O violão é tocado. Simples e concreto. Os dedos brincam com as cordas como se o mundo os pertencesse. As notas flutuam pelo ar sem direção. Como se já não fosse o suficiente, o violino acompanha presencialmente o caminho do violão. Gemidos gostosos vindos da fricção. Sutilmente as notas saem entrelaçadas, contempladas pela voz que inicia a letra. Um dó laranja seguido de um sol azul claro. Claro como o Sol e azul como o céu. Primeira e quinta entornadas suaves como veludo. A maestria da harmonia desliza pelos céus como o canto dos pássaros adornando o espaço.
A flauta é soada no primeiro refrão causando júbilo e o fechar dos olhos. Os troncos balançam levemente, junto aos troncos as cabeças oscilam se deixando levar pelo suave movimento. Não é preciso mais ver as notas, apenas seguir o fluxo que embala suas mentes. O sopro é aquele afagar de cabelos na cama em um domingo de manhã. Aquele roçar de narizes sorridentes. É aquele desejo proibido e eterno.
As cordas vibram como pequenas ondas em um lago escuro, ondas causadas pelo vento. Vento que traz consigo o cheiro de manhã nova, de pão quentinho, de beijo molhado. O arrepio é certo. O som envolve a todos como a água morna de uma piscina em uma casa de campo em meio ao breu da madrugada.
Os dedos continuam a harmonia prodigiosamente enquanto a voz para de súbito.
Mi dedilhado
Mi com sétima valsado
A voz volta enlaçando o vazio deixado pelo intermédio calado. O infinito prossegue infinitindo em sua infinitude, infinituando a canção.
A voz já parou com sua sonoridade, agora é a descida após o júbilo da vista após a dor da subida. Agora é a saída das flautas. Do violão. E o violino chora pressentindo o fim.
O silêncio.
A vida continua e nos sonhos dos presentes será cantada aquela canção novamente, pois não há nada no mundo que se perpetue como uma canção.
No fim tudo acaba.
Achei bem legal a sonoridade e a cadência do conto (quase uma poesia).
Bem poético e musical.
Só não entendi o porquê de não respeitar a pontuação em alguns momentos.
Bom texto!
Abraço.