a mulher velha, de seios ressequidos, sou igualzinha a cada grão de areia e cada gota de água.

Tac.

Ela está me dando mole. É a terceira vez que ela perde a bola, que vem em minha direção. Ela ri. A amiga dela ri. Os jovens estão sempre rindo. Eu, seminovo, um jovem redivivo, rio também, enquanto passo a mão na minha tribal que significa força e honra. Sinto me uma potência da natureza. Uma potência da natureza que precisa tomar anti-inflamatório por mais cinco dias. Mas valeu a pena. Força e honra.

Tic.

Mamãe enxugou as lágrimas e, tão feliz em me ver, nem me deu bronca. Papai saiu para me procurar e voltou cansado e bravo. Titia prometeu que não me perderia de vista nunca mais. E eu, esperando ser encontrada, sentei na toalha sob os olhos de titia e pedi um sorvete.

Tac.

— Dá pra tomar mais cuidado? — grito.

Enzo chora, berra, metade fúria, metade indignação. Esfrega a mão na cabeça como a apagar o contato com a bola de frescobol, enquanto uma mocinha pede desculpas protocolares e a outra ri. Ri de quê? Parece boba. Garota sonsa. Limpo o nariz de Enzo com o restinho de papel higiênico, ajeito o maiô que insiste em invadir reentrâncias e me arrependo de não ter passado Hipoglós entre as coxas.

Tic.

Patético. O barrigudo da tribal vai até a mocinha tonta que ri, parecendo preocupado de verdade que ela esteja em choque por ter acertado uma bolada na cabeça do menino ranhento e ter tido um ataque de riso. Vou juntar-me à água e ao sal e torcer para que eu me sinta em casa.

Tac.

Tomo meu sorvete enquanto vejo uma mulher velha entrar na água. Papai e mamãe e titia ainda não decidiram de quem é a culpa por eu ter me perdido. Eu vejo a mulher velha que entra na água encontrar o homem que ela procura. Ela também se perde. Ela também nunca será encontrada. Como eu.

Tic.

— Eunice.

Olho para ele e sinto o frenesi de ter meu nome escapando por seus lábios como um fluído corporal de origem obscura. Meu nome soa indecente. Nome de freira, de tia solteirona, de velha com seios ressequidos. Indecente, só por passar por entre seus lábios. Tento responder, mas não consigo. É tarde demais. Estou virando água, me desfazendo na areia, voltando ao que eu era.

Tac.

A mulher gorda de maiô preto que teoricamente emagrece gostava da praia quando era criança e usava um biquini amarelo de crochê que a avó tinha feito para ela. Talvez o problema seja o maiô preto. Pena que o biquini amarelo de crochê que a avó fez para ela se perdeu. Mais um que nunca foi encontrado.

Tic.

— Da hora! Maneiro! — Disse o barrigudo que tem tribal no bíceps flácido, acreditando estar se comunicando fluentemente no dialeto juvenil.

Menina tonta 1 e menina tonta 2 riem e ele sente que se dará bem esta noite, entre duas jovens risonhas sereias enfeitiçadas pela força e honra que emprestam vigor e rigidez ao seu bíceps.

Tac.

Sou água e sal. Meus seios ressequidos não existem mais. Sobrou só a indecência de meu nome escorrendo por seus lábios.

Tic.

Um pouco do sorvete escorre e suja meu biquini amarelo de crochê. Titia tenta limpar. Mamãe ralha. Diz que a mancha nunca vai sair. Eu digo que vovó vai fazer outra. Mamãe e titia se entreolham e choram. Vovó se foi. Como eu, nunca foi encontrada.

Tic.

Perco a noção das horas. A mancha cresceu e tapou o sol. Fiquei imaginando, quase desejando que um tsunâmi chegasse agora e engolisse aquela praia. Não faria falta alguma. Ninguém faria falta. Elas são todas iguais, as pessoas. Você conhece uma e conhece todas.

Tic.

Vertigem. Olho para o futuro como se fosse o meu passado. O tempo vem e vai, em ondas, ainda que o relógio pareça estar quebrado. O salva-vidas chegou tarde, mergulhou até perder o fôlego, mas não encontrou meu corpo. Não era uma figura de linguagem apenas. Eu me dissolvi naquela água, naquela areia. Agulha no palheiro, jamais alguém me encontraria.

. . .

Depois do ocorrido, nunca mais me encontrei, nunca mais fui encontrada. O homem me ofereceu um sorvete. Mamãe disse para não falar com estranhos, mas ele não era um estranho, eu o vi a manhã inteira sob o guarda-sol do lado, olhando para as meninas que jogavam frescobol. Eu o reconheci pela tatuagem.

Aquela mancha, nunca mais ia sair da frente do sol. Ele perguntou meu nome, e o meu nome soava estranho na boca dele, como se fosse uma coisa ruim e feia, uma barata morta, uma gosma de lesma, uma meleca, uma língua de sapo nojenta. Nunca mais gostei do meu nome. Nunca mais gostei de praia, nem de sorvete, nem das pessoas, apenas disfarço, não gosto de chamar a atenção.

Nunca fui feliz. Até tentei, conheci um homem bom, me deixei casar, tive o Enzo com ele, mas depois ele se perdeu também – ou se achou, quem sabe? Descobriu que gostava era de homem e me deixou sozinha com o recém-nascido. Nunca me queixei da vida, fiz o melhor que pude. Somatizei tudo em banha, que tento disfarçar nesse maiô preto que, teoricamente, emagrece.  Corro atrás do Enzo, esse menino ranhento que eu crio mal e porcamente, porque tenho um vazio tão grande dentro de mim, que olho através do tempo e só vejo o túnel escuro onde quero me enfiar.

Enzo grita, esperneia, irritadiço e sensível demais. Teria puxado o pai? Só o tempo dirá. Sempre Ele. Melhor do que se metamorfosear nessa figura ridícula do guarda-sol ao lado. Tenho asco só de olhar aquela tatuagem… É como se uma vertigem me atingisse em ondas e me lembrasse quem realmente sou.

Minha irmã está morta, por certo, mais feliz que eu. Bons tempos aqueles em que jogávamos frescobol na praia, parece que foi ontem, ou teria sido hoje? O tempo vai e vem em ondas, às vezes, sinto-me mais perdida do que realmente sou.

A bola de frescobol passou pelo Enzo e foi parar aos pés do barrigudo da tribal. Enzo corre atrás e para, afoito e agitado, na frente dele, como se tivesse se chocado com uma parede. O homem olha fixo nos olhos de Enzo, de um jeito que não gosto, e entrega a bola.

— Ennnnnzo! Volta aqui, moleque! — grito.

Tic

O tempo vai e volta, me confunde. Não me encontro e ninguém me encontra. Minha avó, também, nunca foi encontrada.

Tac

As ondas seguem seu padrão hipnótico e eu perco a noção das horas. As pessoas passam, seguindo também um padrão, mas que só eu pareço notar. Elas são todas iguais, as pessoas. Você conhece uma e sabe de todas.

Tic

Não sou mais criança. Deixei de ser quando não me encontraram. Restou pouco: a mancha de sorvete, a nódoa da nuvem sobre a areia, a sombra de tudo que eu não pude ser.

Tac

Sou velha porque ele me fez assim, seca, desnutrida da minha infância. Apartada dos risos e das brincadeiras que me esperavam. Nunca mais fui encontrada. 

Tic

Ninguém percebe que desapareci. Por que as pessoas são assim? São todas iguais. Você conhece uma e sabe de todas. 

Tac

Ninguém mais soube de mim.

Tic

Vejo aquela garotinha sentada na toalha e sinto medo. Por ela, por mim e por Enzo. O maiô preto cai melhor do que o biquini amarelo. Tudo é triste mesmo sob o sol inclemente.

Tac

As garotas ficam rindo, brincando e se exibindo. Ele não liga para elas, mas finge que sim. É o que se espera de alguém como ele.

Tic

Sou velha e enxergo o mundo. O imundo, também. Aquele sujeito se acha o tal. Patético, o barrigudo do frescobol. Só eu conheço o avesso do seu sorriso. Disse meu nome, salgando cada sílaba. Eu nunca mais quis ser Eunice.

Tac

Sinto pena do pai que chega cansado de tanto me procurar, daquela mãe que sorri achando que me encontrou. E até me comovo com a tia, preocupada em não me deixar escapar. Como não enxergam que aquela não sou mais eu? O corpo resgatado continuará crescendo. Mas a menina que gosta de sorvete nunca mais será encontrada. 

Tic

As mãos daquele homem fazem a criança se perder. Enquanto ele finge me encontrar, eu desapareço. Meu nome se desfaz no mar, seco antes mesmo de florescer. Torno-me velha, ressequida, sem futuro.

Tac

As mãos pegam o que eu ainda nem sei que me pertence.

Tic

Invento esta história porque há um corpo que precisa continuar se desgastando. Até chegar a hora de sumir, e meus ossos ressequidos virarem areia no fundo do mar.

Tac

Sozinha, espero. Pelo final que talvez seja também um começo. Meu pai, minha mãe e minha tia há muito já se foram. Eu? Nunca mais me encontrei, nem mesmo nas fotos do álbum de família. Como minha avó, deixei de existir.

Tic

Ouço o barulho do tempo, do relógio incapaz de me despertar. Em poucos minutos, aquelas mãos me fazem velha. Vou me desfazendo em água e sal. Sou conduzida de volta ao guarda-sol, já não tão colorido. São só pedaços de sombras costuradas.

Tac

Alguém percebe a mudança em meu comportamento. Não há de ser nada, diz meu pai. É só uma fase, diz minha mãe. A tia, sorri concordando, mas sabe de alguma coisa que preferia não saber. Sou uma estranha, mas as pessoas são todas iguais: só veem o que querem ver.

Tic

Revejo cortes do que vivi. Tudo foi tão rápido que ninguém notou. Nos sonhos, o homem da tatuagem acaba preso, torturado e morto. Seria justo, mas é só mais um faz de conta. 

Tac

Espero ansiosa pela notícia: o monstro capturado. Envelhece mal, com a tatuagem desbotando no bíceps cada vez mais flácido. Ninguém se lembra direito dele. Eu lembro, e pelo avesso. 

Tic

Ninguém perdoa esse tipo de gente. Os detentos têm seu próprio código de conduta. É só uma questão de tempo para o monstro descobrir que são de tribos diferentes.

Tac

O que é esquecido deixa de existir. Eu nunca esqueci, mas deixei de ser.

Tic

Resgato imagens de uma manhã na praia e transformo os cacos na minha história.  Sou aquela mulher gorda de maiô preto, correndo atrás de um Enzo ranhento. Roubo a cena para mim. É a vida que sempre desejei: normal, banal.  

Tac

A memória falha, o que é uma benção. Os sons já não me chegam claros aos ouvidos. Não vejo mais as moças, tão idiotas, rindo uma para outra. Nem o braço com a tatuagem. Nem a mulher gorda de maiô preto.

Tic Tac

Ninguém repara na velha, avançando lentamente pela areia.   

Tic Tac Tic

A bola atinge a cabeça de Enzo. Alguém grita e corre para o mar. Só então as moças param de rir.

Tic Tac Tic Tac

O alvoroço finda e se torna pausa. Respiração contida, silêncio. Braços fortes golpeiam o mar. A água se espalha e encobre as lembranças.

Tic…Tac…

A velha e eu, enfim, nos encontramos. Invisíveis entre as ondas, já dissolvidas em espuma.

Tiiiiiiiiii….

O salva-vidas prende o fôlego, mergulha mais fundo, procura meu corpo. Em vão. Deixei de existir.

Sobre Fabio Baptista

Avatar de Desconhecido

24 comentários em “A Praia (Kelly Hatanaka, Silvio Vinhal e Claudia Roberta Angst)

  1. Fabio D'Oliveira
    30 de setembro de 2024
    Avatar de Fabio D'Oliveira

    Buenas!

    Dessa vez farei uma avaliação mais pessoal, apontando o impacto do conto em mim.

    Aqui está um conto que me surpreendeu bastante. Achei a primeira parte intrigante, como se fossem vários recortes do dia a dia da praia, com os pensamentos intrusivos de cada personagem não nomeado. É uma abertura excelente, pois abre espaço para muitas abordagens. O segundo autor quebrou um pouco o ritmo, mas achei que serviu bem, pois o terceiro autor apareceu e amarrou tudo, entregando um final excelente. Enxergo que é um texto onde cabe várias interpretações. Gosto disso. De certa forma, no momento que você publica seu texto, seja num livro, seja na Internet, ele não é mais seu, simbolicamente falando. Ele é dos leitores, também. A forma como cada um entende o texto é algo único, belo e faz parte da arte. Expressão e comunicação.

    Gostei demais desse conto. Parabéns para todos os envolvidos!

  2. Renato Puliafico da Silva
    21 de setembro de 2024
    Avatar de Renato Puliafico da Silva

    Gostei da proposta, mas achei a narrativa um tanto confusa. Pensei que iria entender mais à frente, mas terminei do jeito que comecei. Pode ser um erro meu e perdoe minha falta de tempo para outras releituras. Espero não ser injusto.
    Gosto de textos fragmentados, pois eu mesmo não sou bom com eles. Já deixei contos para trás por não entender de onde retomar, por isso que meus contos são mais lineares.
    Parabéns aos autores, pois o estilo foi mantido e não pude perceber a troca de autores ao longo da leitura.

  3. Sílvio Vinhal
    21 de setembro de 2024
    Avatar de Sílvio Vinhal

    O texto iniciou de forma brilhante, anunciando um formato diferente, quase experimental. Com certeza foram corajosos aqueles que o continuaram, e posso afirmar que fizeram um bom trabalho.

    Adoraria saber o que o primeiro autor achou da continuidade. Seria algo assim que ele havia vislumbrado?

    Apesar de inicialmente parecer confuso, a ideia de que a história se desenvolve num looping onde os personagens se repetem – de certa forma – a partir de uma premissa do primeiro autor que diz: “As pessoas passam, seguindo também um padrão, mas que só eu pareço notar. Elas são todas iguais, as pessoas. Você conhece uma e sabe de todas.”

    A partir daí, o tempo, as ações e os personagens parecem se sobrepor e se repetir. O relógio ora bate lento, outras horas apressado, outras, ainda, perde o ritmo. 

    Não que os personagens sejam os mesmos, mas é como se fossem.  

    O resultado é uma pérola, e os três autores conseguiram manter uma lógica e coerência relativamente boa entre as partes.

    Parabéns pela participação no desafio. Desejo sorte!

  4. Givago Domingues Thimoti
    21 de setembro de 2024
    Avatar de Givago Domingues Thimoti

    A Praia
    Bom dia aos autores!
    Esse é um conto difícil de comentar (avaliar não porque nem participar estou, tô aqui só de passagem). Só menos difícil do que continuar. O primeiro autor em nada facilitou a vida de quem continuasse. Seguir com o ritmo dele era difícil, com as várias camadas narrativas acontecendo ao mesmo tempo. 
    A ideia de fragmentar as linhas narrativas em parágrafo, embora seja uma boa ideia, uma experimentação válida, eu acho que ficou pesado demais. Pesado no sentido de subverter demais, fragmentar demais a narrativa e jogar no peito do leitor a missão de interpretar e encontrar os fios da meada. Ao mesmo tempo que é interessante, para mim, tanto quanto escritor quanto como leitor, ficou um pouco demais.
    Mas é um bom conto. É interessante e instiga, pelo menos até certo ponto.

  5. Leo Jardim
    20 de setembro de 2024
    Avatar de Leo Jardim

    🗒 Resumo: se entendi bem (não li os comentários ainda), são várias linhas temporais meio que sobrepostas, acontecendo na praia. A menina que se perde e é violentada pelo homem de tatuagem que observa duas adolescentes jogando frescobol. Uma mulher com filho (Enzo, claro!) e uma idosa desaparecendo.  Todas são a mesma mulher ao longo da vida. 
    📜 Trama (⭐⭐⭐▫▫): é simples e achei um pouco repetitivo em certo ponto. Talvez a roda do tempo pudesse se quebrar e mudar um pouco. Mas gostei da forma que o conto foi proposto, dando pistas a cada tic ou tac de o que cada uma daquelas cenas significava. Só que ficou só nas mesmas cenas sempre, rodando como um relógio. 
    📝 Técnica (⭐⭐⭐⭐▫): achei muito boa. Apesar do conto não ser do tipo tradicional, foi fácil de ler e até bem prazeroso. 
    ▪ *Sinto me* uma potência da natureza (hífen)
    🧵 Coesão (⭐⭐): muito boa. Os dois autores que continuaram mantiveram a mesma pegada do que iniciou, exceto por um trecho que é mais tradicional. Parabéns ao trio, em especial ao 2 e 3.
    💡 Criatividade (⭐⭐⭐): ganha muitos pontos pela forma, mas também pela temática. 
    🎭 Impacto (⭐⭐▫▫▫): então, apesar de todos os méritos do conto descritos acima, ele não me impactou em quase nada. Os temas são pesados e emotivos, mas o formato não ajudou a me afeiçoar à(s) personagem(ns). No fim, gostei da proposta, mas não tanto do resultado.

  6. André Lima
    19 de setembro de 2024
    Avatar de André Lima

    Esse foi o conto mais complicado de avaliar. Eu tive que reler 2 vezes.
    Na terceira leitura, algo brotou em minha mente e pareço ter entendido: não se trata de mudanças de personagens dentro da mesma praia, mas sim da mudança temporal do mesmo personagem (A mulher) na infância, no tempo atual e na velhice, na mesma praia.
    Parece-me uma narrativa de experiência traumática dessa personagem, TALVEZ, e aí eu posso estar viajando demais, de abuso sexual sofrido pelo cara da tatuagem. Isso fica evidente em alguns trechos, como quando ele oferece sorvete a ela e a mãe diz para “não falar com estranhos”, depois a menina reconhece a tatuagem, depois diz que tem nojo de si e do próprio nome quando sai da boca do homem.
    Parece-me que é uma narrativa intimista que mostra 3 estágios da vida da mulher (Criança abusada, adulta com filho e refletindo sobre a vida e uma velha ressentida com o tempo perdido que desiste e talvez se mate na praia).
    Essa ideia também se evidencia nas partes em que a mulher adulta diz que ela mesma criança jamais foi encontrada novamente. Mas isso num sentido figurado, como se houvesse perdido a pureza após o abuso.
    Bom, espero que os autores possam me elucidar isso, pois eu REALMENTE quebrei a cabeça com esse conto e consegui montar uma narrativa que, infelizmente, é um esforço que não deveria ser meu, pois não fui eu um dos autores do texto.
    Achei o conto confuso, denso, pesado, mas… Ao fim da terceira leitura, o conto ganhou um brilho enorme com tudo que montei. Pode ser viagem minha, apenas, mas está aí, uma história montada após 3 leituras.
    A técnica é boa, a forma experimental é boa, mas tudo poderia ser menos complexo para dar mais brilho ainda à história…
    É um conto bom que, se pudesse ser revisado e modificado ao ponto de facilitar algumas coisas, poderia ser o melhor deste certame.
    Mas, para mim, não o é. Embora seja excelente.
    De todo modo, obrigado aos 3 autores por me proporcionarem essa viagem!

  7. Thales Soares
    19 de setembro de 2024
    Avatar de Thales Soares

    Não entendi nada deste conto, absolutamente nada. Na verdade… quando eu achava que finalmente desvendei a charada, a única coisa que eu entendia é o fato de que eu realmente não estava entendendo.
    O conto inteiro se passa numa praia, e tem várias pessoas ali. Entre as pessoas, há uma garotinha, que ao que me parece, foi abusada ali na praia. Há também o antagonista, um barrigudo com uma tatuagem tribal, que é o lazarento abusador. Há 2 gostosas jogando frescobol, e o vilão da tatuagem tribal finge estar de olho nelas, mas na verdade ele está de olho na garotinha. Há uma gorda e seu filho ranhento… mas essa gorda é a garotinha no futuro, eu acho. Há uma véia que está derretendo, e acho que essa véia é a garotinha também, só que mais no futuro ainda. E há os pais dessa garotinha.
    Enfim… as história parece lidar com algum tipo de linha do tempo distorcida, ou fragmentada, na qual eu não me senti muito acolhido enquanto lia. Há muitas partes, frases específicas, que se repetem várias vez, para dar esse impacto da linha do tempo indo e voltando (eu acho), mas eu achei um tanto cansativo esse recurso. Por sorte, o conto não é tão longo, mas de qualquer forma me senti um pouco aborrecido lendo, pois nada acontecia… eu apenas via as mesmas pessoas, fazendo as mesmas coisas, em perspectivas diferentes, e às vezes as perspectivas se repetiam, e então começava a acontecer uma salada mista, e meu cérebro começava a dar um nó!
    Compreendo perfeitamente que este é um conto experimental, de um estilo narrativo mais surrealista, e que certamente não agradará todo mundo, mas que conquistará muitas pessoas devido ao seu nível técnico elevado. Uma coisa admirável aqui é a passagem de um autor para outro, que é imperceptível. Isso indica que os três autores tomaram o mesmo alucinógeno na hora de escrever, mesmo sem combinar nada (pois não sabíamos quem era quem na hora da escrita), e eles estavam em plena sintonia, pensando de forma semelhante. Este é um conto que eu definitivamente não conseguiria pegar para continuar, e fico impressionado com a coragem dos autores que quiseram encarar o desafio de continuar esta bucha.
    Resumindo, este conto não é para mim. Admiro o nível técnico elevado, mas no geral, não me agradou em nada. Me pareceu que o objetivo deste conto não é entreter o leitor, e sim fazer um exercício criativo entre os autores. Mas de qualquer forma, parabenizo os três autores pela coragem, e por conseguirem manter essa conexão entre as três partes.

  8. Victor Viegas
    18 de setembro de 2024
    Avatar de Victor Viegas

    Olá, Frankensteiners!
    ✨ Destaque: “Somatizei tudo em banha, que tento disfarçar nesse maiô preto que, teoricamente, emagrece”
    📚 Resumo: Diversas cenas cotidianas de uma cidade no litoral sendo alternadas por barulhos de TIC e TAC. Depois temos a estória de uma mulher, que teve o Enzo, foi casada, descobriu que o marido era gay, foi largada. Em determinado momento vão à praia, onde Enzo joga a bola de frescobol. Por fim, mais TIC e TAC. Tu entendeu? Eu entendi? Os autores entenderam? Eis a questão.
    🗣️ Comentário: Sinceramente, eu acho que meu raciocínio está muito limitado. Não entendi bulhufas deste conto. Começando com a escrita difícil do primeiro autor, não pelas palavras, mas pela forma como conduziu o texto. O segundo mudou completamente a dinâmica ao colocar uma linearidade e acabar com os TICs e TACs. Confesso que ficou legalzinha, mas não tinha muito para fazer. Gostei que conseguiu colocar elementos da versão original. O terceiro autor colocou a língua para fora, apontou na nossa cara e riu da gente. “Tava difícil acompanhar os TICs e TACs? Então, bora ver tudo isso novamente, mas com um toque mais poético” E na minha terceira leitura eu me deparo tentando entender o meu próprio idioma. Não sei se esse é um elogio… preciso de mais café.
    💬Considerações finais: Os três autores demonstraram que escrevem bem, mas a linguagem inicial realmente não ajudou. Talvez tenha sido proposital. Não sei nem como referenciar este texto, talvez seja uma versão, em conto, do Ultraje a Rigor: um tanto aleatório, inteligente, mas ainda aleatório. Parabéns pelo Frankenstein! Boa sorte!

  9. vlaferrari
    18 de setembro de 2024
    Avatar de vlaferrari

    Demorei a compreender e confesso que fiz uma segunda leitura. Mas a frase do Gustavo sobre o problema do leitor: “é que a gente divaga demais enquanto lê, pensando nas continuações que nós mesmos faríamos”, é perfeita. Foi sensacional a exposição das várias fases e de toda a trama e até mesmo a quebra de estilo do segundo/a autor/autora fez bem ao resultado, na minha opinião. Poderia até se colocar um aviso, como um subtítulo entre parênteses (prepare-se para pensar no que está lendo).
    Achei um excelente conto. Coeso. Se, em uma situação hipotética, o autor/autora 1 fizesse uma revisão para publicar uma “versão final”, na minha opinião, teria pouco a “reescrever”.

  10. claudiaangst
    17 de setembro de 2024
    Avatar de claudiaangst

    Meus cumprimentos e vamos ao que interessa.

    Neste desafio, usarei o sistema ◊ TÁ FEITO ◊ para avaliação de cada conto.

    ◊ Título = A PRAIA – Traz a ideia de um dia de sol, clima de alegria.

    ◊ Amálgama = Houve uma quebra de estilo (sem os TIC TAC) na segunda parte, mas não interferiu muito na interação/coesão entre os(as) autores(as).

    ◊ Fim = Os fins justificam os meios? Talvez… E a ordem dos fatores altera o produto? Permita-me começar pelo fim, observando o impacto causado na leitura.

    O(A) terceiro(a) autor(a) retomou à sequência de TIC TAC, embora com pequena alteração para dar a ideia de aceleração e depois o apagamento do tempo e da vida.   O desfecho escolhido parece unificar as figuras femininas (menina + mulher do maiô preto + a velha) em uma só personagem, talvez fases da vida de uma única mulher, que por fim se desfaz nas águas. Não sei se está coerente com a proposta inicial do conto, mas parece que o(a) autor(a) 3 tentou emular as partes anteriores da melhor forma possível (talvez tenha sido uma missão impossível, afinal).

    ◊ Entremeio = O(A) segundo(a) autor(a) alterou o estilo narrativo, deixando de lado os TIC TACs, dando maior foco à vida de Eunice. Pareceu-me que o(a) autor(a) buscou justificar a situação apresentada como premissa do conto.

    ◊ Início = Apresenta de forma entrecortada personagens em uma praia. Parecem pessoas comuns que interagem no espaço aberto. Há a divisão das cenas em pequenos parágrafos intitulados pelo TIC TAC (que poderia ser o som de um relógio ou até mesmo de uma bomba relógio – marcando a passagem do tempo).

    ◊ Técnica e revisão = A narrativa feita tanto em primeira pessoa quanto em terceira pessoa, intercalando os narradores/personagens. Linguagem rápida, mas com um toque poético, metáforas abundantes.

    Não percebi falhas importantes no quesito revisão. A narração feita pela criança é mais simples e com vocabulário menor, o que a torna coerente.

    ◊ O que ficou = Talvez a mesma impressão que o Thales terá: nadei, nadei e acabei na praia. Não entendi muito bem o que aconteceu aos personagens, e quantos eram, afinal. Alguém me explica?

    Parabéns pela participação e boa sorte!

  11. Luis Guilherme Banzi Florido
    17 de setembro de 2024
    Avatar de Luis Guilherme Banzi Florido

    Olá, autores! Tudo bem? Primeiramente, parabéns pela participação num desafio tão dificil e maluco quanto esse!

    Início: esse conto é bem difícil de comentar, especialmente dividindo meu comentário em 3 partes, como eu tenho feito. O que posso dizer sobre a parte 1 é que soa muito poética e interssante, e a estrutura em tic tac funcionou muito bem pra dar ritmo e ditar os cortes entre diferentes linhas temporais. De alguma forma, sinto que se não fosse o tic tac, esse conto (pelo menos me referindo ao início) jamais funcionaria. Muito interessante! Por outro lado, parece que você deixou um abacaxi gigante nas mãos do próximo autor. Se eu tivesse que continuar esse conto, eu me jogaria no mar. Hahahaha

    Meio: o meio destoa bastante estrututalmente da parte inicial, como se o autor tivesse decidido sair do padrão de tic tac para desenvolver de forma mais fluida o enredo. Não estou reclamando disso, só constatando. As coisas aqui começam a ficar um pouco mais claras, o que foi bem vindo para mim, pois, apesar de ter funcionado bem na parte 1, caso o conto seguisse ao longo das 4500 palavras de forma tão subjetiva, seria difícil se manter conectado ao conto. Em algum momento entre a parte 2 e 3 a informação chave do conto, que dá cola ao todo, aparece: o abuso que a menina sofreu do nojento da tatuagem. Isso explica tudo muito bem.

    Fim: a parte três retoma o ritmo de tic tac e conduz o restante do enredo. Em algum momento, no entanto, tudo fica muito explicado e explícito. Eu imagino que, dada a confusão narrativa caracterísitca do conto, o autor 3 tenha tido medo que o leitor não entendesse que a menina foi abusada, e começa a expor isso explicitamente, inclusive falando de prisão e como tratam esse tipo de criminoso. Achei expositivo demais e tirou um pouco do charme do conto.

    Observação extra: pelo que entendi, todas aquelas pessoas são relacionadas ao dia 0, o dia do abuso. Os pais que perderam a menina de vista, o tartuado fdp que cometeu o crime, as adolescentes (protagonista e irmã), que são outra fase da vida da menina, e ela ainda se sente exposta ao fantasma do abusador, a mulher velha, que é a menina na vida adulta, vivendo uma vida medíocre enquanto tenta fingir que ainda está viva (ela diz ter morrido por dentro no dia do abuso), mas que odeia sua vida, e também a mulher já velha, se suicidando (matando seu corpo) no mesmo mar onde outrora sua alma morreu. Ou seja, são 4 linhas do tempo interligadas, demonstrando como ela entrou num loop a partir do momento que morreu por dentro. Não sei se li demais e entendi coisas onde não havia, mas essas ideias que relatei aqui elevam o conto pra outro patamar, na minha opinião. Um conto que seria bom, se tornou muito bom.

    Coesão entre os autores: autor 1: tic, tac. Autor 2: tic, tac. Autor 3: tic, tac. Como engrenagens de um relógio. Em outras palavras: a coesão ficou excelente. Apesar de perceptível a mudança de estilo no meio, achei que ela foi bem vinda, assim como a retomada do tic tac no terço final. Os autores fizeram um trabalho incrível, pegando uma ideia dificílima do autor 1, e quase como se pudessem ler a mente um do outro, seguiram perfeitamente uma linha de raciocínio em meio ao caos do conto. Excelente!

    Nota final: muito bom!

  12. Jorge Santos
    15 de setembro de 2024
    Avatar de Jorge Santos

    Olá, trio.

    Este texto fez-me lembrar um bumerangue não-linear metafórico. Deixem-me explicar, explicações essas que são muito difíceis de encontrar no texto. O início foi não linear, e escrito de uma forma poética, que deixa pistas sobre os acontecimentos. O problema é que não existe um referencial temporal que permita ordenar a narrativa. Nunca sabemos quem faz o quê, nem onde, nem quando. Assim foi a primeira parte do texto. A segunda parte já é mais elegante e convencional. Conseguimos obter algumas respostas. Já a terceira parte volta a cair no tipo de texto da primeira parte. Daí o efeito “bumerangue”, que poderia ter sido explorado de outra forma, mantendo na mesma a carga poética, sem cair numa linguagem coloquial.

  13. Gustavo Araujo
    14 de setembro de 2024
    Avatar de Gustavo Araujo

    A habilidade do primeiro autor, no que se refere à escrita, só é comparável a seu nível de sadismo kk Isso porque este conto é, talvez, o mais difícil de continuar em todo o nosso certame. Se é que dá. É mais ou menos – guardadas as devidas proporções – como levar alguém até a estátua do Davi de Michelângelo e dizer: ele está nu, pode terminar. O que quero dizer é que a primeira parte está perfeita, e aqui uso “perfeição” no sentido de “terminada, acabada”. Não precisa de mais nada. Temos a história de Eunice, a menina que hoje gosta de tomar sorvete hoje e que, amanhã se afoga, já velha e gorda, usando um maiô preto que achata seus seios ressequidos. Além disso, temos as histórias paralelas, como a do marido de Eunice, que pateticamente flerta com duas garotas que jogam frescobol, alheio ao pequeno, insuportável e ranhento Enzo…

    Enfim, são peças de um quebra-cabeças que se completa, exigindo, é verdade, dedicação do leitor, mas que ao fim se revela inteiro. Nesse sentido, usa muito bem os avanços e recuos no tempo. Se tivesse terminado ali, nos três pontinhos, ganhava minha nota dez.

    O segundo autor inicialmente procura, com dignidade, dar à protagonista Eunice uma história. Talvez tivesse sido mais interessante falar, no mesmo ritmo de tique-taque, dos personagens que na primeira parte surgiram como coadjuvantes, como o marido de Eunice, as garotas do frescobol, ou mesmo o Enzo… Mas estou divagando. O problema deste desafio literário é que a gente divaga demais enquanto lê, pensando nas continuações que nós mesmos faríamos.

    Retornando, no que parece ser a terceira parte, vemos uma aceleração do tempo. Todavia, ao contrário do primeiro trecho, aqui os parágrafos surgem mais desconexos, confusos até, não deixando traços para que o leitor possa interligar as histórias. Personagens se misturam e se confundem. Não dá para saber direito quem é Eunice, quem é a tia ou a garota do frescobol. Parece que se impõe em termos literais a premissa inicial de que “as pessoas são todas iguais”. Bem, talvez tenha sido exatamente essa a intenção, já que era um conto difícil de finalizar.

    Em suma, fiquei com a impressão de uma ideia muito boa, mas que talvez não comportasse continuação. A coesão não está ruim, mas é que o ritmo estabelecido no início era, de fato, complicado de se emular e principalmente de manter. Tenho certeza de que os dois autores seguintes fizeram o melhor que podiam, mas realmente era um trabalho difícil de dar sequência. De todo modo, este é um conto que vai ficar na minha cabeça por um tempo. Parabéns a todos pelo conto e boa sorte no desafio.

  14. Priscila Pereira
    14 de setembro de 2024
    Avatar de Priscila Pereira

    Olá, autores! Tudo bem com vocês?

    Começo: Me pareceu uma narrativas do mesmo momento em uma praia na visão de alguns personagens distintos.

    Meio: o autor escolheu focar em uma única personagem meio que sendo todos eles. Estranho, eu sei… mas não sei como explicar melhor. Acho que o autor 1 não iria levar a narrativa para esse lado, foi que me pareceu, mas o conto ficou bem interessante assim.

    Final: Continuou seguindo a linha do autor 2 onde uma mesma personagem é tanto a menina que se perdeu, como a mãe do Enzo, como a velha que se dissolve na água.

    Coesão: O autor 1 e 3 estão muito bem conectados, e o autor 2 se não tivesse quebrado a narrativa compartimentada em pequenos episódios, também estaria, porque no geral o estilo foi mantido.

    Visão geral: Bem, me parece que o conto fala sobre um abuso que a menina que se perdeu sofreu antes de encontrar a família e que mudou completamente quem ela era, e as consequências se arrastando ao longo de toda sua vida. Por isso a fragmentação de suas lembranças e até de sua personalidade.

    No geral um conto bom, interessante de ler, mas que (na minha opinião) perdeu força por ser narrado por 3 pessoas, imagino que se tivesse uma só linha de raciocínio seria mais impactante.

    Parabéns aos autores!

    Boa sorte no desafio!

    Até mais!

  15. Fernando Cyrino
    10 de setembro de 2024
    Avatar de Fernando Cyrino

    Olá, amigos e/ou amigas de desafio. Puxa, que interessante o conto que vocês me trouxeram. Algo bem experimental. Uma história diferente e que usa a onomatopeia antiga gerada pelo barulho ritmado dos relógios. Agora eles não têm mais barulho… Mas o tic tac funcionou bem, inclusive porque a narrativa carrega vários tempos. Um enredo que se prenuncia com muitas possibilidades a partir do primeiro autor. O segundo dá uma como que direcionada na história que é retomada no tic tac frenético do autor até que a velha e a menina se encontram sob as águas, para nunca mais serem encontradas. Um conto triste que me traz a todo momento a metáfora desse tempo inexorável que joga frescobol, que um dia usou maiô de crochê amarelo e hoje usa maiô preto que emagrece (novidade pra mim essa), do homem que tem um avesso negro, que usa e abusa e que tem a tatuagem tribal significando “força e honra”. Apesar de que fica evidente a passagem de bastão entre os três autores, o conto é coeso e está bem escrito. Houve um bom trabalho e gostei da história, curti as reflexões que me traz. Parabéns aos autores. Abraços e um grande sucesso no desafio.

  16. JP Felix da Costa
    10 de setembro de 2024
    Avatar de JP Felix da Costa

    A ideia, ou as ideias, dos 3 autores, nesta história, são muito boas. A forma de escrever, dos 3, combina muito bem. Em traços gerais, a ideia que me parece que, no global, é tentada passar, na soma das 3 partes, é que o individuo da tatuagem fez algo à menina que a mudou para sempre. A saúde mental dela é afetada e ela vê a sua vida, em trechos da praia, que ela funde tudo como se ocorresse ao mesmo tempo. O autor 2 introduz uma parte em que ela tem um laivo de sanidade e recorda a vida que tentou ter, daí desaparecer o relógio. No fim o relógio regressa porque ela está de volta ao interminável dia na praia que representa uma vida inteira e o relógio para a sua marcha quando ela se entrega ao mar.

    O problema desta interpretação, se é o que foi procurado, é que o facto de ser dividido por três faz com que sejam incluídos na história detalhes e passagens contraditórios já que não há um planeamento completo do texto. O autor 1, com esta primeira parte, subiu muito a fasquia e a continuação não se mostrava fácil. Dou os parabéns aos três pelo resultado, apesar das falhas, por vezes algo evidentes, que vão surgindo em determinados pontos do texto.

    Dentro do espírito do desafio, e devido ao elevado nível de dificuldade que a primeira parte inseriu, considero o conto muito bem conseguido e merecedor de um repensar a três para lhe dar uma forma final mais coerente.

  17. Pedro Paulo
    8 de setembro de 2024
    Avatar de Pedro Paulo

    COMENTÁRIO: O tiquetaquear do relógio é um barulho marcante pra mim. Às vezes, me rouba toda atenção quando é tudo que se pode escutar. Outras vezes, me enche de agonia, lembra-me todos os meus atrasos. Neste texto, pondera sucessivas mudanças de perspectiva que compõem, com os seus personagens, habilmente caracterizados, o cenário que dá título ao texto. É o conto que tem sido chamado de experimental e dá para ver o porquê. Colocar-me na pessoa da segunda autoria é um exercício interessante, pois o primeiro trecho não constrói um enredo, mas sugere vários, estabelecendo personagens que qualquer autor que seguisse poderia aproveitar de uma forma ou de outra. Ainda que seja generoso, não deixa de ser desafiador, pois leva à escolha de preservar ou não a segmentação do texto em tiques e taques. 

    A segunda autoria manteve a narração em primeira pessoa e preferiu um único bloco de texto. É compreensível e não desfaz do conto, especialmente porque, apesar da opção estilística, costurou um enredo com habilidade, tocando em todos os pontos da introdução em uma complexa trama que, à maneira como é narrada, pode ser lida como um fluxo de consciência que passa por mais de um tempo e por mais de uma pessoa, demandando atenção de quem lê. Na terceira autoria, o tique e taque volta. Arriscado, pois na tentativa de retomar o estilo do começo, poderia frustrar a escolha da segunda autoria, mas não foi o que senti. Em forma, reencontrou a primeira autoria e, em conteúdo, deu uma continuidade louvável ao que se construiu pela segunda autoria.  Posso apontar até mesmo um aspecto metalinguístico, pois se a princípio o leitor se perde, estar perdido é justamente o tema desse texto, em que duas perdições simultâneas ocorrem e se diferenciam por uma ser momentânea, física, e a outra perdurar a vida inteira, sendo psicológica. Acredito que os dois autores que sucederam ao primeiro souberam dar continuidade a essa mensagem central, tornando mais substancial para caracterizar a protagonista narradora.

    Enfim, a retomada do tique-taque reforçou a abordagem que o conto dá ao tempo, denotando a complexidade de fatores e eventos que ocorrem ao mesmo tempo e como o impacto de um instante pode desencadear consequências duradouras. Esse recurso utilizado no fim serviu mais ao clímax que finalmente nos faz compreender que início e fim ocorriam como se ao mesmo tempo, simbolizando como a protagonista nunca conseguiu sair daquele dia na praia, revivendo-o em seu último dia, no mesmo lugar. Ótimo trabalho das três autorias.

  18. rubem cabral
    8 de setembro de 2024
    Avatar de rubem cabral
    • Enredo: o conto fala-nos de existências diversas, observadas por pequenos segmentos de tempo, marcados por tics e tacs de um relógio imaginário. E, nesse rendado de tramas, apresenta-nos uma história que parece juntar mundos paralelos, onde afogados nunca achados deixam seus relatos, onde idosas foram crianças na mesma praia, como se a praia fosse um meio onde tudo flui. A trama, contudo, é um pouco estranha; sugere e insinua, mas não chega a entregar uma história sólida.
    • Escrita: a qualidade da escrita é muito boa, namora com a prosa poética e é agradável de se ler.
    • Personagens: a menina afogada, a mulher de maiô preto, são interessantes, mas a estrutura do conto deixa a desejar em termos de trama: tudo é muito tênue, muito vago. O 2o autor até tentou ligar os pontos e desenvolver melhor, mas o efeito foi meio difuso.
    • Coesão: boa. Mesmo tendo o 2o autor desviado do formato marcado por tics e tacs, logrou manter o estilo da prosa, que foi retomado pelo último autor.
  19. Fabio Baptista
    7 de setembro de 2024
    Avatar de Fabio Baptista

    X Sensação após a leitura: caramba, o que que eu vou falar agora?

    X Citações pro bem e pro mal:
    “a sombra de tudo que eu não pude ser”
    Já vi isso em algum lugar 😀

    X Conclusões:
    Esse conto é bem difícil de avaliar. O único genuinamente experimental do desafio. Tem muitos méritos por isso. A primeira parte é muito boa, ritmada, com frases e descrições que vão se repetindo sem se tornarem cansativas, gerando um efeito quase hipnótico. Os pontos de vista se alternam, parecem ser de pessoas diferentes, mas também poderiam ser da mesma pessoa, observando as outras e tentando se colocar no lugar delas ao mesmo tempo em que as julgava. Ou poderia ser… da praia.

    O segundo autor quebra o ritmo dos tic tacs, mas percebemos que isso acaba não sendo um defeito. Dentro do “experimental” essa quebra de estrutura narrativa se encaixou.

    Do meio até o desfecho, algumas “explicações” são apresentadas. Uma menina que morreu afogada foi a primeira coisa que eu (e acho que todo mundo) pensou ao ler a primeira parte. Dar um descanso a ela parecia (e até agora me parece, porque sinceramente não consegui pensar em nada melhor) o rumo a ser tomado. Algumas mudanças de velocidade do relógio antes do fim.

    Tudo funcionou e, ao mesmo tempo, pareceu não se encaixar. Estava bem complicado e sinto por desejar algo que eu mesmo não conseguiria entregar, mas, apesar da leitura prazerosa, o último gosto que ficou foi o de uma promessa não cumprida.

    BOM

  20. Leandro B.
    3 de setembro de 2024
    Avatar de leandrobarreiros

    Um texto experimentalista muito bem desenvolvido.

    De início, é proposto que cada batida de tempo alterna a perspectiva entre diferentes pessoas na praia. Há já no começo algumas propostas interessantes como a garotinha que nunca foi encontrada, mas foi encontrada. O autor 1 opta também por alguns comentários de tonalidade mais cômica. Contudo, aos poucos, tudo vai se tornando um pouco mais sinistro e melancólico.

    Não sei se a sugestão de que todos naquele ambiente partilhavam a mesma alma surgiu do primeiro ou segundo autor, mas ficou super interessante. Não precisa necessariamente fazer sentido, sendo uma escrita mais experimental, mas tudo se conectou muito bem.

    Certamente, contudo, foi o segundo autor que quebrou um pouco o estilo narrativo para inserir explicações mais diretas. Não ficou ruim. As explicações são bem escritas e, de certa maneira, mantém o tom da história, ainda que o formato seja diferente. Estaria tudo bem em manter o estilo também.

    Por fim, o estilo é retomado adiante, de novo, não tenho certeza se pelo segundo ou terceiro autor e os ciclos vão se desenvolvendo. E vão retornando, como as ondas.

    Enfim, é naturalmente difícil falar de um conto como esses. A impressão que fiquei é que foi escrito por um único autor muito experiente e envolvido com experimentalismo.

    Conseguir realizar tal feito em um desafio de contos escrito por três pessoas não é algo pequeno.

    Parabéns a todos, vocês mandaram muito bem.

  21. Kelly Hatanaka
    28 de agosto de 2024
    Avatar de Kelly Hatanaka

    Olá, caros colegas entrecontistas!

    Primeiramente, parabéns pela participação corajosa e desapegada.

    Vou avaliar e comentar de acordo com meu gosto, não tem muito jeito, afinal não tenho conhecimento nem competência para avaliar de forma mais “técnica”. Ou seja, vou avaliar como leitora mesmo. Primeiro, cada parte separadamente, valendo 1 ponto cada. Depois, a integridade do resultado, valendo 3 e, por último, o impacto da leitura, valendo 4.

    Começo

    Um começo interessante. Tics e Tacs separam fragmentos de pensamento de uma pessoa. Ou seriam várias pessoas? Ou seria uma pessoa fragmentada? Há um sentido nesses pensamentos que sugerem uma perda, um trauma, uma pessoa perdida de si mesma. Nada está muito claro, porém, existe um sentido, uma mensagem. Apesar de parecer arriscado, achei que este formato facilita a vida dos autores que farão a continuação, pois nada está engessado, tudo está aberto a interpretação. Gostei.

    Meio

    O autor 2 optou por explicar os pensamentos. Válido, mas, pessoalmente, preferiria não explicar nada ou simplesmente explicar o mínimo necessário. Penso que num texto desses, cada pessoa faz sua leitura e explicar as coisas poda as possíveis interpretações particulares. Além disso, se fosse absolutamente necessário explicar o texto, penso que isso deveria ser feito no final, não no meio. Esta explicação poderia ter atrapalhado o desenvolvimento da terceira parte. O que, na minha opinião, não aconteceu.

    Fim

    O autor 3 manteve a estrutura da primeira parte e acho que isso foi uma boa decisão. No final, há uma mudança de ritmo, os Tics e Tacs ficam mais rápidos, o que ilustra a intensificação da crise e sugere a inexistência (morte?). Gostei bastante, acho que conseguiu dar uma boa conclusão a uma narrativa complicada, mantendo a coesão e a ideia inicial.

    Coesão

    Acho que o resultado final ficou coeso. Só que este texto foi diferente. Até agora, senti, nos demais textos que comentei, que o final destoou, talvez pelo excesso de coisas a resolver em pouco espaço. Mas neste caso, embora o meio tenha ficado bem escrito e bem desenvolvido, senti que o começo e o final é que estavam bem conectados.

    Impacto

    Gostei muito. Achei um texto diferente, uma história dolorida, narrada por um personagem que nem consegue falar da própria dor em termos racionais. Tem algo de onírico nele, como se uma pessoa estivesse tentando dar vazão a seus sentimentos através de imagens e símbolos.

  22. Fabiano Dexter
    26 de agosto de 2024
    Avatar de Fabiano Dexter

    Primeiramente gostaria de parabenizar o primeiro autor pela originalidade e risco assumido, já que não sabia quem continuaria a sua história, e pelos dois corajosos que pegaram e seguiram com a ideia e juntos fizeram uma história excelente.

    Muitas vezes temos histórias, sejam em filmes ou livros, onde o final ruim impacta uma boa obra. Aqui temos um final excelente e que acaba apagando os pequenos defeitos que aparecem durante o Conto. Ainda que não tenhamos pistas na primeira parte do rumo que a história vá tomar e, relendo, vemos alguns “furos” na conclusão, um desavisado teria dificuldade em perceber que o texto foi escrito por três pessoas diferentes, ainda que tenhamos no meio do texto um trecho que destoa por sair da linha do Tic Tac, que é depois retomada.

    A ideia de tratar todos os personagens como o mesmo, por exemplo, exclui um dos trechos onde o narrador é o “barrigudo que tem tribal no bíceps flácido”. Seria algo que um único autor certamente corrigiria em uma revisão antes da publicação. Ou deixaria pois vê algo ali que eu não vi. Mas a junção das demais personagens em uma só e a explicação do porquê, logo no início, vemos a protagonista sendo encontrada pela família e se enxergando na terceira pessoa.

    Sem dúvida um dos contos que me marcarão nesse desafio e mostra a importância de uma boa conclusão em qualquer história.

  23. bdomanoski
    25 de agosto de 2024
    Avatar de bdomanoski

    Quesitos avaliados: Entretenimento, Originalidade, Pontos Fracos

    Entretenimento Num primeiro momento sofri pra ler. No fim, reli, e gostei. A leitura ficou fluída. Não acho que seria uma história que faria sucesso com a plebe no geral, porque não estão acostumados a esse tipo de leitura, mas que foi bem bacaninha foi.

    Originalidade Olha só, esse era um dos contos q eu mais tinha torcido o nariz quando postaram a primeira vez, mas agora, após a obra concluída, achei mesmo um dos melhores do certame. As entrelinhas e tudo mais, embora um pouco exageradamente reforçadas na parte final c muitas repetições sobre o que havia acontecido. Foi bem bacana.

    Pontos Fracos Pelo que entendi, a Eunice era criança, era a menina jogando frescobol, e a velha que no fim se matou. Trechos deram a entender que Eunice havia sido abusad4 qnd criança, embora um trecho dela conversando com o tatuado suspeito tenha aparecido quando ela era adolescente também. Ou então, havia só duas ordens temporais, e ela jogava frescobol quando criança. Isso achei um pouco confuso. No geral, parabéns pros corajosos que pegaram e concluíram esse conto. Acabou sendo surpreendente o resultado final.

  24. Antonio Stegues Batista
    22 de agosto de 2024
    Avatar de Antonio Stegues Batista

    O conto tem uma estrutura marcada por tic e tac”s que separam os pensamentos de cada um dos personagens na praia. A narrativa inicia com a fala de um dos personagens descrevendo as pessoas e dando a elas um adjetivo para que o leitor possa identificá-las; o menino ranhento, a mulher gorda, o homem barrigudo, a mocinha tonta e a mulher velha. Cada tic e tac separa o pensamento de cada um. Eu fiz um esquema num papel para melhor entender, mas não vou fazer no comentário pra não ficar chato, além do mais, cada um interpreta como quer, ou como sabe. O tic tac como o simbólico som de um relógio, ou bomba relógio, ao contrário, marca a quebra de tempo e espaço. Gostei da ideia do primeiro autor(a), mas a segundo parte não seguiu a sequência intercalada, e a terceira parte não teve essa divisão de personagens e seus pensamentos, focando nas reminiscências e divagações da menina perdida, agora adulta. Gostei do conto, apesar das divagações em excesso do personagem na última parte. Gostei da ideia de usar o tic e tac em vez de *** como separação de parágrafo/pensamento. Eu escrevi algo parecido no conto A teia da Aranha, no Desafio Lume.

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Publicado às 1 de julho de 2024 por em Começo, meio e fim e marcado , , .