EntreContos

Detox Literário.

A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim* (Pedro Paulo)

* Personagens e enredo deste conto foram inspirados em músicas das bandas inglesas Queen e King Crimson, incorporando ainda outras referências literárias.

E quando eu falava dessas cores mórbidas

E quando eu falava desses homens sórdidos

E quando eu falava desse temporal

Você não escutou

Você não quer acreditar

Mas isso é tão normal

Lô Borges e Fernando Brant

O HISTRIÃO

A infâmia é o melhor arauto, pois é a curiosidade alheia que transporta e engrandece a alcunha. Assim, Gregório de Carcosa se transformou em muitas coisas. Curandeiro, sacrílego, poeta, devasso, profeta… bem ou mal, falava-se dele e temiam a sua chegada. Também era famoso o poderoso azulado dos seus olhos. Esse homem infame foi convocado ao Palácio Escarlate.

O príncipe havia adoecido. Uma equipe de médicos foi reunida apenas para fracassar em todas as suas tentativas de tratamento. “Surtos! Não parece habitar a nossa realidade”, um dos médicos explicou para Gregório sem mirá-lo nos olhos, indignado por ter que lhe dirigir a palavra, mas evidentemente desconcertado pelo magnetismo do seu olhar. Sua presença na Corte Vermelha era polêmica, mas ele tratava todo aquele alvoroço com um sorriso discreto e o ímpeto de suas feições.

Foi a Rainha quem o protegeu. Ele exigiu que ficasse a sós com o garoto e o desespero materno e a autoridade régia garantiram essa privacidade. O menino se tranquilizou pelo jeito gentil do pregador de Carcosa. Entre as madeixas acobreadas dos cabelos do príncipe, desabrochavam rosas, jasmins e gerânios, entrelaçando seus caules verdosos com os fios avermelhados. Gregório passou os dedos pelos ramos, ao que o menino se recolheu, estremecido. As flores também vibraram.

— Meu pai disse que se eu for louco, não posso ser rei.

— Você quer ser rei?

O menino se deteve.

— Eu não quero desapontar… — havia soado mais como uma criança agora.

— E você quer ser louco?

O príncipe desencontrou o olhar de Gregório, um rúbeo fugaz em seus olhos. A loucura como opção iluminava o seu rosto, realçando a idade que tentava mascarar com a atitude principesca que o haviam ensinado. Mas só por um instante. Então já pareceu envergonhado daquelas considerações, baixou o olhar e sacudiu a cabeça. As flores se balançaram e se encolheram no meio da cabeleira, acompanhando-o no acanhamento. Ao invés de responder a Gregório, o príncipe lançou outra pergunta, uma performance de autoridade em sua voz:

— O que você vai fazer?

— Arrancá-las.

— Vai doer?

— O tanto quanto apenas um rei pode suportar.

Cortadas e jogadas na lareira, as flores que coroavam a cabeça do príncipe perfumaram todo o salão real enquanto o Rei abraçava o filho, que apesar da palidez sorria. Tinha voltado aos olhos do garoto o fulgor coralino da realeza. A Rainha se ajoelhava para agradecer a Gregório, que segurava suas mãos. Então contou a eles.

— Não há cura para o mal do príncipe. Deve ser acompanhado pelo restante da vida.

Toda a alegria desvaneceu do rosto do casal. O Rei tinha um dilema em mãos, pois apesar das súplicas da esposa, não podia arcar com o burburinho da presença daquele homem em sua corte, mas, ao mesmo tempo, não havia conhecido outro sujeito que tratasse o problema do seu único herdeiro. O próprio Gregório propôs uma saída, acatada de pronto.

Ao fim daquela noite, Gregório vestia os trajes do restante de sua vida. O macacão o cobria dos pés à cabeça, estampado em duas cores que se distribuíam em seu corpo em padrões desconcertantes os quais, conforme se movia, recombinavam-se no tecido, alternando entre o rubro pontual e o cróceo dominante. Seu capuz o enfeitava com duas orelhas de burro. Esse detalhe pôs o príncipe rolando no chão de tanto rir. Gregório fingiu revolta, enrolando os dedos em uma de suas orelhas de asno.

— Ora, o príncipe ri da minha bela coroa? Não vê que se dirige a um rei? O seu Rei de Amarelo?

A MARCHA

A mórbida política da monarquia é a sucessão e, então, o menino doente quase tomado pela loucura cresceu e se tornou tão alto e forte quanto o pai. Abandonara tanto a meninice como o principado e agora usava a coroa de cobre do Rei Carmesim. Seu império era tão grande e próspero como nunca e, por todos as décadas de seu reinado, Gregório o havia acompanhado em regulares sessões de “jardinagem na cabeça real”, como costumava chamar. As flores teimavam em germinar. Um mês antes do septuagenário do rei, o bobo da corte amarelo se dedicava a cortar o botão de uma rosa quando o Rei deteve a sua mão. A tesoura foi guardada.

Na manhã seguinte, nos limites do Império, a Rainha Negra pôs suas tropas em uma marcha dirigida à capital. Ao Palácio Escarlate. O Rei Carmesim não reuniu generais ou vassalos. O monarca, com uma das orelhas ornada pela complexidade da corola filamentar de um crisântemo vermelho-carmim, anunciou um torneio.

A festança ocorreu no dia do aniversário do Rei, com os cavaleiros empolgados para provar a sua valentia e cativar os olhares e suspiros das donzelas, enquanto vassalos e emissários murmuravam sobre os rumos da guerra unilateral que o Negrume impunha ao Rubro, fazendo avançar, ainda que lentamente, uma linha escura nos amplos domínios do Império. Não interessava ao Rei Carmesim. Aquele dia também honrava a sua única filha, nascida ao final do último grande conflito entre os reinos, quando todas as cores do mapa tinham se dobrado ao Vermelho e, assim, foi batizada de Alva, a famosa Princesa Branca. Naquele dia, casava-se com uma nobre do além-mar e se preparava para deixar toda a vida que tivera até ali.

O Rei se entretinha com o torneio e a sua expectativa era ainda maior para a Orquestra Imperial, chamada assim por reunir os melhores músicos dos Estados Amigos – lê-se derrotados – e Colônias. O Rei exigiu que cada agrupamento de músicos utilizasse as cores de suas pátrias, colorindo o pátio do palácio com uma inquietante combinação de cores e tonalidades. O Flautista Roxo abriria a sessão. Antes, Gregório declamou mais um de seus versos inquietantes, desfilando cambalhotas e rolamentos em seu clássico traje amarelo.

— O homem endireitado questionou o homem atrasado: onde você esteve? E ele disse: estive aqui e estive ali… eu estive no meio!

Lágrimas, honrarias, dança, a Orquestra tocou para todas as emoções. Mas ninguém antecipava indignação ou protesto, ainda mais no coração da corte do Rei Carmesim. Como encerramento, o Flautista Roxo orientou o coral em três línguas nativas, havia muito esquecidas nas Escolas Imperiais. Mas não foi só isso. A canção “Poetas míopes enxergam o arrebol” letrava um dos momentos de maior decadência da Casa Carmesim, satirizando as vergonhas da infame “Geração da Fuligem”. Ao fim, toda a corte era troca de olhares e sussurros de incredulidade. O Rei Carmesim, por sua vez, levantou-se e bateu palmas, instigando a uma lenta e gradual aclamação geral cair sobre a Orquestra de músicos inseguros, mas orgulhosos.

Ao final do torneio de seus setenta anos, despedida de sua primogênita e última lembrança de sua esposa falecida, o Rei Carmesim finalmente declarou guerra à Rainha Negra. Tratava o tema com jovialidade, um pequeno inconveniente a distrair da celebração do seu império. Em seu salão de guerra, entretanto, o Equilibrista de Padrões avistava premonições em seus orbes flutuantes e conjecturava um cenário infeliz para o andamento da guerra. Só pela pressão dos generais e sábios que o Rei concordou em fazer ressoarem os rachados sinos de bronze, enfileirados de modo que seus badalos alcançassem o alto das montanhas da capital. Aos ouvidos da Bruxa Incendiária.

Naquela manhã, Gregório de Carcosa acompanhava turmas escolares pelos pavilhões do palácio, entretendo-os com palhaçadas no meio das explicações do guia. Entre rodopios, recitava seus versos histriônicos, mas pegajosos, que pareciam perdurar nas mentes. As crianças os repetiam para os pais, escreviam em seus cadernos e, de pouco em pouco, as palavras do Bobo Amarelo fugiam de seus lábios e tomavam o rumo dos ditos populares. Eram lidas como sinais. Grafavam as paredes da capital e de cada vez mais numerosas cidades do Reino, sempre assinados com um curioso emblema amarelo que parecia retorcer a primeira letra do alfabeto. As pessoas repetiam a mensagem sem sequer questionarem a sua origem, fazendo do lema um abrigo para as suas inquietudes crescentes.

— A letra A tem o meu nome! Sou o filho que ainda não veio. Sou o início, o fim e o meio!

A BRUXA INCENDIÁRIA

A guerra de movimento havia acabado. Trincheiras dilaceravam todos os pontos do reino, com múltiplos levantes de separatismo sangrando os domínios do Reino Carmesim, toda a zona de guerra incinerada pelas labaredas da temida Bruxa Incendiária, cujo rastro flamejante singrava o firmamento e acendia de terror a antes tranquila linha do horizonte. A Rainha Negra era a única que avançava, tão grande a sua sombra que os reinos menores a buscavam para servir-lhes de vassalos na guerra total. A essa altura, os cabelos grisalhos do Rei mal se viam, omissos nas pétalas vermelhas de cravos, dálias, crisântemos, rosas, gladíolos e todo um ramalhete rubiáceo dependurado até abaixo dos ombros, mal comportando a coroa que ornara a cabeça de seus predecessores. A hera substituía o cobre.

Persianas cobriam os sonhos. O estado de sítio havia obrigado o Guardião das Chaves da Cidade a impor o seu toque de recolher, cortando os choros das viúvas e tragando todos os moradores da capital para um longo sono sem perigos. Mas Gregório de Carcosa nunca dormia. Estava a sós no palácio, no bagunçado salão de guerra, as mãos cruzadas nas costas enquanto investigava os orbes. Aqueles globos premonitórios flutuavam, irradiando uma vertiginosa luz dourada que se incandescia no fundo dos seus olhos azuis.

Virou-se quando a ouviu chegar. A sala se iluminava na presença dela, uma mulher esbelta, o corpo seminu, sua pele uma superfície vulcânica de negro craquelado pelo qual se desenhavam radiantes veios alaranjados. Seus cabelos combinavam chamas de várias tonalidades e os olhos eram brasas acesas. Fumaça escapava-lhe do corpo todo e um saiote de flâmulas rodopiava a partir da sua cintura. Toda ela era a personificação de um incêndio hecatombe retido pela própria vontade.

Os orbes se pintaram de suas cores. O Bobo sorriu, sua sombra estendida pela parede: robe, as orelhas de asno quadruplicadas a coroar sua versão umbra com uma galhada. E duas asas espinhosas. A voz da Bruxa Incendiária misturava o crepitar de uma fogueira com o sopro dos grandes incêndios.

­— O homem esquizoide desta era.

— Homem?

— Um modo de falar. Não me engana com esse disfarce ridículo.

— Então me diga, Bruxa. O que sou?

Ela flutuou para mais perto, tão leve como uma chama.

— Um emissário… de Carcosa!

O Bobo da Corte Amarelo abriu um terrível sorriso, talvez o único verdadeiro em décadas de servidão ao reino. Abafou o riso com uma das mãos e foi com ela ainda no rosto, entre os dedos magros, que mirou os olhos faiscantes da Bruxa Incendiária, cujos pés já alcançavam o chão.

— Devo confessar, minha querida. Eu nunca entendi o seu papel nisto tudo. Em todo o seu poder? A indignidade de servi-los, de jogar em seus tabuleiros mundanos…

— Cumpro o meu dever. O meu juramento depois que a Casa Carmesim me libertou.

— Assim como eu.

— Suas juras são outras e o ligam a outras dimensões. Nada de humano.

— Não… isso é certo. Em definitivo, nada de humano. Assim como você, uma força da natureza.

A risada dela esfumaçava o espaço entre eles, encurtado pelo seu avanço.

— Também não há nada de natural em você.

Ele alargou mais um de seus tenebrosos sorrisos sinceros.

— Outra leitura certeira.

Os orbes se espalharam por detrás dele, levitados até parearem a Bruxa. Em suas superfícies, exibiam um fósforo se apagando. Gregório baixou a mão com a qual havia coberto o rosto. Não sorria mais.

O REI CARMESIM

Gregório de Carcosa encontrou o Rei Carmesim no planalto da Torre Negra, subindo a ladeira com dificuldade, metade do seu corpo um derretimento que, entre bolhas, deixava ver um pouco dos seus ossos. Um encaracolado de flores vermelhas dava voltas na cabeça do Rei até alcançar a metade das suas costas, movendo-se como pequenas serpentes. Um único girassol despontava do meio de sua cabeça. Essa flor amarelada vibrou e se reclinou na direção da qual vinha o Bobo Amarelo. Sem parcimônia, o Rei arrancou o girassol e o estendeu a Gregório.

O Bobo inspirou a flor até deixá-la cinza e sem pétalas. Seu corpo se restaurou. O Rei Carmesim falou primeiro.

— Eu imaginava quem sairia vivo do embate… é uma pena. Não me leve a mal. É apenas que a Bruxa sempre nos serviu com lealdade.

— Você a convocou?

— “Você”? Nem mesmo performa, Gregório? Nada de “majestade”?

— Ouve os tambores, meu Rei? A Rainha Negra se aproxima.

— Isso é verdade. Pergunto-me: você a chamou?

Gregório jogou os ombros.

— Não.

— Imaginei que não. Algum dos nossos domínios eventualmente se revoltaria. Era apenas questão de tempo… o seu jogo é outro.

— Meu jogo?

Mas o Rei lhe dera as costas. Gregório apertou o passo para acompanhá-lo. Andavam na direção da Torre.

— Meu Rei de Amarelo… aos demais pode ter enfeitiçado, mas de mim não passou despercebido que em minhas décadas de reinado você não tenha envelhecido um dia sequer. Que sempre foi capaz de entender as línguas de todos os estrangeiros. Eu não sei o que você é. Mas tenho meus palpites.

O Bobo sorria, divertido pelas conjecturas do Rei. Pararam ao pé da Torre, uma construção em tijolos escuros e desiguais que apontava, colossal, para o céu.

— Ilumine-me, meu Rei. Dê-me de sua sabedoria!

— Você é um debate. Um passatempo filosófico!

O sorriso vacilou no rosto do piadista. O Rei prosseguiu.

— Quando me conheceu ainda menino, concordou de imediato com todos. “O príncipe vai enlouquecer”. Eu já sabia que não se tratava disso. As flores crescem em minha cabeça e é apenas isso. A flor que lhe coube cresceu apenas uma vez e eu a dei para você. Consumiu-a de pronto. A questão, meu caro comediante, é apenas que eu nunca quis ser rei. Não é o que floresce em minha cabeça, é apenas o que sempre esteve lá. O que é um império se não a renovada opressão em nome da ordem? Nesta idade, o que eu faria disso? O que é legar isso à minha menina? Minha única filha, presa a uma coroa de guerra sem fim! Pois começaria logo, não tenha dúvidas, um novo conflito, uma nova coalizão a derrotar… que venham novas tiranias, mas estou cansado de pintá-las de vermelho. Cumpri o meu dever com os meus antepassados. E você… bem, você estava aqui. “Qual é a verdadeira natureza humana”? Você deve perguntar. A questão deve te fazer gargalhar sozinho. Eu não sei te responder. A destruição mútua ou a colaboração? A Rainha Negra trará paz aos reinos ou pintará a miséria de nova cor? Você acha que o seu Amarelo prevalecerá no fim? Talvez. Mas o velho conflito da humanidade versus humanidade tem teólogos, filósofos e literatos de diferentes matizes debatendo desde o imemorial. Você deve pensar muito de você mesmo: o próprio conceito da dúvida no que é humano. Mas, apesar de você, eu vivi. Cumpri o meu dever, mas me deixei escolher. Durou pouco, viver do meu verdadeiro arbítrio. — O Rei enrolou o dedo em uma de suas flores-cabeleira. — Mas amei tudo o que tive.

O Rei Carmesim deu um passo à frente, iniciando caminhada ao interior da torre, no qual uma suave luminescência impedia a vista do que a construção guardava. O Bobo, em choque, só falou quando o monarca estava a um passo de entrar.

— Milhares morreram!

O homem de cabelos floridos bufou.

— Não haja como se te importasse.

— E sua filha? O que pensa que vai acontecer a ela?

O Rei Carmesim sorriu. Gregório, mestre na arte do sorriso, constatou que só agora percebia que aquele também era o primeiro sorriso sincero do seu adversário.

— Pode ser que a Rainha Alva retorne e reconquiste a terra dos seus ancestrais. Pode ser que faça as pazes com o que já tem e abandone as ruínas das glórias passadas. De certo, ela terá a melhor herança que pude legar: a escolha.

O Rei sumiu no interior da Torre Negra. O Bobo da Corte Amarelo não podia avançar para além daquele ponto. Como também ninguém jamais entraria ali. Não soube quanto tempo ficou a olhando, mas acompanhou quando da última janela, quase invisível na lonjura do alto daquela construção, flores avermelhadas brotaram e se estenderam, uma miscelânea carmesim tecendo um espiral que floreou toda a superfície da torre.

A RAINHA NEGRA

Os portões se abriram. A Rainha Negra, em seu cavalo escuro e armadura plumada, asas de cisne recolhidas às costas de seu traje de conquistadora, olhava não só do alto de sua montaria, mas da própria autoridade, obtida à base da guerra, do sangue, do ferro… e das sombras. Tinha a pele tão branca que parecia brilhar no meio do negrume de suas vestes. Tinha um rosto de feições felinas, lábios grossos e rosados, olhos puxados e impetuosos. Sua comitiva parou.

Os meninos, seus afilhados a quem a boataria concedera a alcunha infame de “meninos maus”, avançaram palácio adentro. Mirrados, maltrapilhos, adotados nos confins do Império que ela paulatinamente conquistou, desmontando a opressão e acolhendo os marginalizados. Para eles, era como uma mãe e com seus nomes ela havia homenageado diversos fortes, avenidas e até cidades. Os seus meninos — que serviram como porta-vozes, espiões, sabotadores, mas nunca soldados — tinham a parte de cima do rosto omissa em uma permanente e inviolável tarja de sombras, seus sinais de batismo.

— Ela é uma rainha assassina! É garantido explodir a sua mente!

Do outro lado um único homenzinho a aguardava com um estúpido sorriso no rosto. Mas, na imbecilidade da aparência daquele anfitrião, a Rainha não podia negar uma certa simpatia no trejeito desavergonhadamente servil do sujeito. Gregório de Carcosa, o Bobo da Corte Amarelo, vestido em ouro, já se curvava numa mesura tosca.

— Minha Rainha! Sou Gregório, o Bobo Amarelo. A seu serviço!

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48 comentários em “A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim* (Pedro Paulo)

  1. André Lima
    14 de junho de 2025
    Avatar de André Lima

    Assim como a fanfic de Madmax, destaco este conto como um bom exemplo para construção de personagens. Aqui, o enredo e a narrativa ficam em segundo plano.

    A narrativa explora a complexa relação entre o bobo e o rei. O Bobo Amarelo é o epicentro da ambiguidade e do mistério. Desde sua introdução como um homem infame, curandeiro, poeta, etc., até a revelação de sua natureza não-humana. Sua incapacidade de envelhecer e sua identidade como “o próprio conceito da dúvida no que é humano” elevam-no a um patamar filosófico muito interessante. Aliás, o conto inteiro tem uma profundidade filosófica que me atraiu. O personagem é recheado de contrastes.

    Já o Rei é o coração emocional do conto. Iniciando como um menino adoecido, coroado de flores que não germinavam, sua luta o torna imediatamente empático ao úblico. A evolução do personagem é notável, mas sua verdadeira profundidade surge na velhice, quando ele questiona o império e sua loucura é recontextualizada como sua verdadeira natureza, loucura esta que é um ato poderoso de libertação e autodescoberta.

    A Rainha é apresentada como uma força de mudança inevitável, enquanto a Bruxa Incendiária é uma figura de poder elementar e seu papel no conflito acrescentam um toque de magia e perigo à trama. Entende como tudo gira em torno da complexidade dos personagens?

    Este conto, assim como “A Morte de Mickey Mouse”, é recheado de simbolismos. As Flores representam a essência, a natureza inerente do Rei, o “Livre Arbítrio” é o tema central do Rei Carmesim, que culmina em sua abdicação do trono para buscar a si mesmo, tudo isso numa prosa poética muito interessante.

    Embora tudo isso seja uma força, a densidade do simbolismo e das descrições pode, em alguns pontos, tornar a leitura um pouco mais lenta. A complexidade é tanta, num espaço tão curto, que o fluxo de leitura é prejudicado. Eu aprendi uma coisa com o Tropicalismo: às vezes, a beleza poética está no uso corriqueiro da linguagem, da informalidade, do popular, etc, sendo ferramenta pra construções imagéticas ou de beleza lírica. Acho que faltou “simplicidade” em alguns pontos do conto.

    No mais, excelente trabalho. Certamente entre meus favoritos!

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, André!

      É como você assinalou: a forma realmente obstrui o conteúdo do texto. Ainda assim, fico feliz que tenha interagido com os personagens, captando a caracterização de cada um deles.

      No whastapp escrevi uma resposta mais longa acerca do seu comentário, a seu pedido.

      Muito obrigado pelo comentário!

  2. Bia Machado
    14 de junho de 2025
    Avatar de Bia Machado

    Olá, autor ou autora, tudo bem? Seu conto foi bem complicado de ler pra mim. Eu amo Queen pra vida toda, mas não fazia ideia dessa outra banda… adoro o King, mas não li A Torre Negra, ensaiei para ler O rei de Amarelo várias vezes, iniciei a leitura umas duas vezes, mas não consegui passar de umas poucas páginas, achei entediante. Não sei se tudo isso influenciou minha leitura de seu texto, só posso dizer por hoje que foi bem cansativo… a sua narrativa parece bem segura, a impressão que tive foi a de você saber muito bem o que está fazendo, mas ainda assim pra mim foi cansativo. Excesso de referências? Talvez. Bem, boa sorte no desafio.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Bia!

      Excesso de referências? Sim. Eu sabia o que estava fazendo? Sim.

      Com certeza um texto arriscado, mas curti bastante escrevê-lo.

      Obrigado pelo comentário!

      • Bia Machado
        20 de junho de 2025
        Avatar de Bia Machado

        Que bom que curtiu seu texto. Penso que isso seja o mais importante. Até o próximo texto. 😉

  3. Alexandre Costa Moraes
    13 de junho de 2025
    Avatar de Alexandre Costa Moraes

    Entrecontista,

    Seu conto é uma ousada e criativa releitura da música “The Court of the Crimson King”, entrelaçando outras referências literárias de forma sofisticada. Confesso que precisei de três leituras para absorver completamente a riqueza da narrativa. Na primeira, a densidade me afastou; na segunda, percebi a força do texto; e na terceira, após mergulhar nas referências da música e do conto do Rei Amarelo, a história se revelou brilhante.

    A leitura acompanhada da música proporcionou uma atmosfera única, intensificando a experiência. O Bobo Amarelo é um dos personagens mais intrigantes deste desafio, e sua conexão com Carcosa adicionou camadas de significado à trama. Sua sagacidade e ironia, além de sua capacidade de “dançar conforme a música”, tornam-no uma figura fascinante.

    A metáfora sobre os perigos do poder absoluto e a manipulação das massas é poderosa e atual. A presença do realismo mágico, como as flores que crescem na cabeça do príncipe, adiciona um toque pitoresco e simbólico à narrativa.

    Parabéns pela ousadia e pela escrita refinada. Gostei muito do seu conto. Pra mim, o mais impactante do certame. Boa sorte no desafio.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Olá, vossa excelência!

      Muito obrigado pela leitura atenta. Não é sempre que sobra tempo para se ler um texto mais de uma vez, ainda mais quando há mais de uma dezena de outros aguardando, então fico tocado pelo empenho e pela profundidade do seu comentário. Lembro que lá no grupo do whatsapp foi o primeiro a trazer a música do Queen para o grupo e sublinhou alguns temas. Também foi quem apontou para a inspiração no “Rei de Amarelo”, ao que aludi também.

      Fico muito feliz de ter quem tenha prestado tanta atenção a ponto de ter captado. Obrigado pelo comentário!

  4. Rodrigo Ortiz Vinholo
    12 de junho de 2025
    Avatar de Rodrigo Ortiz Vinholo

    Devo dizer que fico em dúvida se vale a definição de fanfic para essa obra que mistura tantas referências de formas mais ou menos diretas… mas isso é o de menos: é excelente! Gosto do andamento, do pensamento, dos personagens! Interessantíssimo, muito bem escrito! Parabéns!

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Rodrigo, vale sim. Abandone o regulamento que prescreve, abrace o entrecontista que vos escreve.

      Fico feliz que tenha gostado. Obrigado pelo comentário!

  5. Fabiano Dexter
    11 de junho de 2025
    Avatar de Fabiano Dexter

    História
    Aqui temos contada a história do Rei Carmesim, que ainda príncipe tinha flores crescendo em sua cabeça, até que um curandeiro aparece e consegue retirar essas flores, para alegria do Rei e Rainha. Esse curandeiro acaba se tornando conselheiro/bobo-da-corte e com orelhas de burro.
    A partir daí fala-se de guerras, festas e magia de uma forma que traz as músicas que são utilizadas como referência em uma história que acabou ficando um pouco corrida e confusa. Acredito que um maior desenvolvimento da história, sem limite de palavras o que possibilita um maior desenvolvimento entre as partes, deixe o conto ainda melhor, já que temos aqui um bom conto de fantasia.
    Tema
    O conto faz referências musicais, algumas já “avisadas” no início e outras, como Raul Seixas, citadas no meio. Ao arriscar no tema de fanfic o autor acaba “afastando” um pouco o leitor médio e perdendo o principal impacto da fanfic que é justamente a identificação dos personagens ou mundo no qual a história está incluída.
    Independente disso, o conto está inserido no tema do desafio.
    Construção
    A construção ficou um pouco corrida, com cortes abruptos entre um capítulo e outro. Como eu disse acima, acredito que com um maior número de palavras sendo utilizadas no desenvolvimento o conto tem potencial de ficar ainda melhor.
    Impacto
    Foi, para mim, um bom conto de fantasia, tema que me agrada muito. O fato de não conhecer a fundo as referências tirou um pouco do que poderia ter sido, acredito. Mas mesmo tirando as referências eu gostei bastante.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Dexter!

      Do meu último conto você não gostou muito, mas fico feliz que esse tenha te conquistado mais.

      Obrigado pelo comentário!

      P.S.: Cara, me bateu aqui, por que você não fez uma fanfic do Dexter? Poderia ter sido do assassino ou do cientista mirim.

      • Fabiano Dexter
        18 de junho de 2025
        Avatar de Fabiano Dexter

        Sim, esse eu curti bastante. Para seu azar, que quando eu não gostei tanto (na verdade eu não curti tanto a pegada quando o conto cresceu demais e saiu da cidade) vocêsvenceu. 🙂

        Essa ideia do Dexter era uma boa mesmo. Ou usando o dos livros/série como cientista ou o do desenho como assassino.

        Colocar essa ideia na minha lista interminável.

  6. Fabio Baptista
    8 de junho de 2025
    Avatar de Fabio Baptista

    Esse é difícil de resumir, hein. Mas vamos lá… Gregório de Carcosa, o bobo da corte, acompanha o rei Carmesim desde a infância como um príncipe que tem flores brotando na cabeça até sua derrocada frente a investida da Rainha Negra.

    Cara, é inegável que esse conto está muito bem escrito, com palavras escolhidas a dedo para darem ritmo às frases. Frases inspiradas, das quais destaco “O que é um império se não a renovada opressão em nome da ordem?”. Frases que brilham isoladamente, mas que não conseguiram dar fluidez a uma história. Não foi entretivo. Foi uma leitura densa, arrastada em muitas partes, desconectada. Naquele balanceamento de técnica e trama, a balança afundou no lado da técnica.

    Infelizmente não gostei.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Fábio!

      De fato, peso maior na técnica. Nas demais respostas confessei o mesmo, mas explicando que as próprias fontes originais também desenham um enredo colorido e confuso. Uma pena não ter gostado, mas assumi esse risco.

      Obrigado pelo comentário!

  7. Mauro Dillmann
    6 de junho de 2025
    Avatar de Mauro Dillmann

    Um conto bem escrito. Uma fantasia que exige atenção do leitor, tanto pelo enredo quanto pelas escolhas lexicais.  

    Opta por um vocabulário rebuscado, tornando o texto de leitura lenta. Poderia citar vários exemplos. Desnecessário. O autor deve estar consciente.

    Há uma passagem do texto, no item “O Rei Carmesim”, em que o conto parece querer trazer uma lição. De difícil compreensão e escrito com um excesso de conjunção “mas”.

    Por favor, me explique essa comparação assinalado pelo “versus”: “Mas o velho conflito da humanidade versus humanidade tem teólogos, filósofos e literatos de diferentes matizes debatendo desde o imemorial”. O que quis dizer, afinal? Várias passagens do conto, fica a mesma pergunta.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Mauro!

      Estou consciente.

      Quanto ao “versus”, eu não cheguei a estudar isso em um espaço acadêmico, mas já vi em discussões sobre literatura uma alusão aos vários conflitos explorados em obras literárias: aquele “homem vs homem”, “homem vs natureza”, “homem vs deus”, etc, etc.

      Foi nesse sentido.

      Obrigado pelo comentário!

  8. Kelly Hatanaka
    2 de junho de 2025
    Avatar de Kelly Hatanaka

    Um bom conto, com uma escrita muito rica. Mas o resultado, para mim, foi meio confuso. Uma confusão bonita, mas, ainda assim, uma confusão. Um conto barroco e penso aqui em uma bela igreja barroca, cheia de detalhes, rococó e ouro, que enchem os olhos. Bonito, mas confuso e um pouco demais. Começa pelas referencias. Queen, ok. King Crimson, não conheço, mas ok. Outras referências literárias. Hum… é uma fanfic de um monte de coisa, então? E daí, vem um trecho de Paisagem da Janela. Então tá.

    E, confuso ou não, foi indo tudo muito bem até a bruxa incendiária. Daí, já não entendi mais muita coisa. E olha que tentei, reli, reli de novo e acho que não sei.

    A escrita é bela, mas, pessoalmente, privilegio a história. Gostei da forma, mas nem tanto do resultado.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Kelly!

      Obrigado pelos esforços. É um conto no qual investi mais na imagem e que o enredo é propositadamente confuso, até pelas músicas que o embasam. Eu diria que é mais diretamente uma referência das duas músicas que, juntas, intitulam o texto, mas as outras várias referências foram feitas meio que brincando com outras ficções já estabelecidas, uma licença que penso ter quando se trata de um desafio fanfic. A música “Paisagem da Janela” aparentemente é sobre as paisagens vistas no interior mineiro, mas eu sempre tomei como uma música sobre ensinar História e achei caber aqui no conto, especialmente pelo verso das “cores mórbidas” e por aludir a uma tragédia avisada, mas ignorada.

      Você achou bonito. Então deu certo!

      Muito obrigado mais uma vez.

  9. Felipe Lomar
    31 de maio de 2025
    Avatar de Felipe Lomar

    olá!

    Foi uma leitura interessante. Percebe-se uma habilidade literária bem desenvolvida, pela eloquência e vocabulário. Interessante a ideia de uma fanfic em cima de músicas. O texto é criativo, não se pode negar, mas é confuso. Em parte pelo próprio rebuscamento e surrealismo, mas a própria narrativa é em si confusa. É difícil entender o sentido em alguns momentos. Me indago se, assim como o rock progressivo, o texto também seja composto para se ler chapado, e não seja aproveitado em sua plenitude enquanto sóbrio.

    boa sorte!

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Felipe!

      Hahahahaha, sim, talvez seja isso mesmo.

      Muito obrigado pelo comentário!

  10. Givago Domingues Thimoti
    29 de maio de 2025
    Avatar de Givago Domingues Thimoti

    A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim

    Da série “fazendo a boa”, vou tentar comentar o máximo de contos da Série A possível, apresentando minhas impressões pessoais sobre o seu conto. 

    A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim é um conto fanfic (?) que versa sobre a derrocada da Corte do Rei Carmesim (King Crimson) em virtude da armada da Rainha Negra. Antes de pesquisar as referências, eu entendi esse conto como uma fantasia que versa sobre política (poder), a disputa e a abdicação do Rei de todo o seu legado para sua filha e suas razões..

    Bom, minhas interrogações sobre o tema é se esse conto, de fato, se aplica ao tema e dá para fazer um conto sobre músicas/bandas? Neste último aspecto, eu diria que sim: afinal, músicas são obras literárias, poemas com acordes. Acho justo, portanto, dizer que dá para fazer uma fanfic de Faroeste Caboclo, por exemplo.

    Agora, ao que me parece, esse é um conto que mais usa as bandas e algumas de suas canções como referências para fazer um conto fantástico/épico do que uma fanfic propriamente. Quero dizer, se você não for um fã das duas bandas, você vai perder muitas das referências e, por conseguinte, a profundidade do conto. Tão somente referenciar torna um conto uma fanfic? Creio eu que não.

     Eu diria que gosto de Queen (antes da leitura desse conto, eu até diria fã, mas vou me abster dessa nomenclatura 😂), e somente percebi uma similaridade com Bohemian Rhapsody. Talvez o Bobo da Corte possa ser Freddie Mercury também… Enfim, joguei para o Machado (o CHAT GPT que eu nomeei para ver o que ele achava de referencia. Segue abaixo as conclusões da IA: 

    🔴 King Crimson – Referências encontradas

    🎵 “The Court of the Crimson King” (In the Court of the Crimson King, 1969)

    • Referência explícita no texto:
      • A figura do Rei Carmesim, seu trono decrépito, a guerra estagnada e a atmosfera onírica.
      • O título da música é literalmente citado de forma velada, e o conteúdo lírico da canção ressoa com a ideia de um império preso em símbolos que perderam o sentido:
         “The purple piper plays his tune / The choir softly sing…”
         “The gardener plants an evergreen / Whilst trampling on a flower”
    • No seu texto, a flor amarela esmagada na cabeça do rei evoca essa imagem simbólica e contraditória — vida e destruição simultâneas.

    🎵 “Epitaph” (In the Court of the Crimson King, 1969)

    • Clima de colapso civilizacional e niilismo profético:
       “The wall on which the prophets wrote is cracking at the seams…”
    • Reflete-se na fala do Histrião: “ninguém mais sabe que jogo se joga”, e no império onde a guerra virou farsa.

    🎵 “Starless” (Red, 1974)

    • Clima emocional sombrio e desesperançado:
      • O vazio e melancolia crescente da faixa ecoam na descrição do palácio vazio, da rainha estrategista e do histrião que ri na escuridão.

    🎵 “Larks’ Tongues in Aspic (Part I)”

     (Larks’ Tongues in Aspic, 1973)

    • Instrumental caótico, tribal, esotérico:
      • A tensão dramática entre lógica e loucura no conto lembra essa faixa, onde tudo parece construir uma ordem mística e violenta — tal como a Rainha Negra, que joga como uma IA bélica calculista.

    👑 Queen – Referências encontradas

    🎵 “The March of the Black Queen” (Queen II, 1974)

    • A figura da Rainha Negra, imponente, manipuladora, estrategista — como uma encarnação das forças do destino ou da destruição.  “Now I’ve got you, you’ve been had / And I can make you feel bad”
    • A ambientação mística e dualista do álbum Queen II (lado branco e lado negro) parece servir de pano de fundo simbólico para seu conto.

    🎵 “Bohemian Rhapsody” (A Night at the Opera, 1975)

    • O Histrião, que surge como um “culpado inocente” e altera o destino com palavras e canto, lembra a jornada tragicômica e absurda do narrador dessa música:
       “Is this the real life? Is this just fantasy?” “Mama, just killed a man…”
    • A forma como o Bobo transforma tudo em espetáculo remete à teatralidade quebrada da faixa, que muda de tom e gênero várias vezes — assim como seu conto oscila entre o drama político e a farsa simbólica.

    🎵 “The Show Must Go On” (Innuendo, 1991)

    • Tema central do conto: o show continua, mesmo que tudo desmorone.
       “My soul is painted like the wings of butterflies / Fairy tales of yesterday will grow but never die…”
    • A ideia de representação forçada, como no herdeiro que é apenas um palhaço, casa com esse espírito.

    🎵 “Was It All Worth It?” (The Miracle, 1989)

    • O tom de melancolia reflexiva que atravessa o final do conto, onde a vitória é conquistada por alguém que ri e dança sobre os escombros, ecoa esta canção:  “We went to Bali, saw God and Dali / So what was the final game plan?”

    🎵 “Dear Friends” (Sheer Heart Attack, 1974)

    • Frase como “poetas míopes enxergam o arrebol” soa como uma versão satírica ou lírica das mensagens curtas e emotivas de canções como esta: “Dear friends, I’ve had enough / I’m standing on my own”

    Para concluir meus punhados de pensamentos sobre esse aspecto, (ainda bem que eu não tive que avaliar esse conto, seria um baita desafio), eu diria que esse conto resvalou no tema pelo excesso, pela ganância de querer abarcar o máximo de entrecruzamentos entre Queen e King Crimson. Como eu disse anteriormente, eu não sei se fazer referências a muitas canções de duas bandas configura uma fanfic. Da primeira leitura, é possivel perceber que as referências não somente corroboram com a minha primeira impressão, mas também aprofundam e muito o conto. Ainda assim, não me convenci tanto sobre adequação ao tema. Creio que funcionaria bem melhor enquanto conto fantástico.

    No mais, eu diria que esse conto é bem escrito, autêntico (sempre gosto de contos que mostram o esmero do escritor por trás da narrativa), que peca mais por apostar na pluralidade de referências para leitores que, provavelmente, não têm o mesmo conhecimento das obras originais que o autor/a autora. Claro, aí fica também a cargo do leitor ir atrás e pesquisar. 

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Givago!

      Veja, muitas das músicas citadas ali não foram consideradas e a maior parte dos personagens e enredo foram tirados das duas músicas que intitulam o conto. Defendo que é uma legítima fanfic.

      Muito obrigado pelo comentário!

      • Givago Thimoti
        18 de junho de 2025
        Avatar de Givago Thimoti

        Oi, PP! Desculpa! Meu comentário no seu conto foi mal redigido, ficou muito ambíguo mesmo agora que reli. Ele tá dentro do tema, sua defesa é legitima e correta. Pelo erro, perdão.

  11. claudiaangst
    24 de maio de 2025
    Avatar de claudiaangst

    Olá, autor(a), tudo bem?

    A narrativa está dividida em quatro partes — O Histrião, A Marcha, A Bruxa Incendiária, O Rei Carmesim — o que faz o texto se assemelhar a uma peça de teatro.

    Logo no início já há o aviso de que se trata de uma fanfic, tendo como base músicas das bandas inglesas Queen e King Crimson.

    Talvez, as músicas escolhidas como inspiração tenham sido: Killer Queen, The March of the Black Queen (não conhecia), Death on Two Legs (também não conhecia), Don’t Stop Me Now, The Court of the Crimson King, Epitaph, 21st Century Schizoid Man e Starless. Confesso que não conhecia nada de King Crimson. Uma pegada mais sombria, melancólica. Foi bom ter citado a referência, pois eu não saberia conectar os pontos da fanfic.

    Suponho que o autor tenha conhecimento musical aprofundado, pois optou por um caminho um tanto ousado em se tratando de um desafio EC.

    Muita informação por todos os lados, acabei me sentindo em meio a um tiroteio de referências e simbologias. Não posso dizer que entendi tudo o que o autor (ou terá sido uma autora?) buscou transmitir, mas fiz o meu possível.

    Quanto à revisão, aponto algumas falhas:

    • Repetição da expressão “restante da vida”
    • Não haja como se te importasse > Não aja (do verbo agir) como se te importasse
    • Repetição de “tinha” muito próxima.

    Parabéns pela participação e boa sorte na hora da classificação.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Cláudia!

      Não me considero com um conhecimento musical aprofundado, não, mas gosto bastante das músicas dessas bandas e pesquisei sobre cada uma das bandas e algumas das músicas. Inclusive, algumas das músicas que citou eu realmente utilizei de inspiração direta ou indireta, mas outras conheço só por nome, por exemplo.

      Os erros que apontou serão considerados em uma revisão. O haja/aja me deixou consternado. Reli tantas vezes e deixei passar!

      Obrigado pelo comentário!

  12. Jorge Santos
    20 de maio de 2025
    Avatar de Jorge Santos

    Olá. Achei o seu texto algo difícil de descortinar. É um fanfic das histórias de capa e espada, com reis, cavaleiros, guerras, bobos. Faltou algum coerência para ligar tudo. A personagem de Gregório parece levitar através da trama, imune ao passar do tempo. Primeiro é curandeiro temido, no final é bobo, quando, pelas minhas contas, deveria ter 90 anos. O problema é que esta passagem do tempo apenas é visível no rei. Não existe uma única indicação sobre a idade de Gregório. Quanto à qualidade da escrita, é irrepreensível. Só esperava algo mais fluído, com outro tipo de coerência. O foco da narrativa é a do rei louco, algo que foi bastante comum na História, em parte devido aos problemas de consanguinidade. O rei indica que não quis ser rei – preferia ter sido simplesmente louco –, mas demorou décadas para chegar a esta conclusão. Não sei se a minha análise é certa. Vou esperar algum tempo e fazer uma releitura.

    PS: Obrigado pela sugestão dos King Crimson. Aprendo sempre alguma coisa com os desafios do Entrecontos, e esta banda vou guardar na pasta das boas surpresas.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Jorge!

      Apesar de ter identificado como uma história de “capa e espada”, eu não apontei um contexto tecnológico e econômico em que se passa a história. Eu tenho pensado em ramificá-las em novos contos-experimentos e acredito que caberia bem em um steampunk, na real. Mas isso não coube nesse conto.

      Foi escutar “King Crimson”? Parece que gostou. Isso já valeu a leitura.

      Obrigado pelo comentário!

  13. paulo damin
    15 de maio de 2025
    Avatar de paulo damin

    Texto bem escrito, cheio de detalhes e movimento. Dá pra ver que o autor gosta bastante do assunto e das referências. A ideia de cortar por seções ajuda a aliviar a impressão de que é um texto muito longo. 

    Mesmo assim, não sei, acho que o fato de as referências não serem evidentes torna o conto trabalhoso para o leitor. O próprio autor parece ter percebido isso, porque indicou antes do texto as referências musicais citadas. Ou seja, trabalho triplo: ouvir as bandas de rock, traduzir as letras delas e, depois, buscar isso no conto.

    Eu precisaria de mais tempo. Recém estou ouvindo o segundo disco do Queen.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Paulo!

      Pois é, eu arrisquei nesse desafio, tanto que fiquei lá no meio da série. Se escutou o segundo álbum, encontrou a Marcha da Rainha! Espero que tenha gostado.

      Obrigado pelo comentário!

  14. cyro eduardo fernandes
    12 de maio de 2025
    Avatar de cyro eduardo fernandes

    Conto recheado de citações musicais do rock britânico e um cheirinho de Raul Seixas. Muito bem escrito e criativo. Propicia uma reflexão interessante sobre a nobreza, a hereditariedade e a escolha.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Obrigado, Cyro! Fiquei muito feliz com localizou a referência sutil a “21st Century Schizoid Man”, lá no grupo do whatsapp.

  15. Antonio Stegues Batista
    11 de maio de 2025
    Avatar de Antonio Stegues Batista

    Sinopse: Os outros contos que li, fiz uma sinopse antes do comentário, mostrando que li o texto, mas esse é um conto complexo que se eu fosse fazer um resumo, seria muito longo. Posso dizer que gostei da ideia, da escrita. O conto, como diz o autor, é baseado em músicas de banda de rock Queen e King Crinson. Os versos das músicas são complexos e precisam de certo esforço para interpretá-las. A narrativa do conto não segue um padrão coerente  como com tema cotidiano, por exemplo onde tudo é verossímil, mas é valido em sua estética estranha e original, como a letra das músicas.

    Músicas brasileiras também são ótimas para servir de base para fanfic. Exemplo; Mulheres de Atenas de Chico Buarque, Domingo no Parque, de Gilberto Gil, Sentado à Beira do Caminho, de Erasmo e Roberto Carlos e muitas outras. Parabéns e boa sorte.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      No próximo desafio espero que o senhor escreva a partir de pelo menos uma ou algumas dessas músicas! Sendo um desafio fanfic ou desafio músicas.

      Pensando aqui, tem sim uma música brasileira de um desses compositores que quero pegar para ficcionalizar. Aliás, teremos um filme da Geni, não é mesmo?

      Obrigado pelo comentário!

  16. Thiago Amaral
    7 de maio de 2025
    Avatar de Thiago Amaral

    Meu conto favorito até agora.

    Em meio à leitura, fiquei em dúvida se estava gostando mesmo pelo conteúdo ou pelas referências, já que o conto empresta muito da letra da música do King Crimson, que é maravilhosa, além de algumas outras do mesmo album. Mais para o fim da história, no entanto, percebi que não: as adições feitas, a colagem de referências, tudo resultou numa narrativa muito bem feita e interessante, para além da mera nostalgia.

    Em adição ao que já encontramos na música, temos o rei carmesin com suas flores na cabeça, que não sei se é referência a alguma coisa, mas achei um símbolo muito bonito. A própria visão de sua herança também considerei bela, além da maneira como ele se despoja dela. Gregório de Carcosa também é interessante, e me parece ser uma mistura de Gregori Rasputin e do Rei Amarelo da literatura de dois séculos atrás. Rasputin por causa do olhar penetrante e do papel de cuidar do filho do rei, e depois se instalando no poder. é com certeza uma referência, e uma que adoro, por ter tantas coisas bizarras e curiosas associadas a ele (basta ver como ele morreu).

    O contraste e diálogo final entre os reis vermelho e amarelo desperataram meu interesse e me lembraram também de Watchmen, quando o comediante (olha aí) é derrotado pelo plano megalomaníaco do Ozimandias. Aqui é um pouco diferente, mas também parece desconstruir o niilismo como uma filosofia vazia (o que é irônico).

    Caçar referências sempre é divertido, e eu queria dar destaque também à referência ao Gita, do Raul Seixas, que se encaixa bem na boca do Gregório. O fato dele espalhar suas ideias imperceptivelmente pelas mentes da população, criando desejo por anarquia e caos simboliza parte do que é a loucura da arte, mas também do papel primitivo que alguns discursos incoerentes fazem nos esgotos da sociedade. E, assim, o caos e o vazio também encontram seu poder.

    Como ressalva, encontrei alguns trechos ambíguos que me geraram confusão. Quando Gregório se encontra com o rei, achei que era o segundo quem estava com o corpo todo destruído (sim, apesar de o comediante ter acabado de encontrar com a bruxa). É que a frase estava muito ambígua, mas depois entendi quando reli algumas vezes. Também há ambiguidade em: “— Ela é uma rainha assassina! É garantido explodir a sua mente!” (apesar de que eu entendi, mas toma cuidado com isso kkk)

    Bom, resumindo: excelente conto, nota máxima, amei revisitar as referências, reler as letras do King Crimson, decifrar esse conto gostoso.

    Meus parabéns e boa sorte no desafio!

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Thiago!

      Mencionei na live, mas fiquei impressionado com ter identificado a referência direta a Rasputin, ainda mais porque, para além de Gregório ser o português de Gregori, de fato o destaque dado aos olhos azuis foi proposital após eu ter decidido que faria essa referência. A princípio, eu não tinha feito o elo entre o Bobo e Rasputin, tendo pensado primeiro que a aproximação do Bobo da Corte Carmesim seria por conta dos cuidados do príncipe… mas aí lembrei do caso russo, pesquisei um pouco e fiz as ligações mais diretas: nome e olhos azuis. E você captou, o que me deixa muito feliz!

      Evidentemente, foi o leitor com quem mais as referências se conectaram diretamente, tendo desvendado boa parte do enredo e personagens estruturado nas músicas do King Crimson. Parece que escrevi para você. Muito obrigado pelo comentário e por uma leitura tão atenta e particular. Obrigado mesmo!

      • Thiago Amaral
        18 de junho de 2025
        Avatar de Thiago Amaral

        Pois é, foi um conto bem do meu gosto, mesmo! O próprio Rasputin é um personagem histórico que me inspirou em algum momento do passado, o que me fez pesquisar sobre ele. Não só as músicas caem no meu gosto, como até esse cara… engraçado. O que me fez lembrar primeiro foi a história com a família real, mesmo. Depois que eu fui reler a descrição dele e percebi as outras ligações (inclusive o nome).

        Valeu e até a próxima!

  17. toniluismc
    6 de maio de 2025
    Avatar de toniluismc

    AVALIAÇÃO CRÍTICA – CONTO “A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim”
    ✒️ Por um leitor sem paciência para circo literário sem foco

    📉 PRIMEIRA IMPRESSÃO

    O título é pomposo. A premissa é ambiciosa. A execução é… um delírio barroco com síndrome de grandeza.

    Este conto é um desfile de referências, alegorias e personagens com nomes de impacto — mas sem nenhuma âncora emocional, nem eixo narrativo firme. É como se um fã obcecado de King Crimson e Queen resolvesse transformar um álbum progressivo em prosa e esperasse que o leitor assistisse a tudo de pé, batendo palmas, sem ousar perguntar: “Mas o que está acontecendo aqui, afinal?”

    ✍️ TÉCNICA — Nota: 3.0

    Pontos positivos:

    • O autor escreve bem — demais, até. Domina a gramática, tem vocabulário amplo, ritmo cadenciado e consegue construir imagens densas, com frases que soam como prosa poética.
    • A narração tem um certo charme em sua teatralidade, como se estivéssemos lendo o script de uma ópera psicodélica narrada por um bobo da corte que fez doutorado em filosofia existencialista.

    Mas…

    • O texto tem pavor de ser direto. Esconde o enredo atrás de camadas e mais camadas de alegoria, fazendo do simples um labirinto.
    • confusão entre linguagem rebuscada e boa literatura. O excesso de adjetivos, as construções pretensiosas e a tentativa constante de soar “grandioso” tornam a leitura cansativa e pedante.
    • A estrutura lembra mais uma peça de teatro simbólica mal adaptada para prosa do que um conto de verdade. É um caso clássico de forma sufocando o conteúdo.

    🔎 Resumo técnico: Um estilo maduro, mas intoxicado pelo desejo de impressionar. O conto brilha, sim — mas como purpurina no escuro: bonito, inútil e logo irritante.

    🎨 CRIATIVIDADE — Nota: 2.0

    Ideia promissora? Sim.

    • Misturar referências musicais, criar um universo simbólico e reinterpretar reinos e arquétipos como cores e figuras mitológicas soa interessante… no papel.
    • Gregório de Carcosa, a Rainha Negra, o Rei Carmesim, a Bruxa Incendiária… todos parecem personagens ricos.

    Mas a execução…

    • O mundo é construído em cima de metáforas que o leitor precisa decodificar constantemente.
    • As referências a Queen e King Crimson estão lá — mas não são nem acessíveis, nem aproveitadas narrativamente de forma criativa. São citações embutidas com a sutileza de uma marreta.
    • O que poderia ser uma fábula de guerra, identidade e decadência imperial vira um devaneio hermético.

    🔎 Resumo criativo: É criativo no mesmo sentido que pintar um quadro só com tons de cinza tentando descrever um arco-íris: ambicioso, mas frustrante. Parece feito para quem já sabe do que se trata — o leitor não é convidado, ele é desafiado.

    💥 IMPACTO — Nota: 1.7

    E aqui vem o colapso.

    • O conto não emociona.
    • Não há vínculo real com nenhum personagem. O Bobo Amarelo é caricato, o Rei Carmesim é uma alegoria ambulante, e a Rainha Negra é uma figura de vitrine.
    • A tentativa de grandeza filosófica esvazia qualquer conexão humana. Você lê o fim com a mesma emoção com que assiste a um PowerPoint conceitual sobre “A Essência do Ser”.

    Além disso:

    • Não há conflito palpável, apenas simbolismos e arquétipos jogados na tela como confetes.
    • Quando finalmente se anuncia algo que deveria ser impactante (a guerra, o fim do rei, a ascensão da Rainha), o texto se refugia em mais abstrações. É como assistir a um filme onde toda explosão acontece fora da tela.

    🔎 Resumo do impacto: O impacto é como o som abafado de um trovão dentro d’água. Você percebe que algo aconteceu, mas não sente.

    🧨 CONSIDERAÇÕES FINAIS

    “A Marcha da Rainha Negra sobre a Corte do Rei Carmesim” é o conto mais ambicioso do grupo — e também o que mais fracassa no que se propõe. Tenta ser tudo ao mesmo tempo: fábula política, fanfic musical, crítica filosófica, poema em prosa, teatro simbólico… e, no fim, não é nada que prenda o leitor além da estética. Resumo cruel em uma frase:

    Um conto que desfila com capa real, mas tropeça no próprio ego e acaba sufocado sob o peso de suas próprias metáforas.

    Se o objetivo era escrever um hino de batalha literária, o autor entregou um solo de guitarra em loop infinito, sem refrão, sem clímax e sem plateia.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Luís!

      Concordo que neste conto a forma suplanta o conteúdo. Foi uma decisão minha, mas ao mesmo tempo preciso reiterar o que já observei em outros comentários, das principais obras de inspiração não apresentarem personagens em enredos claros e lineares. A minha própria narrativa preenche esses espaços, mas sem nenhum esforço para criar uma trama mais apreensível, preferindo preservar a psicodelia das imagens coloridas e o mistério de muitos dos cenários mostrados.

      Discordo do que apontou sobre as referências a “Queen” e “King Crimson” estarem lá, mas não serem aproveitadas. Pois não escreveu nenhum apontamento para nenhuma das referências em específico, apenas generalizando que houve falha em sua adaptação, enquanto outros leitores que sacaram o que exatamente é homenageado elogiaram a abordagem. Agora, é claro que existe a subjetividade nisso… mas esse trecho do seu comentário é tão vago que me pareceu mera generalização de uma crítica decididamente negativa como ponto de partida. Mas, mais importante. Eu não escrevi o conto dependendo de um reconhecimento de suas referências para que fosse aproveitado. Pelo contrário, assumi o risco de que muito ficasse sem explicação, mas que a trama envolvesse e os personagens estivessem caracterizados. Quem reconheceu as referências não entendeu mais do enredo, apenas identificou mais diretamente quais foram minhas inspirações e intenções. Afinal, como já mencionei as próprias músicas não trazem tramas de todo explícitas, permitindo mais de uma interpretação e sem uma definição clara de seus personagens. Até porque são músicas, operando seus versos em um espaço menor e com uma intenção diferente daquela de um conto. Não vejo problema em desafiar os leitores, ainda mais quando se trata de entrecontistas.

      Apontar a inexistência de conflito é falho. Entendo que uma das principais características de um conto é justamente a existência e desenvolvimento de um ou mais conflitos. Aqui há pelo menos alguns: o Rei e sua loucura; o Bobo e a ordem e a natureza; a Rainha e o Rei; o Império e a tirania contra a ruptura, a renovação e a sucessão… pode-se criticar que não adianta que eu esteja incluindo isso em um comentário, pois deveria estar no texto. Mas outros leitores também identificaram, não acho que tenha ficado comigo em uma tentativa falha de transmitir esses nós narrativos. É possível que nenhum desses conflitos te empolgue, mas partir de seu gosto pessoal para apontar que não existem é mesquinharia sua, o que parece sobrar.

      O texto tem metáforas, mas não depende delas. Apesar de que, há uma certa ironia em sua crítica, pois parte do seu comentário é mesmo redigido em cima de metáforas, não sei se com o intento de mostrar que também sabe faze-las. Vou exemplificar com as flores do rei: essa metáfora vem de uma referência específica que, ao me decidir por ela, eu sabia que ninguém captaria e entretanto gostei da imagem, preferi arriscar a inserção mesmo sabendo que não seria de todo explicado, mas delineando um dos conflitos da trama em torno disso. Então ainda que a metáfora não seja desvendada, esse ponto ainda dá base ao conto e uma simples correlação se estabelece: sem flores = ok; com flores = algo está errado.

      O conto não te empolgou. É compreensível, um texto vai ressoar mais ou menos com os diferentes leitores que se tem aqui, e arrisquei com esta participação sabendo que não seria bem recebido por todos. Entretanto, o que espero de todo leitor é uma crítica construtiva que parta da leitura do conto e não de um pressuposto de que o texto não funciona. Quem sabe na próxima.

      Obrigado pelo comentário.

      • toniluismc
        18 de junho de 2025
        Avatar de toniluismc

        Oi, Pedro!

        Quero começar agradecendo pelo seu retorno tão detalhado. É sempre um privilégio poder dialogar com autores que têm domínio do que estão propondo e que, como você, tratam a crítica com maturidade. Ao reler seu comentário, percebi o quanto ele expõe pontos legítimos — especialmente em relação à forma como conduzi minha análise.

        De fato, fui duro. E admito: talvez tenha sido mais do que o conto merecia. Todavia, existe um contexto que acho justo esclarecer. Na rodada anterior, fui alvo de avaliações bastante ríspidas, e confesso que isso me deixou com um certo amargor. Não estou dizendo que você fez parte disso (sei que não), mas, como o desafio é anônimo, acabei descarregando meu incômodo em contos que lembravam escritores com aquele estilo que me atingiu de maneira desproporcional. O seu, infelizmente, acabou no meio do fogo cruzado.

        Sobre as referências — e aqui faço um mea culpa — eu realmente não entendi. Cheguei a pesquisar as bandas mencionadas e por isso mesmo citei no comentário. Só que a leitura ainda me pareceu hermética e difícil de acessar. E, como me propus a fazer críticas mais incisivas nesta rodada, acabei apontando esse estranhamento como uma falha, quando talvez o melhor fosse apenas reconhecer que eu não consegui entrar na proposta, o que não invalida a proposta em si. Outros leitores se conectaram, e isso diz muito sobre a qualidade do seu texto.

        Admiro bastante seu trabalho e venho acompanhando suas participações com interesse. Inclusive, nas últimas duas rodadas, apontei seus comentários como os melhores que recebi — e continuo achando que sua leitura crítica é uma das mais ricas do EntreContos. Acredite, minha intenção nunca foi desmerecer a qualidade do seu conto, mas provocar um debate sobre o uso da forma como camuflagem de um certo pedantismo literário que, infelizmente, tem sido usado para atacar autores menos “vistosos”. Você não faz isso, mas sem querer, acabou atingido por esse meu acerto de contas.

        Por fim, reforço o quanto valorizo sua escrita e sua presença no desafio. E agradeço imensamente por manter o nível do debate lá em cima. Que venha a próxima rodada — com menos ranço da minha parte e, espero, boas surpresas de ambos os lados.

        Abraço,
        Luís

  18. Leandro Vasconcelos
    5 de maio de 2025
    Avatar de Leandro Vasconcelos

    Olá! Este conto é curioso e original. Primeiro porque a fanfic foi feita tomando por base a música, como o autor bem esclareceu logo no início, o que é surpreendente. Esperávamos, neste desafio, obras derivadas da literatura, cinema, cultura popular etc. Segundo, muito me atraiu a qualidade de forma, o rebuscamento, que afastou o texto de lugares-comuns e trouxe uma atmosfera única, muito adequada ao enredo fantástico. Este que, aliás, talvez se enquadre no “dark fantasy”, com regicídios, sucessões sangrentas, guerras imperiais etc.

    Outra coisa que me atraiu foi o simbolismo dos personagens. Se bem entendi, Gregório, o Bobo Amarelo, funciona como uma entidade metafísica, uma espécie de pícaro ou emissário do caos, que observa e manipula a decadência do poder. O Rei Carmesim não é apenas um monarca: é um símbolo da fadiga do poder, do ciclo eterno de guerra e sucessão. A Rainha Negra, por sua vez, representa a força revolucionária que derruba a ordem estabelecida. Esses papéis são bem construídos e coerentes ao longo do enredo, representados, cada um, por uma cor.

    Contudo, a narrativa pecou pelo excesso: foi muito ousada, muito rebuscada, muito grandiosa, sobretudo para um conto curto. Encaixar uma trama complexa num universo fantástico já é deveras difícil, mas escrevê-la em três mil palavras se torna impossível. Creio que foi o caso. Ficaram muitas pontas soltas, muitos pontos obscuros. O autor pressupõe um conhecimento do leitor a respeito das músicas para que entenda o enredo. Eu sou meio ignorante a respeito do universo musical, então admito que me vi perdido em algumas partes. O que realmente é o bobo da corte? E a bruxa incendiária, qual foi o papel dela? No fim, até o discurso final do rei pareceu hermético. Se tudo isso tinha significado nas músicas, então o texto é voltado a um nicho de apreciadores desse universo. Se, por outro lado, o significado tinha que ser encontrado no próprio texto, então receio que o autor não foi muito claro.

    Talvez o autor quisesse valorizar a forma, com bonitas construções frasais, em detrimento do conteúdo. Mas, mesmo sob esse aspecto, foram várias os momentos em que eu achei excessivas as descrições; um excesso de rebuscamento que pouco contribuiu para o texto – pelo contrário, obstou o ritmo de leitura e nada influiu na trama.  

    Convém destacar que o autor não deu margem à imaginação do leitor, povoando o texto com adjetivos. É aquele chavão que serve para quase todas as narrativas: o ideal é mostrar mais do que contar. A advertência é válida, porque muitas vezes queremos impor uma visão ao leitor, mas quando ele recebe o texto, faz o que quiser dele. E, se impormos essa visão, o leitor pode se sentir usurpado. Nesse texto, vejo um pouco disso. Embora reconheça a beleza em algumas construções (a exemplo das “orelhas ornadas pela complexidade da coroa filamentar de um crisântemo vermelho-carmim”), o autor empregou essas expressões sem um significado prático, parecendo mero ornato sem conteúdo, além de parecerem excessivas, em longas orações, o que prejudica o ritmo de leitura.

    De toda forma, como já ressaltado, é um texto bonito e que tem um enredo curioso, simbólico, o que me agrada. Para mim, é objeto de uma obra maior, um romance talvez, no qual se poderia expandir o universo e defini-lo de forma mais aprimorada.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Leandro!

      Concordo que aqui a forma desequilibre com o conteúdo, mas, por um lado, as obras de inspiração ao conto não são em si repletas de um sentido claro ou de uma narrativa linear. Existe muito de onírico que me empolgou de representar em um texto que é muito mais imagem do que enredo, mas que, extrapolando as obras originais com a proposta do certame de ficcionalizar em cima do ficcional, ainda me esforcei para sutilmente desenhar uma trama entre as personagens representadas. O que, é claro, entremeio a tantas cores, viradas de contexto e alusão a narrativas pregressas, não fica facilmente transmitido. Um risco que assumi.

      Obrigado pelo comentário!

  19. Luis Guilherme Banzi Florido
    5 de maio de 2025
    Avatar de Luis Guilherme Banzi Florido

    Boa tarde!

    Um conto escrito de maneira profissional, do tipo que seria mais provável encontrar numa publicação oficial do que num desafio de internet. Não que não haja profissionais aqui no EC, nao entenda mal. Foi só uma forma de destacar o primor da sua escrita.

    Sinceramente nao conheço o material original, entao nao sei dizer o quanto aqui é fanfic, adaptação, reimaginação, remake, etc, pra usar os termos que estão na moda, mas analisando unicamente o seu conto, é de cair o queixo, sinceramente. A escrita é bela, correta e na medida certa poética, as descrições, diálogos, situações, personagens, tudo impecável. Um contaço.

    Falando sobre os personagens especificamente, sao mto bons! Todos sao densos e bem construidos, se considerarmos uma historia tao curta. O Amarelo se destaca, claro, como voce planejou. Um personagem cheio de artimanhas, intenções, agenda, o que o torna complexo e que desperta nossas suspeitas.

    O enredo é ótimo, a montagem funciona perfeitamente aqui. E o desfecho é primoroso. Nota 5, me surpreenderei se não ficar pelo menso no top 3.

    Parabéns e boa sorte!

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Luís!

      Parece que sempre acerto contigo e seus comentários me acalentam. Aliás, foi o primeiro a dar uma impressão mais definitivamente positiva ao conto lá no regime semiaberto do whatsapp. Fico mesmo feliz de ter gostado! Posso estar arriscando ao afirmar, mas acho que gostaria das outras ideias que tenho nesse universo.

      Muito obrigado pelo comentário.

      • Luis Guilherme Banzi Florido
        18 de junho de 2025
        Avatar de Luis Guilherme Banzi Florido

        Opa, tenho muito interesse nas outras ideias! Quando escrever algo mais, me avisa!

  20. Augusto Quenard
    5 de maio de 2025
    Avatar de Augusto Quenard

    Bom, eu confesso que hesitei um pouco ao pensar no conceito de fanfic pra participar, mas acabei concluindo que as personagens tem que ser de conhecimento popular, massivo, embora seja bem difícil definir isso. Como diz a orientação do próprio entrecontos: “Queremos histórias de personagens conhecidos popularmente”. Aqui, no entanto, acho que é fácil concluir que não são personagens conhecidas, né? A não ser uma vaga ideia do “rei de amarelo”. Mas, bom, ainda que eu pudesse aceitar estar enganado, parto da ideia de que fugiu do tema.

    Fora isso, gostei muito do estilo do texto. Mas, mesmo que tenha tudo a ver com o tema e o universo narrado, eu baixaria um pouquinho o tom culto pra facilitar a leitura. E não me refiro a palavras difíceis que a gente precisa ver no dicionário, ou a inversões sintáticas, etc, disso eu gosto, mas acho que aqui às vezes ficou confuso, como nesses trechos, entre outros:

    “Foi a Rainha quem o protegeu. Ele exigiu que ficasse a sós com o garoto”, acho que era “exigiu ficar” não? De início, entendi que era pra rainha ficar a sós com o filho.

    “que o haviam ensinado”, não seria “lhe”?

    “Os orbes se espalharam por detrás dele, levitados até parearem a Bruxa. Em suas superfícies, exibiam um fósforo se apagando”. Não entendi o que aconteceu aqui.
    Mas, fora isso, que são sutilezas, quem escreveu certamente escreve muito bem.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Augusto!

      De fato, decidi ignorar esse ponto do regularmente. Repudiei abertamente, criticando no grupo do whatsapp, mas também escrevi o meu conto sabendo que não se enquadrava, ainda que achando que é uma legítima fanfic.

      Obrigado pelas observações sobre a estruturação das frases. O Gustavo abriu para o reenvio de versões atualizadas e farei essas correções mais umas que a Cláudia também notou.

      Quanto às partes da órbita, a exibição dos fósforos se apagando foi uma ameaça velada de Gregório, mostrando para a sua adversária, uma elemental do fogo, a imagem de uma chama se apagando. A sugestão é que ele faria o mesmo a ela, como de fato se concretizou.

      Obrigado pelo comentário!

  21. Rangel
    4 de maio de 2025
    Avatar de Rangel

    Olá, Crimson,Você trouxe um conto cheio de referências e uma narrativa fantástica medieval construída com bastante complexidade. O protagonista é muito interessante, carismático e misterioso. O príncipe em que as flores nascem é igualmente bem construído. Sua escrita é desafiadora, sem apelar para construções difíceis e arcacaicas, mas também não caindo numa simplicação.O texto está bem revisado e isso é um excelente ponto. E os diálogos estão escritos com qualidade. Contudo, em algum me perdi na história. Talves fosse necessário conhecer as obras de referência para entender o motivo do conflito, as origens das personagens etc. Em algum momento eu me peguei pensando, o que e por que isso tudo isso está ocorrendo. Quem é de fato o tal histrião? O que são essas flores na cabeça do rei? De onde vem a guerra? Não acho que isso não esteja na história, é bem possível que esteja e seja mais evidente do que pareça, mas eu realmente não peguei. E aí perdi um pouco do interesse pelo desfecho e me preocupando mais em tentar entender o que estava acontecendo ali.

    • Pedro Paulo
      18 de junho de 2025
      Avatar de Pedro Paulo

      Oi, Rangel.

      Não acho que as motivações e o contexto estejam tão evidentes como supôs e, portanto, a confusão é compreensível e é um risco para o meu texto, sobretudo quando inserido em um certame. Mas por um lado, há motivo para isso. A principal inspiração para a história é a música “In The Court of the Crimson King”, que ordena uma boa parte dos acontecimentos e personagens narrados aqui, mas também em uma atmosfera caótica e psicodélica que não esclarece. Nas 3 mil palavras não tive como expandir, mas também foi uma decisão autoral não me prolongar em explicações as quais, conforme me detenho nesse conto e nas suas possíveis ramificações, passo a guardar comigo. Muito obrigado pelo seu comentário!

      P.S.: Se não me engano, lá no grupo do whatsapp você leu o conto e identificou uma restrição do uso de “como” por influência do Anderson. Apesar de achar que esse nosso colega tem exagerado no personagem criado para si mesmo de “crítico malvado”, eu costumo valorizar suas leituras e conselhos, mas esse em específico eu não tomei muito para mim, é algo que sequer noto, mas que é mesmo válido observar.

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Publicado às 3 de maio de 2025 por em Liga 2025 - 2A, Liga 2025 - Rodada 2 e marcado .