EntreContos

Detox Literário.

Homens de Preto (Fabio Baptista)

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As luzes do ocaso tingiram o horizonte de Ipanema com uma profusão de matizes avermelhadas que faria Monet revirar-se na cova em busca de tinta e pincel. O mar, espelhando as nuvens e as primeiras estrelas, tornou-se um abismo tremeluzente que inspirava poetas com seus versos sangrados de dor fingida; conferia veracidade e testemunho às juras de amor eterno proferidas na areia; enchia de esperança os corações – de pacifistas, ativistas dos direitos humanos, defensores do meio ambiente, protetores dos animais, idealistas e todos aqueles que creem na possibilidade de uma sociedade mais justa e igualitária –, com sua brisa quente soprando-lhes aos ouvidos: “talvez você seja apenas um sonhador, mas… você não está sozinho”.

Bonito pra caralho, né? Só que deixa eu te falar uma coisa, parceiro – tudo isso aí é uma grande babaquice, coisa de gente mimada que não apanhou o suficiente quando era criança.

***

Este conto faz parte da coletânea “Devaneios Improváveis“, Segunda Antologia EntreContos, cujo download gratuito pode ser feito AQUI.

88 comentários em “Homens de Preto (Fabio Baptista)

  1. Rodrigues
    17 de novembro de 2014
    Avatar de Rodrigues

    porra, achei muito bom. a narrativa bem conduzida, rápida, certeza que o cara tava com a voz do Nascimento na cabeca enquanto escrevia. esse final foi muito interessante, pois tornou Loriva um personagem que exemplifica genialmente toda a desgraceira que assola a vida tanto da policia como dos moradores do morro. deu ate pra ver o olho seco e perdido refletindo a cidade.

    • Roberto Nacimento
      17 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Caveira!

  2. Thiago Mendonça
    17 de novembro de 2014
    Avatar de Thiago Lee

    Que início! Que desenvolvimento! Que final! A maneira como o conto é contado só ajuda o desenvolvimento da trama e das personagens. Não vejo um simples motivo pra não dar nota máxima. Melhor conto do certame com certeza. Meus parabéns pela obra-prima!

    • Roberto Nacimento
      17 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Caveira!

  3. Wender Lemes
    17 de novembro de 2014
    Avatar de Wender Lemes

    Cara!#@… conto muito bom. Os contos maiores geralmente me dão preguiça, mas esse foi uma bela de uma exceção. Quando vi o começo imaginei que seria um bom conto, mas de leitura pesada, o que você desconstruiu já de cara kkk. Trabalhou bem as gírias, não ficou forçado, ficou extremamente fluido. Enfim, nada a acrescentar. Boa sorte e, sinceramente, parabéns.

    • Roberto Nascimento
      17 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira, meu capitão!

  4. Gustavo Araujo
    16 de novembro de 2014
    Avatar de Gustavo Araujo

    Porra, caveira, gostei pra caralho.

    Trama Muito bem amarrada. Parece uma continuação do “Tropa”, incluindo a narração em off do Wagner Moura. O enredo é muito fiel ao filme. Chego a pensar que o próprio Padilha iria dar boas risadas com esse enredo. “É, parceiro, o sistema é foda.”

    Falando mais sério, o conto tem a qualidade inegável de trazer à tona a velha e infindável discussão sobre direitos humanos e o papel da polícia no Rio de Janeiro. E o autor – refiro-me à pessoa que escreveu – tem o mérito singular de se fazer passar com muita fidelidade por um adepto da extrema direita. Ah, o Boslonaro seria outro a apreciar o texto, seguramente.

    Voltando, creio que se o leitor pergunta a si mesmo se, de fato, a pessoa que escreveu o conto pensa daquele jeito, é porque a história prendeu, cativou, deixou sua marca. E este conto tem essa qualidade ímpar. É possível imaginar que o autor realmente pensa assim, mas, no fim, claro, não se pode afirmar com certeza. A razão crítica que deve acompanhar o leitor o leva a por os pés no chão e a concluir que, talvez, o autor tenha apenas emulado o Capitão Nascimento. Puta mérito do caralho.

    Claro, há espaço para melhorar. Há pontos na narrativa que não se afinam com o tom condutor. Na maior parte do texto, o discurso é bastante informal – é como se ouvíssemos o policial do BOPE contando vantagem na mesa de um bar. Todavia, há outros trechos em que a narrativa assume ares, digamos, tradicionais, como qualquer (bom) livro comum. Talvez fosse o caso de rever esses trechos para que o discurso ficasse uniforme.

    Outra coisa que pode ser (bem) melhorada é o aspecto psicológico do narrador. Isso, temo dizer, ficou bem raso, especialmente quando se compara com a construção do próprio Lorival. O que quero dizer é que não comprei a ideia da execução do Lorival só por conta de um pedido, assim, sem mais nem menos. Isso se reforça porque mesmo na retórica direitista, há uma questão ética envolvida. O BOPE sobe o morro para matar bandido. O pessoal caveira tem orgulho disso – pelo menos é o que o filme deixa passar – e o narrador não parece diferente. Só que em momento nenhum o Lorival deu mostras de ser bandido. O quando o narrador o mata, o faz para atender um capricho, colocando-se no mesmo patamar dos traficantes. Sim, depois ele ficou com remorso e tal, mas esse rompante, quero dizer, a razão pela qual ele atendeu o pedido do Lorival não ficou nem um pouco claro. Pareceu mais – perdoe-me, caro autor – uma tentativa de criar uma surpresa, um “a-há, não esperavam por isso, hein?” Enfim, não deu certo.

    Ainda, há um trecho em que o narrador dá a impressão de ser o comandante do BOPE – refiro-me ao momento em que ele diz “meu batalhão”. Talvez fosse o caso de rever essa fala porque o comandante do BOPE é, se não me engano, um coronel, alguém que dificilmente (para não dizer, jamais) subiria o morro numa patrulha ordinária. Isso está mais afeto à realidade dos tenentes e dos capitães.
    Bom, apesar dessas observações, quero reiterar que o conto é muito bom. As críticas que fiz seguem a linha “quanto melhor o texto, mais há o que comentar sobre ele”. Ou, em outras palavras, quanto mais hábil o autor, mais há o que se falar sobre sua criação, isto é, mais propenso a ouvir críticas ele ou ela estará.
    Parabéns.

    • Roberto Nascimento
      17 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      ATENÇÃÃÃÃÃOOOO… ZERO-UM!

      Zero-um, o senhor é o novo Xerife!

      Porra, senhor zero-um, o senhor acha que eu não vi que o senhor também comentou tudo em meia hora?

      Sabe o que eu tenho vontade de fazer quando vejo uma coisa dessas, senhor Zero-um?

      A verdade mesmo é que eu tenho vontade de colocar o cidadão no pau-de-arara, senhor Zero-um! Mostrar pro sujeito trinta e três boas maneiras de se comportar, lembrar um pouco dos bons tempos, senhor Zero-um!

      Mas se eu falo um negócio desses, essa merda de direitos humanos cai matando em cima de mim. Porra, esses caras enchem o saco pra caralho.

      Então eu tenho que me conter, senhor zero-um… tenho que falar que só tenho vontade de prender o cidadão e deixar apodrecer lá na cadeia pra sempre, sem visita íntima, sem liberdade condicional, sem televisão, banho de sol e essas mordomias todas que esses filhos da puta têm.

      É foda, senhor Zero-um!

      HUAHUAHUAHAUAHU

      Fala, meu capitão!

      Cara, percebi esses “deslizes” puxando para uma narrativa mais convencional vez ou outra enquanto estava escrevendo. Pensei em reescrever, mas achei melhor deixar assim (e não foi por preguiça, juro! hahahaha), pensei que dar uma “quebrada” no tom informal seria benéfico de vez em quando. Mas é algo a se repensar, realmente.

      Sobre o “meu batalhão”, foi falha minha. Acabei dando a entender que o policial tem uma hierarquia maior. Acredito que tirar esse “meu” resolva o problema. Agradeço a observação cirurgica (olho de águia do caralho, como diria o capitão! :D).

      O final dividiu opiniões. Analisando friamente (sem bancar o autor que quer defender a cria) não acho que tenha ficado inverossímil. A ideia é que o soldado deu um tiro de misericórdia, tipo uma “eutanásia”. O tiro no Lorival não foi por ódio, nem por gosto. Foi por pena. Talvez uma tentativa de redenção depois de tantas mortes (de bandidos, que na visão dele não são seres humanos, mas ainda assim… mortes) nas costas.

      Enfim, pelo feed-back geral percebo que preciso mexer ali naqueles últimos parágrafos, deixar mais clara a visão do policial sobre os acontecimentos e também delinear melhor o que é realidade e o que é “reconstituição dos fatos”. Só ainda não sei como fazer isso sem usar um tom meio didádico, à moda “Christopher Nolan”.

      Saudações,

      Zero-quatro.

  5. williansmarc
    9 de novembro de 2014
    Avatar de williansmarc

    Muito bom. Trama boa e bem escrita. Legal a referencia ao MIB ao fim do conto, bem interessante a mistura dos homens de preto reais com os homens de preto da ficção.

    Na minha opinião, o excesso de palavrões e violência é totalmente justificável por causa do filme em que o conto é baseado. Esse excesso não me incomoda de forma alguma.

    Parabéns e boa sorte no desafio.

    • Roberto Nascimento
      10 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  6. Brian Oliveira Lancaster
    7 de novembro de 2014
    Avatar de Victor O. de Faria

    Meu sistema: essência. Metáforas e eufemismos. Acho que reconheço este estilo. Não sou fã do estilo visceral, mas vou avaliar sem prerrogativas. O início proporciona um sentimento de curiosidade indescritível, o que é ótimo. O personagem narrador tem uma presença muito forte e crível. O bom humor, apesar de focar na realidade, dá o tom certo da tragicomédia. O final, com aquele ar de dúvida se o que lemos foi verdade ou inventado, fechou com chave de ouro. Resumindo, dentro da proposta, captou bem a essência da inspiração.

    • Roberto Nascimento
      7 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira na essência, meu capitão!

  7. Wallisson Antoni Batista
    6 de novembro de 2014
    Avatar de Wallisson Antoni Batista

    Muito boa narração e leitura satisfatória. Na minha opinião “Tropa de Elite” é um dos melhores filmes na cena do cinema brasileiro por mostrar a realidade do dia a dia policial e é isso que este texto demonstra. Tirando alguns errado de ortografia seu texto caro escritor ficou excelente.

    • Roberto Nascimento
      6 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      ATENÇÃÃÃÃÃÃÃÃO… Zero-dois!!!

      O senhor é um fanfarrão, senhor Zero-dois!

      Porque ontem, em menos de 30 minutos o senhor comentou todos os contos, senhor Zero-dois! Porra, eu com 20 anos de curso mal consigo comentar um conto em meia hora e o senhor comentou todos, senhor Zero-dois… TODOS!

      Sabe o que eu concluo com isso? Que o senhor lê rápido pra caralho e merece uma medalha? Não, senhor Zero-dois!

      Eu concluo que o senhor não leu NADA! Concluo que o senhor, senhor Zero-dois, não tem respeito nenhum pelos seus colegas. Que esses seus comentários são uma vergonha, senhor Zero-dois.

      Se tem tanta preguiça de ler, se acha mais fácil resumir o comentário dos outros do que gastar um pouco do seu precioso tempo e dar uma opinião decente sobre o que leu, ENTÃO NÃO INVENTA DE PARTICIPAR DO CONCURSO, SENHOR ZERO-DOIS!!!

      PEDE PRA SAIR!

  8. Virginia Ossovsky
    5 de novembro de 2014
    Avatar de Virginia Ossovsky

    Devorei o conto! Achei fantástica a mudança de tom depois do primeiro parágrafo( que achei super chato). Entrei totalmente em sintonia com as emoções das personagens e quase não aguentei a violência em que a história mergulha… Não gosto de palavrões, mas acho que fazem parte do jeito “Capitão Nascimento” de ser. Mas o que achei melhor mesmo foi o final, já que toda a história pode ou não ter sido invenção do policial.

    • Roberto Nascimento
      7 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  9. piscies
    4 de novembro de 2014
    Avatar de piscies

    Putz, é muito comentário grande, não vai dar para ler tudo. Vou comentar sem me embasar no que a galera está falando, se não for incômodo, rs.

    Primeiro: este texto está incrível! Gostei MUITO do jeito que o narrador vira personagem de uma hora para outra. Perfeito. Também gostei do mistério que ficou no ar no final, não deixando claro se a história foi toda inventada ou se foi a verdade.

    A narrativa xula caiu muito bem, especialmente os característicos “mermão” e “parceiro”, que eu ouvia com a voz debochada do Capitão Nascimento. Li esse montão de palavras com grande emoção. Parabéns! Seu conto está incrível!

    • Roberto Nascimento
      5 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  10. Roberto Nacimento
    4 de novembro de 2014
    Avatar de Roberto Nacimento

    Acredito que devido à polêmica gerada, com alguns colegas chegando a atribuir opiniões do personagem ao autor, alguns esclarecimentos sejam necessários.

    Primeiramente – esse é um texto de ficção, baseado no filme Tropa de Elite. Não acredito que o José Padilha ou o Wagner Moura sejam sujeitos truculentos, que sufocam as pessoas com sacos plásticos ou abrem mão de artifícios similares para convencer os outros a fazer o que eles querem em suas vidas reais. Também não acredito que o ator que interpretou o Baiano “cobre geral” ateando fogo em quem descumpriu suas ordens ou em diretores que lhe negaram papéis de destaque. E assim por diante.

    O mesmo raciocínio vale para mim.

    Já escrevi sobre astronautas, sendo que jamais fui ao espaço (infelizmente). Já escrevi sobre cavaleiros que enfrentam dragões (e eu fujo até de iguana). Também já contei histórias de personagens com orientação sexual diferente da minha, de sexo diferente do meu, opiniões e comportamentos dos mais variados. Ora, se fosse contar apenas histórias de personagens com a mesma visão de mundo e com as mesmas experiências de vida que eu, teria me aposentado depois de duas páginas!

    Contudo, acho que seria desonesto na minha parte fazer um discurso politicamente correto ou ficar em cima do muro, no intuito de conquistar a simpatia dos leitores. Então vou dar algumas opiniões PESSOAIS sobre os temas abordados nesse conto.

    Antes, porém, uma questão – as opiniões/vida particular do autor, deveriam influenciar na apreciação/julgamento de sua obra?

    E outra – só devemos considerar bom aquilo com o que concordamos?

    Sem mais delongas – Não tenho ideias e ideais (bendita reformulação gramatical! hahahaha) talhados em pedra. Sempre (quase sempre :D) procuro o debate e tento entender os pontos de vista contrários aos meus. Porém, o que tenho notado ultimamente é que as pessoas tendem a assumir posturas muito radicais – ao menor sinal de conflito e questionamentos as conversas já acabam, com acusações de “esquerdopata, petralha, comunista fdp” de um lado e “tucanalha, coxinha, reacinha fdp” do outro.

    Tudo anda muito dividido – ou você concorda com tudo, ou não concorda com nada. Ou é preto ou é branco, não há mais lugar para o cinza. Ou é herói, ou é vilão. Assim, para a esquerda, Reinaldo Azevedo é um idiota que só fala besteiras. Para a direita, nada que saia da boca de Lula e companhia merece atenção.
    – Foi o Malafaia que falou? Ah, então com certeza é homofóbico, não precisa nem ouvir, manda prender!
    – Foi o Jean Wyllys? Não quero nem escutar, esse PSOL só quer promover a ditadura gay e a anarquia…

    E assim vamos caminhando, perdendo (se é que um dia tivemos) a capacidade de entender os pontos de vista alheios e, principalmente, perdendo a capacidade de rir de nós mesmos. Pois tudo hoje é muito sério, tem que ser levado à ferro e fogo, senão não vale. Pudemos ver o show de horrores que foi essa última eleição presidencial. E, na minha modesta opinião, essa onda “politicamente correta” tem contribuído para essa “seriedade”.

    Mas eu falei que não ficaria em cima do muro – tenho sim uma linha de pensamento que em geral é tachada de “conservadora”. Aliás, fico pensando quanto tempo a esquerda precisará ficar no poder para que invertam-se os papéis reacionário/”revolucionário”, mas enfim… 😀

    Poderia ficar horas escrevendo minhas opiniões sobre o mundo, mas não quero fazer ninguém dormir. Vou focar na polícia (que é o mote desse conto).

    Não acredito que a polícia seja a solução para o problema da violência. Porém, sou da opinião que “ruim com ela, pior sem ela”. Pode ser uma sensação falsa, mas eu me sinto mais seguro sabendo que a polícia está na rua. E tenho certeza que muitas pessoas também sentem-se assim. O pânico generalizado que se instaura na população quando a polícia faz greve reforça meu argumento.

    Há policias despreparados, corruptos, que cometem excessos e abusos de autoridade? Claro que sim. Mas isso desabona toda a instituição? Acredito que não.

    Eu gostaria muito que não houvesse necessidade de polícia. Que, assim como no Canadá, Noruega e outros lugares frios, os policiais sequer armados andassem. Eu adoraria que no Brasil todos nascessem com chances iguais, com condições dignas de se desenvolver como ser humano, cursar uma boa escola, desenvolver uma profissão e ser útil à sociedade como um todo. Mas, infelizmente, estamos tão distantes dessa realidade quanto a temperatura do verão carioca para o inverno da Noruega.

    A colega Anorkinda usou a palavra que define tudo, na minha opinião – “sorte”. Não nasci em berço de ouro, mas, graças a Deus, nunca faltou comida na mesa de casa. Isso me proporcionou condições para estudar e ter um emprego que não vai me deixar rico, mas também não vai me deixar passar fome. Foi mérito? Também… pois se eu não tivesse estudado hoje provavelmente estaria em outras condições. Mas, principalmente – sorte. Sorte de ter nascido em uma família que me proporcionou a oportunidade de estudar. Qual era minha chance de entrar para o tráfico de drogas? Infinitamente menor que a do menino que nasceu na favela, vendo os trabalhadores passarem fome e os traficantes andarem com colar de ouro no pescoço. Houve mérito da minha parte aqui? Obviamente não, foi apenas uma questão de sorte.

    Acredito que a solução da violência e de muitos outros problemas sociais seja reduzir esse fator sorte. Que independente de onde nasça, o sujeito tenha condições mínimas para se desenvolver.

    Isso é uma coisa. É sonho, é meta para os próximos 50 anos, senão mais. INFELIZMENTE.

    Outra coisa é o seguinte… por mais justificativas que tenha, por mais dura e injusta que seja a vida, por mais “vítima da sociedade” que a pessoa seja – a partir do momento em que se pega em armas para assaltar, roubar, estuprar, proteger boca de fumo… o sujeito se torna um bandido, um inimigo da ordem, da paz e da estabilidade da sociedade. E nesse momento a polícia deve agir.

    O papel do policial é prender e não matar, nem torturar. Concordo plenamente. É muito perigosa a ideia de um estado onde as forças militares agem como juízes e carrascos. Porém, como podemos imaginar, não deve ser tão simples dar voz de prisão a um camarada entocado no morro com uma AR-15 a tiracolo.

    No texto flertei com o prazer de matar que o policial sente. Isso é algo que discordo. Não deveria ocorrer tal sentimento no policial… o gatilho só deveria ser puxado por necessidade, não por gosto.

    No filme, existe a questão da tortura. Os fins justificam os meios? Com o sangue frio podemos cravar que não, que é um absurdo e tal. Mas e se fosse um familiar nosso preso em cativeiro? Eu arrisco dizer que se um bandido que soubesse o paradeiro desse meu familiar fosse capturado, eu arrancaria até a última unha e daria uns bons choques nele, até que revelasse a localização. Isso é uma atitude pessoal, claro, baseada em emoções e sentimentos. O Estado deve ser “frio”. Mas acho que esse exemplo pode ilustrar o quanto nossos pontos de vista podem ser relativos.

    Sejam quais forem os motivos, desafortunadamente, mais cedo ou mais tarde haverá troca de tiros, etc. entre a polícia e os bandidos (como nas brincadeiras que fazíamos quando criança, mas com balas de verdade). E nessas ocasiões eu confesso que não tenho pena alguma dos traficantes, assassinos, estupradores, etc. que eventualmente morram no conflito.

    Boa parte da inspiração original desse texto foi o vídeo abaixo. Para quem quiser ver a “consciência social” dos traficantes na vida real (é apenas uma gravação telefônica, não tem imagens):

    https://www.youtube.com/watch?v=m0XjOWWHalY

    Saudações.

  11. rubemcabral
    4 de novembro de 2014
    Avatar de rubemcabral

    Excelente texto: muito bem ambientado, com certo humor negro e crítica social. Bacana a narração do “caveira”: “casa” bastante bem com a ideologia de extrema-direita do filme que serviu de inspiração.

    Acho que não se deve cobrar ou penalizar o conto por isso (as ideias de ultradireita). O texto é uma espécie de spin-off do Tropa de Elite e, por isso, ficou muito fiel ao filme, incluindo gírias do tráfico e muito mais.

    • Roberto Nacimento
      4 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Caveira, meu capitão!

  12. Victor Gomes
    3 de novembro de 2014
    Avatar de Victor Gomes

    Cara, de longe, o texto mais bem escrito que li até agora nesse concurso. Contudo, faço das minhas palavras a do Eduardo Selga, o primeiro a comentar esse texto. É perigosa a adoção dessa ideologia superficial e truculenta.

    Você narrou muito bem, de uma forma atraente, e deu a profundidade adequada a cada personagem. Até o modo de falar do narrador casou bem com a sua natureza, embora eu não curta muito o linguajar chulo, pois, pra mim, é uma forma de querer “chocar” a sociedade, o que não é objetivo da arte.

    No entanto, eu estranhei o enredo. Achei muito repentina a decisão do capitão em matar um inocente, entrou totalmente em conflito com a natureza da personagem. O remorso que surge posteriormente mostra esse conflito, mas de uma forma atrasada e, a meu ver, incoerente com um profissional que é treinado para odiar o bandido, não o inocente.

    Além disso, a narração meio ficcional não faz sentido. O capitão não ouviu a história do trocador, mas a narrou inteiramente. Ou ele inventou (o que ressaltaria a falta de escrúpulos do capitão, mas não faria sentido com o remorso dele), ou ele “misticamente” soube, o que é incoerente.

    • Roberto Nacimento
      4 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Victor,

      Aqui o linguajar chulo foi usado no intuito de trazer verossimilhança, não de chocar. Poderia trocar muitas palavras por expressões mais “light”, deixando o conto mais palatável, porém acredito que com isso perderia em ambientação. E também em honestidade enquanto autor, pois estaria moldando meu texto ao que sei ser preferência do público (textos mais “limpos”).

      Sobre a decisão do Capitão… de forma alguma ele odiou o inocente (Lorival). Tampouco sentiu prazer em apertar o gatilho. Ele só tomou aquela atitude por ter notado que a vida daquele homem já havia acabado – os olhos denunciavam isso e o próprio pediu para morrer. O capitão deu um tiro de misericórdia, uma “morte limpa de soldado”, como se fizesse um favor ao homem. Porém essa atitude teve um preço em sua consciência. As histórias que inventa à noite são tão somente uma válvula de escape, uma maneira de tentar entender o que poderia levar um homem a pedir para morrer daquela forma.

      Saudações.

  13. Eduardo Selga
    1 de novembro de 2014
    Avatar de Eduardo Selga

    André Luiz,

    Desculpe-me, mas vou defender a escolha narrativa do autor. Não é nenhum absurdo sua onisciência porque muito do que ele narra não são “fatos’, e sim ficcionalizações suas para justificar seu ato, conforme pode-se observar no final: “[…]recordo do trocador cativo no barraco de um traficante graduado e FICO INVENTANDO HISTÓRIAS pra entender como ele foi parar ali. HISTÓRIAS PRA JUSTIFICAR justificar tamanha desesperança no olhar. Pra justificar meu dedo no gatilho e os miolos do Lorival, que eu deixei espalhados naquele quarto imundo”.

  14. Andre Luiz
    1 de novembro de 2014
    Avatar de Andre Luiz

    Primeiramente, meus critérios complexos de votação e avaliação:
    A) Ambientação e personagens;
    B) Enredo: Introdução, desenvolvimento e conclusão;
    C)Proposta: Tema, gênero, adequação e referências;
    D)Inovação e criatividade
    E)Promoção de reflexão, apego com a história, mobilização popular, título do conto, conteúdo e beleza e plasticidade.
    Sendo assim, buscarei ressaltar algumas das características dentre as listadas acima em meus comentários.
    Vamos à avaliação.

    A) Os personagens são bem construídos pelo que percebi. Houve um trabalho minucioso em sua elaboração. Contudo, Jaqueline é o ápice e sem ela, a história poderia até mesmo ficar sem seu brilho. (Óbvio que o enredo teria que ser mudado, porém em meu ver Lorival não é lá tão brilhante quanto a garota.) O Capitão nascimento é também outro ponto a se comentar: Sua perspectiva parece demasiadamente forçada; ao passo que os palavrões complementam a obra, o policial do Bope entra na trama como narrador, porém é onipresente e onisciente, algo que não é cabível em narrador personagem.

    B)Então, curiosamente ao contrário da maioria das pessoas que comentaram aqui, achei um erro extremamente forte ao meu ver na produção do conto: Como já salientei, o narrador personagem não deve ser onisciente e onipresente, como nos foi apresentado. Fora isto, a introdução, o desenvolvimento e o clímax do texto são excelentes e a trama é bem amarrada, tirando as falhas que apontei.

    Considerações finais: Além de Jaqueline, a figura dos sequestradores é extremamente bem construída, porém o holofote dado a Lorival desencanta um pouco, visto que parece que é um personagem sem possibilidades de sustentar o papel principal. Todavia, não retiro os méritos do autor. Quem sabe recompor Lorival psicologicamente e refazer o problema do narrador personagem não resolva os problemas que eu achei? Parabéns pelo conto e sucesso no concurso.

    • Maria Santino
      1 de novembro de 2014
      Avatar de Maria Santino

      Hey, posso?
      Luiz, há uma outra forma de visão interessante mencionada aí embaixo no comment da Agnst, mas, fora isso, me prendi no que você disse: o narrador personagem não deve ser onisciente e onipresente. Sabe, no romance “Morro dos Ventos Uivantes”, a trama é narrada pela empregada, e ela descreve tudo dos personagens, sentimentos, ambientes, conflitos… As obras literárias e escolhas narrativas são um caso a parte.

    • Roberto Nacimento
      4 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Andre,

      Sobre esse ponto do narrador personagem, existe uma justificativa na história para amarrar essa ponta. É uma frase curta no meio de 4.000 palavras, mas está lá – o capitão estava inventando parte da trama (contando a história para ele mesmo durante a noite insone).

      Ademais, concordo com o ponto de vista da Maria Santino. Mesmo que não houvesse essa explicação, acredito que o autor não deva se prender tanto a essa coerência do narrador (é o mesmo caso, por exemplo, de quanto o personagem que está narrando morre no final e deixa a questão – “então ele estava narrando no mundo espiritual?” hahahaha).

      No próprio filme Tropa de Elite o capitão narra eventos em que não estava presente.

      Agradeço pelo comentário.

      Saudações.

  15. Pétrya Bischoff
    27 de outubro de 2014
    Avatar de Pétrya Bischoff

    Cara, teu texto é extremamente intimidador, senão invasivo! A narrativa é excelente e remete muito ao próprio Capitão Nascimento.
    A ambientação está de parabéns, todos aquele calor e abafamento e degraus infinitos me puseram na favela. Odiei inda mais os traficantes e o estupro foi como um grito gutural saindo de nossa alma… Mesmo na hora do “microondas” não me senti tão mal quanto no estupro.
    Também gostei da reação do Lorival ao pedir para morrer. E, obviamente, o Caveira ficaria com o peso de todas as almas que tirou.
    Muito bem desenvolvido, escrito e narrado.
    Está de parabéns, boa sorte.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  16. GARCIA, Gustavo
    27 de outubro de 2014
    Avatar de Gustavo de Andrade

    Achei genial.
    Você conseguiu construir os personagens/cenário e a narrativa de uma forma extremamente semelhante, o que foi muito louvável e acho ser o objetivo de qualquer escritor. Não perdeu a pose (quase) em nenhum momento! E a sacada do “homens de preto” no final foi muito foda, pela constatação da insanidade do Lorival, de tudo. Muito bom!
    Se teve uma coisa que me deixou com a pulga atrás da orelha foi o que o capitão fez. Porque se ficou com peso na consciência é porque se arrependeu, ok… mas ele tomou a decisão de um jeito muito instintivo, sem se importar aparentemente, pra convencer esse peso na alma que ele ficou, sabe? Me pareceu que “garoteou” muito pra um capitão supostamente experiente.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Gustavo!

      Agradeço pelo “genial”, extremamente generoso da sua parte.

      Sobre a pulga atrás da orelha… bem, aqui só posso dar minha interpretação pessoal para o fato. Acredito que as pessoas que lidam com situações estressantes com o tempo vão ficando mais “frias”. No caso dos policiais, a segunda morte não pesa tanto quanto a primeira. A terceira é mais leve que a segunda e assim por diante. Dessa forma, como você bem observou, esse peso na consciência não condiz com a experiência do capitão.

      Porém, (aqui é uma teoria minha) eu acho que todos nós temos um evento capaz de desenterrar a humanidade que foi se perdendo com os anos de repetição de uma rotina. Um evento que é a tal “gota d’água”.

      No filme (o primeiro), ocorre um evento desses. Depois que a mãe do fogueteiro (que o BOPE havia abandonado à própria sorte no dia anterior) vai à delegacia pedindo para que eles encontrassem o corpo do filho para que ela (mãe) pudesse ao menos enterrá-lo, o Capitão Nascimento tem uma crise de consciência e vai até o morro, impulsivamente, tentar encontrar o rapaz (e é aí que, naquelas grandes coincidências do cinema, conhece o Neto e o Matias hahahaha).

      Enfim, aqui tentei retratar a morte do Lorival como algo similar.

      Mais uma vez agradeço a leitura e o comentário.

      Faca na caveira!

  17. JC Lemos
    26 de outubro de 2014
    Avatar de JC Lemos

    Faca na caveira, mano!
    Bom, muito bom. Bem narrado e o enredo foi bem desenvolvido. Utilizou o espaço com eficiência e criou uma história bem real. Eu sempre estranho essa narração com gírias e tudo mais, mas ficaria fora do contexto se não tivesse as daqui. O que mais me chamou a atenção foi a construção dos personagens, que ficaram muito bem definidos.

    Ficou muito bom mesmo. Parabéns!
    Boa sorte no desafio!

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira, meu capitão!

  18. Douglas Moreira
    25 de outubro de 2014
    Avatar de Douglas Moreira

    São 50% narração e os outros enredo.
    Os da narração, sinceramente, não gostei. Uma vez que gosto da poesia que permeia as palavras, a apreciação, e neste, não vi. Os palavrões tiraram isso. Mas percebo que você é um grande narrador. Uma pena que o tema pedia isso.
    Já os 50 do enredo… Você os atingiu maestralmente, a história ficou muito boa. Jaqueline, a morte dela, e a desesperança do pai, gostei muito, muito mesmo. O enredo ficou excelente.
    Parabéns. Boa sorte!

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      50% caveira! hahahaha

  19. Eduardo Selga
    25 de outubro de 2014
    Avatar de Eduardo Selga

    Roberto Nascimento,

    A ideia das cervejas, gostei tanto dela que nesse momento em que escrevo saboreio uma Devassa. Bem gelada.

    Quando você diz que se sente, no ato de escrever, “um ator interpretando”, isso toca num dos temas que mais me intrigam: o processo criativo. Há diversos caminhos seguidos, conforme a subjetividade do autor, uma espécie de cartilha e gramática individuais. Isso deixa rastros no próprio texto, o chamado estilo. Os que fazem como você costumam construir enredos realísticos, preocupados com uma aproximação ficção-realidade. Nada contra, por certo (todo processo criativo é válido), desde que o estereótipo na construção dos personagens e o clichê na trama não falem alto.

    A respeito do contraponto à ideologia e sua consequente transmissão via textual, sim, o modo como você entendeu foi o que eu pretendi dizer.

    Entretanto, quanto ao fato de ele, personagem, ser um contraponto “por si só”, em função de seu comportamento, isso depende muito da recepção textual. Para aquele leitor mais atento, e mais sensível ao não-dito, esse contraponto é captado. Mas isso não ocorre com os leitores que enxergam apenas o “visível”. Nesse último caso, a chance de serem “capturados” pela ideologia é razoável, pois ela adentra sub-repticiamente.

    Quando o personagem é caricato, normalmente escapando aos padrões realísticos, o que eu disse acima muda um pouco. O Hitler de Chaplin, em “O Grande Ditador”, por exemplo, é um discurso contra o autoritarismo. Afinal, o deboche e o riso têm o poder de ridicularizar ideologias. O seu personagem, intencionalmente “colado” no Capitão Nascimento, não é caricato e é realístico. Mas é um “realístico” construído pela mídia e pela estética do cinema comercial de entretenimento, portanto carregado de estereótipos e clichês.

    • Roberto Nacimento
      4 de novembro de 2014
      Avatar de Roberto Nacimento

      Eduardo,

      Finalmente consegui parar um pouco e abrir a minha gelada!

      Começando pelo final do seu comentário – sobre o personagem ser carregado de estereótipos e clichês. Bom… esse personagem é, evidentemente, uma cópia do Capitão Nascimento do filme (um pouco adiantado no tempo, como bem observou o amigo Felipe Moreira, mas, ainda assim, uma cópia). Aqui não tive espaço para trabalhar todas as nuances da personalidade do Roberto Nascimento, mas acho que, na medida do possível, consegui ser bastante fiel ao filme. E o Capitão Nascimento do cinema, provavelmente devido à interpretação magistral do Wagner Moura, me pareceu um personagem extremamente crível. Respeito a sua opinião (sem demagogia, seus comentários estão sempre entre os mais aguardados), mas, honestamente, não consigo ver todos esses estereótipos e clichês mencionados.

      Entendi o seu ponto sobre os personagens realísticos, onde a sensação de “pregação” de uma ideologia fica mais acentuada. Em um personagem mais caricato, como o de Chaplin, a ironia fica mais visível (salta mais aos olhos do público) – o tal contraponto em si mesmo.

      Porém, aqui vai uma questão para estimular o debate: o autor não estaria de certa forma subestimando o leitor ao “mastigar” muito as coisas (salientar certos aspectos do personagem como ironias, por exemplo). E ainda – mesmo com contrapontos e personagens mais caricaturizados, ainda não se “corre o risco” do leitor não captar a ideia?

      Vou usar um exemplo pessoal – li duas vezes a série Watchmen, do Alan Moore. (Que, aliás, é sensacional). A primeira com 15 anos e a segunda aos 30, aproximadamente. Na leitura que fiz durante a adolescência, achei fantástico o personagem Rorschach… considerei-o um tipo de Paladino, a expressão máxima da justiça. E recordo que à época, meus amigos tinham a mesma visão. Na segunda leitura continuei achando-o fantástico como personagem, mas muitos detalhes de sua personalidade revelaram-se diante de meus olhos e eu já não concordava tanto com os métodos dele quanto da primeira vez. O personagem continuou sendo extremamente realístico (dentro do possível em um universo de super-heróis, é claro, hahahaha), foi minha visão de mundo que mudou.

      Com base nesse exemplo (poderia citar muitos outros), dou o meu ponto de vista sobre a questão que lancei – acho que o autor não deve subestimar o leitor e mastigar as coisas, tampouco se preocupar se o texto ou determinado personagem transmitirá ideologia X ou Y. Radicalizando um pouco, acho que o autor deve se ater apenas em contar uma história da melhor maneira possível e que cada leitor chegue às suas próprias conclusões à partir daí. No meu entender não cabe ao ficcionista a “tarefa” de doutrinar.

      Alan Moore errou ao não caricaturizar o suficiente o personagem para que meu “eu” de 15 anos pudesse compreendê-lo melhor? Os leitores poderiam ter assimilado a homofobia, sociopatia, etc. do Rorschach como coisas “boas”, devido à falta de percepção? Comigo não aconteceu (pois esses eram os aspectos que eu sequer conseguia ver), mas talvez com outros leitores tenha ocorrido. É “culpa” do autor? O músico que escreve uma música triste pode ser responsabilizado pelo adolescente que se mata após escutá-la um milhão de vezes? Devido ao risco de alguém se suicidar, apenas canções alegres devem ser compostas?

      Como dizem em South Park… são questões que eu não quero mexer nem com uma vara de 10 metros! hahahaha

      Saudações!

      • Eduardo Selga
        4 de novembro de 2014
        Avatar de Eduardo Selga

        Roberto Nascimento,

        Qual a referência que o escritor ou outro criador normalmente usa para montar um policial “linha dura”? Raramente é fruto de uma experiência pessoal. Essa referência chega a ele de fora, ou seja, pelos meios de comunicação e pelo largo histórico de personagens ficcionais com esse perfil. Ora, em ambos os casos, são narrativas. Mesmo um telejornal “imparcial” é uma narrativa. Isso implica dizer que existe, na escolha das palavras, das imagens e do discurso, uma orientação ideológica, um sistema organizado de ideias a partir do qual a realidade é traduzida. Assim, a enorme quantidade de policiais truculentos popularizados pela indústria cultural, obedece a um objetivo específico, não significa, necessariamente, que o padrão ideal de um policial eficiente seja a porrada, bem como não significa que, no caso do Brasil, a tropa seja formada majoritariamente por Rambos. Mas, não nos esqueçamos, qualquer discurso sempre é uma edição da realidade, assim sendo, o receptor do texto (escrito ou visual) tende a acreditar que esse comportamento é um padrão de excelência. Por isso, quando disse dos estereótipos, estava a me referir a essa repetição “ad nausean” do mesmo policial, que é, observe, muito conveniente ao modelo de pensamento que supõe que a voz discordante de uma “normalidade” institucional deva ser calada à força. Não à toa há um pessoal pedindo a volta da ditadura militar no Brasil. Quem são eles? Qual o perfil sociológico? O Capitão Nascimento é a reprodução, com sotaques brasileiros, de um sem-número de policiais similares produzidos por quem? Pelo grande espelho desse pessoal, os EUA. Por isso falei do estereótipo. Capitão Nascimento pode ser visto como o nosso Rambo, ou até o nosso Capitão América, se levarmos em consideração os códigos narrativos do super-herói.

        Claro, em se tratando de recepção textual, não se pode falar de apenas um modo de captar a narrativa. Entretanto, quase sempre existe uma recepção majoritária, que se sobrepõe às outras. E normalmente é o próprio escritor quem “manipula” o leitor, conduzindo sua percepção para esse ou aquele lugar. Para essa “manipulação” um recurso bastante usado é, de novo, o estereótipo. Se eu, desde o início do texto, percebo que o personagem é uma releitura de Capitão Nascimento, a chance de eu estar predisposto a entendê-lo como alguém truculento é grande. E é possível perceber o efeito desse jogo quando nos damos conta de que alguns comentaristas disseram ter visto o Capitão nas linhas. A Simoni Dario, por exemplo, disse que “[…] tive a impressão de ouvir a voz da narrativa do próprio Capitão Nascimento […]”. Claro: é o Capitão Nascimento, e também outros tantos personagens similares que serviram de forma. Na indústria cultural é assim: fabrica-se personagem em linha de montagem, como faz um revólver.

        Considerando o que disse sobre a recepção, mesmo o texto mastigado (que não raro é esteticamente pobre) não garante uma única leitura. Há uma quantidade enorme de variáveis nesse processo. A famosa cena de “O Grande Ditador”, de Chaplin, aquela em que o personagem, lembrando muito Hitler joga para lá e para cá o globo terrestre como se fora seu brinquedo, é majoritariamente lida como um protesto contra o autoritarismo. Mas há outras leituras possíveis, como o fato de aquilo ser, na verdade, menos que um protesto, um elogio estético a uma nova forma de dominação do mundo pelo capitalismo, pois a partir daquele evento histórico (a Primeira Guerra), o capitalismo reorganizou-se e passou a ver o mundo “de fora”, ou “de cima”, e todos os Estados nacionais são até hoje considerados quintais do Grande Império.

        O leitor, municiado com leituras prévias e conhecimento de mundo, bem ou mal armado, terá uma interpretação do texto ficcional lido, mas, ao contrário do que a ilusão iluminista prega, ele não chega “às suas próprias conclusões”. As conclusões às quais ele atingir serão, quase sempre, frutos de manipulações do autor. E ele mesmo, leitor, faz parte de uma grande narrativa (o meio social), da qual ele é personagem. Assim, ele estará condicionado a esta ou aquela conclusão, a depender de várias variáveis. Então ele é um boneco? Não. O leitor traz em si um repertório que não produziu, chegou até ele via leituras e convívio social. A partir daí, ele constrói hipóteses, etc.

        O escritor sempre doutrina. Evidente, pois se ele escreve um discurso, ficcional ou não, ele quer de algum modo convencer o outro de alguma coisa. Ou não? Você, quando escreveu as respostas não quis me convencer de nada? O que ocorre é que o senso comum (também por uma orientação ideológica) considera que “doutrinar” é apenas divulgar explicitamente uma ideologia, como no texto ficcional com ares panfletários (porta aberta para a má qualidade estética). Ora, a melhor maneira de convencer alguém de alguma coisa é quando ela não se dá conta disso, ou seja, subliminarmente. Olha a manipulação da mídia aí. Sob uma capa de “imparcialidade”, o autor consegue naturalizar e reforçar a ideologia dominante, como por exemplo, exaltar a truculência da polícia contra uma camada específica da população (você nunca ouviu falar que a tropa de elite estadual invadiu os prédios de Copacabana e desceu a porrada nos filhinhos de papai que sustentam o tráfico dos morros, não é mesmo?).

      • Roberto Nascimento
        5 de novembro de 2014
        Avatar de Roberto Nascimento

        Eduardo,

        Com o texto não quis convencer, tampouco doutrinar, ninguém a nada.
        Eu não consigo convencer nem meu cachorro a fazer xixi no jornal! huahuahuauha

        Só quis contar uma história e despertar reflexões e emoções no leitor. Essa sobre o porquê da tropa não invadir os condomínios e descer o cacete nos filhinhos de papai que financiam o tráfico é uma ótima, por exemplo. (No filme essa questão é abordada). Agora, não ter falado sobre isso não implica que eu esteja pregando a ideologia que é legal a polícia invadir a favela com truculência e tal.

        Nos comentários, estou no máximo tentando convencer as pessoas a encarar esse texto como o que ele é – uma obra de ficção, inspirada no filme Tropa de Elite! E julgá-lo pelo mérito literário, não por questões ideológicas.

        Em resumo… estou tentando convencê-los a me dar uma nota boa! hahuuhahuahuaha

        Saudações!

  20. Anorkinda Neide
    25 de outubro de 2014
    Avatar de Anorkinda Neide

    Com o comentário da Claudia, lembrei de minha mãe… senhorinha idosa já, foi obrigada pelo meu irmão a assistir o filme Cidade de Deus.. depois de terminado, madrugada já e ela assistindo televisão: – Mãe, pq não vai dormir? – Quero tirar aquela negrada toda da cabeça… (ela nao era racista, mas o termo veio, o que a atingiu mesmo foi a violencia e o tipo de seres humanos que foram ali retratados).
    Nos que temos a sorte de não viver neste tipo de ambiente, ficamos, sim, chocados com a crueza da vida que essas pessoas levam…
    Enfim, sabes, autor, que puxastes a polêmica pelo pé, pq todos os filmes deste filão, assim o fazem, muito bom ver que estás abertos a todas as reflexões levantadas.
    Mas falando do conto em si, está formidável… tb gosto de encarnar personagens e eles vem com tudo e quando encontram um porta-voz competente como vc, só fazem a festa! Parabens!

    O final inteligente e inusitado acaba por amenizar as cenas cruéis que poderiam perseguir o leitor por muito tempo.. obrigada por isso.. rsrsrs

    Abração

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Anorkinda!

      A resposta da sua mãe quase me fez encher o monitor de coca-cola… estava tomando refrigerante enquanto lia e segurei a gargalhada por pouco hahahahaha

      Fico contente que tenha gostado. 😀

      Abração!

  21. Felipe Moreira
    25 de outubro de 2014
    Avatar de Felipe Moreira

    O texto é impecável ao se passar como um spin-off ou fanfic do Nascimento nos tempos de capitão do Bope, embora esse período ainda seja final dos anos 90, início dos anos 00. O conto se passa nos nossos dias – Nascimento já exonerado-, a julgar pelo uso das redes sociais mencionadas.
    Assim como a maioria, eu li com a voz do Wagner e devo dizer que você atingiu a perfeição ao trazer a narração dele, as gírias, o tom, a sua postura ideológica. E o ponto importante é que em nenhum momento o autor demonstrou se concorda ou não com esse pensamento do capitão, mantendo-se imparcial do que demonstra ser um senso comum no Brasil.

    Obviamente que o pensamento do narrador é completamente oposto ao meu, mas o texto é muito bom dentro daquilo que ele se propôs a dizer, tal qual o filme.

    E não posso deixar de parabenizar pela ideia de transformar tudo isso numa ficção pessoal do narrador, uma tentativa de justificar o seu ato naquela noite. Eu vejo que seu trabalho foi primoroso porque todo o conceito de moralidade do Nascimento foi perfeitamente construído dentro dessa ficção que ele mesmo criou para entender a vontade de morrer do Lorival e o “favor” que ele fez com tamanha facilidade, como se ele estivesse libertando o sujeito de uma realidade fodida. Um cara comum, que vive uma vida difícil e é destruído, humilhado pelos bandidos malvados. Assim seria muito mais fácil pro Nascimento lidar com sua postura durante as operações em que ele foi treinado e educado para matar e não prender.

    Dentro do tema, o texto ficou acima da média. Parabéns pelo trabalho e boa sorte no desafio.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira, meu capitão!

  22. Jefferson Reis
    25 de outubro de 2014
    Avatar de Jefferson Reis

    A narrativa me irritou do início ao fim. Exceto o primeiro parágrafo, claro.
    Detesto palavrões, argh! Detesto descrições de violência, essa coisa tão explícita.
    Veio daí o nó na garganta. Quase chorei com a morte da Jaqueline, senti a vergonha e a humilhação de Lorival. Toda aquela dor…

    Sem dúvidas, o autor do conto é um grande escritor e merece meus parabéns.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Jefferson!

      Acho que a grande “missão” de um escritor é despertar emoções nos leitores, mesmo que não sejam muito agradáveis, como você fez com muita competência no ótimo “Mal Du Siècle”.

      Seu comentário me deixou com a sensação de “missão dada, missão cumprida!”.

      Caveira!

  23. Fabio D'Oliveira
    24 de outubro de 2014
    Avatar de Fabio D'Oliveira

    Opa, capitão, tudo certo contigo? Não vou enrolar, indo direto pra análise.

    TEMA: Encaixou-se. A história de Lourival descrita pelo capitão do BOPE lembrou o filme. E poderia muito bem ser um spin-off. Queria saber a identidade do narrador, mas esse mistério pode ser bom, dependendo da situação, haha.

    TÉCNICA: Ótima. Gostei bastante da narrativa, principalmente no início. Poesia é algo que adoro e o primeiro parágrafo ficou excelente. A ideia de fazer exatamente o contrário do que se espera pode dar certo. E eu arriscaria um conto com esse tema sob o ponto de vista poético. Porém, mesmo com a mudança, ficou muito bom.

    ENREDO: Bem construído, mas não impactou. Os personagens possuem Verossimilhança. Não gostei muito de uma coisa. Dá a entender que o narrador não sabia muito da história. Então, por qual motivo ele consegue descrever tudo com muitos detalhes? Conclusões próprias? Sei lá, ficou estranho, muito estranho. E qualquer explicação não irá tirar a estranheza dessa situação. Sinceramente, foi uma grande falha no desenvolvimento do texto, em minha opinião. Mudando o final, com o Lorival vivo, poderia mudar a minha visão sobre essa situação.

    PESSOAL: Gostei da leitura, mas não muito da história. Sou um romântico, por isso, procuro beleza poética em tudo. O texto está muito bom e agradará aqueles que gostam do estilo.

    Senhor Roberto, parabéns pelo texto. É um escritor competente.

    Boa participação no concurso.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Fabio!

      Nietzsche diz que há sempre um pouco de loucura no amor, mas também há sempre um pouco de razão na loucura.

      Escrevi isso para embasar o raciocínio de que “há sempre um pouco de beleza e poesia nas palavras torpes”, mas percebi que não tem muito a ver… hahahaha
      De qualquer forma, não consegui lembrar de uma citação mais apropriada, então vou deixar essa aí mesmo (o velho Friedrich nunca é demais :D).

      Bom… mais de uma pessoa “reclamou” do final, então percebo que realmente é um ponto que preciso deixar mais claro numa versão final desse conto.

      Você disse que nenhuma explicação vai tirar essa estranheza, mas tentarei ao menos amenizá-la. 😀

      @@@

      [Trecho do penúltimo parágrafo]:
      “Às vezes acordo de madrugada, recordo do trocador cativo no barraco de um traficante graduado e fico inventando histórias pra entender como ele foi parar ali.”

      @@@

      [Copiando parte da resposta que dei à colega Sonia, sobre o mesmo assunto]:

      Ele (narrador) está inventando parte de uma história. A história que ele sabe que realmente aconteceu é do momento que o BOPE sobe o morro para frente. Toda parte do Lorival ser mulherengo, da Jaqueline ter sido estuprada e morta por vingança do traficante, etc. foi uma “reconstituição” feita pelo Capitão, para tentar entender o porquê do Lorival ter parado ali naquele cativeiro.

      Não é mencionado no texto, mas ele como Capitão poderia ter acesso posterior a algumas evidências, do tipo – celular do Lorival (com N mensagens de whatsapp de diferentes mulheres… talvez até com mensagens da filha do Fernando Onça – na verdade há uma pequena “pista” sobre isso quando é falado sobre o whatsapp), confirmação de que a ossada que estava no “micro-ondas” era da filha do Loriva, informação de que a filha do traficante morreu num hospital em decorrência da hemorragia causada por um aborto mal feito, etc.

      Isso poderia ajudar a recriar algo mais próximo da realidade nessa história inventada que ficava lhe tirando o sono. Ou… pode ser que ele simplesmente criava uma hipótese diferente a cada dia.

      Olhando meu texto da posição de leitor, encararia mais pela primeira opção (do policial tendo acesso às evidências e, assim, conseguindo pelo menos as peças do quebra-cabeça). Mas, de qualquer forma, esse detalhe sobre o “processo de criação” do policial não tem muita relevância para a trama. O que pesa mais é o fato de que ter matado um civil naquelas condições (pedindo para morrer, com o olhar completamente desolado), acabou sendo um tipo de “gota d’água” para o policial tão acostumado a matar.

      @@@

      Espero que ao menos tenha tirado a impressão de “furo na trama”.

      Caveira!

  24. Leonardo Jardim
    24 de outubro de 2014
    Avatar de Leonardo Jardim

    Adorei a ruptura entre o primeiro e o segundo parágrafo. O narrador é fantástico em sua própria forma de ver o mundo, seus comentários ácidos e análise da situação. Ao contrário de alguns aqui, eu entendi que ele é um personagem criado pelo autor (na verdade um Cap. Nascimento). Aquela é a visão dele de tudo e, claro, uma visão deturpada, mas muito bem descrita. Fiquei apreensivo, indignado e enjoado com o desenrolar do conto. Roí minhas unhas, como vendo um filme. E gostei muito do final, quando dá a entender que tudo aquilo não passou da imaginação do narrador. Enfim, gostei muito. Parabéns!

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  25. Daniel Vianna
    24 de outubro de 2014
    Avatar de Daniel Vianna

    Quando comecei a ler aqueles trechos poéticos do primeiro parágrafo, pensei: ‘ok, lá vem aqueles textos sem senso de adequação ao tema’, já que se tratava de um conto sobre violência. E eis que, de repente, vem a porrada. Achei a narrativa realista e irretocável. A história envolveu. Show de bola.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira, meu capitão!

  26. Cácia Leal
    24 de outubro de 2014
    Avatar de Cácia Leal

    Adorei o texto. O primeiro parágrafo prometia, mas, com a mudança de linguagem, cheguei a pensar que tomaria outro rumo. Gostei do efeito. As gírias e palavrões são parte do contexto. A trama é criativa e o texto foi muito bem escrito. Só achei que, no final, o Caveira matou o cara muito rápido e, se todos os bandidos foram mortos, com a morte do trocador, como o Caveira pode narrar a história com tantos detalhes???? Não houve tempo de o trocador contar-lhe o que se passara. Talvez fosse melhor rever esse final. Mas o conto está excelente! Parabéns!

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Cácia Leal

      Agradeço a leitura e fico feliz que tenha gostado.

      Sobre a questão do final, realmente não havia tempo hábil para que a história fosse contada. Mas isso está explicado nos últimos parágrafos:

      “Às vezes acordo de madrugada, recordo do trocador cativo no barraco de um traficante graduado e fico inventando histórias pra entender como ele foi parar ali”

      A ideia é que o capitão não sabia toda a história. Talvez posteriormente ele tenha tido (nossa, “tenha tido” é horrível, né? hahaha) acesso a mais evidências do caso, por exemplo: celular do Lorival, identificação da ossada da Jaqueline, etc. e com isso foi montando um quebra-cabeça… mas a história “real” mesmo, nunca saberemos como foi. 🙂

  27. Roberto Nascimento
    24 de outubro de 2014
    Avatar de Roberto Nascimento

    Saudações, Eduardo

    Primeiramente agradeço pelo seu comentário, muito atencioso como de costume.

    Gostaria de debater algumas questões levantadas.

    @Eduardo Selga: “Fico me perguntando se o autor pretendeu ser fiel a esse tipo de filme ou se, ao repetir alguns estereótipos, tentou reproduzir realisticamente o que imagina ser a verdade desse submundo”.

    R: Um pouco dos dois. Eu estava com a espinha dorsal desse conto na cabeça (bem antes de ser lançado o desafio), mas a princípio ele não teria nada a ver com Tropa de Elite – narraria a captura do Lorival pelos traficantes, sem intervenção da polícia. Provavelmente o conto terminaria parecido com “O Poço e o Pêndulo” (que, aliás, foi o insight para a trama), de Edgard Alan Poe, com uma facção rival atacando os traficantes e deixando o Lorival “livre”.

    Porém, mesmo que seguisse essa linha (sem a presença da polícia), não teria como deixar de me basear em Tropa de Elite, Cidade de Deus e similares para construir a ambientação, afinal, essa é a referência que tenho desse “submundo” e é uma imagem que já faz parte do imaginário popular. Imagem essa reforçada por Datenas e Cidades Alertas da vida.

    Quando surgiu o tema do desafio, me veio a ideia de pegar essa história e encaixar no contexto de Tropa de Elite. Comecei o primeiro parágrafo imaginando que todo o texto ficaria em 3º pessoa (um narrador “imparcial” no caso), mas daí veio aquele estalo “Por que não narrar como o Capitão Nascimento narra o filme??”.

    Então assisti (novamente) o primeiro Tropa de Elite e tentei ser o mais fiel possível àquela narrativa/ambientação. Nesse momento, não tive mais a opção de ser imparcial… tive que mergulhar na persona do policial e contar a história o melhor que pude dentro desse ponto de vista.

    @Eduardo Selga: “Temos, por exemplo, um discurso em favor do Estado policialesco, seguindo a Lei de Talião (olho por olho, dente por dente)”.

    R: Quem menciona “Olho por olho” é o traficante.

    @Eduardo Selga: “Temos a misoginia (‘o Lorival tinha o mais perigoso de todos os vícios – mulher. E lógico que acabou se fodendo por causa disso’), em que a mulher é posta como um mal em si mesma e como objeto usufruto sexual”

    R: Não havia encarado a questão por esse lado. Quando escrevi (na perspectiva do policial), quis dizer que ficar paquerando todas as mulheres é perigoso porque uma hora o sujeito está arriscado a mexer com mulher que “já tem dono” e acordar com a boca cheia de formiga. E aqui posso falar com conhecimento de causa, pois essa é uma realidade da periferia que eu já vi acontecer de perto…

    @Eduardo Selga: “Temos a desumanização do outro, excelente ferramenta para justificar todo tipo de arbitrariedade”

    R: Ótima observação. Foi um dos pontos que coloquei propositalmente no texto para fomentar o debate sobre o modo do policial ver o mundo.

    @Eduardo Selga: Temos a depreciação da cultura nordestina, quando o personagem Paraíba é provocado

    R: Aqui também foram os traficantes (embora dentro da história criada pelo policial). Tentei trazer um pouco de verossimilhança ao convívio dos bandidos… imagino que um fique tirando sarro da cara do outro, como em qualquer grupo de amigos. Agora, de maneira alguma tive intenção, como autor, de depreciar a cultura do nordeste.

    @Eduardo Selga: “Temos, no dois primeiro parágrafos, a ridicularização do pensamento humanista e da luta política situada no campo da esquerda”

    R: Em determinado momento do filme (já mais pro final), os estudantes fazem uma marcha pela paz (depois do casal da ONG ser morto pelos traficantes) e o Capitão Nascimento comenta – “Acho engraçado que quando policial morre ninguém faz passeata… toda vez que vejo essas marchas pela paz tenho vontade de ir lá e descer a porrada”.

    Acho que isso expressa bem o ponto de vista do PERSONAGEM a respeito dessas questões. Foi esse ponto de vista que eu trouxe para o texto.

    @Eduardo Selga: “Não existe discurso inocente. Ele sempre defende um campo de pensamento e, por consequência combate outro, e isso gera repercussões, mínimas ou em grande escala. Isso quer dizer que Literatura não é apenas a estética pela estética: há implicações ideológicas.”

    R: Concordo! Porém, acredito que não é porque o autor contou a história de um personagem que tinha “pensamento X” que ele (autor) concorde com o “pensamento X”.

    Se fosse assim, ninguém falaria nada sobre Hitler, sob pena de ser tomado como nazista.

    Na época do lançamento do filme Tropa de Elite, vi entrevistas do Padilha e do Wagner Moura (que é um conhecido militante do “pensamento esquerdista”) dizendo que não imaginava que a repercussão do filme se daria da forma que se deu (a população gostando de ver a polícia matar bandido), que a intenção original era mostrar a truculência policial e despertar reflexões sobre isso… resumidamente em outras palavras – expor o pensamento X, para defender o pensamento Y

    @Eduardo Selga: “é correto defender o texto literário ‘politicamente correto’? É correto aplaudir um discurso preconceituoso em nome da liberdade de expressão?”

    R: Realmente um bom assunto para ser debatido.
    Em um “cenário ideal” acredito que o que deveria ser levado em conta é o mérito literário. Afinal, em última instância, os contos aqui postados são obras de ficção, mesmo levando-se em conta que “Não existe discurso inocente”.

    Porém eu sei que é complicado não ser influenciado por nossas próprias convicções e não torcer um pouco (ou muito) o nariz ao nos depararmos com algo que vai de encontro a nossos princípios.

    Sobre defender textos politicamente corretos… sou totalmente contra. Se apenas textos dessa natureza fossem incentivados, perderíamos a oportunidade de ler excelentes obras como “Bonecas estupradas”, “Menina 2D”, “Planeta Peregrino”…

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Droga… escrevi num editor separado, copiei, colei e esqueci de apertar o link “Resposta”.

      Desculpe.

      Esse comentário é uma resposta ao primeiro comentário, do Eduardo Selga.

    • Eduardo Selga
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Eduardo Selga

      Roberto Nascimento,

      Obrigado pela atenção dispensada em suas respostas.

      O “politicamente correto” é um tema sempre em pauta em questões envolvendo a relação entre Literatura e sociedade, a respeito do qual não tenho opinião absolutamente fechada. De um lado, a criação literária exige liberdade, inclusive para a construção de personagens racistas, autoritários, etc. Por outro, ao construir tais personagens num terreno realístico (o que dá um tom de verdade), o autor, defendendo ou não tais ideias, pode estar contribuindo para a valoração positiva dessas ideias junto ao público, na medida em que no texto não haja um contra-discurso. Por isso disse não haver discurso inocente. Ele afeta, necessariamente. E uma suposta neutralidade (não sou eu, é o personagem) faz o jogo da força.

      Não obstante a defesa do que chamei de Estado policialesco se dar pelo traficante (o mundo do alto tráfico é um Estado dentro do Estado), e o preconceito contra dos nordestinos também, não há no texto a refutação, de modo que na recepção textual a ideia de defesa dessas teses é forte. Noutras palavras, diante do preconceito, se eu não o combato, eu o defendo, em alguma instância. Quem cala consente. É claro, a Literatura não é um discurso político, explicitamente, não é panfleto, carta de princípios, coisa assim, mas transmite, por meio da estética, alguma ideologia. Qual será transmitida, aí é com o autor.

      Nem o personagem nem o narrador são o autor, é correto. Correto se considerarmos num sentido absoluto, ou seja, um como cópia do outro. Mas, pergunto, é possível o total desvínculo? Conseguiria, por exemplo, um autor retratar realisticamente um travesti, sem os estereótipos do cinema e da mídia, se ele, autor, não tiver consciência que há nele o feminino (não que ele seja homossexual), como existe em todos os homens? (bem como na mulher habita o masculino). Narrador e personagem são, implicitamente, o autor em sua subjetividade. Assim, voltando ao conto, a capacidade de narrar convincentemente a estória a partir do ponto de vista de um personagem do cinema implica uma aproximação do autor com este personagem (no caso, o Capitão de Wagner Moura).

      Falando nesse ator, se ele conseguiu convencer tanto na pele de uma autoridade que acredita na violência como melhor ferramenta de “convencimento”, é porque em algum lugar de seu espírito habita alguém assim. Claro, essa construção foi facilitada pelos estereótipos de militares durões que a mídia divulga em filmes e teledramaturgia.

      Quando se constrói personagem a partir de estereótipos ocorre um fenômeno curioso: ele é real e bem construído para aquele público acostumado a uma representação estereotipada, que é a artificial simplificação de algo intrinsecamente complexo. Porém, para outro público, o mais próximo do fato, não é bem assim.

      Na verdade, o que parece estar em jogo, também, é a questão da “reapresentação em si”, ou seja, a ideia de que a construção literária fala sozinha, como se toda repercussão possível de um texto literário fosse apenas estética, e esta entendida como um limbo onde os males do mundo não penetram.

      • Roberto Nascimento
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Roberto Nascimento

        Caro Eduardo,

        É um grande prazer debater esses assuntos. Você levanta questões realmente muito interessantes: essa da personalidade do Wagner Moura, por exemplo… nunca tinha pensado nisso.

        Não sei se concordo com essa teoria, preciso pensar um pouco mais. Hedger Ledger por exemplo, teria um quê de psicopata para interpretar magistralmente o Coringa como interpretou? O contato com essa “face oculta” poderia ter sido aterrador e feito ele sucumbir na vida real?

        Viajando um pouco na maionese… talvez não tenhamos, todos nós, um pouquinho de cada coisa dentro da nossa personalidade? Como naquele ditado apache que surgiu em um conto nos desafios passados: “Tenho dois cães dentro de mim. Um é bom, o outro mau. Os dois brigam constantemente. Qual deles vence? Aquele que eu alimento…”. Não estou sugerindo que todos sejamos sociopatas, fascistas, ou revolucionários em potencial… mas que tenhamos ao menos uma leve noção de como seria essa personalidade, mesmo que bem diferente da nossa. Como você bem observou na questão do masculino/feminino.

        Vou escrever um comentário sobre algumas convicções pessoais após as eleições (não seria discurso político de forma alguma, mas… a mulher de César deve ser correta e parecer correta), mas só adiantando algo que escreveria lá – no meu processo de criação, eu “incorporo” os personagens. resumidamente, sinto-me um ator interpretando enquanto escrevo.

        Agora… estaria um lado obscuro do escritor/ator sendo inconscientemente liberto durante a produção artística?

        Uma questão que poderia ser melhor analisada com algumas cervejas geladas sobre a mesa! hahahaha

        Sobre o assunto dos preconceitos, agora tive a oportunidade de entender melhor o que você quis dizer. Não importa quem (o policial, o trocador, o traficante ou qualquer outro personagem) fez um comentário machista, por exemplo. Caso não exista um contraponto a essa linha de pensamento (alguém que conteste essa visão machista, resumidamente), o texto como um todo acaba transmitindo a ideologia machista.

        É isso mais ou menos? (Me corrija se eu estiver errado, por favor).

        Nesse ponto concordo parcialmente. Por exemplo, em obras de comédia (não é o caso aqui, claro) notamos muito a utilização do exagero de uma determinada ideologia para induzir a reflexão no espectador e consequentemente uma mudança de atitude, fazendo-o caminhar para o “outro lado”.

        Ilustrando (sendo extremamente simplista): imaginemos um personagem “machão”, totalmente exagerado em seu modo patriarcal de encarar o mundo. O exagero de um personagem assim levará às risadas e também, vez ou outra, à reflexão “putz… nesse ponto aí eu sou quase igual o cara que tá todo mundo dando risada”. Não é preciso, necessariamente, um contraponto à visão patriarcal do personagem… ele é o contraponto por si só.

        Nesse texto, coloquei algumas pequenas “armadilhas” para tentar obter esse efeito. Dois exemplos:

        – quando o policial diz que um bom soldado cumpre as ordens sem questionar.
        – quando o policial narra que “só não foi mais gostoso (matar)…”

        Ora, então não questionar é algo bom?
        Então é “gostoso” matar? E dependendo do jeito pode ser mais gostoso ainda? hahahaha

        São ideologias que eu, enquanto cidadão, não concordo e não apoio.

        Mas não era eu falando, era o Capitão Nascimento… ou, talvez… o pequeno sociopata que vive dentro de mim… 😀

        Saudações

  28. Lucas Rezende
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Lucas Rezende

    Caralho!
    Que história!
    Como meus colegas abaixo, li o conto ouvindo a voz do Wagner Moura.
    A história é grande, mas li rápido e sem o menor esforço. Me prendeu completamente. As cenas são chocantes, descritas perfeitamente. Me deu um enorme aperto no peito quando pegaram a Jaqueline.
    A escrita não tem o que falar.
    Parabéns Autor(a).
    Melhor conto que li até agora.
    Boa sorte!!!

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira, meu capitão!

  29. Fabio Baptista
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Fabio Baptista

    ======= TÉCNICA

    Perfeita dentro da proposta.
    Também li com a voz do Wagner Moura na cabeça e isso é ótimo!

    Meus mais sinceros parabéns.

    ======= TRAMA

    Encarei como um “spin-off” de tropa de elite, perfeitamente dentro da proposta do desafio na minha opinião.

    Achei muito boa: a ambientação, a abordagem dos temas, as reflexões que desperta. Justamente como o filme que o conto se inspira (aliás… os dois “Tropa de Elite” estão entre meus filmes preferidos de todos os tempos).

    Confesso que sou um dos “Capitães Nascimento” que aplaudiram, tanto o filme, quanto esse conto.

    PS: Apesar de excelente, não achei a trama genial. E só daria nota máxima para tramas que considerasse geniais, mas dessa vez vou abrir uma exceção, bonificando a ousadia de ter escrito algo que foge desse politicamente chato que impera hoje em dia. Faca na caveira!

    ======= SUGESTÕES

    Deveria ter abordado o lado homofóbico do Capitão Nascimento, para cutucar logo todos os ninhos de marimbondo de uma só vez! kkkkkk

    ======= AVALIAÇÃO

    Técnica: *****
    Trama: *****
    Impacto: *****

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Faca na caveira, hahaha!!! Gostei!

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Esqueci de comentar… até que enfim vi você dar uma nota boa! (São 5 estrelas no máximo, certo?)

      Aleluia! hahahaha

      • Fabio Baptista
        6 de novembro de 2014
        Avatar de Fabio Baptista

        Opa, Capitão!

        Só vi agora seu comentário, desculpe.
        Sim, são 5 estrelas no máximo.

        Impressão sua, vivo dando nota boa! Às vezes acho até que sou mão aberta demais kkkkkkkkk

        Abraço!

  30. Maria Santino
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Maria Santino

    Ops, ESDRÚXULO* (comentário via cel., não fica em resposta)

  31. Claudia Roberta Angst
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Claudia Roberta Angst

    Li o conto com a voz do Wagner Moura na cabeça. Assisti ao filme a pedido da minha sobrinha que então completava 15 anos. Por coincidência, hoje, ela faz 22 anos. Sete anos… Parece praga cabalística. Não é o tipo de narrativa que me agrade, mas tem aquele quê fascinante e nauseante. A gente quer largar a leitura, mas não consegue. Sendo mulher e mãe de menina, ler sobre tanta maldade, ódio e preconceito, é ainda mais difícil. Não gostei, mas tenho de admitir que o conto está muito bem escrito e escorre o talento do autor. Espero apagar logo essas imagens da minha mente. Quero esquecer, mas merece uma boa nota. Boa sorte!

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Claudia

      Agradeço o comentário. Espero que esqueça logo a história, mas relembre na hora da votação hahahaha

    • Claudia Roberta Angst
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Claudia Roberta Angst

      Mais uma coisa: eu interpretei a história como uma criação do narrador para justificar a morte de Lorival. Pode ter acontecido de fato ou foi simplesmente um enredo criado a partir de suposições do policial. Matou Lorival porque sentiu vontade, não por caridade.
      Assim, criou um drama carregado de drama e violência para calar qualquer vontade de apagar sua memória de vez:
      “(…) e fico inventando histórias pra entender como ele foi parar ali. Histórias pra justificar tamanha desesperança no olhar. Pra justificar meu dedo no gatilho e os miolos do Lorival, que eu deixei espalhados naquele quarto imundo.”

      • Claudia Roberta Angst
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Claudia Roberta Angst

        *Assim, criou um drama carregado de violência

      • Roberto Nascimento
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Roberto Nascimento

        Caveira!

        É exatamente essa a ideia.

        Na minha leitura do personagem, ele não mataria um civil por gosto… mas quem sabe?

        Quem pode garantir que o extermínio dos bandidos não seja tão somente uma válvula de escape, com uma justificativa moral de promover o “bem”, para o desejo de matar inato do policial que aperta o gatilho?

  32. Maria Santino
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Maria Santino

    Cacetada! Num guentei esperar até chegar em casa.
    Vou te contar, autor. Eu estava relutante em permanecer lendo seu texto, achei muitas passagens descartáveis, gratuitas, mas, depois da boa descrição do estupro da Jaqueline, vou te contar que fiquei vidrada. Você me ganhou ali e depois eu não consegui parar de ler e no final eu so posso dizer que gostei, sobretudo, do bom aproveitamento do número de palavras, pois sei que se seu texto fosse menor eu não teria conseguido me ambientar e gostar. No geral a narrativa é boa e semelhante ao Capitão Nascimento, mas digo aqui que o que me cativou foi a parte tensa que poderia descambar de vez para o exdrúchulo, mas foi descrito com maestria ao ponto de me fazer sentir pena da mina e devorar o restante para saber como terminariaVou te contar, Vou te contar, autor. Eu estava relutante em permanecer lendo seu texto, achei muitas passagens descartáveis, gratuitas, mas, depois da boa descrição do estupro da Jaqueline, vou te contar que fiquei vidrada. Você me ganhou ali e depois eu não consegui parar de ler e no final eu so posso dizer que gostei, sobretudo, do bom aproveitamento do número de palavras, pois sei que se seu texto fosse menor eu não teria conseguido me ambientar e gostar. No geral a narrativa é boa e semelhante ao Capitão Nascimento, mas digo aqui que o que me cativou foi a parte tensa que poderia descambar de vez para o exdrúchulo, mas foi descrito com maestria ao ponto de me fazer sentir pena da mina e devorar o restante para saber como terminariaVou te contar, autor. Eu

    • Maria Santino
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Maria Santino

      Que coisa! Não via a hora de vir aqui melhorar isso. Além do meu celular repetir tudo o que disse como um robô, ele ainda cortou o que estava dizendo. Aff! Sas Tecnologia do DEMO :/
      Bem, só completando que adoraria que a narrativa tivesse o mesmo ponderamento que houve na cena de estupro, pois ali você dosou a mão o suficiente para ver as cenas sem uso de descrições desnecessárias. Acho que muitas palavras como: Maldito, infame, infeliz, desgraçado… tem a mesma força que outras palavras, mas acredito que dariam uma atenuada em algumas passagens, sobretudo no início que soaram carregadas em demasia (mas sei que essa opinião é algo só meu mesmo). Enfim, foi bom ler seu texto e mudar de ideia no decurso da leitura.
      Boa sorte no desafio. Abraço!

      • Roberto Nascimento
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Roberto Nascimento

        Saudações, Maria Santino

        Fico satisfeito que no geral tenha apreciado o conto.
        Entendo que a linguagem chula desagrade os ouvidos de muitos leitores e sabia que acabaria perdendo alguns pontos com isso, infelizmente.

        Porém eu precisava me manter fiel à proposta do conto, que era ser fiel à linguagem do filme (Tropa de Elite), que por sua vez é (no meu ponto de vista), fiel à linguagem utilizada na vida real (ufa! Quanta fidelidade!).

        Poderia talvez substituir alguns palavrões, mas em alguns pontos tenho impressão que isso soaria como filme legendado, onde ouvimos o personagem dizer “shut fuck up, godam motherfucker” e aparece na legenda “- Fica quieto, droga!”. 😀

      • Maria Santino
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Maria Santino

        Olá, Nascimento.
        Entendo perfeitamente o que você disse e adiando que participar deste certame tem sido, no mínimo, interessante para mim, pois nele me vi diante de diversos contos dos quais em outra ocasião eu simplesmente fecharia a cara e desistiria da leitura por manter ainda algumas ideias fixas, convicções, sobre o ato de escrever (uma hora eu mudo ou descubro que é este mesmo o caminho e sigo nele. FOREVER!). Enfim, acho que se você está satisfeito com seu trabalho, com o resultado final do seu escrito, isso deve contar bastante, pois escrever tem ser prazeroso para quem o faz. As impressões deixadas são somente reflexos dos estímulos que cada um assimila (e todos nós temos um modo distinto de receber e repassar isso).
        Obrigada pela atenção. Já estou curiosa em saber a autoria. Mais abraços aê!

  33. Rafaella Soto
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Rafaella Soto

    Texto bem produzido, fácil perceber a inspiração (Tropa de Elite).

    Pesado, sem dúvida. Porém, não deixa de retratar a realidade de muita gente. E, o povo ativista de internet, não deve conhecer essa realidade, julgando por tanto, exagerada e desnecessária.

    Diverti-me com os comentários “politicamente corretos” e as distorções de conceitos como criação e inspiração, com opinião pessoal do escritor.

    Ora, fica difícil entender um mundo que não tem coragem de enxergar o feio, o sujo, o errado que está aí fora.

    Realmente o policial de elite parece ter matado o cara muito rápido, mas como estamos fazendo interpretações políticas e cheias de pudor, pq não interpretarmos que o cara, um dos traficantes ou alguém qqr narrou tdo isso… antes do tiro?

    O estômago revirou, porém entendo que é mais um texto bem escrito com uma história forte.

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Caveira!

  34. Sonia Regina Rocha Rodrigues
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Sonia Regina Rocha Rodrigues

    Um texto descritivo.
    Qual o objetivo do conto?
    Há livros famosos pelos seus personagens de submundo, como Os Miseráveis e Oliver Twist, onde está bem claro o objetivo de citar tanta maldade, sem tanto palavrão desnecessário.
    Poderia ter desenvolvido melhor o relacionamente pai e filha, explicitando o confltio; não fica claro pelo texto se ele ama a filha ou se ele a negligencia (antes dessa noite, que nessa noite para covarde faltaria muito)
    A cena me que o policial atira no personagem é tão rápida que não daria tempo para ele ter ouvido toda a história que conta como narrador – faltou alguma indicação de que ele ouviu a detalhada confissão do que descreve no conto, fiquei com a impressão de que ele atirou logo para ir logo assistir o final do jogo.

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Sônia

      Qual o objetivo do filme Tropa de Elite?
      As histórias, necessariamente, precisam ter um objetivo para existir?

      Infelizmente não houve tempo (limite de palavras) para desenvolver melhor esse relacionamento entre pai e filha, mas em duas oportunidades ao longo do texto acho que é possível captar que ele a amava sim.

      Deixar ir ao baile funk é negligenciar? Provavelmente sim, mas o que poderia ser feito?

      Talvez despertar essa reflexão seja um dos “objetivos”…

      Na ocasião em que o sujeito foi “covarde”, o que você teria feito no lugar dele? Teria pego a picareta e ido bater de frente com os vagabundos armados com metralhadora?

      Outra reflexão que tentei despertar nos leitores, em meio a tantos “palavrões desnecessários”…

      Sobre a sua consideração a respeito do desfecho, você está completamente equivocada em um ponto (questão do cara querer acabar logo o serviço para ir assistir o jogo) e certa em outro… não havia tempo para ouvir a história toda. E o policial de fato não ouviu! Só que isso está explicado pouco à frente.

      Sugiro a releitura dos últimos parágrafos (“Ele esqueceu, mas eu lembro. (…)”) para um melhor entendimento da trama.

      • Sonia Rodrigues
        26 de outubro de 2014
        Avatar de Sonia Rodrigues

        Relendo o final: se o policial não ouviu a história das duas uma:
        1 – está inventando a história
        2 – está sendo assombrado pelo fantasma do Lorival em pesadelos?

        Já vi muito pai e mão e até estranhos defenderem pessoas ameaçadas, tenho uma idéia mais generosa do ser humano. Inclusive porque eu vi um homem desarmado empurrar um outro empunhando um revólver e salvar a vida de todo o grupo. Minha profissão colocou-me em algumas situações bem estranhas, algumas vezes, médico de pronto socorro vê muitas vezes gente baleada ou esfaqueada por ter defendido a vida de seus familiares.

        Uma história tem de ter um motivo? Certamente tem de tere um enrêdo, mesmo quem escreve teatro do absurdo segue enredos coerentes. O motivo de sua história certamente foi participar do desafio.

        E, sim, Tropa de Elite teve um objetivo – ou não teria sido filmado.

    • Roberto Nascimento
      30 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Sonia,

      Lendo novamente meu comentário percebi que soei um pouco rude e arrogante, não foi essa a intenção. Respondi muitas perguntas em sequência e acabei perdendo um pouco o tato, me desculpe.

      Sobre o final, ele está inventando parte de uma história. A história que ele sabe que realmente aconteceu é do momento que o BOPE sobe o morro para frente. Toda parte do Lorival ser mulherengo, da Jaqueline ter sido estuprada e morta por vingança do traficante, etc. foi uma “reconstituição” feita pelo Capitão, para tentar entender o porquê do Lorival ter parado ali naquele cativeiro.

      Não é mencionado no texto, mas ele como Capitão poderia ter acesso posterior a algumas evidências, do tipo – celular do Lorival (com N mensagens de whatsapp de diferentes mulheres… talvez até com mensagens da filha do Fernando Onça – na verdade há uma pequena “pista” sobre isso quando é falado sobre o whatsapp), confirmação de que a ossada que estava no “micro-ondas” era da filha do Loriva, informação de que a filha do traficante morreu num hospital em decorrência da hemorragia causada por um aborto mal feito, etc.

      Isso poderia ajudar a recriar algo mais próximo da realidade nessa história inventada que ficava lhe tirando o sono. Ou… pode ser que ele simplesmente criava uma hipótese diferente a cada dia.

      Olhando meu texto da posição de leitor, encararia mais pela primeira opção (do policial tendo acesso às evidências). Mas, de qualquer forma, esse detalhe sobre o “processo de criação” do policial não tem muita relevância para a trama. O que pesa mais é o fato de que ter matado um civil naquelas condições (pedindo para morrer, com o olhar completamente desolado), acabou sendo um tipo de “gota d’água” para o policial tão acostumado a matar.

      Sobre a covardia do Lorival… realmente há muitos casos desse tipo que você citou. Pais e mães que pulam sem hesitar na frente de disparos efetuados contra os filhos e até lutam contra animais selvagens (acho que foi o ano passado que ficou bem popular um vídeo da mãe lutando contra um jacaré para resgatar o filho). Isso é fato. Mas nem todas as pessoas reagem da mesma forma. O Lorival, travou… algumas pessoas pulam na frente do trem em movimento para salvar os filhos, outras travam. Agora, podemos acusá-lo de covardia por causa disso? Era uma situação limite… eu sinceramente não sei como reagiria ali e peço a Deus que jamais passe por nada similar. (A intenção aqui não é “defender” o personagem, mas apenas debater o assunto).

      Sobre o objetivo do conto – além de, claro, participar do desafio, foi despertar a reflexão nos leitores sobre os assuntos ali abordados. Que acredito ter sido um dos objetivos também do filme.

      Saudações,

      Roberto Nascimento

  35. simoni c.dário
    23 de outubro de 2014
    Avatar de simoni c.dário

    Com certeza muito bem escrito,mas tive a impressão de ouvir a voz da narrativa do próprio capitão Nascimento no filme Tropa de Elite, o formato é o mesmo. Poderia ser o roteiro de Tropa de Elite 4. Faltou um pouco de originalidade na minha opinião. Não gosto de narrativas violentas apesar de ter gostado muito dos filmes Tropa de Elite. Nos filmes a temática da violência até que foi mais ou menos suportável. Neste conto foi violência escancarada, a meu ver com detalhes demais, pesando na leitura.
    A construção do texto é realmente muito boa.
    Boa sorte!

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Simoni

      Se você ficou com a voz do próprio Capitão Nascimento enquanto lia, então meu objetivo foi alcançado, porque era ele mesmo (Cap. Roberto Nascimento) quem estava narrando.

      Lamento que considere isso falta de originalidade dentro de um desafio cuja proposta é o desenvolvimento de contos inspirados em filmes.

      Sobre a questão da violência, só posso concluir que você não se recorda muito bem do filme (principalmente do primeiro).

      De qualquer forma, obrigado pela leitura.

  36. Luiz Eduardo
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Luiz Eduardo

    Podia repetir tudo o que os outros já disseram quanto à ideologia do conto. Não concordo, mas como se trata de um texto de ficção, é importante se ater à história. Gostei da construção do conto. Valeu por isso.

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Luiz Eduardo

      Fico satisfeito que tenha encarado dessa forma e gostado do resultado.

      Obrigado.

  37. Fil Felix
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Fil Felix

    Confesso que você tem um jeito muito fluído de escrever, tudo acontece “tranquilamente”, sem travas e os diálogos soam naturais. Passou um filme pela minha cabeça, tamanha desenvoltura em escrever. O final ficou ótimo, abrindo espaço para diversas interpretações e talvez esse seja o ponto mais alto do seu conto.

    Entretanto, preciso ser sincero: não gostei, por questão de empatia mesmo. A temática não me agrada, o uso excessivo de palavrões e as críticas nas entrelinhas também não.

    Posso estar enganado, mas me parece que o autor incluiu diversas ideologias próprias no conto, muitas delas que são extremamente contrárias à minha. Desumanizou a favela, engrandeceu a polícia. Utilizou de esterótipos preconceituosos, como o papel da Mulher, única e exclusivamente pra causar a desgraça das famílias. Particularmente, foi até difícil chegar ao final. Por mais que a história, tecnicamente falando, esteja boa e bem amarrada, me soou mais como um discurso violento que com um conto.

    • Roberto Nascimento
      24 de outubro de 2014
      Avatar de Roberto Nascimento

      Saudações, Fil Felix

      Só posso lamentar essa interpretação de que o conto é na verdade um discurso violento que expressa as ideologias de ódio e preconceito do autor.

      É uma afirmação um tanto perigosa, eu diria (embora aqui, nesse caso específico, eu concorde com ALGUNS pontos de vista do personagem – mas falarei disso em comentário separado).

      Seguindo o mesmo raciocínio, poderíamos concluir que o ator Wagner Moura (que interpretou o personagem Capitão Nascimento no cinema) é homofóbico, racista, machista, etc. e exala ódio reacionário pelos poros.

      Não me parece ser o caso…

      • Fil Felix
        24 de outubro de 2014
        Avatar de Fil Felix

        Por isso comentei que “Posso estar enganado, mas me parece que o autor incluiu diversas ideologias próprias no conto” e você acaba de dizer que realmente concorda em alguns pontos da personagem. Não estou julgando nem nada, apenas que não concordo em nenhum ponto e por isso não gostei do conto, o que não exclui o ótimo desenvolvimento do mesmo. Como falei, pura questão de empatia. Há contos que gostamos e outros não.

        Não sou contra violência e palavreado excessivo, há ótimos exemplos de livros e filmes com esse contexto, mas geralmente como forma de criticar o sistema, a hipocrisia do público.

  38. Eduardo Selga
    23 de outubro de 2014
    Avatar de Eduardo Selga

    Não é fácil ser imparcial num conto que emana uma ideologia que se encontra no extremo oposto das minhas convicções enquanto sujeito. Mas… vamos lá.

    Do ponto de vista narrativo, uma das maiores qualidades dele está no fato de não haver “pontas soltas”, ou seja, todos os elementos convergem para um construto sólido, cujo arremate foi inusitado: os fatos narrados pelo policial são parcialmente ficcionais, uma válvula de escape dele. Ele cria os fatos antecedentes à ação policial no cativeiro. Assim, o conto, um gênero ficcional, narra não o suposto real (como normalmente os narradores querem nos fazer acreditar), e sim uma verdade fabricada. Como estratégia narrativa, o recurso é muito bom.

    Mas, ao inspirar-se num desses filmes que vangloriam a violência policial como “solução” para um grave problema social brasileiro e latino-americano, Roberto Nascimento opta por repetir o discurso impresso neles. Nalgum lugar do imaginário, Capitão Nascimento deve estar batendo palmas. Bem como os muitos Capitães Nascimentos existentes dentro e fora das corporações militares.

    Fico me perguntando se o autor pretendeu ser fiel a esse tipo de filme ou se, ao repetir alguns estereótipos, tentou reproduzir realisticamente o que imagina ser a verdade desse submundo. O que se coloca por trás disso é algo maior: a representação, ou seja, como os marginais e os policiais são mostrados na literatura. A demonização de um, a heroicização do outro que, ao usar muitas vezes uma violência desproporcional, ao assassinar desnecessariamente (a tarefa da polícia é prender, não matar), “combate o mal”. Esquemático demais, maniqueísta em excesso o conto.

    Temos, por exemplo, um discurso em favor do Estado policialesco, seguindo a Lei de Talião (olho por olho, dente por dente), o que desprestigia a função da Justiça numa sociedade que se pretende democrática. Temos a misoginia (“o Lorival tinha o mais perigoso de todos os vícios – mulher. E lógico que acabou se fodendo por causa disso”), em que a mulher é posta como um mal em si mesma e como objeto usufruto sexual. Temos a desumanização do outro, excelente ferramenta para justificar todo tipo de arbitrariedade (“Mas o que as pessoas não entendem é que traficante não é ser humano normal”). Temos a depreciação da cultura nordestina, quando o personagem Paraíba é provocado ( “Responderam que isso sim [funk] era festa de cabra macho e emendaram que forró era coisa de fresco”). Temos, no dois primeiro parágrafos, a ridicularização do pensamento humanista e da luta política situada no campo da esquerda.

    Não existe discurso inocente. Ele sempre defende um campo de pensamento e, por consequência combate outro, e isso gera repercussões, mínimas ou em grande escala. Isso quer dizer que Literatura não é apenas a estética pela estética: há implicações ideológicas. Mas aí entra-se numa discussão das mais interessantes, que não cabe no presente espaço: é correto defender o texto literário “politicamente correto”? É correto aplaudir um discurso preconceituoso em nome da liberdade de expressão?

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Publicado às 22 de outubro de 2014 por em Filmes e Cinema e marcado .