‘Bárbara e Flip formariam um belo casal, mas um terceiro elemento ingressou na relação e os conduziu a um rumo bem inesperado.’
Bárbara era já uma linda mulher. Com seus vinte e dois anos de idade, fazia estágio em um escritório de advocacia. Como estudava à noite, seguia para o escritório pela manhã e lá ficava até o meio da tarde, quase todos os dias. Rotineiramente, por volta das oito e meia da manhã, parava em um restaurante para tomar café. Gostava de se sentar à mesa em frente à janela. Era uma grande janela, que lhe possibilitava olhar para a praça que ficava do lado de fora. Do outro lado, pontos de ônibus recebiam um amontoado de gente, que se confundia com outros tantos que subiam a passarela para pegar o trem, na estação que ficava logo ali. Bárbara gostava de ver esse movimento, e observar gostosamente o vai e vem humano. O prédio em que trabalhava ficava ao lado do restaurante, e, como só iniciava o expediente por volta das nove, tinha sempre tempo de sobra para ficar ali. Seus colegas não sabiam que tinha esse hábito, e Bárbara preferia assim. Queria permanecer em silêncio por alguns minutos antes de iniciar o dia de trabalho. Silêncio e meditação.
Havia, entretanto, outro motivo para que ela estivesse sempre ali, àquela hora. Um misterioso rapaz trabalhava na cozinha. Ela sempre o via chegar, e ele nunca abria o restaurante. Ouvira seu nome certa vez, Flip. Flip, um nome misterioso para alguém misterioso. Pensou, a princípio, tratar-se de algum apelido, mas, depois que ouviu gracejos por conta disso, teve a certeza de que era realmente seu nome. Bárbara gostava de vê-lo. Não era um homem muito bonito. Era jovem, não devia ainda ter seus trinta, mas possuía já certa dramaticidade inquietante em seu rosto, o que lhe despertava grande interesse. Com algum esforço, percebeu que ele também não usava aliança, e nunca, nunca ouviu sua voz.
Flip, por sua vez, já tinha dado conta da moça. Percebeu que ela sempre vinha ali, e se sentava na mesma mesa, e pedia o mesmo café com pães de queijo. ‘Ela é bonita’, disse o Imperador. ‘E cheira bem’, completou. Flip tentava conter seu amigo, que parecia muito interessado pela moça. Flip também estava interessado. Realmente, Bárbara era muito bonita, e Flip também sentira o seu cheiro. A garota era de pequena estatura, devia ter algo em torno de um metro e cinquenta e cinco, no máximo. Era magra, mas tinha um corpo esbelto e bem definido. Flip atentava principalmente para um aspecto peculiar de sua anatomia: as nádegas. A bunda de Bárbara não era grande, mas muito bem definida. Às vezes, ela vinha de saia curta, e era possível vê-la empinada. Para Flip parecia um convite. Quando ela vinha de calça era possível observar melhor os contornos arredondados. Os seios, entretanto, não eram de chamar muita atenção, mas Flip não tinha predileção por seios. A cintura de Bárbara acabava por realçar seus quadris. Ela possuía um aspecto frágil, pele clara, olhos claros, cabelos claros e curtos, até o pescoço.
Flip poderia perfeitamente manter a calma e o equilíbrio. Era um homem capaz de se conter. O Imperador, por sua vez, era atrevido, audaz, malicioso, inquieto. Flip sabia que ele o levaria a tomar uma atitude rápida. Parou o serviço por um momento e olhou para o salão. E lá estava ela, tomando um banho de luz do outro lado, depois de todas aquelas mesas e cadeiras. Parecia uma fotografia, com aquela luz pálida atravessando a janela e aquelas pessoas se movimentando ao fundo. De repente, como que ouvisse seus pensamentos, Bárbara virou, e seus olhos, que repousavam sobre a praça, voltaram-se para Flip. E Flip congelou com aquele olhar. Era tão presente, tão marcante, tão próximo. Os olhos de Bárbara pareciam conversar diretamente consigo, como se Flip pudesse ouvir seus pensamentos, como se ambos estivessem frente a frente e nada mais no mundo existisse. Tudo brilhava em volta e os dois sabiam que estavam se comunicando.
Assim, Flip, hipnoticamente, saiu do balcão e, lentamente, dirigiu-se à mesa onde estava a moça. Ouviu as palavras zombeteiras do Imperador, que repetia, em coro: ‘uh, vai morrer! uh, vai morrer!’. Bárbara o olhava se aproximar, friamente, sem esboçar um sorriso sequer, gélida, sem o menor desejo de ser gentil. Ela viu aquele homem se aproximar e ficar de pé, diante de sua mesa. Percebeu a ousadia de Flip, ao sacar que um volume se intensificava em sua calça. Flip puxou a cadeira para disfarçar e se sentou a sua frente. Ele a olhou nos olhos. Olhos claros, quase transparentes. Os cabelos de Bárbara caíam diante de seu rosto, enquanto o vapor do café, ainda quente, subia e, juntamente com a luz do sol, compunham a moldura perfeita para aquela beldade de olhar profundo e penetrante.
Flip não sabia muito bem o que dizer. Aproveitou, entretanto, que o dono somente chegaria mais tarde e que sua cozinha, única parte do trabalho que era de sua responsabilidade, estava em dia.
– Vejo você aqui todos os dias – Tentou.
Bárbara ouviu sua voz. Uma voz marcante. Imaginou-a sussurrando em seus ouvidos. Mas precisava ser fria.
– E daí? – Perguntou, num tom seco.
– Sempre senta na mesma cadeira, pede a mesma coisa.
– Eu acho relaxante.
– Qual o teu nome?
– Bárbara.- Eu sou…
– Flip. Eu sei. Eu ouvi.
– E gravou meu nome?
– Não é um nome muito comum.
Flip assentiu com um sorriso. Os dois ficaram em silêncio por algum tempo. Flip teve a impressão de que Bárbara lhe dava alguma condição, mas percebeu que ela decidira não facilitar. Investiu mais um pouco.
– Você trabalha aqui por perto?
– Trabalho no prédio ao lado.
– Eu trabalho aqui.
– É.
Bárbara percebeu que Flip estava ficando um pouco sem graça.
– Eu vou ter que arrumar a cozinha. Caso você queira mais alguma coisa…
– Tudo bem.
Flip, entretanto, não se levantou. O Imperador, de onde estava, quase mijava de tanto rir. Bárbara notou o silêncio desconcertante e deduziu que o rapaz não queria se levantar por estar excitado ainda, o que a deixou um pouco sem graça. Por outro lado, a situação também a excitava, ao perceber o poder que parecia exercer sobre Flip. Flip sabia que a moça tinha percebido, e Bárbara corou, tentou desviar os olhos para conter um sorriso, mas era notório que ambos, mais uma vez, conversavam ali, sem palavras.
– Eu tenho um problema muito sério.
– Como?
– Bárbara começou a sentir um constrangimento crescente, achando que ouviria alguma bizarrice.
– É, eu preciso te contar.
– Ai meu Deus. – Bárbara fez uma pausa, e deu um sorriso. Tinha o desejo de conhecer Flip, e agora ouvira sua voz, e ele estava ali tão perto, sentado em sua frente, numa condição tão inusitada.
– Vamos, diga.
– Todos os dias eu vejo você chegar e, eu tenho um amigo, sabe.
– Um amigo?
– Sim, quer dizer, amigo, amigo mesmo. Eu o chamo de Imperador.
– Sim.
– Pois é, eu vou ser sincero com você, eu sou um cara meio tímido. Sabe, eu sou na minha. Eu venho para cá, faço meu trabalho, depois vou para minha casa. E essa é minha rotina desde que eu vim para essa cidade.
– Entendi. Mas, o que tem o Imperador?
– Ah, ele não é que nem eu, sabe. Ele é mais atirado, meio atrevido. Ele diz coisas para as mulheres, e, às vezes, eu sigo o conselho dele.
– Ah, é?
– É.
– E o que o teu amigo já te fez dizer para uma mulher?
– Ah, coisas.
– Que coisas?
– Coisas escabrosas, sabe?
– Ele te mandou dizer alguma coisa para mim, por exemplo?
– É. Sim. Ele me deu umas ideias, sim… Você gostaria de sair comigo?
‘Claro que sim’, Bárbara pensou. Entretanto, voltou a esboçar aquele olhar gélido. Ao mesmo tempo, desejava ver a promessa daquele volume na calça de Flip se cumprir. Estava há algum tempo sem namorado, e, na verdade, não pretendia relacionamentos sérios por um bom tempo. Pensou que, de repente, uma aventura descompromissada com Flip não seria má ideia.
– Para onde você me levaria?
– Você curte rock?
– Curto. Um pouco. Não muito.
– Tem um show de uma banda num barzinho aqui perto, hoje à noite. Se você quiser, nós podemos nos encontrar lá.
– É muito barulho?
– Não. É um bar, tem uma banda que toca. Uma galera mais agitada fica lá na frente e a gente pode ficar em uma das mesas no fundo, onde é mais escurinho. É maneiro, você vai gostar.
– Tudo bem.
– Então, podemos nos encontrar em frente ao Bali Bali, às dez.
– O restaurante Bali Bali?
– Sim. Sabe onde fica?
– Sim. É até perto da minha casa.
– É mesmo? O bar é próximo também.
– Tudo bem. Às dez horas.
***
A mãe de Flip o inquiria todas as vezes em que ele tomava banho. Sabia que ouvir o barulho da água caindo diretamente no chão não significava boa coisa. O menino provavelmente estaria fazendo o que não devia, debaixo do chuveiro. Flip, no começo, satisfazia-se de ir ao banheiro quando a mãe não estivesse em casa. Mas o desejo incendiou o menino de tal modo que perdera o controle e o discernimento, e, então, não havia mais hora certa para isso. Dez, às vezes quinze vezes por dia, todos os dias. Tal fixação com seu pênis fizera com que desenvolvesse uma relação distinta com ele. Tal qual a lâmpada mágica, capaz de lhe satisfazer os desejos, seu pênis se tornara também uma espécie de gênio, um demônio com vida própria, que lhe transmitia uma sensação irresistível de poder. Sim, o poder ao alcance das mãos, concedido diretamente pelo seu senhor, o Imperador, apelido com o qual batizara seu membro.
Depois de algum tempo, entretanto, o Imperador decidiu ampliar seus domínios, tomando posse de toda a alma do pobre Flip, que se tornou seu escravo. Flip passou então, a atender aos desejos de seu mestre, que, com o tempo, revelou-se insaciável, dominador, tirânico. O imperador queria sempre mais, e mais, e mais. E Flip, aos poucos, viu se esvair toda a sua soberania, até não ser mais capaz de discernir entre o real e o imaginário, e não se fazer mais capaz de impor sua própria vontade.
Agora, enquanto se preparava para seu grande encontro, Flip, com sua voz profunda e doce, suplicava diante de seu mestre.
– Por favor, poupe-a! Ela é diferente. Ou então, deixe-a ir. Eu imploro!
No que o Imperador lhe respondia, insensível, com um tom de voz autoritário e ríspido:
– Gostei muito dela. Sentiu seu cheiro? Ela quase não usa perfume. É o cheiro de sua xoxota que ela exala. Como tem coragem? Diante de mim? É uma petulante.
Flip esfregava o Imperador cada vez mais intensamente, com o intuito de apaziguar a divindade, que, por sua vez, permanecia impassível:
– Imperador, eu faço o que quiseres. Há outras tantas lá fora. Eu encontro outras hoje mesmo e a dispenso, mas, ela, ela não, deixe-a. Por favor. Ela não.
– Não adianta. A decisão já foi tomada. Eu a desejo. Agora, vamos. Depressa! Já está na hora.
Flip acabou de tomar seu banho e seguiu, resignado, movido pela ordem que lhe fora dada. A bela Bárbara agora agia sobre ele uma incrível força gravitacional. Na verdade, era o Imperador quem o impulsionava até ela, estimulado pelo cheiro de sua vagina.
***
Bárbara usava um macaquinho de oncinha. ‘Um macaquinho de oncinha!’, Flip ficou extremamente preocupado com a reação de seu senhor. ‘Mais sexy impossível‘. Os cabelos estavam propositadamente rebeldes, e ela usava um batom vermelho vivo. Um pouco de perfume, levemente aplicado no pescoço, bem discreto. E um também discreto, mas charmoso par de brincos. Parecia embrulhada para presente. Andaram por dois quarteirões enquanto Flip procurava se conter, a si e a seu amigo. Para tanto, preferiu não olhar muito para ela. Bárbara falou um pouco da cidade e do medo que tinha de andar à noite. Na entrada do bar, dois homens brigavam, o que fez com que Flip pensasse em se desculpar, já que a moça parecia tão preocupada com a violência. Bárbara, no entanto, talvez tentando evitar uma situação estressante, demonstrou achar engraçado. Entraram no bar, onde o som comia solto.
Os ‘Bad Boys Thinking‘ tocavam um som que era uma mistura de Nirvana com Public Image Limited, e gostavam de barulho. Uma galera animada se amontoava na frente do palco, pulando e se batendo, enquanto Flip e Bárbara escolheram uma das poucas mesas que ainda sobrava no fundo. Flip pediu uma caipirinha para tentar relaxar um pouco, no que Bárbara resolveu acompanhá-lo.
– Gosta de caipirinha? – Perguntou Bárbara.
– Na verdade, nunca bebi. É a primeira vez. – Flip respondeu, agora mais relaxado.
Não era um lugar onde pudessem dançar, e Flip sentiu que poderia ter mais liberdade para conversar com a bela à sua frente e ficar excitado sem constrangimentos. Por outro lado, não queria dar muita vazão ao Imperador, pois sabia muito bem de seus planos e intentos. Durante a noite, conversaram sobre diversos assuntos. Flip sempre se esquivava de falar acerca de seu passado, e preferiram conversar sobre o trabalho de Bárbara.
– Não é um trabalho, na verdade. É apenas um estágio. Daqui a dois anos eu termino minha faculdade, e, aí sim, vou ver o que vou fazer. Talvez eu monte um escritório.
– Escritório? Vai ser doutora?
– É.
Bárbara já tinha desistido de se importar com a simplicidade de Flip. Não achava mesmo que aquela relação fosse muito longe. À medida que a noite passava, e como a bebida contribuiu, entretanto, começaram a conversar mais profundamente sobre assuntos que, na verdade, não tinham qualquer relação com o motivo de estarem ali, mas que serviram muito bem para fazer o papo fluir. Descobriram que, de algum modo, tinham uma afinidade de ideias em relação ao poder.
– Gosto da ideia do controle. – Divagou Bárbara, enquanto os ‘Bad Boys Thinking’ pareciam hipnotizar o público, que se entregava ao som de ‘Delírio Psicopata’, uma canção inspirada em Psicose, de Hitchcock.
– Controle? – Flip perguntou, curioso.
– Sim. Controle. Acho interessante como alguns homens de poder conseguem controlar tanta gente. E a maneira sutil como o fazem – respondeu Bárbara, enquanto um telão trazido pela banda de rock para o show esboçava um grande olho azul, no fundo do palco. ‘Foi extraído da foto de Hannibal Lecter’, afirmou, tempos depois, Alexei, o band líder, em sua autobiografia que ninguém leu nem comentou.
– Explica – Flip prosseguiu com a conversa.
– Eles usam propaganda, usam instituições. Tudo com o objetivo de controlar os outros.
– Controlar os outros…
– Sim. As pessoas não dizem o que querem dizer, não fazem o que querem fazer, não pensam o que querem pensar. Na verdade, as pessoas sequer sentem o que querem sentir. As pessoas apenas obedecem às ordens de um poder que as controla. Mas uma coisa eu te digo: é por essa razão que as pessoas sofrem. Elas não pesquisam antes de votar e acabam elegendo as pessoas erradas. Enfim, cada povo tem o governo que merece.
E, então, tudo começou a fazer sentido para Flip. Ele compreendeu aquela conversa. Estaria a moça, de certo modo, comunicando-se com ele novamente, nas entrelinhas? Porque Flip se sentia extremamente controlado por algo maior que ele. Também não pensava, nem sentia, nem falava, nem fazia o que realmente tinha vontade, mas era como um escravo que vinha se sentindo, submetido às ordens do Imperador. Tocou nele e, mais uma vez, o sentiu presente, forte, desejoso de entrar em cena e controlar tudo. Bárbara observou onde suas mãos estavam. Não pôde se conter, ela o desejava.
– ‘Me come‘, ela disse. A ordem indicava o ponto do qual não havia mais retorno. Flip a beijou de modo intenso, e, sob as ordens do Imperador, por um impulso, pegou suas mãozinhas delicadas, pousando-as sobre ele. Bárbara sorriu, assustada. Tarde demais. O Imperador entrava em ação. Não havia mais nada que Flip pudesse fazer para impedi-lo.
Flip pagou a conta e os dois se levantaram. Não podiam perder tempo. Ingressaram em um motel que ficava logo em frente ao bar.
***
Seu pênis tinha vida própria. Pois ele se erguia diante de Bárbara e, com a autoridade que lhe era devida, domava seu dono tal qual um cachorro submetido à coleira de sua lascívia. Este, por sua vez, sentia todo o seu corpo ser invadido freneticamente pelo poder que agora reinava absoluto entre suas pernas. Já não havia mais qualquer resquício de soberania sobre sua vontade, nem a menor possibilidade de retomar o controle da situação. Bárbara estava ali, à sua frente, totalmente entregue e vulnerável. ‘Eu sou toda sua’, sentenciou, e Flip, que não era capaz de ver nada naquele quarto além de sua presa, pôde, no entanto, perceber o brilho que tomou conta do lugar, e sentir que o ar agora era tomado pelo tesão que ambos partilhavam. Não queria seguir regras. O poderoso Imperador o tomou por completo, o que se pôde perceber até na mudança de sua voz. Sem o menor desejo de ser gentil, Flip segurou Bárbara pelos cabelos num gesto brusco e começou a esfregar o Imperador em seu belo rostinho, de um lado a outro. Depois o passou em seus cabelos, e enrolou-os, masturbando-se. Desferiu-lhe um tapa seco, mais impactante que forte, e Bárbara reagiu chocada, com um olhar assustado, após o que Flip, fora de si, mergulhou o Imperador em sua boca. Enquanto assim o fazia, brincava com os dedos na boca de Bárbara, acariciava seu rosto e a estapeava um pouco mais. O Imperador, entretanto, não se satisfazia com tão pouco. Rapidamente, Flip sentiu um desejo inexplicável de estocar aquela boca. Bárbara esboçou um choro diante de tal violência, ao mesmo tempo em que assentiu, resignadamente. E Flip, irreconhecível, grunhia enquanto manipulava a cabeça de sua escrava de diferentes formas, brincando com seus cabelos, com sua boca, retirando o pênis para voltar a bater com ele em seu rosto e esfregá-lo ainda mais para depois voltar às suas estocadas, até, finalmente, explodir-lhe na cara, o que não a deixou desanimada, já que compreendera bem do que fazia parte agora. Não era apenas sexo, era poder, poder quase que sobrenatural. Pressentiu que se tratava apenas do início de uma longa noite, talvez sem fim, ao lado daquele monstro irreconhecível que tinha a sua frente. Tal qual uma criança travessa que teme se levantar no escuro para ir ao banheiro à noite, Bárbara experimentava agora um misto de terror e fascínio. O prazer que tomava Flip era tão intenso que, mesmo em um ato tão egoísta, Bárbara pôde partilhar da mesma sensação. O próprio ato em si, antes do gozo, fizera com que se sentisse parte de um jogo de dominação ao qual decidira se entregar deliciosamente. A maneira como o Imperador roçou em seu rosto, ainda seco, e depois, molhado de sua saliva e do esperma de Flip ao final, tudo isso lhe causou espasmos de excitação. Aguardava ansiosamente pelas próximas tramas do Imperador, certa de que era ele, na verdade, quem estava no comando.
Agora Flip, seguindo ordens de seu comandante, jogou Bárbara na cama. Seu rosto ainda estava todo melado, mas não foi por essa razão que a jogou de costas. Desejava penetrá-la por trás, e assim o fez, e o fez com ímpeto. Desejava ouvi-la gemer. O cheiro de Bárbara, o perfume natural de seu corpo, o embriagava de prazer. Suas mãos acariciavam aquelas costas lisas e firmes, agarravam seus braços e os punha para trás. A luz do dia já atravessava a janela e adentrava no quarto, banhando seu corpo. Bárbara, a pequenina Bárbara. Flip a pôs em seu colo e a fez subir e descer, cada vez mais rápido, num ritmo cada vez mais frenético. As estocadas poderiam ser ouvidas nos corredores. Flip, então, se levantou e a jogou contra a parede, beijando-a ardorosamente. Sentiam-se unidos totalmente. Flip buscava nos lábios de Bárbara a plenitude dos sentidos, seu gosto, seu tato, seus gemidos. Sentia toda a feminilidade de Bárbara atacada ferozmente por seu membro tirânico, mas este desejava mais, mais que o seu cheiro, mais que o gosto de sua boca e de sua pele macia e sensível, mais que seus cabelos e seu rostinho bonito. O Imperador desejava consumi-la por inteiro e Flip começou a mordê-la forte. Bárbara gostou de ser mordida daquele jeito, e estava também tomada por um transe tão intenso que não percebeu que um pedaço de sua pele fora arrancado, e depois outro, e outro. Até que Flip, totalmente possesso, atacou sua boca, arrancando-lhe a língua.
Em seguida, foi o resto da boca. E enquanto Bárbara era atacada, e enquanto sentia a mistura de dor e de prazer, cada vez mais dor que prazer, ela presenciou a besta humana à sua frente devorar-lhe aos poucos, sem que pudesse gritar por socorro, sem que tivesse forças para reagir. Então, Flip a jogou na cama e comeu sua bunda. Literalmente. Mordeu-lhe as nádegas impetuosamente, e, como um abutre, ou uma fera selvagem e faminta, banqueteou-se do restante.
Tal qual um comandante, de pé diante de um campo de batalha, o Imperador acompanhava solenemente a execução de sua tropa. Erguido, feliz a ponto de chorar mais uma vez, finalmente. Suas lágrimas, entretanto, levaram seu desejo, o que, por sua vez, devolveu a liberdade à lucidez e à soberania mental de Flip. Mas era tarde. Não tinha a menor ideia do que ocorrera. Sentou-se no chão e ficou catatônico por algumas horas. Como o período no quarto se findou, e à medida que os telefonemas e batidas na porta não eram atendidos, a polícia chegou. Antes que abrissem a porta, entretanto, Flip foi até o frigobar e pegou uma faca. Trancou-se no banheiro e tentou invocar o Imperador novamente, pois sabia que somente poderia arrancá-lo de seu trono caso estivesse de pé. Foi quando vieram à memória todas as outras meninas, e todos os outros casos terríveis, como tinham se sucedido. Flip desejava, a princípio, tê-los esquecido, mas, agora sabia, sempre desejou tudo aquilo. Não podia culpar o Imperador. Eram cúmplices. Olhou para ele e o viu de pé e compreendeu que não devia destronar aquele que lhe dera tantas alegrias. Fora tão poderoso quanto. Mereciam morrer juntos.
A polícia invadiu o quarto e Flip partiu para cima dos homens com violência. Quatro tiros foram ouvidos, quatro tiros perfuraram sua carne. Quatro balas o penetraram com o mesmo ímpeto com que costumava golpear suas vítimas, mas agora era seu sangue que espirrava no chão, misturando-se ao sangue de Bárbara. Pobre Bárbara. Talvez devesse ter pesquisado um pouco. Elegeu a pessoa errada. Merecia ela tal destino?… Flip caiu de joelhos e segurou, pela última vez, seu companheiro, tentando lhe prestar ainda uma derradeira homenagem, porém sem sucesso. Um dos policiais, aparentemente o mais transtornado com o cenário que se lhe apresentava, decidiu acabar com aquela cena doentia, descarregando a arma nas mãos de Flip, resvalando os tiros no Imperador, acabando, assim, com um reinado de terror que assombrou diversas cidades por aí a fora.
Mas, terá isso tudo realmente acabado? Ou o Imperador teria deixado aquele corpo para tomar outros membros em outros lugares?
Bom texto, Daniel. A trama foi bem contada e os elementos foram bem apresentados… Eu não sou nenhum fodão da literatura mas acho que a prática tendencia à perfeição. Continue escrevendo! Abs
Muito obrigado, meu irmão. Esse texto, em verdade, foi escrito para participar de um concurso de contos em que se pedia para explorar os temas sexo e psicopatia. Eu mesmo não costumo pender muito para esse campo, mas foi divertido. Aquele abraço e sucesso pra ti também.
O enredo parece bom. O que me deixou instigada foia a forma que o autor narra sua história. Bastante incipiente.
Muito obrigado, Ledi. Entrei neste fórum para aprender a escrever contos, o que para mim é uma novidade. Estou gostando muito da experiência. Até mais.