Dependurado no galho de uma árvore, no alto da colina, ele admira a placidez da cidade. Nem mesmo a corda envolta em seu pescoço se destoa do silêncio que invade a noite e as entranhas das casas que abrigam o povoado que, crédulo, hiberna por ventos de nova esperança.
As ruas estão vazias. As folhas secas dançam nos olhos dos gatos que miam, ouriçados, ao toque de recolher da lua. Fechadas as portas, as lojas lembram tristes mausoléus esperando a voz de seus donos para novamente alimentarem seus cômodos com a presença viva de seus clientes.
Neste cenário onde a sombra do voo de uma ave seria uma milagre rasgando o deserto, seus olhos passeiam livres de pecados. Sua alma corre solta, rente às nuvens, e pousa nas frestas das janelas trancafiadas. Não há furtos ou assombros; apenas um último olhar às suas origens, seus pactos de infância que, por ironia da vida, jamais serão cumpridos na fase adulta.
Ao lado da árvore onde, agora, seu corpo balança feito um aceno de um farol a um barco de sonhos, uma fotografia rasgada, um nome de menina riscado com sangue e perfume de lágrimas recentes: tesouros de um amor ceifado aos doze anos.
Enquanto ele se despede da terra que fez brotar versos, flores e dor em seu peito, outros anjos o aguardam em meio a uma chuva que se inicia. Não há sorrisos ou luz divina em seus semblantes; de seus dedos, correm fúria e neve. E quando estão zangados, os ossos da cidade congelam.
É um texto bem poético, pintando várias imagens para assegurar a sua ambientação. Enquanto é bem-sucedido em passar essa sensação de agouro, há mais uma menção a uma história, o enredo é quase subliminar.
Oi Rogério.
Este conto tem cara de poesia. A tristeza e a desesperança parecem brigar com as palavras bonitas. Uma história trágica se insinua nas entrelinhas: um amor perdido o suicidio de uma criança (?). Nada fica muito claro, é uma narrativa misteriosa.
Parabéns,
Kelly.
Que sinistro!! Tem um ar melancólico, desesperançoso e mesmo assim belo. Gostei. Bem enigmático.