EntreContos

Detox Literário.

Elvira (Vladimir Ferrari)

Sua meta era procurar no fundo dos próprios olhos a coragem. O problema? O peso de erguer a cabeça e ver-se no espelho. Como se uma corrente de elos grossos, atada ao coração, prendesse o queixo ao peito atestando a derrota. Mas não era medo de vê-la — a derrota — impressa na face. Era algo como aguardar aquela dor ao engolir errado, passar.

O coração jazia esparramado e desmilinguido, como no chão de uma cela escura, com uma janela quadrada, no alto e inatingível. Uma claridade desenxabida de um dia nublado e sem sal.

Havia um peso.

Havia um resto de vivacidade surpreendida, berrando ser necessário recomeçar:

— Mulher, o pior já passou! — ouviu-se sussurrar.

Um passado de sorrisos e confiança, jazia em uma imagem tão diminuta de si própria, tão … no passado. Elvira quase perdera a esperança de reagir e sacudir a poeira. A montanha era alta demais para escalar. Estava tão entregue, quanto o Harry de Hemingway aos pés do Kilimanjaro. A gangrena para ela, estava na alma.

Essa mulher imaginária, outrora cheia de esperança, encarava um monstro enorme de pessimismo, instalado na mente. Como uma pedrinha no interior do sapato: incomodava por um tempo e acabava por integrar-se à rotina do caminhar.

“Quando estiver a sós, tiro o sapato e a palmilha.”

A procrastinação do bem-estar, por comodismo.

Lembranças vinham à mente, enquanto prostrava-se apoiada no granito da pia do banheiro. Dedicara-se desde o princípio aquilo tudo que acabava ali, atrás da porta.

Começou no esforço para ser notada, entre tantas “candidatas”. Comparava-se e media-se, como se estivesse competindo de verdade. Um único olhar de Ivan, acendera uma chama poderosa em seu coração. A alegria inundou o peito, quando o primeiro sorriso trocado deu a certeza de estar fazendo direito. Conquistar a preferência daquele Adonis. Uma de suas mais cálidas memórias.

“Meu Deus!”

Sua razão aliada ao tempo, corrompeu toda a ternura dessa lembrança, transformando-a no primeiro elo da corrente que atava seu coração ao calabouço da tristeza. As descobertas ao longo dos últimos dias, formavam os demais. A afligiam ali, na solidão, sem forças de erguer o queixo e mirar-se no espelho.

O poeta cantava sobre o banheiro ser “a igreja de todos os bêbados”. Elvira acreditava nisso. Mas, e também, em ser um poço dos desejos, um travesseiro perfumado, um porto seguro. O cofre de todos os seus segredos. Era ali, sob o chuveiro, sentada ao vaso ou diante da pia, podia sempre renovar-se e enfrentar a vida que escolhera para si.

Onde se escondera o homem de seus sonhos? Não tinha a menor ideia da resposta. Tinha lembranças puídas das flores e chocolates, dos beijos no escurinho do cinema, dos passeios de mãos dadas pelo parque. Ivan parecia intensamente feliz ao apresentar-se para todos ao seu lado. O aperto em sua mão, sutil, transmitia toda a segurança do mundo. Traduzia-se em felicidade e paixão.

Os olhos grudados na cuba da pia, notaram uma gota d’água pequenina, refletindo algum objeto azul — o cabo da escova de dentes que não seria mais usada — e isso lhe trouxe o dia do pedido, as margens de uma lagoa azul, sentados em um banco sob uma quaresmeira em flor:

— Estamos parecendo um casal de velhos, apreciando o nascer do sol aqui nesse banco — sorriu ele, segurando a mão direita de Elvira entre as suas. Olhares fixos e eletrificados pela paixão avassaladora que os trouxera ali, fruto da noite anterior.

“Uma lembrança puxa a outra” — pensou ela — “Ah! A noite anterior!”

A felicidade ao se entregar pela primeira vez. A delicadeza dos gestos dele e o cuidado ao invadi-la, provocando o mínimo de dor permissível.

— Dor gostosa de sentir essa, meu amor. Envolve paixão — foi o que ouviu dos lábios dele. Elvira o chamou de “maravilhoso”.

Voltou a focar a gota com o reflexo azul, o amanhecer às margens da lagoa. O modo como ele soltou sua mão com rapidez — buscando o anel no bolso do jeans — e tornou a pegá-la, já o enfiando no dedo e sussurrando:

— Case-se comigo, Elvira.

Não foi um pedido. Não foi uma pergunta. Foi mais uma ordem. Daquelas onde o subtexto se insinua e promete uma vida de sonhos e deleite. Uma paixão embrulhada em promessas de renovar-se a cada beijo, a cada gesto de carinho, a cada noite de amor.

Toda a energia que fluía em seu corpo e fazia suas células trabalharem, sustentando-a viva, projetou-se em uma lágrima solitária da mais pura emoção. O “sim” saiu também sussurrado — similar aos fogos multicoloridos das festas de final de ano, quando uma luz pequenina cruza os céus descrevendo uma parábola, explodindo de repente em milhares de desenhos. Elvira aceitou e jogou-se nos braços dele, colando os lábios em sua boca em um beijo de total entrega, de alma, corpo e energia vital.

Lembranças doces, perdidas no tempo e revividas em acasos como uma gota despretensiosa no topo da cuba da pia do banheiro. Sua “igreja”. Ali, confessava todos os seus pecados, suas alegrias, seus temores, suas derrotas e suas conquistas.

Mais derrotas.

Um jorro interno de angústia atingiu seu esôfago e subiu até a garganta. Torceu a cabeça para à esquerda, esforçando-se para segurar o choro e as lamentações. Uma hora a insistência delas lhe atormentaria o espírito. Prometeu não chorar. Espremeu a maçã do rosto no ombro, travando a boca e cerrando os dentes, sufocando um gemido. Promessa é promessa!

Respirou fundo e fechou os olhos, já de cabeça erguida. Soprou o ar fazendo um bico com os lábios, como quem sopra uma vela de aniversário, uma haste de dente-de-leão. O lado direito do maxilar superior ainda estava dolorido. Não queria abrir os olhos. Bom seria se não precisasse.

Inúmeros receios povoavam sua mente. Temia olhar o espelho e perceber os olhos de Ivan impressos no fundo da própria retina, como um fantasma pairando no ar diante de si. Temia ouvir a própria voz e perceber-se imitando os trejeitos de seu sotaque, assimilados após tantos momentos, tanta entrega, tanta resignação.

Temia as marcas. Não os hematomas, que mais dia, menos dia, sumiriam. As marcas na alma, a perseguindo a cada segundo, a cada passo dentro daquela casa, daquele banheiro-confessionário.

Uma última vez antes de encarar seu destino, sorveu o ar pelas narinas.

Devagar.

Enchendo os pulmões, buscando concentrar-se no que a aguardava do lado de fora daquele banheiro. Abriu os olhos. As pupilas azuis estavam ali, firmes e fixas. Não registrou aquela imagem de olhos borrados de tristeza. Quis certificar-se antes de mais nada, de haver uma decisão suficientemente capaz de executar o necessário para aquele momento.

Não havia umidade retesada nas pálpebras inferiores. Se as registrasse, entregaria os pontos e desabaria em um choro mesclado com todas as emoções enclausuradas. Não se arriscara a postergar isso, para não se atrapalhar no ponto final.

Uma pequena mancha restara, entre a pálpebra do olho esquerdo e o alto do nariz. Não doía mais. Era mais fácil de desconsiderar. A atenção poderia se desviar para a mancha roxa no canto da boca, onde ainda pairava uma dorzinha.

O que importava agora, era a certeza no fundo de seus olhos azuis: vida nova. Outro sopro de ar saiu da boca. Outro jato de ar invadiu as narinas. Piscou os olhos. Buscou no cofre de sua vitória a frase triunfante construída num passado cheio de esperança daquela mulher diminuída e quase sem esperança.

— Está feito, Dona Elvira! Bola para a frente!

A fez ressoar na mente. Selava todo o passado, enterrando-o de vez num canto escuro e frio. Onde outrora, seu coração fora aprisionado pelo relacionamento dos sonhos, transformado num pesadelo com o correr dos dias.

Por que aconteceu? Não interessava mais.

Girou a alavanca da torneira e lavou a faca suja de sangue.

Estava quase feliz.

Sobre Fabio Baptista

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38 comentários em “Elvira (Vladimir Ferrari)

  1. Vladimir Ferrari
    10 de março de 2024
    Avatar de Vladimir Ferrari

    Se é esse o caso, deixe-me aproveitar então. Convido-a para ler as outras coisas que escrevi em https://linktr.ee/Vlaferrari. Os áudio-contos são todos artesanais, das vozes à trilha sonora.

  2. Sílvio Vinhal
    9 de março de 2024
    Avatar de Sílvio Vinhal

    O autor tem um bom domínio da escrita. A história é envolvente e consegue manter um certo mistério até o desfecho. A ação dramática está diluída no pensamento da protagonista, e vai sendo entregue aos poucos, quase como algo que não existiu.

    Quando a revelação surge, enfim, é que se nota que Elvira não é mais apenas uma vítima, tomou as rédeas e redefiniu sua vida, para o bem ou para o mal.

  3. Pedro Paulo
    9 de março de 2024
    Avatar de Pedro Paulo

    RESUMO: Elvira medita sobre a escolha drástica que a permitiu uma nova vida a partir da morte.

    COMENTÁRIO: Adorei este texto! A escrita é bela, a complexidade dos sentimentos da personagem é bem trabalhada de forma poética por meio de metáforas bem concebidas e o estado de aflição da personagem nos coloca em tensão quanto às lembranças que vão sendo narradas. A escolha de cada memória a compor esse texto de rememorações revela uma autoria madura e hábil, conseguindo dar profundidade ao amor da personagem e, justamente, a altura da queda. De certa forma, a única ação efetiva no texto é ela se levantar e se olhar no espelho, mas muito se implica nesse gesto, como o seu próprio significado, o que permite uma última reviravolta que eleva o conto ao deixá-lo ainda mais sofisticado em sua estrutura, acrescentando uma cena prévia sem ser por meio da lembrança, mas por um objeto no presente, e, enfim, por apontar um texto tão voltado ao passado para o futuro, concretizando a abordagem do tema. Excelente.

  4. Priscila Pereira
    5 de março de 2024
    Avatar de Priscila Pereira

    Olá, B.T.! Tudo bem?

    Seu conto não está na minha lista de obrigatórios então não poderei avaliá-lo mas mesmo assim quero deixar meu comentário.

    Elvira é uma personagem bem executada. O conto todo gira em torno dela, seus pensamentos e sentimentos enquanto está no seu santuário: o banheiro.

    Todo o drama retratado no conto não apontava para o final. Elvira não parecia uma pessoa que acabou de matar o marido… Então achei esse final desnecessário.

    Imagino que você não estava satisfeito com como terminaria, só mais uma mulher desiludida e maltratada, reclamando para o espelho, então você colocou aquela faca lá de plot Twist, ou talvez o conto todo tenha sido escrito ao redor da faca, mas aí… Acho que faltou indicações para instigar o leitor.

    Pra mim o conto fica melhor sem a faca.

    Vou te contar um segredo, quase coloquei um drama extra no final do meu conto pq achei que estava sem graça e chato demais, mas me segurei e agora estou satisfeita com ele.

    Boa sorte no desafio!

    Até mais!

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Não vejo sentido em tirar a faca. É algo similar a você comentar “Vou te contar um segredo” em um comentário que estará a disposição de todos os leitores do Entrecontos. Muitíssimo grato por comentar e por expor sua opinião. É assim que crescemos na escrita. Abraços.

      • Priscila Pereira
        10 de março de 2024
        Avatar de Priscila Pereira

        Touché! 😁

  5. Thales Soares
    2 de março de 2024
    Avatar de Thales Soares

    Este conto não foi muito do meu gosto pessoal…

    Tive que ler umas duas ou três vezes para compreender, e mesmo assim ainda fiquei meio boiando. Não foi culpa da escrita do autor, que por sinal, é maravilhosa. Nota-se que o autor é alguém experiente e que possui um pleno domínio da escrita, fornecendo descrições muito boas e um desenvolvimento complexo da mente da personagem. No entanto, para mim, a leitura ficou um pouco enfadonha.

    A história descreve a batalha emocional de Elvira, enquanto ela tenta se reconciliar com as lembranças de um relacionamento amoroso que começou cheio de promessas e alegria, mas que foi aos poucos deixando ela quebrada e presa num ciclo de tristeza. É um tema até que interessante, mas que para mim não funcionou tanto, pois não vi muito avanço na trama. Senti como se a história fosse muito contemplativa, com construções narrativas incríveis, mas que iam do nada a lugar nenhum, não fluindo bem. Se o conto tivesse um pouco mais de dinamismo, ou um clímax mais definido, acredito que seria mais interessante.

    O final foi até que interessante, mostrando uma pequena surpresa ao leitor. Mas eu já estava tão cansado quando cheguei na conclusão, que não fui tão fisgado. Tenho certeza de que outras pessoas apreciarão muito essa história, mas para mim, não foi uma leitura tão prazerosa. Boa sorte no desafio!

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Pena não ter-lhe entretido com minha narrativa. Muitíssimo grato pelas impressões, mesmo assim.

  6. Mauro Dillmann
    2 de março de 2024
    Avatar de Mauro Dillmann

    Um conto bem metafórico em relação aos sentimentos, mas com algo abstrato, que exige atenção do leitor.

    “Jazia” é palavra forte, não merecia repetição no texto.

    Em mais de um momento, lembrei-me do poema “Retrato” de Cecília Meireles. Será que o/a autor/a esteve inspirado por esse poema? Seria legal saber. 😉

     “Dedicara-se desde o princípio aquilo [àquilo] tudo”

    “Torceu a cabeça para à esquerda” [Uso equivocado da crase. Seria “Torceu a cabeça para a esquerda” ou “Torceu a cabeça à esquerda”].

    Elvira, nome forte, diferente e título do conto.

    Acho que não entendi direito o final.

    Parabéns !

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      A crase é uma pedra no caminho da narrativa, que ainda não aprendi a contornar com o devido esmero. O português brasileiro é uma lingua riquíssima. O que atrapalha o desenvolver de histórias, na minha opinião, é a diferença entre o que se narra e o que se escreve. Nem sempre vírgulas e crases irão lhe ajudar. Mas, por ser uma língua riquíssima, as palavras existem para que as utilizemos, ainda que sejam fortes. Muitíssimo grato pelo comentário e avaliação.

  7. Simone
    28 de fevereiro de 2024
    Avatar de Simone

    Temos um momento na vida de uma mulher neste conto. O intervalo de tempo em que ela enfrenta sua escolha. O enredo deixa em suspense os motivos para a prostração da personagem. O entendimento vem aos poucos: ela sofre por amor, pelo fim de um relacionamento, essa relação é intolerável, eles tem um momento de violência e ela o mata.
    O clima de angústia e tristeza é bem caracterizado. Acho que um pouco redundante em alguns momentos. Mas passa o quanto ela sofre com as escolhas. Fica claro no flashback que ela acreditou naquele relacionamento e teve esperança de felicidade. Depois há pistas de que ela descobriu algo terrível que culminou nesse momento trágico. Penso que essas pistas estão bem adequadas e dispersas de forma harmoniosa no texto, mas que há algum exagero dramático que incomoda um pouco. O mesmo texto mais enxuto pode ser uma boa experiência. O final foi realmente surpreendente e, assim que cheguei à última frase, voltei para a releitura e observei com mais atenção a construção do escritor. Parabéns!

  8. Kelly Hatanaka
    27 de fevereiro de 2024
    Avatar de Kelly Hatanaka

    Estou avaliando os contos de acordo com os seguintes quesitos: adequação ao tema, valendo 1 ponto, escrita, valendo 2, enredo, valendo 3 e impacto valendo 4.

    Adequação ao tema
    Atende ao tema. Elvira livra-se de um relacionamento abusivo mantando o marido e sente isso como um recomeço, vida nova.

    Escrita
    Escrita bem correta. Aqui, é uma questão de gosto pessoal: acho que há um excesso de adjetivos. Este excesso, na minha opinião, deixa a leitura difícil e um pouco cansativa. Por vezes, me perdi. Tive que reler para entender o que acontecia.

    Enredo
    Elvira rememora sua vida após matar o marido. Acho que a história acabou ficando meio soterrada por baixo da narrativa floreada. No fim, o que sabemos: Elvira se casou com Ivan, no começo tudo parecia perfeito, ela tem marcas no rosto e ela o matou. Mas, o que aconteceu? O que levou a este momento? Quem era Ivan? Como o relacionamento deles passou de perfeito para insustentável?

    Impacto
    Gostei da revelação final, da faca suja de sangue bem no finalzinho. Mas, como disse logo acima, senti falta de mais história. Faltou saber como chegamos nesse momento e quem são as pessoas envolvidas. A narrativa resultou distante.

    Kelly

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Que surpresa boa ser avaliado por você novamente e, positivamente. Achei, no entanto e em linhas gerais, seu comentário um tanto estranho, como maneira de aproveitar as dicas para melhorar na escrita. Ok. Realmente, há exageros. Mas, houve entendimento dos porquês da protagonista ou não? De todo modo, Muitíssimo grato.

  9. Karina Dantas Nou Hayes
    25 de fevereiro de 2024
    Avatar de Karina Dantas Nou Hayes

    Conto com um final surpreendente, que não nos deixa tirar os olhos dele desde o início, onde a personagem parece estar se despedindo da vida. Durante uma conversa que ela tem com ela mesma, no banheiro-confessionário, numa espécie de autoanálise, a respeito dos caminhos que escolheu seguir, e das razões que a fizeram tomar certas decisões. Elvira, ainda marcada pela dor de um relacionamento que se tornou um pesadelo, tenta, apesar da grande desilusão que viveu, (desilusão descrita de uma forma bem detalhista) buscar uma esperança em dias melhores. Quer voltar a ter essa esperança. Acreditar numa vida nova. Mesmo que essa esperança numa vida nova consiga ser alcançada depois de lavar na torneira do seu banheiro-confessionário, uma faca suja de sangue.

  10. Alexandre
    23 de fevereiro de 2024
    Avatar de Alexandre

    Gostei muito do texto. Alguns equívocos com a pontuação, sobretudo, o uso da vírgula, torna algumas frases longas demais e um pouco confusas, mas não prejudicam o entendimento da história. A concordância verbal foi um problema maior. A mistura de pretérito mais que perfeito do indicativo e pretérito perfeito pra afastam, ora aproximam o leitor do texto e gera confusão. Nada disso tira o brilho da história, uma trama bem construída, programada para um desfecho surpreendente. Esse objetivo foi alcançado.  Parabéns ao autor. Nota 7

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Muitíssimo grato. Como disse a outro colega, o que atrapalha as narrativas nessa belíssima língua que é o nosso português brasileiro, é a quantidade de exigências da sintaxe e da gramática. Claro que, a língua falada nas ruas é muito pior e há aberrações horrorosas nas trocas de mensagens das redes sociais. Mas aqui, peço perdão. A revisão ortográfica dos textos, à vera, é uma tarefa dispendiosa e nem sempre há uma “barganha” que me favoreça. Sei que é um pecado, mas fico-lhe grato por notar e expressar o erro. Ficarei atento as concordâncias verbais. Como disse: seria mais fácil se o narrar (falar) fosse semelhante ao escrever. Abraços.

  11. Karina Dantas Nou Hayes
    23 de fevereiro de 2024
    Avatar de Karina Dantas Nou Hayes

    O fim inesperado de mais um conto de fadas idealizado.

  12. Gustavo Castro Araujo
    19 de fevereiro de 2024
    Avatar de Gustavo Castro Araujo

    Diante do espelho, todavia sem coragem para encarar o próprio reflexo, uma mulher relembra o amor por um homem, amor agora transformado em pesadelo.

    Dito desta forma, parece propaganda do próximo filme do Tela Quente, rs

    Só que o conto é bem melhor do que isso. A começar pela escolha das palavras e pelo suspense bem montado. O enredo se desenrola aos poucos, nos obrigando a catar os cacos de informação e, como um mosaico, recompor a história de Elvira.

    A filosofia de banheiro ficou muito boa, com os devaneios, com as metáforas bem empregadas, em especial a do Kilimanjaro, Hemingway, claro, e da escova de dentes (essa foi sensacional).

    Pouco a pouco aprendemos sobre o amor de Elvira devotado ao marido Ivan, e como esse sentimento transformou-se em desilusão. Aparentemente – e só aparentemente, já que não há confirmação expressa – essa desilusão deu-se em razão da natureza violenta do sujeito. De fato, há pistas nessa direção, a partir do momento em que a proposta de casamento não se revela como proposta, mas como ordem. As menções a machucados e ferimentos também conduzem a isso. Ela, cansada de ser agredida, acaba com tudo utilizando uma faca. É nesse momento em que encara seu próprio rosto.

    Interessante é que, como disse, não dá para ter certeza de que foi isso mesmo, isto é de que foi culpa da violência física praticada por ele contra ela. Em uma leitura alternativa, é possível interpretar que os roxos e os ferimentos tenham se originado da briga que Elvira e o marido travaram logo antes que ela o assassinasse. O motivo da briga poderia ter sido algo que ela descobriu “nos últimos dias”, quando seu castelo de cartas ruiu de vez.

    Essa falta de certeza foi o que mais me chamou a atenção. O suspense atrelado a essa dúvida fez muito bem ao texto – Hitchcock teria gostado dele.

    A leitura foi bem prazerosa e manteve meu interesse do começo ao fim. O fato de ser curto ajudou aqui, pois não havia muito mais a ser dito. Há um ou outro errinho de revisão, mas nada que comprometa. No fim, é um excelente trabalho. Parabéns e boa sorte no desafio.

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Muitíssimo grato. Poxa vida, cheguei a me emocionar em certos momentos de sua análise, sem brincadeiras. Fiz um recorte da tela e guardarei-o com carinho nos meus alfarrábios. Se puder lhe entreter ainda mais, recomendo meus links no https://linktr.ee/Vlaferrari, onde disponibilizo inclusive minhas experiências em áudio (amadoras, mas muito legais de fazer). Grande abraço.

      • Gustavo Araujo
        10 de março de 2024
        Avatar de Gustavo Araujo

        Obrigado pela indicação, Vladimir. Vou conferir.

  13. Givago Thimoti
    18 de fevereiro de 2024
    Avatar de Givago Thimoti

    Elvira (B. T. Holder) 

    Primeiramente, gostaria de parabenizar o autor (ou a autora) por ter participado do Desafio Recomeço – 2024! É sempre necessária muita coragem e disposição expor nosso trabalho ao crivo de outras pessoas, em especial, de outros autores, que tem a tendência de serem bem mais rigorosos do que leitores “comuns”. Dito isso, peço desculpas antecipadamente caso minha crítica não lhe pareça construtiva. Creio que o objetivo seja sempre contribuir com o desenvolvimento dos participantes enquanto escritores e é pensando nisso que escrevo meu comentário.

    No mais, seguimos para minha avaliação: 

    Impressões iniciais: 

    – Um conto um tanto difícil de avaliar

    + Tema importante

    +/- O recomeço da personagem talvez não combine tanto com o que penso sobre recomeço, mas também não tá diametralmente oposto.

    Resumo: “Elvira” é um conto que versa sobre o recomeço da personagem Elvira. Mergulhamos através de flashbacks da mulher relembrando o início de seu relacionamento com Ivan, ao passo que percebemos a luta diante da culpa em mandar matar seu marido, após ele revelar-se como um homem abusivo e violento. 

    Corpo (gramática/estilo de escrita): 

    Quanto à gramática, acho que percebi mais alguns erros de vírgula que separaram o verbo do sujeito.

    O estilo de escrita foca bastante nas sensações da personagem. Contudo, não arrebatou esse leitor, infelizmente.

    Alma (o que tocou ou não o leitor. Pontos fortes e/ou fracos): 

    Bom, penso que a opção da/do autora/autor por focar nas sensações da personagem Elvira foi uma boa opção. Contudo, duas coisas me incomodaram; a maneira como foi escrita, primeiramente. Não foi uma escrita que me pegou ou conquistou. A sensação que tive, ao final do conto, era de que faltou trabalhar melhor essa parte, com mais esmero, com mais vocabulário , com mais enfeite para arrebatar mesmo o leitor. Além disso, esse pêndulo entre passado e presente deve ser muito bem trabalhado, para evitar que o leitor sinta-se perdido no meio, o que acho que particularmente foi bem feito. Ainda assim, creio que sobrou um pouco de espaço no conto para investir em algo que desenvolvesse melhor o relacionamento conturbado dos dois, talvez algo como o primeiro sinal de problema, não sei.

    Além disso, também senti que o(a) autor(a), ao fazer esse movimento pendular entre passado e presente, perdeu um pouco de espaço para desenvolver melhor as sensações de Elvira. Creio que, como é notório no nosso país a relação turbulenta, violenta e abusiva num relacionamento entre homem e mulher, a história em si é preenchida por esse conhecimento notório, não necessariamente criando a empatia do leitor pela forma como se conta a história, mas talvez mais pelo cenário nacional dos relacionamentos. Por focar nas sensações de Elvira e focar no presente, a sensação que tive por vezes parece que foi um retrato quase sutil demais. 

    Ainda assim, é um conto denso, com potencial e que toca o leitor pela situação de Elvira.

    Nota: 7

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Mutíssimo grato. Como disse aos colegas acima, a riqueza do português às vezes, fica comprometida pelo excesso de regras e acabamos por nos trair entre o falar e o escrever. No papel, falar é diferente de escrever, não é? Não compreendi o “quase sutil demais” e na sequência “é um conto denso”. Mas ainda assim, muitíssimo grato pelas avaliações. Abraços.

      • Givago Thimoti
        11 de março de 2024
        Avatar de Givago Thimoti

        Olá, Vladimir! Imagina o seu conto como uma pessoa magra que esteja vestindo uma roupa folgada demais. Aí ela tira a roupa e revela músculos; sutil, mas denso.

        Ou um iceberg; ele tem a ponta ali, que às vezes até parece inofensiva. Embaixo, tem um trambolho que rasga o casco de um navio (aqui não estou dizendo que seu conto é um trambolho rs)

        Sutil, mas denso

  14. Antonio Stegues Batista
    18 de fevereiro de 2024
    Avatar de Antonio Stegues Batista

    O primeiro parágrafo foi construído com algumas frases com sentido figurado, “correntes de elos grossos, fazendo a cabeça pender diante da derrota”. Fiquei meio confuso com “ aguardar aquela dor ao engolir errado, passar”. No segundo parágrafo, “coração esparramado, e  desmilinguido”. Desmilinguido,  essa palavra não possui um significado oficial, uma origem, mas pode ser interpretada como  enfraquecido, debilitado. Creio que ela não é muito usada por causa da pronúncia e sonoridade truncada. Os parágrafos seguintes também tem algumas frases com sentido figurado, nada errado, mas o importante numa narrativa é a originalidade do que se diz, é importante evitar frases clichês. A protagonista Elvira conheceu Ivan e foi paixão à primeira vista. Ela está no banheiro, diante do espelho, lembrando do namoro, do casamento, dos dias felizes. As lembranças de Olivia e Ivan, são acentuadas, destacadas no texto com frases mais objetivas, coerentes e lógicas.

    Adiante, o narrador sugere que o casamento deles tornou-se turbulento. Com o tempo, Ivan revelou a sua verdadeira índole, passando a maltratar Olívia. No final do conto, ela está lavando uma faca ensanguentada e isso mostra que matou o marido. Não me surpreendeu, é previsível. De qualquer forma bom conto, boa escrita mas achei que algumas frases poderiam ser melhor elaboradas, evitando excesso de sentido figurado. Boa sorte no desafio.

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Perdão caro Antônio. Mas confesso que, na minha opinião, confundir o nome da protagonista ao comentar, revela um desleixo. Como se comentar fosse uma obrigação. Ainda assim, dicas muito sugestivas que serão consideradas para aprimorar minha escrita. Muitíssimo grato. Abraços.

  15. mariainezsantos
    16 de fevereiro de 2024
    Avatar de mariainezsantos

    texto elaborado com esmero e requinte. A trama se constrói e ao mesmo tempo se desmonta com simplicidade e instiga o leitor a continuar a leitura

  16. Fernanda Caleffi Barbetta
    15 de fevereiro de 2024
    Avatar de Fernanda Caleffi Barbetta

    Parabéns pelo seu texto.

    Gostei de como foi intercalando a narrativa com informações do passado, nos ajudando a compreender a história das personagens.

    Interessante como foi mantendo o suspense durante toda a narrativa. Sabemos que vai acontecer algo, mas não sabemos o que.

    Abaixo, algumas sugestões. Use o que achar que vale. É apenas minha opinião.

    Gosto de finais surpreendentes, mas não sei se entendi direito rsrs. Pode ser falha da leitora aqui. Como sugestão, deixe algumas dicas pelo caminho para que o desfecho inesperado possa ser justificado, possa fazer sentido quando o leitor recorrer ao texto em uma nova leitura. Não vi nada que citasse ou indicasse o uso de uma faca, um assassinato ou tentativa de suicídio.  

    Não sou contra o uso de adjetivos e advérbios, mas, em alguns casos, houve um exagero, como neste parágrafo: “O coração jazia esparramado e desmilinguido, como no chão de uma cela escura, com uma janela quadrada, no alto e inatingível. Uma claridade desenxabida de um dia nublado e sem sal.

    Houve também um excesso de metáforas.

    “Era algo como aguardar aquela dor ao engolir errado, passar.” – não entendi.

    “Havia um resto de vivacidade surpreendida” – não sei se a escolha pela palavra surpreendida foi a melhor. Não fez sentido para mim.

    “— Mulher, o pior já passou! — ouviu-se sussurrar” – Sugiro tirar a exclamação, já que foi um sussurro.

    “Um passado de sorrisos e confiança, jazia em uma imagem tão diminuta de si própria” – quem jazia? Se for o passado, tirar a vírgula.

    Cuidado com os clichês. Tanto de palavras quanto de ações muito utilizadas. Exemplos: “sacudir a poeira”, “A montanha era alta demais para escalar”, “pedrinha no interior do sapato”, “receios povoavam sua mente”

    “Quando estiver a sós, tiro (tire) o sapato e a palmilha.”

    As aspas são utilizadas em casos distintos, como em “Meu Deus!” e “Quando estiver a sós, tiro o sapato e a palmilha” e em outras situações, como “as candidatas” e “a igreja de todos os bêbados”. Isso pode atrapalhar a leitura. É legal ter uma padronização. No primeiro caso, não entendi se é pensamento da personagem ou do narrador.

    “Dedicara-se desde o princípio aquilo (àquilo) tudo que acabava ali, atrás da porta” – cuidado para não tornar a narrativa muito cifrada, de difícil entendimento.

    Em alguns trechos, a vírgula precisa ser suprimida. Exemplos: “Um único olhar de Ivan, acendera” / “Sua razão aliada ao tempo, corrompeu toda a ternura” / “As descobertas ao longo dos últimos dias, formavam os demais”/ “O que importava agora, era a certeza no fundo”

    “Torceu a cabeça para à (a) esquerda”

    “Espremeu a maçã do rosto no ombro, travando a boca e cerrando os dentes” – difícil visualizar esta cena.

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Bem, Fernanda. Suas observações me serão úteis e se há um comentário, dos tantos que recebi, que notou o mesmo erro que eu (as aspas), foi o seu. Os dois primeiros são pensamentos de Elvira. “A Igreja de todos os bêbados” é uma frase de Cazuza, no poema/música “Down em Mim”, ainda na fase Barão Vermelho. É uma citação.
      No mais, faltou a revisão sim, confesso. Todas as consultas com os conhecidos sobre revisões, retornaram com $$ e não tenho nem mesmo uma contrapartida para a barganha. Mas prometo melhorar. Muitíssimo grato. Abraços.

  17. Angelo Rodrigues
    14 de fevereiro de 2024
    Avatar de Angelo Rodrigues

    Elvira

    Por B. T. Holder

    Conto bom de ler, onde o autor nos relata uma história acerca de uma relação abusiva entre Elvira e o marido Ivan, onde nos deixa um ‘cheiro’ de crime passional.

    O autor, ao abordar o tema opta por não fazer um lide do texto que virá a seguir, e vai construindo lentamente a história que ocorre entre o casal. Não entrega necessariamente o desfecho, e o faz de forma um tanto enigmática ao final, insinuando que ela, Elvira, passou a faca em Ivan.

    Bem lentamente vamos conhecendo o caráter da protagonista e do marido. Ela, um tanto carente de companhia, sonhadora, em busca de uma vida estável. Ele, um sedutor que se vai transformando – esta parte é negligenciada no texto, provavelmente para não ‘entregar’ o final – até se mostrar um monstro abusador.

    O recomeço de Elvira, com certeza, será um tanto ou quanto problemático, dado que ela não voltará ao estado anterior do que um dia fora, mas provavelmente por decorrência da dor que sentia ao lado do marido, optou por dramaticamente recomeçar a vida traumática, agora sem ele, provavelmente tendo que conviver com o ‘crime’ que cometeu.

    Parabéns pelo conto e boa sorte no desafio.

  18. Regina Ruth Rincon Caires - Caires
    12 de fevereiro de 2024
    Avatar de Regina Ruth Rincon Caires - Caires

    Elvira (B. T. Holder)

    Na densidade deste texto, na alternância de sentido das palavras que descrevem todas as “alegrias” e amarguras vividas por Elvira, o leitor mergulha exatamente no “mundo real” vivido pela personagem. O autor foi brilhante. A cada parágrafo lido, não há como não ficar incomodado com a situação sem saída. A anulação em vida, a humilhação suportada silenciosamente, a violência no corpo e na alma, a vontade de parar de “empurrar com a barriga”, o desejo de que tudo acabe para permitir um recomeço – isso tudo desperta a sensibilidade do leitor. E ao final, extrapolando o limite, chega o peso do feito. Como encarar. E agora?! Alívio ou aflição? (“Estava quase feliz.)”.

    Conto bem elaborado, bem escrito. Narrativa com boa construção e o autor soube, com doses acertadas, determinar o crescente dos fatos para fechar a trama.   

    Se há qualquer deslize na escrita, não percebi. De maneira alguma retirou o encanto do texto.    

    Bem encaixada a citação do grande Cazuza: “que o banheiro é a igreja de todos os bêbados (Down em mim); e também a referência à agonia de Harry acamado com a perna gangrenada: “Estava tão entregue, quanto o Harry de Hemingway aos pés do Kilimanjaro. A gangrena para ela, estava na alma.”.

    Interessante como descreve o monstro enorme do pessimismo: “Como uma pedrinha no interior do sapato: incomodava por um tempo e acabava por integrar-se à rotina do caminhar.” E, no comodismo, como resolvia: ”Quando estiver a sós, tiro o sapato e a palmilha.”

    Tocante como é feita a narração da gota de lágrima na cuba, o reflexo da escova azul é lindamente contado. E intrigante é “do outro lado da porta”. Lindo!

    B. T. Holder, parabéns pelo trabalho!

    Boa sorte no desafio!

    Abraços…

    • Vladimir Ferrari
      10 de março de 2024
      Avatar de Vladimir Ferrari

      Regina, confesso que não sei o que dizer. Se existe uma prova de que “o melhor está no final”, a prova é essa. MUITÍSSIMO GRATO. Cabe a nós autores, entreter ao menos UMA alma que ainda não faz parte de nossa convivência. É esse o papel do artista. Eu, agora, fiquei feliz pra k*& de, ao menos aos seus olhos, ser um artista (ainda que só na brevidade de um conto). Muitíssimo grato, mais uma vez e Grande Abraço.

      • Regina Ruth Rincon Caires - Caires
        10 de março de 2024
        Avatar de Regina Ruth Rincon Caires - Caires

        Menino, obrigada pelo retorno! Olhe, eu sou uma leitora voraz, e sou um combo de muita “razão” e excessiva “paixão”. Portanto, tudo aquilo que avalio ou escrevo vem impregnado dessa alquimia. Parabéns pelo trabalho!

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Publicado às 10 de fevereiro de 2024 por em Recomeço e marcado .