EntreContos

Detox Literário.

Uma das Histórias por Trás do Herói Emoldurado (Givago Thimoti)

Desde que as sinhás saíram para a Capital comprar roupas novas e visitar o filho mais velho, que estudava para ser doutor, percebia uma presença observando-a em meio aos suntuosos corredores da casa enquanto fazia suas tarefas diárias. Por dias a fio, Anastácia se pegava olhando para trás sobressaltada, procurando por um perigo oculto. O escorrer gelado em sua espinha permanecia, mesmo que não o encontrasse.

Se pudesse, fugiria dali. Já havia ventilado para alguns até sobre o boato de um quilombo ali perto. Sozinha era arriscado demais. Ninguém ousava sequer arriscar algo.

Se pudesse, estaria em qualquer lugar que não em frente aquela porta. Com as mãos ocupadas, Anastácia dobrou os joelhos, girando a maçaneta com os cotovelos. Empurrou a porta com o quadril. Viu apenas o retrato. Alívio.

Então, foi derrubada no chão junto com o ensopado. Presa contra o chão, jamais fugiria.

(…)

Valença-RJ, janeiro de 1861

Um homem caminhava triunfante em meio ao nobre salão do Paraíso, passando por seus convidados, segurando uma taça de vinho na mão, e na outra lendo a manchete de um jornal amassado.

(…) Dentre os empossados, um merece o destaque de nossa Gazeta; eleito com grande parte dos votos possíveis, o Visconde de Valença, o senhor Gonçalo Ramos Guedes. Conhecido por ser um exímio administrador, bem-sucedido tanto na criação pecuária, onde começou a construir sua riqueza fornecendo carnes para a Corte Imperial, quanto na plantação de café, o qual contribuiu para colocar o Império do Brasil como o maior produtor mundial do grão e sua personalidade austera, a chegada dele ao campo político no Vale do Paraíba do Sul não chega a ser uma surpresa. Pai de quatro filhos (dois homens e duas mulheres) e casado com a Viscondessa desde 1838, após um breve período de viuvez, ele se candidatou com o apoio dos demais cafeicultores.

Em seu discurso de posse na Câmara Municipal, prometeu não poupar esforços para modernizar a cidade. A partir de sua relação próxima com o Imperador D. Pedro II, o Visconde de Valença estabeleceu como prioridade em seu mandato a construção de uma ferrovia que ligue a cidade ao Porto da Capital Federal, facilitando o escoamento do principal produto da região para o Brasil e, porque não, o mundo.

Sob aplausos dos convidados, o Visconde sorveu o ardente tinto da glória.

(…)

Manchete do Jornal do Commercio, outubro de 1863, Rio de Janeiro.

Rebeliões escravas ameaçam a expectativa de safra recorde dos fazendeiros do Vale do Café. Em um discurso voltado para o Império, o Visconde de Valença prometeu uma resposta rápida contra as insurreições.

Do extenso terraço de sua mansão, em meio à tempestade, o vereador assistia o conflito, enrolando firmemente o terço. A Cruz de Cristo repousava nos lábios finos, que balbuciavam veloz e ferozmente orações. Era um homem de palavra. Parte de sua fazenda ardia persistentemente em chamas. Seus homens estavam em menor número, contudo, tinham armas melhores. Havia ordenado; não poderiam dar espaços para misericórdia. Os escravos subiam a colina, rumando em direção à morte bravamente.

(…)

— Por que está amordaçado?

— O maldito não para de falar os nomes daqueles demônios que ele cultua. Tá nos amaldiçoando, sinhô.

O Visconde aproximou-se do líder da revolta, pendurado pelos pulsos por correntes do teto do silo, analisando-o. Segurava o ferro incandescente com o brasão da família Ramos Guedes. Era um ótimo espécime, ideal para o trabalho nos cafezais; jovem e forte, carregava o dobro de sacas que dois escravos conseguiam geralmente. Ainda podia se reproduzir, gerar pelo menos uns 4 homens que nem ele. Ou mulheres tão belas quanto Anastácia. De qualquer jeito, era um investimento perdido.

O vereador tirou a bola de ferro enferrujada que impedia o escravo de proferir impropérios. Em resposta, recebeu uma cusparada de saliva e sangue. Os capatazes foram impedidos de avançar e retaliar graças ao punho erguido do vereador. Encarando firmemente os olhos rubros-coléricos, o político deixou escorrer a mistura viscosa pelo rosto. Saboreou as gotas ferrosas que desceram em meio ao bigode espesso, sorrindo com o gosto.

Então, ordenou que os capitães-do-mato saíssem do silo. Enquanto a madrugada escurecia, anunciando a chegada do crepúsculo, escutaram por diversas vezes o ar sendo cortado pelos silvos do chicote e os gritos de dor do líder da revolta.

(…)

Em meio à clareira e aos preparativos, um homem finalizava um totem com uma lâmina improvisada e mal amolada. Na senzala, exceto por um ou outro, optaram pela revolta mesmo que significasse a morte como represália. Eram escravos; não precisavam de sua filha como mártir, sobreviver como sobreviviam já era o bastante para um levante.

O tempo confinado ao cafezal o ensinou: poderiam parar os trabalhos, fazer corpo mole, destruir as plantações, envenenar o gado, invadir a casa grande, raptar a Viscondessa e transformá-la em Anastácia. Não, nada mudaria. Era preciso algo a mais, algo diferente. Algo pior.

Ao fechar os olhos, podia sentir a presença. Desde o primeiro choro, jurou que faria tudo que pudesse para protegê-la. Trabalhar ao lado das sinhás talvez a livrasse das marcas que ele carregou nas costas. Incentivou-a ir. Nem pode a enterrar. Nada mudou.          

E se nada mudará, o que resta é vingança, rancor e ódio. Por Anastácia, ele quebraria os preceitos que o ensinaram. Por ela, iria recorrer aos que sucumbiram e à Entidade que retribui. Por sua filha, sacrificou tudo que acreditava, encharcando o solo com sangue.

As sombras da mata se agitaram em meio ao chamado; o sangue derrubado se pagará, em vida ou morte, por todos aqueles que compartilham o legado.

(…)

Num primeiro momento, a mácula no Paraíso não era evidente. Exceto pela reconstrução de uma ou outra infraestrutura destruída e uma pequena queda na produção do café, tudo parecia normal. A Viscondessa e os filhos mais novos retornaram, ainda ressabiados com o conflito. Discursou na Câmara dos Vereadores agradecendo a Deus a oportunidade por viver mais um dia entre seus colegas, reforçando a necessidade em melhorar a segurança, e prometendo promover leis mais duras para escravos insurgentes, além de mais verbas públicas para os fazendeiros da região. Por sua postura ativa na defesa das rebeliões escravas, foi condecorado pelos demais políticos como cidadão emérito de Valença.

Ao contrário do que se esperava, o Visconde organizou pessoalmente com a esposa a festa anual dos Ramos Guedes de final do ano, destinando mais recursos do que o costume. Mais convidados, mais comida, mais luxo; um investimento válido para mascarar as cicatrizes nos senhores causados pela rebelião.

Quem compareceu ao evento notou a estranheza. Quase todos atrasaram devido a problemas com charretes; cavalos arredios tornaram a viagem em meio à estrada lamacenta ainda mais desafiadora. Já em Paraíso, por onde caminhavam, sentiam-se indevidamente vigiados pela penumbra que envolvia a fazenda e pelas paredes da mansão com seus luxuosos quadros. Por mais polidas e superficiais que fossem as palavras calculadas no íntimo de cada convidado, as falas revelavam-se bem mais coléricas e rancorosas, despertando conflitos aqui e acolá. As crianças irrompiam em gritos e lágrimas, de cinco em cinco minutos, dizendo que haviam fantasmas tentando participar das brincadeiras. As histórias recontadas pela elite valenciana já não soavam tão divertidas. O glamour dos modelitos não se sustentava; saltos se quebravam quebravam, roupas se rasgavam ou manchavam-se de vinho tinto. A banda de música não conseguia empolgar, errando as notas mais simples, trocando as canções alegres por acordes fúnebres. Os pratos, cozidos pelas escravas da casa sob o atento olhar da Viscondessa, assumiram um amargor inexplicável de café torrado em demasia.

Após a festa, o clima estranho na principal fazenda do vereador permaneceu. Na mata que rondava o terreno, os capitães-do-mato encontraram o corpo de um negro em estado avançado de decomposição misturando-se ao solo. Talvez tenha sido ferido na fuga durante o conflito. Seguindo ordens, retornaram acompanhados de alguns escravizados ao local para jogar o cadáver na mesma cova dos revoltosos carbonizados e, posteriormente, atear fogo. A floresta parecia ter se transformado e se adaptado. Os caminhos já abertos se desfizeram, sumindo com qualquer sinal de trilha prévia. Por vezes, o mesmo barulho parecia vindo de várias direções, confundindo os capatazes. Se o vento vinha da direção nordeste para sudeste, as folhas teimavam em se agitar na contramão. E assim, um trabalho de meia manhã se transformou em longas e exaustivas horas.

O comportamento inconstante do Visconde piorou os embates entre ele e sua esposa. Já não tinha sequer o pudor de arrastá-la pelo braço ou pelo punho para um dos quartos vagos da Casa Grande. Vociferava na frente dos filhos, dos amigos e dos escravizados. No início, apontava o dedo em riste no rosto. Passou a ameaçar de dispensar o mesmo tratamento dos negros para a Viscondessa. Aquilo foi a gota d’água.

Com a Viscondessa e os filhos reclusos numa fazenda pequena de propriedade da família, ele ficou sozinho no Paraíso. Inicialmente, após a manhã trabalhando na Câmara, voltava para o almoço e se fechava no escritório por todo o período da tarde cuidando da administração das fazendas. Antes do jantar, lia em alto e bom som versículos da Bíblia. Com o tempo, o tédio, o rancor e a crueldade inata o faziam caminhar errante pelos corredores escuros, tal qual um carrasco. Desde a revolta, havia tomado um gosto peculiar pela coisa. Os negros que trabalhavam na Casa Grande o evitavam ao máximo, numa tentativa de fugir das punições como a que o senhor realizou na arrumadeira, que teve seus dedos quebrados por ele após ter encharcado sua cama com sangue, ainda que jurasse por sua vida que não ter nada a ver com aquilo.

A cama ensanguentada foi apenas o começo. Conforme as semanas passavam, transformando-se em meses, os eventos inexplicáveis continuavam acontecendo. Ao se barbear em frente ao espelho, certa noite antes de dormir, o Visconde se deteve a analisar seus olhos. Estranhou; não tinham mais o tom esverdeado. Inclinou-se, depositando o seu peso na pia de mármore. Agora, um castanho terroso-avermelhado predominava. Quanto mais detinha-se aos detalhes, mais estranhava os traços em seus olhos; perdeu a noção do tempo. Da onde conhecia aquele tom? Será que alguém notou? Ao punir um escravizado com dez chicotadas, lhe veio a resposta; terra arenosa misturada com sangue. De fato, apenas o Grande Artista lhe concederia uma graça como aquela.

Uma vez caminhava apressado pelo corredor certo de seu destino, carregando a contabilidade do mês, quando distraiu-se com um cheiro conhecido; cravo, suor e ervas frescas. Passo a passo, largou a papelada no chão, perdido na obsessão pela dona. Seu olfato o levou até um quarto vago. Irrompeu nele, já desabotoando as calças quando a encontrou. Voltou no tempo. Os cabelos crespos sujos, os trapos que usava, o formato esbelto de seu corpo, o pescoço torto. Era Anastácia; dura, gelada, sufocada… Até mesmo decomposta. Contudo, ainda cheirosa.

Mostrando os cafezais a um membro da Corte Imperial, ouviu com a suavidade de um sussurro os sons infernais das batucadas da senzala. Bastou olhar para um dos capatazes. Pediu desculpas pelo inconveniente e seguiu apresentando a propriedade.

Mais tarde, ainda naquela noite, quando retirou-se para dormir, a batucada se fez presente; os sons vinham dos móveis de madeira, cujas portinholas e fundos eram espancados rudemente e do chão, pisoteado num ritmo sem sentido. Os escravos, com suas macumbas e mandingas, haviam transformado o quarto do Visconde numa extensão da senzala. Ali estavam o nobre e as vestimentas, tanto as dele quanto de sua esposa, que giravam e flutuavam, dançando no ar e no chão. Tinha plena consciência; não estava louco. Tampouco podia explicar aquele pandemônio instaurado. Colocou-se no centro do quarto e ajoelhou-se para rezar — a única forma racional de deter aquilo.

Foi encontrado no dia seguinte por uma escravizada. Cheio de hematomas pelo corpo. O quarto revirado, com todas as roupas em frangalhos.

(…)

Valença-RJ, meados de junho de 1867.

Para aqueles leitores que indagam-se pelo paradeiro do Visconde, ausente na Câmara Municipal por algumas semanas a fio, o colunista desta Gazeta os oferece um palpite; aparentemente, nos últimos dias do mês passado, alguns escravos que trabalham na construção da ferrovia o encontraram perambulando pela na região, extirpado de suas luxuosas vestes e falando coisas ininteligíveis. Quando questionado sobre o estado de saúde do pai, seu primogênito e herdeiro optou pelo silêncio.

Considerado pelos aliados como um homem à frente de nosso Tempo, pode ser que Este o finalmente alcançou. Para a oposição, o sumiço do Visconde reverbera o burburinho anunciado pelos ventos que vem da Capital do Império; uma nova era se aproxima, com ares republicanos e industriais.

Os papéis que outorgavam poderes a Gonçalo, filho mais velho, jaziam à sua frente.

O senhor tem certeza?

Riscou com excessiva força e pressa sua assinatura no lugar indicado. Tinha certeza apenas do pouco de sanidade que lhe restava. Devolveu o documento, deslizando-o pela mesa para o filho.

Gonçalo molhou a ponta da pena. O pescoço ardia sob tantos olhares. O escritório sempre foi um ambiente hostil. Nesse dia, mais ainda. Olhou para o pai, em seguida, para o retrato pomposo do Visconde de Valença. Filho primogênito e doutor formado, o pulso doía sob o peso do legado que começava a ser transmitido.

Com uma rubrica, sete fazendas, as casas de férias em Petrópolis, o ouro acumulado pela família e 1.300 escravos seriam administrados por Gonçalo Ramos Guedes Filho.

(…)

Acordou no meio da noite, procurando por cada centímetro cúbico de ar que o rodeava. Desta vez, havia algo diferente. Não demorou para perceber o peso depositado sobre seu peito. Com a boca travada e levemente escancarada, a garganta seca guardava em si o último ronco gutural. Tentou se virar na cama, buscando uma nova posição confortável para retornar ao sono. Exceto pelos olhos, o corpo não reagia aos seus comandos. Como uma marionete cortada, ficou ali inerte, com a cabeça levemente virada para a direita, concentrando suas forças em se distrair do torpor que o dominava, da dificuldade para respirar e da cama molhada de mijo na qual jazia.

Tudo que podia enxergar estava à sua frente. A luz esbranquiçada da Lua invadia o quarto pelos vidros da janela, iluminando parcialmente o recinto. Cheia, estava especialmente bonita, reinando sozinha no céu límpido. No chão, a manchete antiga principal do jornal trazia seu nome e elogios a sua pessoa por seu afã em construir a ferrovia. Daquela posição desconfortável, o campo do Paraíso erguia-se imponente diante de seu proprietário, desde o pátio asfaltado na frente da mansão, clareando a área utilizada pela esposa para festas ao ar livre, iluminado a gás pelos candeeiros, até o extenso cafezal, a perder de vista no horizonte.

Passos lentos vindos da porta o tiraram de seu estupor.

— Vosmicê tá bem, Visconde? — Reconheceu a voz aveludada e solícita de uma de suas negras. A ordem por ajuda ficou ali, preso em seus pensamentos e sufocado pela falta de ar. Vulnerável, não havia nada a fazer, além de esperar a vagarosidade de sua salvadora e orar a Deus por alguma explicação da medicina.

Uma figura tão escura quanto a noite se agachou na beirada da cama do Visconde, colocando-se no seu campo de visão, removendo-o dos devaneios e provocando náuseas fortíssimas.  Alto e corpulento, usava trapos rasgados e enlameados como calças. Carregava consigo pesados grilhões interligados entre si, conectados ao seu pescoço, pulsos e tornozelos. Em sua pele salpicada de suor e sangue, podia ver diversas cicatrizes volumosas; umas pareciam produzidas por chicotes, enquanto outras por queimaduras.  Algumas recentíssimas mostravam a carne apodrecida. As rugas nos cantos de seus olhos – brancos, sem íris nem pupila – expressavam um prazer curioso em ver o torpor do Visconde. Sorria, com todos os músculos de seu rosto, um sorriso cruel, escancarando dentes branquíssimos e preenchendo o ar entre os dois com o odor cadavérico.

Os dedos longos e ressequidos o tocaram demoradamente num ponto aleatório de seu tronco, penetrando em sua pele e afundando-os na gordura. Paralisado e mudo, o Visconde sentiu as entranhas serem queimadas por um ferro incandescente, enquanto o demônio se divertia com o terror nos olhos esverdeados do nobre.

Do teto e das paredes que o rodeavam, os conhecidos escravos emergiram agitados, conclamados a assistir sua queda, diminuindo a temperatura do quarto. Agitavam violentamente os braços em direção ao nobre. Reconheciam as sombras; eram as mesmas, tão retintas quanto o céu anoitecido sem nuvens, que os espancavam quando passava pelos corredores. Por todo o seu corpo, ele sentiu chicotadas estalando por toda sua pele.

Não estavam ali pela mera tortura vingativa. Agora era por sua alma. As vistas ressecadas e irritadas o permitiram olhar mais uma vez para a Fazenda Paraíso em toda a sua magnitude. Os escravos podiam tentar vilipendiar seu corpo e sua alma, depredar os cafezais, destruir o maquinário, matar o gado, invadir a Casa Grande… O seu legado como Visconde estava feito, pronto para desafiar o Tempo. Gonçalo herdaria o título. Os demais filhos, os netos que não veriam e, com sorte, até mesmo os descendentes destes poderiam viver com toda a fortuna que havia acumulado. A cada dia, a ferrovia que conectava Valença ao Rio de Janeiro se concretizava, colocando o Vale do Café como um dos alicerces da maior cidade do Brasil.

O jeito que intensificaram a tortura nele confirmava; teriam apenas o corpo dele. Por mais rígido que estivesse, sentia ossos, músculos e tendões se desfazendo por dentro, enquanto os órgãos colapsavam devagar. Imóvel, agonizava. Em seu último momento, recitou:

“Deus é a minha salvação; terei confiança e não temerei. O Senhor, sim, o Senhor é a minha força e o meu cântico; Ele é a minha salvação!”

No fim, tudo valeu a pena.

(…)

A Gazeta do Vale do Café informa à comunidade o falecimento do ilustríssimo Visconde de Valença, o senhor vereador Gonçalo Ramos Guedes, na data de 07 de setembro de 1868. Em que pese a dor da família, dos amigos, e de seus fiéis eleitores, é preciso afirmar que não há nada mais simbólico do que a passagem do Visconde neste importantíssimo dia para o nosso país.

Sobre Fabio Baptista

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24 comentários em “Uma das Histórias por Trás do Herói Emoldurado (Givago Thimoti)

  1. Fabio D'Oliveira
    29 de março de 2025
    Avatar de Fabio D'Oliveira

    Buenas, Luís!

    Um bom conto de terror. Equilibrado. Lembrou-me alguns clássicos do terror, com uma escrita mais rebuscada e densa. Particularmente, o conto me perdeu em alguns momentos e tive um pouco de dificuldade na hora de terminar a leitura. Não sou muito fã da escrita complicada. Mas não deixo de admirar aplicado no conto.

    Quando Gonçalo fica doente e começa a declinar, o conto ganha os verdadeiros contornos do terror, sendo que, antes, era apenas o preparo para o ápice. A cena do insurgente na beirada da cama, observando o vereador e coronel, com um sorriso malicioso e olhos brancos, foi de arrepiar.

    É um terror clássico, atípico, com tons antigos. Não vai agradar muito, pela narrativa, pelo terror sutil. Mas não deixa de ser um bom conto que, tecnicamente, se destaca entre os participantes.

    Abração!

  2. Bia Machado
    29 de março de 2025
    Avatar de Bia Machado

    Enredo/Plot: 1/1 – O conto tem um enredo bem comum, bem estilo conto de época, a mesma atmosfera.

    Criatividade: 1/1 – Achei interessante, não esperava ver um conto de época por aqui.

    Fluidez narrativa: 1/1 – A narrativa é tensa e envolvente. Curioso é que quando tentei fazer a leitura dele no celular, achei enorme, muito longo. Agora, lendo no tablet, achei uma leitura tranquila e bem fluida, além de consistente.

    Gramática: 0,8/1 – Alguns pequenos deslizes, de concordância e palavras repetidas, talvez por pressa.

    Gosto/Emoção: 1/1 – Eu gostei bastante de sua narrativa. Só não consegui sentir medo, apesar de claramente ser um conto de terror. Espero que tenha boa sorte nesse desafio!

  3. Thiago Amaral
    29 de março de 2025
    Avatar de Thiago Amaral

    É um conto bem redondinho de terror. A autoria domina bem a caracterização de época. Também ficou ótimo como o perigo vai crescendo aos poucos em torno do Visconde, a partir do ritual.

    O conto não traz nada revolucionário, mas é bastante competente no que se propõe a fazer. Destaque também para os trechos de jornal, que se encaixam bem. O final foi bem descrito, trazendo ótimo terror.

    Em resumo: fica no bom, por não surpreender. Mas entretém, faz seu serviço bem-feito.

    Parabéns e boa sorte no desafio.

  4. Andre Brizola
    29 de março de 2025
    Avatar de Andre Brizola

    Olá, Luís!

    Seu conto é uma boa história de terror. Os elementos necessários para tal estão aí, temos o conteúdo humano, demonstrado na escravidão e na crueldade com que os escravos eram tratados, e o sobrenatural, que vai além do conhecido, entrando naquela esfera mais atrativa para o gênero tema do desafio.

    Achei que o formato escolhido é interessante. É uma história longa, que engloba muitos anos da vida do Visconde, e que se trata de algo difícil de enredar em um conto com limite de palavras tão curto para a proposta que você escolheu. A divisão por capítulos, as inserções das notícias, tudo foi combinado para dar uma resumida em etapas desnecessárias para aquilo que era importante aqui, que era a ascensão e queda do personagem e o envolvimento da magia da vingança nesse processo.

    E é nesse ponto que eu queria chegar. Com tanto a contar, a parte realmente interessante ficou um pouco perdida dentro do conto. Há algumas cenas realmente muito boas, mas espalhadas, deixando o ritmo bastante fragmentado. Entendo que isso não foi uma falha, foi uma opção. Mas, na minha visão, essa fragmentação toda vai contra o que um conto de terror deveria propor. A tensão é constantemente interrompida e, quando chegamos na cena final, já não há mais descoberta, não há conflito. É um tanto quanto decepcionante. Me pareceu que a cena mais forte do conto é o espancamento do escravo, no começo, e depois daquilo nada mais consegue assustar ninguém.

    Mas não são só críticas. O conto é, sim, muito bem escrito e ganha muitos pontos por tratar de um tema que, por si só, já é horror, nossa escravidão. Todo o cenário e a ambientação foram bem-feitas, e acredito que num espaço maior, ele poderia crescer e virar até mesmo uma novela ou romance. Eu leria esse romance.

    Bom, é isso. Boa sorte no desafio!

  5. Raphael S. Pedro
    28 de março de 2025
    Avatar de Raphael S. Pedro

    Aqui o que mais chamou atenção foi a técnica utilizada pelo(a) autor(a). Expressões bem colocadas, principalmente nos recortes dos jornais, dando a impressão de veracidade aos trechos.

             O conto traz uma história que mistura muito bem a realidade da época com uma pitada do sobrenatural. Contudo, percebo que faltou um pouco mais desse mistério, acabou se buscando mais o aprofundamento no personagem do que no tema proposto ao desafio.

  6. Rodrigo Ortiz Vinholo
    27 de março de 2025
    Avatar de Rodrigo Ortiz Vinholo

    Escrita de qualidade, com uma ótima ficção histórica! Bom ritmo, boa construção, e um ótimo trabalho de construção de personagens. O gênero cai para o terror mais para o final, tendo ares de crítica e talvez até comédia em determinados pontos, mas fico em dúvida se era a melhor escolha para a competição em questão justamente por não se determinar nas categorias apontadas no edital. Ainda assim, ótimo no que se propõe.

  7. Thiago Lopes
    27 de março de 2025
    Avatar de Thiago Lopes

    Eu tenho apontado o que mais gostei e o que menos gostei dos textos, tentando destacar algum aspecto. No seu, digo desde já que gostei do movimento de misturar gêneros, não me lembro de ter visto muito isso nesta edição do certame. Misturar notícias ao conto tem tantos efeitos para o pacto ficcional. Mas houve algo aí que me pegou um pouco, e posso estar sendo muito injusto ao cobrar demais, mas algumas dessas notícias tem passagens meio soltas, genéricas, com linguagem não muito condizente com a do séc. XIX, fora alguns erros gramaticais que os jornais daquela época não cometeriam, embora tenha ficado realmente  bem legal a emulação dessa linguagem, demonstrando virtuosismo do autor.

    Na Hemeroteca digital ficam disponíveis notícias do passado, inclusive do tempo colonial. Acho que o autor poderia jogar com isso, colar umas notícias reais no meio, jogar com ficção e realidade, ainda que o tema seja sensível para o ficcionalizarmos. 

    A história é boa, tem colagens e fragmentos, acho isso muito atrativo para uma leitura. 

  8. Leo Jardim
    27 de março de 2025
    Avatar de Leo Jardim

    📜 TRAMA (⭐⭐⭐▫▫): uma rebelião ocorre em uma fazenda escravocrata no Brasil Imperial. Ela é brutalmente repelida, mas os espíritos dos mortos atormentam o senhor.

    O tema é muito importante e tudo é muito cruel, mas a forma distante, quase documental em que as coisas foram sendo contadas, distante, não me fizeram identificar com nenhum personagem. Claro que tem a raiva do Visconde e compaixão pelos escravizados, mas mais pelo fator histórico que pelo que estava sendo narrado.

    📝 TÉCNICA (⭐⭐⭐⭐▫): é um autor ou autora experiente, que sabe o que faz. Dividiu o conto em trechos de histórias contada, misturadas com notícias e com trechos mais narrados. Cria uma colcha de retalhos (sequenciais, pelo menos) que vamos pegando para entender a trama.

    ▪ estaria em qualquer lugar que não em frente aquela porta (àquela)

    ▪ saltos se quebravam quebravam

    🎯 TEMA (⭐⭐): é um terror da vida real. Não chegou a dar medo porque não houve tanta identificação, mas os elementos estão todos lá.

    💡 CRIATIVIDADE (⭐⭐▫): dentro do média do desafio.

    🎭 IMPACTO (⭐⭐⭐▫▫): adiantei acima que o impacto do texto é forte pelo teor real e histórico e não tanto pelos personagens, que aqui estão bem pouco desenvolvidos. Queria ter gostado mais desse conto, sofrido mais as mortes e torturas cruéis. Para isso, faltou à trama mostrar um pouco mais da vida e das emoções dos personagens da história.

    Apesar disso, não dá pra dizer que a leitura não me impactou, pois me fez pensar e refletir sobre muitas coisas do passado e do presente.

  9. rubem cabral
    26 de março de 2025
    Avatar de rubem cabral

    Olá, Luis Gama.

    Muito bom conto de terror histórico e usando fragmentos de periódicos de época, ilustrando e definindo muito bem o ambiente. Excelente escrita e emulação de um escrever mais antigo.

    Muito bom ver o torturador experimentar um pouco do seu veneno no final. Muito bacana a observação sobre como os escravizados podiam fazer “corpo mole” e prejudicar propositalmente os negócios de uma fazenda.

    Boa sorte no desafio e abraços!

  10. bdomanoski
    23 de março de 2025
    Avatar de bdomanoski

    Pra mim é sempre bizarro imaginar que um dia tais cenas descritas aconteceram mesmo na nossa realidade. Isso de ser dono de humanos, tendo inclusive o “direito” de chicotea-los e fazer o que mais quisesse. Tenho sérias dificuldades pra acreditar nisso, que isso era a cultura dominante. Então ler seu conto me trouxe de novo esse choque do que é o ser humano e sua história. Você ganhou pontos extras ao mencionar a religiosidade do indivíduo. Certamente era assim mesmo, explorando, matando e espancando em meio a certeza que iria pro céu e cheio de amens. Hoje continham fazendo isso com as minorias, inclusive. Nada mudou. Achei bacana você trazer a história brasileira pro conto, embora a leitura pra mim poderia ter sido mais fluida. A vingança ou justiça do negro não conteve nada de surpreendente ou inovador. Acabou sendo não muito criativo ou inesperado. Embora a história seja muito válida, achei que não saiu muito do que é conhecido e facilmente imaginável. Faltou um pouco de ousadia pra brilhar.Mesmo assim, não deixa de ser uma boa história, do tipo que fica na cabeça.

  11. Afonso Luiz Pereira
    21 de março de 2025
    Avatar de Afonso Luiz Pereira

    Achei este conto muito bem escrito. O enredo, um conto de terror com um fundo histórico, é bem interessante. Usa a escravidão no Brasil como pano de fundo para uma narrativa de vingança sobrenatural. Então, acompanhamos o Visconde de Valença, um senhor de engenho e político influente, que enfrenta uma insurreição de escravos e, anos depois, sofre as consequências de sua crueldade em uma maldição que o condena ao tormento eterno.

    Destaco como ótima característica deste conto a sua ambientação histórica. A narrativa faz bom uso de elementos reais da época, como a política cafeeira, a relação com o Império e as rebeliões escravas, tornando o enredo mais verossímil.

    No entanto, a estrutura fragmentada do conto, intercalando trechos de jornais e discursos políticos, a meu ver, tornou a leitura menos imersiva. O texto também se concentra mais em contar a história do que em mostrar os acontecimentos de forma visceral, o que pode diminuir o impacto do horror pretendido, pois a maior parte da história é narrada de forma descritiva, em notícias de jornais, sem mergulhar diretamente nas cenas de horror.

    Acredito que o final poderia ser mais intenso se houvesse uma construção gradual da tensão antes da grande cena de vingança.

    Mas, não tem como negar, que o autor procura misturar terror e crítica social, oferecendo uma leitura perturbadora da época desumana da escravidão, deixando o leitor refletindo sobre os horrores reais e fictícios do passado brasileiro.

  12. Kelly Hatanaka
    21 de março de 2025
    Avatar de Kelly Hatanaka

    Um bom conto, que explora um terror real, o da escravidão. Penso se algo assim realmente ocorreu, dos escravizados se rebelando silenciosamente, entrando na cabeça de seus algozes? Eles teriam poder para isso, estavam nas casas, fazendo tudo, cuidando de tudo. Tomara que tenham feito.

    • Givago Domingues Thimoti
      30 de março de 2025
      Avatar de Givago Domingues Thimoti

      Olá, Kelly! Obrigado pelo seu comentário, mesmo que não estivesse presente na lista obrigatória dos contos! Dessa vez, menos Fagnerverso!

      Parabéns pela dedicação!

  13. paulo damin
    20 de março de 2025
    Avatar de paulo damin

    A política e a história brasileira como tema prum conto de terror, ótima ideia. Dá até pra ser realista, né. Então a ideia de colocar uns trechos de jornal, uns textos assim oficiosos, em contraposição à narrativa anti-escravagista dá um efeito bom, de verossimilhança e registro documental. O próprio tom combativo, de denúncia, da narração, me soaram justos. A única fraqueza do conto, a meu ver, é que a gente já sabe tudo que vai acontecer a partir do momento que percebemos quem são os personagens. Fica meio óbvio, literariamente. Mas acho que a literatura brasileira contemporânea está fazendo isso, e todo mundo tem elogiado.

  14. Jorge Santos
    20 de março de 2025
    Avatar de Jorge Santos

    Olá. Este é o último texto desta jornada da liga. Tem, como outros textos do desafio, algumas curiosidades. A primeira é a do nome do Visconde. Gonçalo Ramos Guedes mistura o nome de dois jogadores da seleção nacional de futebol do meu país, Portugal. Depois, sendo português, sinto profundamente o drama da escravatura e da colonização. Embora odeie as duas práticas, já fui “acusado” pelo simples facto de ser português, mesmo rejeitando essa herança. Este seu texto fala disso, da vingança de um demónio, ex-escravo. Neste ponto, o texto torna-se confuso. Especialmente quando indica “que tudo valeu a pena”. Usado como frase isolada, dá a entender que reside aqui a força do texto, mostrando que a falta de arrependimento do visconde, mesmo na hora da sua morte, é a verdadeira vitória. Fiquei algo confundido com esta frase. Pareceu justificar os atos do visconde, revertendo o resto do texto para uma demonstração de poder escravagista. Não creio ter sido esta a intenção do autor, mas, dada a seriedade do texto, deveria ter sido colocado de forma mais clara.

    • Givago Domingues Thimoti
      30 de março de 2025
      Avatar de Givago Domingues Thimoti

      Bom dia, Jorge! Muito obrigado pelo seu comentário! Sempre aprendo bastante com suas falas. Sim, de fato eu escolhi o nome de jogadores de futebol da seleção portuguesa depois de jogar um FIFA com um colega meu. 

      Além disso, sobre sua fala em relação a visão que alguns brasileiros têm dos portugueses, lamento que você tenha passado por essa experiência. Não querendo passar pano, mas creio que essa visão é comum porque Portugal, assim como outros países colonizadores, por muito tempo ignorou a exploração colonizadora que promoveu nas Américas e na África. Inclusive, uma vez, lá na Universidade de Brasília, numa conferência de Direito e Políticas Públicas que participei, uma portuguesa comentou jocosamente que nós brasileiros devíamos parar de dizer que queríamos o ouro de volta porque o ouro foi tão maldito para os portugueses quanto a exploração promovida aqui no Brasil. Claro, cada indivíduo é personalíssimo, mas tanto aqui quanto aí temos pessoas tão conservadoras quanto os colonos que pisaram no meu país. Mais uma vez, lamento por ter passado por essa estereótipização.

      Não o conheço profundamente , contudo, creio ter sido injusto. Afinal, sua observação sobre a frase “no fim, tudo valeu a pena” demonstra uma preocupação com o potencial danoso que essa frase isolada tem. 

      Eu reconheço esse potencial, mas creio que era necessário. Tirada de contexto, esse trecho, assim como alguns outros, demandam ser interpretados conforme o contexto da narrativa. Então, querendo ou não, evitar isso esvaziaria a cena final dele; afinal, o horror não é a derrocada espiritual do Visconde, mas sim a visão dele de que tudo valeu a pena. E essa é a questão maior do terror: a sede por dinheiro e poder o corrompeu a tal ponto que ele não se importa. Pior, ele faria tudo de novo.

  15. toniluismc
    19 de março de 2025
    Avatar de toniluismc

    O conto apresenta uma técnica narrativa excepcional. A escrita é precisa, segura e demonstra um domínio impressionante de descrições históricas e sensoriais. O autor trabalha bem o ritmo, alternando entre cenas intensas e pausas dramáticas que enriquecem a atmosfera pesada da narrativa. O uso cuidadoso de termos históricos, a recriação verossímil do contexto escravocrata brasileiro e a habilidade em conectar personagens históricos e fictícios são exemplos de técnica narrativa superior.

    Embora histórias sobre escravidão e vingança sobrenatural não sejam inéditas, a maneira pela qual o autor combina fatos históricos com elementos sobrenaturais destaca-se pela originalidade. O conto é criativo em sua construção de personagens, especialmente na personificação das forças vingativas e no tratamento dado ao protagonista, um antagonista que simboliza o peso histórico da crueldade escravocrata. A conexão com eventos históricos reais aumenta ainda mais o valor criativo da narrativa.

    O impacto é profundo e perturbador, tanto emocional quanto historicamente. A leitura é desconfortável e marcante, justamente por expor cruamente a violência da escravidão e suas consequências. A imagem do Visconde atormentado pelos espíritos que ele próprio oprimiu é poderosa, culminando numa cena final visceral e inesquecível. O impacto se amplifica com o uso de elementos sobrenaturais como metáfora para a justiça histórica e social.

    Excelente texto, parabéns!

  16. Cyro Fernandes
    18 de março de 2025
    Avatar de Cyro Fernandes

    Texto criativo e muito bem escrito. (detalhe a ser corrigido O glamour dos modelitos não se sustentava; saltos se quebravam quebravam).

    Achei que o final poderia ser mais impactante.

  17. Leandro Vasconcelos
    16 de março de 2025
    Avatar de Leandro Vasconcelos

    Opa! Este é um conto ambientado no Império Brasileiro e, como já percebemos pela imagem da chamada, refere-se à história do Visconde do Rio Preto, um poderoso latifundiário da época (embora tenha se preferido alterar o nome desse nobre). O autor elabora uma trama que busca mostrar a sua vida oculta, misturando o sobrenatural à história, numa espécie de realismo fantástico, trágico e aterrorizante.

    Agradou-me a disposição do conto, habilmente composto, o qual possui situação, tensão e resolução bem definidos. Logo na abertura, somos apresentados ao fato gerador do conflito: a morte da negra Anastácia, fato este que impele a narrativa. A vingança parte das mãos dos escravos revoltosos. Mas quem realmente sucede nesse intento é o seu pai, que arma um ritual para infernizar a vida do Visconde. A partir daí, observamos a derrocada deste último, destruído pela vendeta espiritual.

    A ideia é muito boa e a imersão foi assaz bem-sucedida. Contudo, o que me cismou foi o ritmo, muito lento não em face da complexidade narrativa ou rebuscamento, mas sim por causa dos vários vícios gramaticais. São muitos os problemas de regência, pontuação, ambiguidade, colocação de pronomes e preposições. Isso tudo atravancou a leitura.

    Para dar alguns exemplos: “Conhecido por ser um exímio administrador, bem-sucedido tanto na criação pecuária, onde começou a construir sua riqueza fornecendo carnes para a Corte Imperial, quanto na plantação de café, o qual contribuiu para colocar o Império do Brasil como o maior produtor mundial do grão e sua personalidade austera, a chegada dele ao campo político no Vale do Paraíba do Sul não chega a ser uma surpresa”. É um período muito grande, confuso, e que conta com vários problemas de regência, escolha pronominal e paralelismo.

    Outro: “A Viscondessa e os filhos mais novos retornaram, ainda ressabiados com o conflito. Discursou na Câmara dos Vereadores agradecendo a Deus a oportunidade por viver mais um dia entre seus colegas…”; neste parágrafo, a elipse leva a crer que a Viscondessa se tornou política e assumiu os negócios do marido. Só ao final descobrimos que foi realmente o marido que discursou. Então, por que usar a elipse? Essas e outras ambiguidades afetaram bastante a clareza do texto.

    Convém apreciar a transitividade e conjugação de alguns verbos: “assistia (a)o conflito” “havia(m) fantasmas”. “Nem pode a enterrar”: Nem pôde enterrá-la.

    No mais, a narrativa poderia menos expositiva e mais dinâmica. Em alguns momentos, parece que estamos lendo jornais de Valença. Não sei se foi o efeito pretendido, mas ficou um tanto enfadonho em alguns momentos.

    Em resumo, eu gostei bastante da ideia explorada. Talvez possa ser até expandida para uma obra de maior envergadura, pois não lembro de qualquer romance a respeito desse personagem (e de outros tantos importantes do Brasil-Império). Contudo, é bom atentar para esses problemas de forma para que o texto ganhe em clareza, precisão e, sobretudo, interesse.

    • Givago Domingues Thimoti
      31 de março de 2025
      Avatar de Givago Domingues Thimoti

      Boa noite, Leandro! Obrigado pelas observações em relação à escrita. Vivendo e aprendendo! Particularmente, apenas discordo de uma: “A Viscondessa e os filhos mais novos retornaram, ainda ressabiados com o conflito. Discursou na Câmara dos Vereadores agradecendo a Deus a oportunidade por viver mais um dia entre seus colegas…” Não creio que afeta a clareza do período pelo simples motivo: se quem tivesse assumido o cargo de vereador fosse a Viscondessa (ou quaisquer um dos filhos do casal), não teria como agradecer a oportunidade por viver mais um dia entre seus colegas porque, afinal, seria a primeira vez que ela frequentaria a Câmara como uma vereadora. Além disso, nada no texto apontou qualquer mudança no status político do vereador… Enfim, apenas pontuando esse aspecto.

  18. Fabiano Dexter
    14 de março de 2025
    Avatar de Fabiano Dexter

    Estou organizando os meus comentários conforme irei organizar as minhas notas, buscando levar para o autor a visão de um Leitor regular e assim tentar agregar algum valor. Assim a avaliação é dividida em História (O que achei da história como um todo, maior peso), Tema (o quanto o conto está aderente ao tema), Construção (Sou de exatas, então aqui vai a minha opinião geral sobre a leitura como um todo) e Impacto (o quanto o produto final me impactou)

    História (1,5)

    Achei a história bem interessante e, pelo menos para mim, original. Ainda que não seja original um Terror onde temos espíritos vingativos amaldiçoando a terra, gostei do modo como o autor (ou autora) trouxe isso para dentro da história do Brasil. A morte de uma escrava, a rebelião, a decadência física e mental do Visconde, a alternância entre os acontecimentos e as notícias e, principalmente, o final.

    É muito claro que o Visconde era o vilão, era mal e teve um final terrível, mas ele venceu. E se foi sabendo disso. Isso nos tira da zona de conforto e é muito positivo para a história.

    Tema (1,0)

    Um terror muito bem contruído e interessante. Totalmente dentro do tema proposto no desafio.

    Construção (1,5)

    Aqui o conto, aos meus olhos não especializados, pecou um pouco. Ficou a impressão de que poderia ser um pouco mais bem dilapidado.

    Algumas passagens ficaram um pouco confusas e, em outros momentos, corridas. Algumas cenas pareciam meio fora de contexto e, ainda que não impactassem na história (para mim o principal) acabavam tornando a leitura um pouco difícil.

    Houve inclusive um momento em que palavras foram repetidas: “saltos se quebravam quebravam”

    Entendo que são desvios que podem tranquilamente ser corrigidos com uma revisão, mas que devem ser pontuados aqui.

    Impacto (1,0)

    Eu gostei do conto, ainda que a leitura tenha sido pouco fluida. O final, principalmente, me pegou bastante, achei bem criativo e que nos faz pensar sobre certo/errado e a punição justa para o mal que foi feito. Parabéns!

    • Givago Domingues Thimoti
      31 de março de 2025
      Avatar de Givago Domingues Thimoti

      Boa noite, Fabiano! Obrigado pelo comentário construtivo! Tudo bem? Apenas para tirar minha dúvida, como foi sua avaliação em termos de nota? Cada aspecto valia 2 no total e você avaliou de 0 a 2 e fez uma média aritmética?

      • Fabiano Dexter
        31 de março de 2025
        Avatar de Fabiano Dexter

        Na verdade ficou um pouco confuso mesmo. Os valores entre parênteses são os valores máximos para cada item, ou seja, o peso que têm na nota final (5).

        Eu dou nota a cada item de 1 a 10:
        História: 9
        Tema: 10
        Construção: 5
        Impacto: 8

        Nota final: 3,9

  19. José Leonardo
    13 de março de 2025
    Avatar de José Leonardo

    Olá, Luís Gama.

    Tendo em vista as minhas limitações técnicas para apreciar melhor o seu conto e de modo a tentar esquentar meus comentários que acho um tanto insossos, decidi convocar, por meio de um ritual de fervura de miojo de tomate com leite coalhado e digitação de Zerinho-um no MS-DOS, a FRIACA® (Falsa Ruiva Inteligente Auxiliar para Comentários e Avaliações) para me ajudar nessa bela empreitada e proporcionar a melhor avaliação possível acerca do seu texto (dentro da minha perspectiva de leitor).

    FRIACA: Do que se trata o conto?

    R.: Em meio a rebeliões de escravos contra os maus tratos infligidos, uma linhagem de Viscondes tenta implantar o progresso à custa de muitas vidas, torturas e sangue derramado. Contudo, os poderes da natureza são invocados e os oprimidos acabam se vingando do Visconde.

    FRIACA: Como você vê a narração, o estilo, a estrutura, a técnica?

    R.: O desenvolvimento é dividido em blocos de acontecimentos, fragmentos de história pontuados com passagens de jornal. Fora uma forma inteligente de dispor o enredo, permitindo ao leitor acompanhar a fervura até o caldo entornar. De fato, um fio de tensão perpassa a história, que é o passado de opressões e misérias de um povo a quem fora negada qualquer redenção social.

    Ademais, as diversas personagens deram dinamismo ao enredo e reforçam, a meu ver, a impressão de que as histórias de opressão têm os mesmos pretextos independentemente da denominação e variedade de seus personagens.

    Alguns deslizes mínimos detectados, sobretudo quanto a elementos de concordância verbal/nominal. Fora isso, temos uma estrutura bem interessante.

    FRIACA: E quanto à adequação ao tema, à criatividade e ao impacto?

    R.: Adequa-se razoavelmente ao tema do terror, a meu ver, pois embora tenha elementos naturais/sobrenaturais que se congregam na vingança impetrada ao novo Visconde, creio que o seu conto tenha um mote mais de crítica social do que de horror/terror/suspense, Luís Gama.

    FRIACA: Indo um pouco mais a fundo nesse particular e apesar do aspecto subjetivo do que a história pode causar no leitor, é um conto para dar risadas ou aterrorizar-se?

    R.: O autor dispõe elementos para proporcionar temor, ainda que não tenha acontecido comigo. Reitero que depreendo daqui um tema eminentemente social.

    FRIACA: Qual sua posição final sobre esse conto, inclusive sobre a nota?

    R.: Seu conto não me atraiu tanto, Luís Gama. Apenas disso, a crítica nele implícita somada com a estrutura escolhida e a boa verve de suas linhas são admiráveis! Nota: 3,8.

    Parabéns pela estória e boa sorte neste desafio.

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Publicado às 9 de março de 2025 por em Liga 2025 - 1A, Liga 2025 - Rodada 1 e marcado .