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Detox Literário.

Pétalas Amarelas – Conto (Douglas Moreira)

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Uma flor amarela de estreitas pétalas crescia no meu jardim. Um espaço pequeno, quintalzinho quadrado de grama verdinha e com umas cercas brancas em volta: nada de especial. Ficava ao lado de uma rua nada movimentada, muito quieta, num cenário cinzento, desprovido de vida. Ela era a pincelada atípica de um tom vivo que faltava na minha cidade morta.

Fitava a rua vazia, como se esperando por algo: como eu. As vezes ficava triste, cabisbaixa, murcha: como eu. Mas de manhã sempre se levantava junto com o sol e lá dispendia horas a fitar o horizonte (como eu), talvez viesse o que tanto esperava. Eu torcia por ela, e sei que ela torcia por mim. Mas, como sempre se repetia, o ocaso se descortinava e nada novo vinha sob o céu.

Tínhamos aquela esperança que se esmaecia dentro de nós. Sempre lá, contando segundos, esperando que a luz se demorasse mais um pouco no céu, porque talvez algo se revelasse. Eu deitava ao lado dela, colocava a mão no rosto e suspirava. E depois de um tempo em que o mesmo cenário se repetia quadro a quadro, tudo ficou meio automático. Eu mal a olhava, mal me prendia a apreciar sua presença, só ensaiava a peça dolorosa dos nossos dias monótonos a fitar a selva de pedra da paisagem, esperando ver o menor sinal daquilo que tanto queríamos.

A vontade nos tornou egoístas, eu acho. Mal olhávamos pro lado, sempre centrados no futuro. O presente se tornou, aos poucos, uma mobilha indesejável nos recônditos dos nossos seres. Apenas queria o ver passar logo, e mal me toquei que quanto mais o futuro chegava mais presente ele se tornava. E, logo, eu também o indesejava. Tudo se resumia à fantasia de um tempo inexistente que eu imaginava, algo destituído de ser, algo que não era palpável e nem estava esperando a hora de chegar em canto algum.

Demorei pra me tocar que o futuro não existe, ele é só o presente que ainda não aconteceu, ele só é ele quando acontece, e mesmo quando o faz… não é o futuro.

Eu vivi em função de sua espera, e no meio daquele ciclo vicioso um ponto final cruzou as minhas sentenças sem fim.

Num dia como todos os outros a flor me presenteou com a ausência. Nada se via além de matéria orgânica decomposta no meio da grama. Talvez sua esperança se desvanecera toda, e o sentimento bizarro de seu vácuo simplesmente a matou, pensei. E então eu me toquei. Ela sempre estivera ali. Ela era o presente insólito e singelo que me trazia conforto, e estava sempre garantida no futuro… até aquele dia.

Me perdi numa projeção de tempo, e só me toquei que algo existia bem ao meu lado quando ele se tornou passado. Morri um pouco aquele dia, e fui obrigado a viver, sem a companhia da flor, o horrendo presente.

3 comentários em “Pétalas Amarelas – Conto (Douglas Moreira)

  1. Anorkinda Neide
    25 de agosto de 2016
    Avatar de Anorkinda Neide

    Olá, eu gostei do conto.
    Embora tenha começado bem, mas depois fez dois paragrafos altamente confusos e terminou o conto de forma descuidada..
    A repetição de ‘me toquei’, ao invés de substituir pelo verbo ‘percebi’ ou outro sinonimo tb nao foi bem-vinda ao texto.
    Mas é uma reflexão muito boa e um conto, se aparado os defeitos, bem leve, meigo até.
    *eu ia falar dos probleminha q a Claudia já apontou.. hehe
    Abraços

  2. Priscila Pereira
    25 de junho de 2016
    Avatar de Priscila Pereira

    Oi Douglas, seu texto parece mais uma crônica, uma mensagem de viver melhor a vida no presente sem se importar muito com o passado ou o futuro, do que propriamente um conto, eu li esperando uma estória, algum acontecimento… mas tirando isso é uma leitura boa. Até mais!

  3. angst447
    18 de junho de 2016
    Avatar de claudiaangst

    Olá, Douglas!
    Ponto positivo do seu conto: é curto.
    Apesar do tema abordado não ser original, exaustivamente discutido por filósofos e até mesmo em livros de autoajuda, foi tratado aqui com a delicadeza das pétalas amarelas.
    A descrição inicial lembrou meus desenhos de criança e me encantei. Cuidado com alguns clichês (se bem que costumo dizer que a vida em si é um enorme clichê): sempre se levantava junto com o sol / o ocaso se descortinava/ selva de pedra/ciclo vicioso
    Atenção para a repetição da expressão – me toquei – Troque por “percebi”, “notei”, “me dei conta”, “tomei consciência”
    Alguns pontos a rever:
    – As vezes > Às vezes
    – Mobilha > mobília
    – Indesejava > neologismo? Verbo novo no pedaço?
    – chegar em canto algum > chegar A canto algum
    – Me perdi > Perdi-me – sim, é estranho, mas não se começa uma frase com pronome oblíquo.
    Estranhei também que no final, o narrador se referiu ao presente como “horrendo”, já que ao longo de todo o texto, passou a ideia de ser algo tedioso, sem graça.
    Enfim, foi uma leitura agradável, sem entraves. Continue a escrever e arrisque expor suas ideias sem se prender ao esperado. 🙂

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Informação

Publicado às 17 de junho de 2016 por em Contos Off-Desafio e marcado .