EntreContos

Detox Literário.

Falta Pouco, Galdino (Affonso Luiz Pereira)

O quê?

Vosmecê veio aqui pra saber sobre a história de Severino Bezerra? O filho da falecida Inácia?

Sente aí neste banquinho, moço, faz favor. Fique à vontade. Não repare na bagunça, viu? A casa é simples, mas é de gente honrada. Quer um golinho d’água? Um café?

Não?

Agora, escute bem o que eu vou te dizer, porque essa história que carrego na alma não é pra ser contada de qualquer jeito, não.

Pra começo de conversa, o Severino Bezerra era muito cabra-macho. Ah, se era. Não havia criatura neste mundão de meu Deus que botasse dúvida de sua brabeza. Sim, pois eu lhe digo uma coisa curta e certa, moço: o caboclo não se metia em encrenca à toa da qual não pudesse resolver na ponta de punhal.

Na época desse furdunço, quando Lampião ainda furava o sertão pra cima e pra baixo, já se botava por riba das costas do Severino a morte de uma dezena de desafetos. A fama dele corria longe, visse? Muito além das terras da pequena cidade de Juazeiro do Norte, onde ele morava, zunia nos ouvidos do povo as proezas de sua valentia.

O meu compadre e o folclore em torno de sua figura só tinham rival em outro sertanejo de igual fama, conhecido como Serapião das Almas. E desse aí pouco se sabia, a não ser que tinha parte com o capeta, o bode Preto. Rapaz, esse bicho arredio morava entocado lá pros fundões da caatinga, bem onde o vento fazia a curva, longe das vistas dos homens de bem.

A verdade, seja dita, é que o velho Serapião era traquejado nas coisas do além. Falava com gente morta. Ahã… e não era em sonho nem cochicho de vento, não. Ele riscava no papel as palavras de quem já tinha virado pó. Ô se isso lá era coisa de cristão temente a Nosso Senhor Jesus Cristo.

Um dia, a mãe do Severino, de quem o enfezado puxou a ruindade, bateu a caçoleta sem aviso. Da boca do povo corria o fuxico que a velha já ia tarde. Ora, ninguém gostava dela porque a surucucu carecia de freios na língua. Falava mal de todo mundo.

O tranco da morte da santa mãezinha pro coitado do Severino foi grande. Aaaah, se foi. Ficou o caboclo desarvorado de um tal jeito que, mal o corpo da defunta se ajeitou no colo da terra, veio ele ter comigo naquela noite medonha.

— Galdino, vosmecê vai me levar inté a tapera do velho Serapião das Almas.

— Oxente, homi! Vosmecê endoidou de vez, é? Aquilo lá tem parte com o cão! — eu disse, assustado.

— Vixe, deixe de ser abestado, homi! Eu lá tenho medo de criatura esquisita feito ele? Minha santa mãezinha finou-se num repente. É capaz dela precisar de alguma coisa lá do outro lado. O velho Serapião fala com quem já bateu a caçoleta. Pois então?

— Ô, meu Padim Ciço! Lá vou, não! Deus que me defenda — falei, fazendo o sinal da cruz.

Aí o porquêra do Severino, como quem não queria nada, puxou a peixeira da cintura e começou a cortar o vento com ela.

— Deixe de ser cagão, homi. Vosmecê já conhece bem o caminho inté lá. Vosmecê tá me fazendo uma desfeita, sabia? E homi desaforado, mesmo sendo amigo meu, eu deito a faca no gorgomilo sem vacilar. Fique atento.

Pois foi bem assim que Severino me convenceu a ir com ele, cada qual montado no seu jegue, pras profundas da caatinga, numa escuridão dos diabos.

Rapaz — me lembro bem — o vento soprava forte naquela noite. Levantava redemoinhos de poeira. A lua, muito da preguiçosa, dava pouco préstimo pra alumiar o caminho. Os braços retorcidos dos mandacarus pareciam os de uma alma penada, visse? Coisa esquisita que só.

O silêncio era tão grande, mas tão grande, que qualquer estalo no mato fazia meu coração querer saltar pela boca. Severino, por outro lado, seguia adiante mangando de minha pessoa. Disse que eu mais parecia uma velha cheia de cisma. Depois de umas tantas horas, já de destino certo e enveredando por trilhas e atalhos, calhou de a gente ver ao longe o casebre do feiticeiro.

A luz buliçosa das velas, à mercê do vento, escapava pelas gretas das paredes pregueadas da tapera. Aquilo batia nos olhos da gente feito um farol maligno dentro do negrume da noite. Dava medo. Eita visão dos infernos. A vontade era me escafeder dali mato adentro. Olhei pra peixeira escorrida na cintura do meu compadre e engoli o pensamento.

Mal invadimos o terreiro do casebre sombrio, o meu amigo não contou passo. Apeou do jegue e mandou pernas na direção da entrada do cafuá do bruxo. Não bateu palmas anunciando a chegada. Nem teve a educação de chamar o dono da casa pelo nome. Simplesmente empurrou a porta e emburacou lá dentro, emproado, que nem galo velho quando faz presença pra galinha nova.

E no rastro dele fui junto, não com a mesma valentia, pois não me criei pra desafiar alma penada. Ainda mais que sou devoto de Santo Antônio, temente a Nosso Senhor.

Lá estava o Serapião atrás de uma velha mesa carcomida de cupins.

Cruz credo! Não conhecia o cabra de presença porque dele só ouvira falar histórias. De fato, como se dizia por aí, o homem mais parecia um cão chupando manga de tão feio. O ambiente agourento da tapera e a luz tremeluzente das velas em volta dele faziam sombras dançarem naquela cara ossuda, piorando ainda mais a sua figura.

De começo, após a nossa entrada repentina, o bruxo não nos deu atenção. O Severino, encrenqueiro de marca, tomou aquilo como desaforo. Rapaz, não é que o porquêra pigarreou alto, assim como quem puxa catarro pra limpar o gorgomilo, e cuspiu no chão da sala do caboclo?

Aí o caldo entornou.

Os olhos negros da cara mofina do velho, pousados no papel na mesa, tomaram prumo e se endireitaram na nossa direção. Aaaah, rapaz, só da mirada do caboclo já veio um bafo gelado que me arrepiou o espinhaço todinho.

O meu compadre, lá daquele jeito grosso de ser, não tomou tento e foi logo intimando:

— Serapião, olha só, comi muita poeira nestas estradas pra mode de vosmecê me dizer como anda a minha santa mãezinha lá do outro lado. A pobre bateu a caçoleta não faz nem sete dias. Quero saber se ela tá precisada de alguma coisa.

Moço, tenho pra mim que o bruxo já devia estar de conluio com o Sacripanta, em meio d’algum tipo de ritual. Porque assim que meu amigo cuspiu a intimação, o endiabrado começou a riscar a folha de papel num apressamento desembestado. Os olhos do cabra reviraram, branquearam e fugiram pra não sei d’onde. Por pouco não mijei as calças quando ouvi a voz espremida e roufenha da velha Inácia, mãe de Severino, saindo da boca da criatura. Foi bem assim:

— Fio… meu fio… Severino… meu menino… tô no fundo do inferno e não tô gostando nada deste diacho de lugar. Vosmecê tem que me tirar daqui, meu fio.

— Oxente, e eu faço o quê, mãezinha?

— Meu fio, meu menino, já fiz um combinado aqui com o Belzebu. Vosmecê só precisa me ajudar.

Foi bem nessa hora que o Serapião das Almas começou a se estrebuchar. Vixe Maria, mãe do céu! O homem ficou uma coisa medonha. As mãos a bolinar o papel pareciam querer se afastar do serviço da escrita endemoniada. O traquina malacabado do velho fazia esforço pra mode de se livrar do encosto maligno, mas não tava conseguindo, não.

Daí, vosmecê agora vai botar dúvida nas minhas palavras, mas te juro que não sou cabra dado a mentir à toa, visse? Por riba da cabeça do velho Serapião começou a se formar uma nuvem empanturrada, escura, parecendo tempestade braba. Ahã… e dentro da sala, veja vosmecê. Sim, senhor. Uma nuvem! Uma nuvem dentro da sala. Homem do céu, vosmecê acredita num negócio desse?

Mas segure o assombro, moço. O pior mesmo vem por aí. De dentro da nuvem começou a brotar um mundaréu de criaturas medonhas, escapulindo das profundas

Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, pensei, o Serapião tinha aberto a porteira dos infernos!

Senti o coração saltar no gogó, me dando falta de ar.

As criaturas bisonhas se misturavam de carne com carne, grudadas umas nas outras: homens, mulheres, ratos, baratas, esqueletos humanos. Era uma força de bichos que não dei conta de atinar. Todos malformados. Um por riba do outro, o outro por riba de um. Olha, era uma misturança que fazia inté mal pros olhos do vivente.

E no meio daquele rebuliço das profundas, entre almas e demônios, não é que apareceu a cara da velha Inácia, cravada no bucho do Bode Preto?

Vixe Maria, mãe do céu!

Eu tentei me escafeder mundo afora, mas meus gambitos travaram. Lá do alto, a surucucu mandou recado pra Severino, botando minhoca na cachola dele:

— Meu fio, presta atenção. O coisa-ruim aqui me aprometeu que, se vosmecê sangrá, esfolá, matá pra mais de trinta cabras, ele bota minha alma no corpo outra vez.

— Mãezinha, a senhora tem certeza?

— Oxente, se não tenho! Pode começá com o Serapião aí, esse fio d’uma égua parideira, que num tá fazendo gosto d’eu proseá com vosmecê. Mata ele. Cutuca a peixeira velha no bucho desse lazarento.

Rapaz, não deu tempo de nada, visse? Foi num repente.

O Severino, esporeado que nem galo de briga, correu com a peixeira na mão, mergulhou por riba da mesa e, num corte de banda, sangrou o gorgomilo do velho Serapião. O desinfeliz emborcou de cabeça, virado de pernas pro ar. O homem não parou o serviço encomendado, não. O sangue do bruxo espirrou pra tudo quanto foi canto.

Vi tudo com estes olhos que a terra há de comer. Enquanto Severino golpeava o corpo estrebuchado do outro atrás da mesa, lá do alto, dentro da nuvem, as criaturas dos infernos se agitavam. Parecia um ninho de cobras ao redor do bode preto, que levava a cara da velha Inácia pregueada no bucho.

Ela ria alto, feliz feito passarinho solto de gaiola, a maldita. Num repente, os olhos malignos dela caíram na minha pessoa. Ai, ai, meu Senhor Jesus Cristo… senti naquela hora a coisa ficar mais feia ainda. Um sorriso murcho da boca chupada da velha me tirou o prumo, e por pouco não desmaiei. A maldita me jogou essa no meio daquele atropelo todo:

— Severino, meu fio, esse aí já se foi. Larga dele. A alma já desencarnou e tá vindo pra cá. Agora, pega aquele estrupício lá, ó. Galdino é fuxiqueiro de marca. Estripa esse desgraçado também.

Daí pra frente, moço, pouco posso dizer. Não sei o que deu no meu compadre, meu parceiro de traquinagens da infância. Ele se levantou num pulo, todo manchado de sangue do velho Serapião, e se virou pra mim. Não disse palavra, mas os olhos dele diziam: vosmecê vai morrer, cabra!

E eu, de bobo não tenho nada, nem pedi explicação. Busquei forças não sei d’onde e destravei as pernas. Tomei o vão da porta escancarada pra noite e me larguei embora daquela tribulação maligna. O jegue ficou pra trás. Me enfiei desesperado no mato da caatinga, caindo, levantando, enquanto o riso da velha Inácia me azucrinava os ouvidos.

Quem sobreviveu àquela tragédia não esquece. Corri inté a cidade, fazendo o maior barulhão que aquele povo já viu. Eu berrava alucinado nas ruas empoeiradas de Juazeiro, alertando que Severino vinha estripar gente de bem pra resgatar a velha Inácia das garras do capeta. Muitos fugiram, outros não acreditaram.

Então, um pequeno grupo se armou de facas e armas de fogo pra esperar o lazarento nos limites da cidade. Foi assim que vimos o meu compadre, acompanhado da velha Inácia, desenterrada, apodrecida e amarrada no meu jegue. O couro encarquilhado da finada se rasgava em feridas profundas. Minhocas passeavam pelos beiços murchos, entrando e saindo das carnes abertas. O cabelo desgrenhado tapava partes da cara chupada.

Mas o pior era a pestilência desgraçada de podridão, moço! Era um fedor de carniça a empestear tudo à nossa volta. O pessoal armado tapou o nariz, engoliu o nojo, mas ninguém desviava a vista daquele desmantelo dos infernos. Quando a luz bateu de um certo jeito nas fuças da surucucu, vi a danada rindo, debochada, fazendo troça da cara apalermada do povo.

O Neco Pedreira, que tinha a língua solta e a mão firme no gatilho, botou peito e gritou:

— Pare onde vosmecê tá, Severino, seu desgraçado!

Se ele parou? Parou nada.

Quando o cabra apeou do jumento, a faca rombuda e os olhos dele tomaram brilho dentro daquele breu. Ninguém amoleceu o couro. Começamos a atirar. Os animais de carga, e a velha também, tombaram no chão. Mas Severino, não! O homem tava de corpo fechado. Nem bala entrava na carcaça do vivente! Ele berrou, correndo pra cima da gente.

Eita que foi um Deus nos acuda. Um desespero sem tamanho. Era só rastro de povo correndo pra tudo quanto era lado. Quem corresse mais chorava menos, porque Severino ia passando a peixeira em todo mundo. Era no pescoço, nas costas, nos braços, nas pernas… vixe… me dá um engasgo de choro só em lembrar…

(…)

Sim, obrigado, já estou melhor.

Então, como eu tava dizendo, naquela confusão dos diabos, o caboclo que o Severino não lanhava uma boa ferida pro resto da vida, morria estrebuchado, segurando as tripas no meio do mato. Olha esta cicatriz aqui nas minhas fuças. Tá vendo? Não nasci zarolho, não. Foi ele quem fez.

Bem… hum… vou dar o causo por encerrado. Não tenho mais o que dizer. Essa história que eu te contei já vai há muito tempo, sabe? Nunca mais botei os pés lá pras bandas de Juazeiro do Norte, mas sigo bem informado do que acontece naquele eitão de terra. É verdade. O Capeta, o Demo, o Coisa Ruim faz questão de me manter inteirado de como anda o combinado dele com a surucucu.

Como ele faz isso?

Aaaah… de vez em quando me bate um encosto brabo, sabe? Entro em transe. Boto medo em todo mundo aqui em casa. Nestas horas, sou tomado pelo sentimento de desespero de alguém, vítima de Severino, que, não conhecendo a região, acaba estripado e largado pra morrer sozinho dentro da noite, em meio à caatinga.

Então, moço, vejo claramente pelos olhos do moribundo, esvaindo-se em sangue, o casebre isolado; e lá no vão da porta, alumiada pelas velas tremeluzentes, alcanço com a vista boa, encostada no batente, a figura apodrecida da velha Inácia sorrindo seu sorriso murcho e me dizendo:

— Falta pouco, Galdino… falta pouco!

Sobre Fabio Baptista

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19 comentários em “Falta Pouco, Galdino (Affonso Luiz Pereira)

  1. Thales Soares
    29 de março de 2025
    Avatar de Thales Soares

    Considerações Iniciais:

    Nossa cara… que bagunça.

    A ideia de um terror no sertão, com elementos de religiosidade, inferno, bruxaria e promessas de ressuscitação é legal. Poderia render muito numa pegada mais seca, mas aqui a execução deixou a desejar, devido aos motivos que eu vou discutir daqui a pouco.

    O nome “Falta Pouco, Galdino” é ótimo. Simples, enigmático, e tem carga dramática. Pena que a história não faz jus.

    ***

    Pedradas:

    O estilo “caipirês” aqui presente é exagerado demais, tornando a leitura pedante. É um recurso estilístico interessante, mas aqui, não combina com o tom de terror que o autor parece querer construir. A linguagem tenta ser regional, mas vira uma caricatura. Parece que o texto tá gritando: “Olha como sou pitoresco!”. Resultado? Em vez de tensão, a gente só pensa em como o excesso de “vosmecê”, “fio”, “furdunço”, “surucucu” soa forçado e cansativo.

    O narrador fala demais. A história se perde em rodeios, interjeições, “oxentes”, e explicações que não contribuem com o clima ou com a progressão do enredo. Parece mais interessado em fazer gracinha do que em contar uma história de terror de verdade, e nisso o conto acaba se perdendo, pois ele não consegue se decidir se pende para um terror ou para uma comédia… e não, ele não funciona como um terrir, porque os dois aspectos aqui não fazem uma boa junção.

    O diálogo entre Severino e o bruxo são muito teatrais. Nada soa natural. Tudo tem aquela pegada de “cordel fake”, tentando fazer graça o tempo todo, mesmo em cenas de carnificina.

    O conto é desnecessariamente longo. Sei que ele está dentro do limite de palavras estipulado no desafio… mas devido a uma escrita desnecessariamente carregada, ele pareceu mil vezes mais longo do que os outros contos do desafio. O texto tenta manter o leitor pela fala do narrador, mas ela é enfadonha, repetitiva e cansa. Chega uma hora que você só quer que alguém morra logo pra terminar isso.

    ***

    Conclusão:

    Esse conto tenta ser terror nordestino com um toque de oralidade, mas o que entrega é uma narrativa inflada, pedante e arrastada, com um narrador que parece mais preocupado em exibir sotaque do que em contar uma história interessante. A técnica apresentada pelo autor(a) é impressionante, e a ideia de fundo tem potencial, mas a execução enterra tudo sob um mar de frases caricatas e situações grotescas mal aproveitadas. No fim, a sensação é de ter lido uma versão ruim de um episódio do remake de “Além da Imaginação” com uma narração do Tiririca.

  2. Pedro Paulo
    29 de março de 2025
    Avatar de Pedro Paulo

    COMENTÁRIO: A história é boa e aqui o regionalismo é bem trabalhado na linguagem e na premissa, com um homem temido intermediando com o diabo para reaver sua mãezinha, que se revela até pior do que ele. A narração é entregue por um personagem cuja voz é bem desenvolvida e faz o texto gostoso de ler, atribuindo-lhe uma identidade própria e mais verossimilhança. Torna-se mais fácil se imergir na leitura, até porque do começo é apresentado como um diálogo e em alguns pontos esse aspecto é renovado, com o leitor sendo considerado na cadência da história. O final é um desfecho agourento apropriado a um conto de terror e fecha a roda, levando de volta ao título. Ótima leitura.

  3. Luis Fernando Amancio
    28 de março de 2025
    Avatar de Luis Fernando Amancio

    Olá, Zé Honório,

    Seu conto arrisca uma linguagem regionalista e isso poderia ganhar minha desaprovação. Não é meu estilo predileto, acho perigoso ser autêntico optando por esse estilo narrativo. E regionalismo “para agradar a crítica”, convenhamos, ninguém merece. Tenho certa preguiça.

    Mas fui positivamente surpreendido. Sua narrativa é fluida, as frases estão bem construídas e não dão a impressão, ao menos para mim, de artificialidade. Você constrói de forma bem natural o seu regionalismo.

    Seu texto talvez seja um nordestern de terror ou algo que o valha. Você mobiliza bem os clichês do estilo e desenvolve boas cenas de terror, sobretudo na “aniquilação” final. No meu entendimento, você vai bem ao escrever  um conto com apelo “popular” (agradar leitores não necessariamente letrados na “alta literatura”) e também deleitar esse leitor mais exigente, que costuma exigir uma linguagem menos convencional.

    O registro negativo fica para o glossário na imagem de ilustração do conto. Além de ser uma forma de burlar o limite de palavras, acho esse zelo bastante desnecessário. Tenha confiança na qualidade do seu conto, o contexto é o suficiente para dizer ao leitor do que se trata cada expressão. E se não for, que quem lê faça o mínimo esforço de procurar o significado. Não é tão difícil. Foi uma preocupação legítima sua, mas infantiliza um pouco a sua relação com o leitor.

    Parabéns pelo conto e boa sorte no desafio.

  4. José Leonardo
    28 de março de 2025
    Avatar de José Leonardo

    Olá, Zé Honório.

    Tendo em vista as minhas limitações técnicas para apreciar melhor o seu conto e de modo a tentar esquentar meus comentários que acho um tanto insossos, decidi convocar, por meio de um ritual de fervura de miojo de tomate com leite coalhado e digitação de Zerinho-um no MS-DOS, a FRIACA® (Falsa Ruiva Inteligente Auxiliar para Comentários e Avaliações) para me ajudar nessa bela empreitada e proporcionar a melhor avaliação possível acerca do seu texto (dentro da minha perspectiva de leitor).

    FRIACA: Do que se trata o conto?

    R.: O tema do pacto fáustico; adjacências com o do Corpo-seco (tema já abordado por outro contos neste desafio, seja de forma explícita ou implícita, o que é curioso). Vemos Galdino, narrador-personagem, que nos conta a história de Severino Bezerra, um sertanejo valente como poucos, que após o falecimento de sua mãe (pessoa cuja ruindade nos parece célebre) resolve apelar a Serapião das Almas, um cabra-macho que se comunica com espíritos e tem pacto com o Aladdin-da-Lâmpada-Apagada, para ver como sua mãe está no mundo do Além. Desse modo, com o ritual feito, tanto Galdino quanto Severino Bezerra e o próprio Serapião irão experienciar acontecimentos medonhos.

    FRIACA: Como você vê a narração, o estilo, a estrutura, a técnica?

    R.: A escolha pela voz de coloquialidade foi muito acertada, ao meu ver. Aliada com a técnica empregada de se dirigir ao leitor como a um interlocutor (gosto de pensar que Zé Honório transcreveu o texto e o apresentou a nós) de cara nos remete àquele que talvez seja o texto brasileiro mais emblemático nesses sentidos, o Grande Sertão: Veredas. E não só por isso, posto que também trata de um pacto realizado (muito sutil).

    Creio também que o esforço para o(a) autor(a) se fazer entender, de dispor um pequeno glossário das palavras e expressões que poderiam causar dificuldades no leitor, é louvável mas também dispensável: as expressões são muito conhecidas, e mesmo palavras que aparentemente ocorrem regionalmente podem ser facilmente inferidas no texto. Mesmo o glossário não sendo parte do texto (está na ilustração do conto), achei importante pontuar esse aspecto.

    FRIACA: E quanto à adequação ao tema, à criatividade e ao impacto?

    R.: Adequando ao tema “Terror”. Desde o ritual de Serapião até o desfecho do conto (que lembra a Galdino que está sendo caçado por um inimigo cada vez mais à espreita), a atmosfera do horror impera no conto. Há cenas de puro gore e outras de tensão distendida (o medo dos moradores com a iminência da vingança de Severino e de sua mãe morta-viva).

    FRIACA: Indo um pouco mais a fundo nesse particular e apesar do aspecto subjetivo do que a história pode causar no leitor, é um conto para dar risadas ou aterrorizar-se?

    R.: Há vários elementos, nuances, facetas do conto que podem causar calafrios num leitor mais suscetível, sem falar do horror corporal (que tem alguma presença neste conto).

    FRIACA: Qual sua posição final sobre esse conto?

    R.: Gostei bastante do seu conto, Zé Honório (ou Galdino). Foi como ler um bom horror através da voz de Guimarães Rosa (ou de um regionalismo que emula o desse autor). Mesmo algumas repetições de expressões bem conhecidas não me fariam diminuir sua nota (se eu pudesse avaliar seu texto dessa forma).

    Parabéns pela estória e boa sorte neste desafio.

  5. danielreis1973
    27 de março de 2025
    Avatar de danielreis1973

    Comentário inicial (válido para todos os contos):
    Prezados participantes: este meu comentário NÃO É UMA CRITÍCA, É A MINHA IMPRESSÃO PESSOAL sobre o seu conto – e não é sobre você, como escritor ou ser humano!  Espero que os comentários possam ajudá-lo a aprimorar sua história ou sua escrita, num sentido mais amplo. Outra coisa é que não está sendo fácil é comparar os contos participantes, já que apesar do desafio estar  restrido a DOIS TEMAS (que inclusive tem fronteiras tênues, e às vezes se misturam entre si, em diferentes proporções), as diferenças dos gêneros literários escolhidos pelos participantes tornam muito difícil dar um valor absoluto entre os contos, quando colocados lado a lado. Então, o melhor humor não tem o mesmo efeito que o melhor terror, e um terror com elementos realistas pode ter um efeito mais impactante para mim que um horror com elementos de fantasia ou ficção científica – por isso, digo que é MINHA IMPRESSÃO, ok? As notas não representam “média para aprovação”, mas O EFEITO FINAL que me causaram.

    Dito isso, vamos ao:

    COMENTÁRIO ESPECIFICO:

    LOGLINE: Galdino, um sertanejo-narrador, conta em tom confessional sobre o evento misterioso da possessão demoníaca de Serapião e a busca junto a ele por parte de Severino da falar com a recém-falecida mãe, resultando numa cena dantesca de violência e morte que impressionou a cidade.

    TEMA ESCOLHIDO: Terror (regionalista). Não percebi tentativa de fazer humor voluntário.

    PREMISSA: O pacto com o demônio como sendo base de muitas histórias do folclore brasileiro – e a busca pelo contato com os mortos, numa inversão da ordem comum das coisas. Aqui só me parece que o mal não demonstra uma motivação efetiva, mas só um exercício gratuito de poder, diminuindo um pouco o impacto do clímax e, principalmente, a resolução final da história.

    TÉCNICA E ESTILO: aqui acho que está o ponto mais vulnerável do conto  – o esforço em dar uma dicção autêntica regional ao narrados às vezes escorrega numa “adaptação” de palavras sofisticadas em um sentido simplista – ou, então, num rosário de expressões regionais que parecem enfileiradas para dar mais “autenticidade” à narrativa. Não nego que o autor pesquisou bastante para escrevê-la, mas a história me cansou um bocado na leitura. Quanto ao final, achei estranho que ele e o diabo continuem “bons amigos”, trocando notícias e como vão as coisas…

    EFEITO FINAL: médio, reconhecendo a pesquisa linguística, que infelizmente foi muito além da construção da história, que a meu ver foi “montada” de uma passada só – e cortada no trecho com as reticências, para caber no desafio…

  6. Amanda Gomez
    27 de março de 2025
    Avatar de Amanda Gomez

    Oi, bem?

    Um conto com uma linguagem muito boa, escrita sem retoques e um enredo cativante. O sotaque do personagem já nos ganha… essa forma de contar, esses causos de tempos antigos lá pelas bandas do Nordeste. Gosto de histórias assim, é gostoso de ler.

    Não temos aqui uma história muito criativa — não me leve a mal… é só aquela sensação de já ter lido algumas parecidas antes, se duvidar até do mesmo autor. Mas é uma boa história, encaminhada super bem… personagens caricatos e interessantíssimos.

    O plano de fundo, que deixa o texto tanto com o humor carregado quanto com o terror iminente, é bem construído. Gostei das motivações dos personagens, do desenrolar… é divertido. É um ótimo terrir.

    Gostei do final e da frase compor o título — acho que foi uma escolha inteligente.
    Como vizinha do Nordeste, muita das palavras eu já conhecia sem precisar da “cola”, mas achei uma boa sacada usar isso na imagem.

    Parabéns pelo trabalho.
    Boa sorte no desafio!

  7. Mauro Dillmann
    26 de março de 2025
    Avatar de Mauro Dillmann

    Um texto com linguagem regional, sotaques e gírias locais. Nesse sentido, é bem criativo.

    Está bem escrito. O conto é articulado, com início, meio e fim interessantes.

    De repente surge um personagem novo, não desenvolvido no conto: Neco Pedreira.

    Mas não sinto o horror, nem a comédia presentes no texto.

    Um conto dinâmico e bem pensado.

    Parabéns!

  8. claudiaangst
    25 de março de 2025
    Avatar de claudiaangst

    Para este desafio, utilizarei o sistema de avaliação TERRORIR:
    T(ítulo) — FALTA POUCO, GALDINO — Falta pouco para…? Quem é Galdino?
    E(nquadramento ao tema) — Terror? Sim! ☠️😈
    R(azão de gostar do conto) — A pegada regionalista torna o texto compatível ao tema abordado. A mistura de realidade e sobrenatural cria uma sensação de terror crescente. 😬😈
    R(evisão) — Devido à escolha pelo vocabulário regionalista, não há como apontar falhas. Também quando há erros gramaticais dentro das falas não é possível corrigir, já que se trata do linguajar de determinado personagem. Na verdade, nem tentei encontrar deslizes. 🧐
    O(utras questões técnicas) — O linguajar regionalista pode não agradar a todos, é um recurso que pode tornar o texto mais familiar a algumas pessoas, mas também cansativo para outras. 😦
    R(azão de desgostar do conto) — O uso excessivo de regionalismo, a abordagem difusa do tema terror.
    I(ntesidade da narrativa) — A intensidade do conto começa a aumentar quando a mãe de Severino pede que ele a ajude a voltar ao mundo dos vivos, e o único meio para fazer isso acontecer é matar ao menos trinta pessoas, a fim de cumprir um pacto com o diabo. Daí em diante, o terror só se intensifica.
    R(esumo da ópera) — Um bom conto, regionalista – sem dúvida alguma, que apresenta o tema pacto com o diabo (Fausto de Goethe manda lembranças). 💀😈
    Parabéns pela sua brilhante participação no desafio e boa sorte!

  9. jowilton
    24 de março de 2025
    Avatar de jowilton

    Bom “causo”. O texto narra a história de Galdino, que acompanha Severino, um cabra-macho da moléstia, numa viagem para visitar o “feiticeiro” Searapião das Almas, na tentativa de entrar em contato com a mãe de Severino, que havia batido as botas recentemente.

    A narrativa é muito boa, conduzindo sem nenhum problema de fluidez e entendimento, mesmo com o uso do regionalismo. A técnica também é muito boa. O conto é meio que uma tragicomédia, com alguns elementos de terror. A comédia se sobressai. O enredo é simples, bem de “causo” que nossos avós costumavam contar. Bom impacto.

    Boa sorte no desafio

  10. andersondopradosilva
    23 de março de 2025
    Avatar de andersondopradosilva

    FALTA POUCO, GALDINO investe no regionalismo. É um investimento perigoso, porque pode soar batido, sobretudo se vazado ao estilo de Graciliano, Ubaldo Ribeiro ou José Cândido, como é o caso. No entanto, no contexto do desafio, foi único. Foi bom observar a oralidade marcando presença, assim como a literatura fora do eixo Rio-São Paulo, ainda que o autor possa ser destas bandas. Escrever regionalismo não é uma habilidade universal, não é de se desprezar. E o regionalismo e o estereótipo é uma boa forma de produzir humor, ainda que o texto também possua alguns elementos de terror. Apenas o glossário depõe contra o texto, pois o sentido das palavras poderia ser depreendido do contexto. Faturou nota 4,6 e o terceiro lugar na minha lista.

  11. Priscila Pereira
    22 de março de 2025
    Avatar de Priscila Pereira

    Olá, Sr Autor! Tudo bem?

    Gostei bastante do seu conto!

    Colocar um glossário na imagem foi uma forma genial de burlar o limite de palavras! Muito criativo, embora, pra mim, desnecessário. Se não tivesse, não prejudicaria a história.

    Não sei se foi sua intenção, mas a escolha de narrar o conto com regionalismo tirou o peso e a seriedade que o conto teria em um estilo mais usual de narração e acrescentou (pra mim) comicidade, mesmo que no teor o conto seja totalmente de terror.

    O conto está muito bem escrito, com personagens marcantes e verossímeis, e um enredo forte e bem amarrado. Só entendemos o título no final, o que foi uma boa sacada.

    O conto tem um nível de qualidade alto e espero que fique muito bem colocado no certame.

    Parabéns pelo conto e boa sorte no desafio!

    Até mais!

  12. Gustavo Araujo
    22 de março de 2025
    Avatar de Gustavo Araujo

    Muito bom o conto. É um terrir bem construído, com o jeitão de causo do interior. A narração em caipirês não ficou forçada. Ao contrário, casou bem com a história. Em vários momentos me senti como se estivesse à mesa de um bar em uma cidade do interior ouvindo uma lenda local. De fato, ri e até me surpreendi com a descrição de algumas cenas mais próximas do horror, sem que isso tivesse parecido abrupto demais. Mérito do autor, que criou uma narração fluida, agradável de ler e capaz de fazer sucesso com qualquer público.

    A birra de minha parte fica com a imagem que ilustra o texto, funcionando como um dicionário completamente inútil. O leitor é inteligente, caro autor, não precisa desse tipo de muleta. Mesmo as expressões mais desconhecidas (não há) seriam facilmente absorvidas pelo contexto. Sugiro que numa futura revisão essa imagem seja suprimida. É por conta dela que não posso dar nota máxima a esta ótima história.

    Nota: 4,5

  13. leandrobarreiros
    22 de março de 2025
    Avatar de leandrobarreiros

    O conto está muito bem escrito e envolvente. Achei a história bem original, inclusive a criação do protagonista e um antagonista . Ou, melhor dizendo, talvez dois antagonistas se considerarmos Galdino como nosso principal. Os personagens tem bastante personalidade, mesmo com um espaço tão curto.

    Os elementos de terror ficaram muito bem apresentados e as cenas envolventes. Foi também a primeira vez que tive contato com um conto de terror usando um regionalismo tão forte.

    Sobre isso, o regionalismo deu um ar meio cômico pra coisa toda na minha leitura. Se foi o objetivo do autor, ótimo. Se não, talvez seja interessante rever o uso.

    E, de toda forma, achei ele um pouco exagerado, de modo que ficou um pouco cansativo mas, aqui, pode ser apenas minha falta de hábito com esse tipo de leitura.

    No mais, as cenas de terror estão muito bem construídas e provocam imagens fortes. Um bom trabalho.

  14. Marco Saraiva
    22 de março de 2025
    Avatar de Marco Saraiva

    Conto muito bem escrito. Técnica perfeita. Esta pegada informal e cheia de regionalismos é sempre muito legal de ler quando bem feita (e péssima quando mal feita). Aqui você a usou com louvor. A linguagem do conto carrega um peso enorme aqui: dita o tom, estabelece a atmosfera, e inclui o leitor na história. Me senti vendo tudo se desenrolar diante de meus olhos, como se Galdino estivesse ao meu lado contando cada detalhe!

    A história é boa, daquelas que, apesar de um pouco simples, sempre são legais de ler quando bem executadas. Me diverti muito com a leitura. Especialmente quando a mãe de Severino aparece e inicia a parte mais tenebrosa da leitura. Isso se fosse mesmo ela!

    Só achei que o texto poderia fazer melhor uso das criaturas do inferno que vieram com ela. Elas foram narradas saindo do portal, mas nunca vieram com Severino para a cidade. Oportunidade perdida mas… não muda muito do meu sentimento: um conto divertido e muitíssimo bem escrito. Parabéns!

  15. Givago Domingues Thimoti
    17 de março de 2025
    Avatar de Givago Domingues Thimoti

    Falta Pouco, Galdino (Zé Honório)

    Bom dia, boa tarde, boa noite! Como não tem comentários abertos, desejo que tenha sido um desafio proveitoso e que, ao final, você possa tirar ensinamentos e contribuições para a sua escrita. Quanto ao método, escolhi 4 critérios, que avaliei de 1 a 5 (com casas decimais). Além disso, para facilitar a conta, também avaliei a “adequação ao tema”; se for extremamente perceptível, a nota para o critério é 5. Caso contrário, 1 quando nada perceptível e 2,5 quando tiver pouco perceptível. A nota final será dada por média aritmética simples entre os 5. No mais, espero que a minha avaliação/ meu comentário contribua para você de alguma forma.

    Boa sorte no desafio!

    1 – ruim 😓 / 2- abaixo da média😬  / 3- regular,acima da média,   😉/ 4- bom 😇/ 5- excelente!🥰

    Critérios de avaliação:

    • Resumo:

    “Falta Pouco, Galdino” é um conto que Galdino nos apresenta, a partir de um relato bem regionalista, o causo entre ele e o seu “amigo” pistoleiro Severino Bezerra, que tenta recuperar sua mãe do inferno após uma sinistra visita Serapião.

    Terror slasher no meio do sertão cearense! Nota 5!

    • Pontos positivos e negativos: 

    Positivo: regionalismo, amooooo. Trechos muito bem trabalhados em termos de descrição, dignos de nota, em especial durante o desbravar dos dois amigos.

    Negativo: escrita não tão bem trabalhada, meio inconsistente entre o coloqualismo e o rebuscado final abrupto e que não encerra nada. O desfecho é engolido, encerrado em decorrência do trauma… Mas foi uma saída antinatural, para mim; digo isso porque o narrador-personagem, que deu tantos detalhes, o fato principal do texto (Severino endemoniado, com o corpo fechado, matando no estilo slasher Juazeiro do Norte), foge de sua explicação 

    • Correção gramatical – Texto bem (mau) revisado, com poucos (muitos) erros gramaticais. 5

    O regionalismo traz uma questão interessante nesse aspecto. As regras gramaticais por vezes são subvertidas e tão subvertidas que prejudicam uma análise nesse critério.

    Nesse conto em especifico, em que pese o conto adote o coloquialismo em grande parte, têm alguns trechos cultos. Preferi me debruçar sobre essa parte. Eles estão muito bem escritos. Não deduzi pontos, no final das contas.

    Duas únicas observações: Bode Preto (no início, foi escrito bode Preto) e faltou alguma expressão que significasse conversa nesse trecho aqui (veio ele ter comigo naquela noite medonha.)

    • Estilo de escrita – Avaliação do ritmo, precisão vocabular e eficácia do estilo narrativo. 2

    Eu, pessoalmente, sou muito fã do regionalismo enquanto estilo de escrita. Acho que já escrevi umas 3 vezes aqui no EC. 

    Bom, o que me fez tirar pontos nesse quesito foi a inconsistência no estilo. Tem vezes, durante o conto, que a escrita enfileira algumas expressões regionais típicas quase prontas (exemplo: Ô se isso lá era coisa de cristão temente a Nosso Senhor Jesus Cristo./. Depois, utiliza-se de uma linguagem mais rebuscada que quase não parece propriamente do personagem e sim do autor. Isso precisa ser retrabalhado, mantendo um tom mais equilibrado entre os dois.

    Ainda assim, é uma escrita que, mal ou bem, emula o sertão nordestino cearense. Talvez mais pelo cenário conhecido que reside no imaginário do brasileiro do que pela construção em si.

    O glossário enquanto imagem do conto demonstrou também o cuidado do autor em pesquisar e buscar a melhor forma de retratar. A execução deixou um pouco a desejar, ao meu ver.

    Quanto ao ritmo, numa analogia aos desfiles das escolas de samba, a evolução deixou a desejar; o desfecho me pareceu apressado, para encaixar a narrativa dentro do limite do desafio.

    • Estrutura e coesão do conto – Organização do conto, fluidez entre as partes e clareza da construção narrativa. 3,5

    O conto se desenrola de uma forma linear. Neste sentido, é possível ao leitor observar com tranquilidade o desenrolar da história sem se perder. 

    No entanto, o final do conto, pelo menos para mim, não ficou muito claro. Muita coisa acontece em poucas linhas. Como disse anteriormente, é como se o trauma do narrador-personagem tomasse o grande desfecho do conto; do jeito que está, Severino, com o corpo fechado, caminhando para dizimar Juazeiro do Norte com suas facas enquanto Galdino foge. Ao tentar implacar que Galdino, de certa forma, também leva a maldição  que devolverá Inácia aos mortos, o final fica muito cheio para o pouco espaço que tem. Enfim, acho que a melhor opção seria manter apenas o desfecho de Severino.

    • Impacto pessoal – capacidade de envolver o leitor e gerar uma experiência memorável: 2

    Bom, gostei e não gostei. O regionalismo tende a tirar o autor/ a autora do lugar comum em termos de escrita. Exige uma pesquisa, um olhar atento a como se escreve. Aqui, eu percebi a transpiração do autor, mas talvez não tenha sido tão bem aplicada.

    Aí, quando olhamos para a narrativa, percebe-se que ela foi um pouco deixada de lado. Quando o limite de palavras vem se aproximando, o conto correu com o desfecho, deixando de certa forma, o grande monstro da narrativa solto, arrasando a cidade de Juazeiro e Galdino carregando o trauma e, de certa forma, Inácia dentro de si.

    Conclusão: faltou refinar um pouco a história em si; diminuir alguns trechos, para dar um desfecho mais detalhado ao leitor.

    Nota final: 3,5 

  16. Kelly Hatanaka
    17 de março de 2025
    Avatar de Kelly Hatanaka

    Oi  Zé Honório.

    Antes, um aviso geral: li seu conto com toda a atenção e cuidado e meu comentário, abaixo, expõe minha opinião de leitora, com todas as falhas que tal opinião possa ter. Os quesitos que uso para a pontuação são: Tema, Escrita e Enredo, valendo 2 pontos cada e Impacto, valendo 4. Parabéns pela participação e boa sorte no desafio!

    Tema

    O conto está dentro do tema terror. Tem também um toque bem humorado. Será que isso o coloca na categoria terrir? Não sei. De qualquer forma, está dentro do tema.

    Escrita

    Uma escrita muito boa. Embora o regionalismo seja um risco, pode ser exagerado, tem gente que não curte, enfim, achei que foi bem utilizado e agregou à personalidade do narrador. Não sei se curti o glossário na imagem. Achei desnecessário. Mas, isso é questão de gosto e com certeza não prejudica o conto.

    Enredo

    Um causo interessante e bem contado. Galdino conta a história de Severino Bezerra, que o procurou para encontrar Serapião, que falava com os mortos. Serapião incorporou a recém-falecida mãe de Severino e pediu que este matasse e esfolasse 30 pessoas, para que ela pudesse voltar à vida.

    Impacto

    Uma leitura prazerosa e bem conduzida. Gostei da história redondinha e a escrita está ótima. Um conto muito bom. Não levantou a torcida, exatamente, e nem sei te dizer o por que, afinal, ele está todo certinho e a história conta com imagens muito bem feitas. Mas, com certeza terá uma nota alta.

  17. MARIANA CAROLO SENANDES
    17 de março de 2025
    Avatar de MARIANA CAROLO SENANDES

    Técnica: Eu estou lendo o Grande Sertão e, por isso, pensei que ia dar de cara com uma imitação de narrativa com temática regionalista. No entanto, não há as experimentações do Rosa, a escrita é tradicional e, por isso, fácil de ler. Talvez o vocabulário lá de cima nem fosse necessário. Um texto interessante e que gostei mais do que achei que ia gostar. Sei que o conto ia ficar muito longo, mas ficou o buraco e queria a morte do Severino detalhada. 1,8/2

    Criatividade: Eu tenho pavor de body horror e eu não estava esperando isso aqui. A velha misturada com o bode, aquele monte de “carne com carne” me deu uma agonia maior do que estava esperando. Tudo isso em um cenário de sertão. A história é boa e surpreende, o narrdor é simpático como um João Grilo. 2/2

    Impacto: bem alto, de eu fazer careta algumas vezes. Mas também me divertir e ficar feliz por ser brasileira 1/1

  18. Antonio Stegues Batista
    14 de março de 2025
    Avatar de Antonio Stegues Batista

    Galdino conta uma história de terror que aconteceu com ele. É a história de Severino que resolve conversar com o espirito da mãe recém falecida. Para isso ele consulta o médium Serapião. Mas as coisas não saem como o esperado. A defunta faz um pacto com o coisa-ruim, que se o filho matar  pessoas, ela vai ressuscitar. Severino provoca o caos na vila, ele desenterra o corpo da mãe sai atacando todo mundo. Mas, que fim teve Severino? Galdino não esclarece esse detalhe importante. O final ficou meio estranho.

    ENREDO – Bom.

    ESCRITA/ FRASES – Boa escrita. Excelente o linguajar caboclo de Juazeiro do Norte. Frases com boas conexões.

    PERSONAGENS – Personagens bem construídos, combinando com os nomes próprios.

    DIÁLOGOS – Boa narrativa e o diálogo com o  interlocutor anônimo.

    AMBIENTAÇÃO – Boa descrição do ambiente.

    IMPACTO – Médio.

  19. Luis Guilherme Banzi Florido
    13 de março de 2025
    Avatar de Luis Guilherme Banzi Florido

    Ola, amigo(a) entrecontista! Tudo bem por ai? Esse conto faz parte das minhas leituras obrigatórias.

    Resumo: a historia de Severino e sua mae Inacia contada pelo cagão do Galdino.

    Comentário geral: esse é um bom conto, mas que para mim acabou perdendo um pouco do impacto ao escolher o caminho do terrir. Vou explicar. PRa mim, o terror tá MUITO bom. De qualidade, mesmo. Coisa linda. Especialmente o final, da cabana pra frente. Aquilo ali tá lindo, gostei muito. Porém, não achei que a comédia casou bem com o terror. Achei um pouco sem graça, especialmente a primeira metade, antes da chegada na cabana. Essa primeira metade é dedicada quase exclusivamente ao humor, por meio do jeito meio destrambelhado de Galdino, mas pra mim não funcionou. Sendo totalmente sincero, se eu não fosse obrigado a ler esse conto, teria parado antes da metade. Mas daí vem a surpresa: se eu tivesse parado antes da metade, teria perdido uma segunda metade incrivel. Gostei muito mesmo do final, sério.

    Falando da escrita, você parece um dos veteranos do EC, ja que domina a escrita como poucos. A riqueza de vocabulario e a tecnica estão otimas. Gostei muito de como o titulo aparece no finalzinho. Funcionou

    Enfim, acho que ficou para mim um gosto agridoce na boca. Um final excelente, um começo muito sem graça que me faria desistir se eu nao fosse obrigado a ler. Um terror excelente, um humor que não me pegou. Uma experiência boa, mas prejudicada.

    Sentimento final como leitor: um pouco de sensação de potencial desperdiçado, sabe?

    Recomendação do meu eu leitor: bom, quem sou eu pra dizer o que voce escreve ou nao, né? Mas ja que me propus a recomendar algo nos comentarios, o que eu teria feito é: cortar o humor fora e investir pesado no terror. Provavelmente teríamos um terror nota 10 e meu preferido do desafio.

    Conclusão: tava fazendo compra em Juazeiro do Norte quando um bafafá começou: o famoso Severino chegou descendo a facada em todo mundo. Quase senti medo, se nao tivesse um tagarela fazendo piada o tempo todo do meu lado.

E Então? O que achou?

Informação

Publicado às 9 de março de 2025 por em Liga 2025 - 1B, Liga 2025 - Rodada 1 e marcado .